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Chapter 23 - 23 — QUEM REALMENTE É BENJAMIN, PADRE?

Julio convidou a mulher para entrar. Fez esforço para que não demonstrasse a repulsa que sentia só por tê-la ali na casa de seu Deus. Imaginou, inclusive, que aquilo poderia ser um presente de Deus, talvez uma carta na manga, se conseguisse persuadi-la.

Ele sabia que ela não tinha ciência de quem o garoto era ou do que Ben e toda a sua família eram, mas isso não desfazia o fato de que aquela mulher e seu marido eram servos de Satã. Trabalhavam para ele e, por isso, no final, seriam punidos também.

O padre podia ver o cansaço estampado no rosto dela. Tantas coisas estranhas aconteceram naquele curto período de tempo desde que haviam chegado em Rio Denso e ninguém dera explicação alguma, nem a ela e provavelmente nem ao marido.

Julio fechou a porta quando Elisa se acomodou em um banco. Seu Deus era muito esperto. Aquela mulher, ali! Jamais passara por sua cabeça disseminar a palavra do Senhor a ela, mas Aquilo era obra Dele, com certeza. Mostrava-lhe o próximo passo. Sentia-se ainda mais protegido, vigiado e ajudado pelo seu Deus.

Foi ela quem falou primeiro, e Julio a ouviu, com um largo sorriso acolhedor no rosto.

— Meu nome é Elisa, padre. Acredito que já nos vimos antes, no dia que chegamos aqui.

Claro que ele lembrava. Como poderia esquecer? Estava feliz em ver novas pessoas na cidade. Fazia tempo que o demônio não permitia a entrada de ninguém, e aquilo trouxe paz ao coração do padre. Mas, quando o garoto apareceu, tudo mudou. Ninguém estava preparado para aquilo. Aqueles olhos... os mesmos olhos do filho do Demônio. Aquele que eles deixaram escapar no dia em que deveriam ter dado fim a tudo. E agora estava de volta. Julio sabia que um dia aquilo aconteceria, mas não imaginava ser pego de surpresa. Os olhos espantaram todos, e ele não podia julgá-los. Quem não teme o olhar do Diabo?

— Ah, sim, me lembro de você. Desculpe por nossa recepção. É que fazia muito tempo que não recebíamos a visita de alguém — disse o padre, sentando-se do lado da mulher. Ele pousou uma mão acolhedora sobre a mão dela. — Veio até aqui para se confessar, minha querida?

Ela o olhou com afeição, e, naquele momento, Julio soube que a tinha. Ela, acima de tudo, era mãe e faria tudo que ele dissesse para proteger seu pequeno demônio.

— Vim atrás de conselhos... e talvez respostas, padre.

— Então, terei o imenso prazer de ajudá-la no que eu puder. — O padre mantinha o sorriso evangelizador sempre armado.

Mas ela não sabia por onde começar. Queria saber mais sobre Ben. Queria saber sobre a velha que a abordara e também a respeito do bebê que ela disse ter perdido. Também se lembrava daquela música, vinda de uma voz invisível... e pensar nisso fez lembrá-la do timbre, da entonação. Aquela voz que havia cantado era a mesma que a abordara na rua. Como pôde deixar aquele detalhe passar? Enquanto se questionava, uma luz clareou seus pensamentos.

— Quem realmente é Benjamin, padre? E por que ele não nos deixa ir embora?

Julio gargalhou por dentro. Imaginava que ela começaria exatamente por aquela pergunta, mas não sabia se deveria revelar tudo naquele dia. A mãe do demônio talvez não acreditasse nele no começo, mas, quando começasse a juntar os fatos, tudo faria sentido. As peças se encaixariam e ela seria dele. Seria a peça-chave na limpeza da cidade, depois a descartaria. Iria enviá-la para junto dos demônios. Todos para o Inferno, enquanto a cidade voltaria a ser de Deus.

— Promete que não contará isso a ninguém, Elisa? Nem ao seu marido e principalmente a Ben ou Berta?

A mulher mordeu os lábios. Depois de tudo o que acontecera na cidade, ela não confiava em mais nenhum Mendonça, mas ter de omitir de Augusto seria difícil. Os dois não guardavam segredos um do outro. Aquilo lhe soava como um tipo de traição.

Percebendo a relutância na resposta da mulher, o padre falou:

— É para a segurança do seu filho e do seu marido, acredite. Se o que eu contar aqui chegar aos ouvidos dele, não gosto nem de imaginar o que acontecerá com vocês.

Elisa assentiu, embora o coração doesse. Internalizou que seria por um bem maior, que seria um sacrifício por amor, para que se livrassem daquela cidade de uma vez. Não seria capricho, muito menos traição. Não, não seria. A segurança das pessoas mais importantes da vida dela precisava daquele ato difícil.

Então o padre começou.