VOCÊ ESTA LENDO (O REINO TRIBAL)
Capítulo 4: Nos Passos da Natureza
O sol começava a despontar no horizonte, tingindo o céu azul. A luz suave invadia nosso pequeno abrigo, trazendo um calor acolhedor que contrastava com o frescor da manhã. O aroma úmido da terra recém-aquecida misturava-se ao som distante de pássaros e ao farfalhar das folhas ao vento. Uma manhã rara, daquelas que renovam o espírito e preenchem a alma de calma e propósito.
Ao abrir os olhos, ondas de energia percorriam meu corpo. A exaustão do dia anterior havia desaparecido, substituída por uma sensação de vigor renovado. Mas não era apenas o descanso que me deixava assim; era a certeza de progresso. Os músculos doloridos e a mente mais aguçada, minhas evidências de que o treinamento estava funcionando. Cada esforço me aproximava mais de compreender e dominar a energia que fazia parte de mim.
— "Vó!" — chamei, me preparando para sair.
— "Posso ir à floresta de novo? Quero trazer algumas frutas e talvez uns peixes para o almoço."
Judith surgiu na porta, seus olhos verdes sempre me analisando com cuidado. Já a expressão era de preocupação, mas havia algo mais ali, talvez um toque de orgulho disfarçado.
— "Você tem crescido rápido, Khargas, porém a floresta não é um lugar totalmente seguro. Eu te avisei antes: não abaixe a guarda, nem mesmo por um instante. A natureza é bela, mas também pode ser traiçoeira."
Seus conselhos constantemente carregavam o peso da sabedoria, e eu sabia que eram ditos por amor. No entanto, hoje tinha algo em seu tom que soava como confiança em minhas habilidades. Talvez ela soubesse que esses desafios seriam necessários para meu crescimento, apesar do perigo.
Com um aceno respeitoso, concordei e parti em direção ao meu destino.
O riacho que eu tanto apreciava estava ainda mais vibrante naquela manhã. A água límpida corria suavemente sobre as pedras, criando uma melodia que acalmava os sentidos. O cheiro fresco da vegetação misturava-se ao som dos insetos, formando um cenário mágico.
Sentei-me à beira do riacho, deixando os pés tocarem a água fria, enquanto meus olhos percorriam a paisagem ao redor. Esse lugar era mais do que um refúgio; uma fonte de energia e equilíbrio. Aqui, a mana fluía livremente, conectando tudo ao meu redor.
Fechei os olhos e comecei a respirar profundamente, alinhando minha mente ao ritmo da natureza. Lentamente, senti a energia invisível que pairava no ar. Como se a própria essência do mundo se derramasse sobre mim, preenchendo cada parte do meu corpo com a vitalidade.
— "É tão pura..." — murmurei, impressionado pela qualidade da mana que absorvia.
A energia ao meu redor não precisava de rituais ou artefatos para ser controlada. Estava ali, acessível a quem soubesse enxergá-la. Nesse momento, compreendi o poder real que os povos tribais possuíam. Eles tinham uma conexão direta com essa força, algo que nem mesmo os grandes impérios feudais do meu mundo poderiam replicar.
Ao meditar, infelizmente senti algo familiar: o limite. Uma barreira natural que impedia o corpo de armazenar mais mana. A pressão crescente nos músculos e nos canais internos era um alerta claro.
— 'A energia é um presente, mas precisa ser tratada com respeito...' — as palavras de um mestre antigo ecoaram em minha mente.
Ultrapassar os limites sem a preparação adequada podia ser desastroso. Rupturas nos canais de mana, ferimentos internos e até mesmo explosões de energia são riscos reais para quem ignorasse essas advertências.
Respirei fundo, aceitando a limitação temporária. Meu corpo ainda estava jovem e inexperiente, mas isso não significava que eu estivesse estagnado. Existia outras formas de crescer, e uma delas logo me veio à mente.
Relembrei de uma prática comum usada por manipuladores: caçar criaturas místicas para obter cristais de mana. Esses cristais eram fontes puras de energia, capazes de fortalecer os canais internos e aumentar a eficiência do fluxo de mana no corpo.
Havia também a técnica avançada de criar um núcleo de mana, algo que só magos experientes ousavam tentar. Esse núcleo permitia armazenar uma quantidade imensa de energia, mas era um processo arriscado e exigia um controle muito sensível. Para mim, seria cedo demais para essa jornada.
— 'Não está na hora de pensar em um núcleo...' — refleti, afastando a ideia. — "Mas caçar criaturas, daqui a pouco pode ser possível."
Enquanto ponderava minhas opções, um som interrompeu meus pensamentos. Algo se movia entre as árvores, e os galhos estalavam sob passos pesados. Levantei-me rapidamente, empunhando minha lança improvisada. Meu coração disparou, mas minha mente permaneceu focada.
Então, entre a folhagem, vi um par de olhos brilhantes. Um javali selvagem! A criatura era massiva, com presas longas e afiadas que refletiam a luz do sol. Antes que eu pudesse reagir, ele avançou com força, movendo-se numa rapidez impressionante.
Instintivamente, desviei para a esquerda, sentindo o impacto do animal ao passar por mim. O javali bateu de frente com uma árvore, e o choque da pancada o atordoou momentaneamente. Era a abertura perfeita que eu precisava.
Avancei com precisão, cravando minha lança no pescoço da criatura. O golpe foi certeiro, atingindo profundamente uma área vital. O javali, já sem forças, soltou seu último grunhido antes de cair, imóvel.
Fiquei parado por um momento, contemplando o corpo sem vida à minha frente. A luta terminou rapidamente, porém, cada segundo tinha sido intenso. Um pequeno deslize custaria caro.
Levantei o javali. Tendo certeza que ele estava morto, apoiei-o nos meus ombros. O peso da criatura era significativo, mas não me incomodava. Para mim, ele simbolizava um troféu, maior do que apenas carne para o jantar: era um marco do meu crescimento, uma lembrança para contar.
O caminho de volta à casa de Judith parecia diferente. Cada passo estava firme, cada respiração cheia de confiança. A floresta, antes um lugar de mistério e perigo, agora um território onde eu podia crescer e explorar meu verdadeiro potencial.
— "Vó!" — gritei ao chegar, minha voz carregada de entusiasmo.
Judith surgiu na porta, com sua expressão habitual de exasperação.
— "Garoto, já não falei para parar de gritar? Vai acordar a vila inteira!"
— "Desculpe, vó..." — murmurei, embora o sorriso no meu rosto deixasse claro que não estava arrependido. — "Olha o que eu trouxe!"
Seus olhos se arregalaram ao ver o grande javali.
— "Você pegou isso sozinho?" — perguntou, cruzando os braços com desconfiança.
— "Claro, Vó! Hoje a sorte ficou do meu lado."
Ela balançou a cabeça, um sorriso surgindo em seus lábios.
— "Bem, sorte ou não, teremos um bom jantar hoje."
Naquela noite, enquanto ajudava a preparar a carne, senti uma onda de gratidão. O universo estava nos agraciando com sua bondade. Com certeza comeríamos uma deliciosa carne de javali! Que no dia seguinte, faria eu engordar uns quilinhos a mais. Isso era o de menos para se preocupar...