Os dois se sentaram na cama. Marcos vestiu o casaco e abraçou Lúcia. Um clima de amizade e sentimentos misturados o cercaram. Falaram de suas brincadeiras de criança. Ele fez um coque no cabelo dela com a mão lembrando como o tinha cortado uma vez.
Ela se deitou na cama com cabeça no travesseiro, ainda estava com muito sono. Ele lhe sorriu belamente fazendo uma caricia em seus lábios.
- Adonis apareceu no bar, onde eu trabalhava - comentou.
Lúcia não esperava por isso, sua expressão mudou.
- Aquele ogro nojento - Resmungou.
- Ele me provocou. Disse que...
- Que canalha? Talvez vá espalhar para o colégio todo para acabar comigo de vez - Protestou Lúcia.
- O que ele fez realmente com você? Me fala.
Lúcia escondeu o rosto com vergonha para não encarar Marcos. Mas ele insistiu no assunto. Queria saber dela a verdade.
- Ele só é um estupido.
Marcos apertou o pulso de Lúcia como quando fazia quando era só um moleque travesso. Ela tentou escapar do olhar interrogativo dele.
- Ele falou que... - Marcos rangeu os dentes antes de prosseguir. - Que mexeu com você bem aqui - Pôs a mão na coxa de Lúcia quase chegando a tocá-la mais intimamente. Queria pressiona-la para que falasse.
- Eu conheço você, não pode me esconder nada.
- Tire sua mão da minha coxa, está doendo - Pediu apertando a mão dele para que a tirasse. - Você chegou agora, não sabe o que passei todo esse tempo. Eu até tinha esquecido você. Não se ache no direito de querer que eu me revele para você - disse com lagrimas nos olhos.
Ele tirou a mão, prensou os dentes de novo num súbito de raiva.
- Eu nem sei nada de você. Tudo mudou, não somos mais crianças - Falou Lúcia.
Ele fixou a mão no rosto dela agora. Ela a segurou.
- Olha aqui. Eu vou acabar com aquele babaca. Ele vai se vê comigo. Se ele mexer com você de novo, não me negue à vontade de ficar sabendo, ok? - Mexeu a cabeça dela com a mão. - Ok?
- Tudo bem - ela respondeu.
Marcos se levantou e foi para janela a fim de sair. Num impulso Lúcia o abraçou pelas costas. Pode sentir seus músculos peitorais pelas palmas das mãos. Ele apenas as tirou se afastando. Sem nem ao menos se virar para ela. Saiu então pela janela.
- Durma mais um pouco. A gente se vê no colégio - Despediu-se descendo pela arvore.
- Você é o mesmo de sempre, espinhoso - Falou Lúcia para si mesma se jogando na cama.
Depois de cochilar por meia hora, Lúcia acordou. Foi ao banheiro e ligou a torneira da banheira, colocou sabonete espumante. Tirou o colam que ainda estava impregnado com transpiração. O cheirou para sentir se o perfume de Marcos ainda estava nele. Sorriu e jogou-o no cesto de roupa. Entrou no banho, pôs os fones e curtiu sua cantora favorita. Passou a mão na parte da coxa em que Marcos pegara. Não parava de pensar nos beijos dele. Não sabia ao certo que o que estava sentindo. Aquele moleque cresceu. Porem às vezes se comporta com gentileza, às vezes com agressividade, paixão e ao mesmo tempo como um rapaz e um moleque. Mas no fundo ainda era seu espinhoso, seu primeiro beijo, seu primeiro amor e agora seu protetor.
Saiu do banho e se arrumou. Pegou suas coisas e desceu. Viu sua mãe na cozinha cortando bolo de milho, isso aguçou seu paladar.
- Que cheiro bom. Eu adoro bolo de milho e adoro minha mami.
- Você me parece contente! Tem alguma novidade para contar?
- Por enquanto não e você?
- Sabia que a nossa vizinha Mayara retornou?
- É, ouvi dizer.
- Nem tive tempo de ir visita-la.
- Vocês terão tempo, moramos tão perto.
- Mais tarde vou visita-la, não parece que anda bem de saúde.
- Mesmo?
- Vou esperar você voltar para irmos juntas.
- Sério? - Lúcia mordeu o lábio.
Abraçou a mãe e saiu. Olhou para os lados procurando ver seu espinhoso. Sentiu-se patética. Subiu para o ônibus, procurou um banco para sentar. Foi puxada por alguém que a fez sentar bruscamente. Quando viu, era seu espinhoso.
- Grosseiro - Retrucou. Pensou em se levantar.
- Nem pense em sair do meu lado - Exigiu a fitando com um sorriso encantador.
Lúcia fez uma careta mordendo os lábios. Este gesto deixou Marcos excitado. Realmente a beleza dela o prendia. Sua escudeira se tornou numa atraente garota. As qualidades que desenvolvera como bailarina o deixara mais apaixonado.
- Não faz isso.
- Isso o que?
- Morder os lábios é feio.
- Então encontrou uma coisa feia em mim? - Disse debochando. - Mordo quando eu quiser, a boca é minha.
- Não, não é sua - Disse rabiscando o dedo na boca de Lúcia. - É minha - Afirmou.
- Você não pode... Não é meu dono.
- Sou. Sempre fui.
- Que ridículo? Só por que foi meu amiguinho de infância não te faz meu dono.
Ele riu.
- Eu sou e pronto.
- Não.
Os dois discutiram até descer no ponto central.
- Para de me seguir.
- Vai ser impossível, eu também faço esse mesmo trajeto para o colégio.
Lúcia deu de ombros e correu. Estavam atrasados. O portão já estava fechado.
- E agora? Como vou fazer para ensaiar? Droga!
- Se esse for problema? Eu sei de um lugar bem bacana para você ensaiar.
- Mesmo?
- A academia do meu tio Gil.
Lúcia teve dúvidas.
- Não é uma boa ideia.
- Por que não é?
- Por que é uma academia de boxe.
- Preconceituosa! - Ele deu uma tapa leve na cabeça dela.
- Ai. Não é preconceito. É que seu tio pode não gostar.
- Eu falo com ele. Peço permissão.
- Senhorita Evelyn e senhor Donavan! - Chamou o diretor Coutinho do lado de dentro do portão que os encarou com um humor nada agradável.
Os dois ficaram paralisados fitando a expressão imponente do diretor. Ordenou que o portão abrisse para que pudessem entrar e os levou direto para secretaria.
'' Estamos ferrados'' murmuraram.