O REINO TRIBAL
Capítulo 2: A Revelação do Éter
O céu estava tingido de um dourado noturno, quando Judith e eu caminhávamos pela trilha de terra batida que serpenteava pela vila. Cada passo me fazia perceber mais o quão primitiva, mas ao mesmo tempo acolhedora, aquela comunidade parecia. Os sons de crianças brincando, o aroma das ervas penduradas em cestos e o murmúrio de conversas ao longe davam ao lugar um ar simples, quase intocado pelo tempo.
Enquanto andávamos, Judith, sempre atenta, quebrou o silêncio.
– "Criança?"
– "Sim?" – Respondi, olhando para ela com curiosidade.
– "Você tem um nome ou apelido? Algo que eu possa usar para me dirigir a você?"
Sua pergunta me pegou desprevenido. A verdade é que, desde que reencarnei neste mundo, o conceito de identidade parecia algo distante e irrelevante. Mas era claro que, para ela, isso tinha importância.
– "Nenhum, senhora... não sei se tenho nome."
Ela parou por um instante, ponderando. Depois de alguns segundos, um sorriso tomou conta de seu rosto enrugado.
– "Bem... não se preocupe. Eu vou lhe dar um nome novo, um nome digno. A partir de hoje, serás chamado Khargas. (O Corajoso!) O que acha, pequeno?"
Senti uma onda de calor percorrer meu peito. Pela primeira vez desde que renasci, parecia que eu tinha um propósito, um ponto de partida.
– "Eu amei, senhora!" – Respondi com entusiasmo genuíno, os olhos brilhando.
Judith soltou uma gargalhada calorosa.
– "Hahah! Que bom que gostou, meu pequeno Khargas!"
Sua risada me contagiou, mas minha curiosidade logo tomou o controle novamente.
– "Senhora, qual é o seu nome?"
Ela pareceu se lembrar que não havia se apresentado.
– "Ah, claro! Sou Judith, mas todos aqui me conhecem como a Grande Xamã da vila."
– "Entendi. E como devo chamá-la?"
– "Chame-me de Judi, ou escolha algo que preferir."
Houve um breve silêncio, mas Judith não conseguiu conter a curiosidade.
– "Khargas, posso perguntar algo?"
– "Claro, vovó."
– "Como você é tão... esperto? Parece que sabe mais do que deveria para alguém com sua idade."
Meu coração quase parou. Se eu fosse descoberto, tudo o que planejei poderia ser arruinado.
– "Bem, vó Judi..." – Gaguejei. – "Eu aprendi observando as placas das barracas e os letreiros das lojas. Foi assim que aprendi a ler e escrever."
Seus olhos brilharam de admiração.
– "Que garoto impressionante! Você deve ser um gênio nato!"
Não sabia se as pessoas daquela vila eram ingênuas ou se Judith apenas tinha fé em meu potencial. De qualquer forma, senti que ela genuinamente acreditava em mim.
{....}
Quando chegamos à casa de Judith, fiquei surpreso com sua aparência. A construção era feita de madeira bruta e palha, adornada com pequenos totens e amuletos que pendiam do teto. O ambiente tribal era mais presente aqui do que em qualquer outro lugar que eu tinha visto na vila.
– "Bem-vindo ao meu lar, Khargas. É humilde, mas é meu."
– "É uma casa... interessante, vovó." – Respondi, tentando esconder o sarcasmo.
Ela me olhou de soslaio, mas não disse nada, apenas riu e me convidou para entrar.
Dentro da casa, o cheiro de ervas secando era forte, mas não desagradável. Judith se mexia com agilidade para alguém da sua idade, preparando algo para comer enquanto eu explorava o ambiente. A casa era cheia de artefatos curiosos, desde máscaras até pedras esculpidas, cada uma parecendo carregar uma história.
– "Está com fome?" – Ela perguntou.
– "Sim, estou faminto!"
Ela colocou alguns grãos e pedaços de carne em uma tigela, explicando que, se eu quisesse leite de cabra, poderia pegá-lo no curral. Enquanto comia, a curiosidade sobre sua vida começou a me incomodar.
– "Vovó, como você consegue sustentar tudo isso?"
– "Uso meu talento de xamã. Minha habilidade de ver o potencial e os poderes das pessoas é muito valorizada aqui. Recebo muitos recursos em troca de meus serviços."
Essa resposta abriu a porta para minha próxima pergunta.
– "O que exatamente é o xamanismo?"
Judith me olhou por um momento, como se ponderasse sobre a profundidade da minha pergunta.
– "Xamanismo, meu pequeno, é a capacidade de enxergar e manipular o Éter" – a energia que flui dentro de todos os seres vivos.
– "E o que é Éter?"
Ela riu, claramente surpresa com meu interesse.
– "O Éter é o que nos dá força, é a energia primordial que nos conecta com a natureza e com nossos ancestrais. Sem ele, seríamos frágeis como folhas ao vento."
As palavras dela me fizeram lembrar imediatamente da mana do meu antigo mundo. Tudo o que ela descrevia parecia bater exatamente com o que eu já conhecia, mas com um novo nome e nuances culturais diferentes.
– "Quem nos ensinou sobre o Éter?"
Judith se ajeitou na cadeira, parecendo animada para contar uma história.
– "Foi Bajin, o líder da tribo Sualiman. Ele liderou nosso povo para além da muralha de Elfirea e trouxe de volta o conhecimento sobre essa energia azul misteriosa. Desde então, o Éter tem sido a base de nossa força e tradição."
Eu ouvia com atenção, mas minha mente trabalhava freneticamente. 'Se este mundo realmente possuía mana.' – ou Éter – 'Eu poderia finalmente alcançar o potencial que nunca tive em minha vida passada.'
{....}
Com a total presença da noite, Judith terminou sua explicação e me mostrou um lugar para dormir. Antes de me deitar, olhei para o teto de palha e pensei no futuro. Aquele era apenas o começo, mas algo me dizia que minha jornada neste mundo seria muito maior do que eu imaginava.