Depois de muitas semanas viajando pelas terras nulas, Kelvisk e Arkadius estavam exaustos e sem forças para continuar. Então, decidiram parar em uma taberna para descansar por uma noite.
Os cavalos que estavam usando logo se deitaram nas palhas que estavam no chão, forrado para essa mesma função. Arkadius era muito curioso a respeito de tudo; foi dessa maneira que Kelvisk entendeu como ele era tão esperto e como conseguia manipular as pessoas com facilidade, o que apenas o deixou ainda mais atento quanto ao seu aliado.
Alguns homens que estavam bebendo ficaram olhando para os dois, desconfiados de que poderiam ser sobrenaturais, o tipo de gente que não era bem-vinda naquelas terras. Todos odiavam magos, vampiros e outros dessa raça, como eles chamavam. Tudo por causa da destruição das dinastias reais dos seis reinos, há muitos anos.
O portador da lâmina de Coldbreath entrou no estabelecimento e foi direto ao balcão, pedindo duas canecas de vinho adocicado. Arkadius pediu puro, e Kelvisk apenas ficou olhando para ele; o camarada gostava de coisas caras.
— Me diz uma coisa: como conseguiu a espada de Coldbreath?
— Faz muito tempo. Eu tinha vinte anos. Na madrugada em que completei essa idade, estava dormindo na cama quando, de repente, acordei sentindo algo em cima de mim. Quando abri os olhos, a espada estava em cima do meu corpo e, ao pegar no cabo, a lâmina brilhou e eu fui transformado em um Lich. Desde aquele dia, passei a ter visões do futuro, da profecia se cumprindo, e pesadelos todas as noites sobre as visões. Fora o fardo pesado de querer impedir a profecia e, ao mesmo tempo, ter que cumpri-la sem querer, mas sendo obrigado…
— Nossa… deve ter passado por uns bocados. Quando fui nomeado pelo Hannibal, pensei que tudo iria mudar na minha vida, que eu ganharia respeito e prestígio. Mas, quando fui negociar com os que mandavam nos recursos, percebi que eu não tinha nenhum pingo de temeridade da minha parte; ninguém ligava para mim, nem olhava nos meus olhos. Até o dia em que encontrei os braceletes, aí sim, tudo mudou.
— Como conseguiu? — Kelvisk pergunta, tomando alguns goles de vinho.
— Humm… foi difícil, mas consegui. As duas estavam com os anões e gigantes. Quando fiquei sabendo, fui até o encontro deles e precisei matar os líderes e chefes. Só assim tomei posse das relíquias.
— Os chefes dos anões e gigantes estão mortos? — Kelvisk pergunta, surpreso.
— Sim, foi o dia mais feliz da minha vida. Sério, tudo mudou naquele grande dia. Até que eu perdi para o Hannibal naquele duelo e, quando fui colocado naquela prisão, perdi todas as esperanças de almejar a vitória algum dia, até que você me libertou… agora sinto que tenho uma nova oportunidade nas mãos e que não posso desperdiçar nenhum momento. Agradeço-o por isso, meu caro! — Arkadius diz, brindando as canecas uma na outra.
— Ei?! Vocês aí? Se fossem mais inteligentes, falariam mais baixo, mas ouvimos tudo. Vocês não deveriam estar aqui! Entreguem a espada e prometemos não machucá-los muito… — diz um dos oito homens que estavam em pé na frente de Kelvisk.
— Quer que eu resolva isso? — Arkadius pergunta, tomando em um só gole todo o vinho.
— Eu resolvo… — Kelvisk se levanta da cadeira rapidamente, tirando a lâmina da bainha e ativando o poder da espada.
— Minha nossa! — diz o rapaz que o havia chamado.
— É A LÂMINA DE COLDBREATH! — falam todos os outros ao mesmo tempo, recuando alguns passos para trás. Alguns deles, que estavam na entrada do recinto, decidem sair e fugir dali.
Os dois, então, partem dali para o reino élfico, que estava bem perto daquela última cidade. Apenas agora teriam que enfrentar a Floresta Sombria. Depois de muitas horas atravessando-a, não encontraram, por incrível que pareça, nenhuma criatura mortal pela estrada, o que deixou os dois bem confusos e mais atentos a cada passo que davam.
Ao avistarem a entrada do castelo real, havia vigias nas altas muralhas, segurando tochas nas mãos e observando a região inteira. Quando perceberam os dois se aproximando, tocaram os sinos e abriram os portões, enviando alguns elfos a cavalo com arcos e lanças nas mãos.
— Senhor Kelvisk? O senhor por aqui novamente? Fico surpreso com a facilidade de chegar até aqui vivo e bem… — diz o líder do grupo.
— Preciso falar com o rei. Trouxe um aliado para que seja ajudado com o controle dos poderes. Podemos entrar? — Kelvisk pergunta, descendo do cavalo.
— Sim, vamos. Sigam-nos, por favor.
Assim que adentraram o lugar, os dois foram recebidos com músicas suaves e muita comida, uma recepção calorosa e muito luxuosa da parte da realeza.
— Rei Eldarion, prazer em revê-lo! — Kelvisk diz, fazendo uma reverência e apertando a mão do rei.
— Kelvisk… prazer, meu amigo. É bom vê-lo bem.
— Onde está a rainha? — Kelvisk pergunta, sentando-se na almofada.
— Ela está descansando no momento. A manhã foi bem agitada para ela hoje. A que devo a sua presença? E como vai a sua missão? Conseguiu fazer o que pretendia?
— Sim, esse meu companheiro é o Arkadius. Creio que o senhor se lembra dele, não?
— Oh… Arkadius… nossa… creio que as coisas mudaram bastante com o tempo que se passou, não? — o rei pergunta, confuso.
— Vim até aqui pedir a sua ajuda. O Arkadius ainda não atingiu o ápice do seu controle, então queria que o ajudasse a conseguir.
— Entendo… Kelvisk? Poderia me acompanhar? Tenho algo que gostaria de lhe mostrar. Se não se importar de esperar, senhor Arkadius, é particular… — fala o rei, se levantando.
— Sem problemas, senhor. Eu aguardo. Vou aproveitar esses aperitivos deliciosos. Obrigado pela recepção!
— Aproveite. Vamos, Kelvisk.
Depois de se afastarem bastante, Eldarion levou Kelvisk para um dos andares de cima, onde pudessem ver Arkadius de longe.
— Kelvisk? Poderia me explicar por qual motivo trouxe esse homem até aqui? Não me diga que o que me pediu é verdade…
— Sim, senhor Eldarion. Quero que ajude ele a conseguir controlar seus poderes. Acredite, terá que confiar em mim. Infelizmente, não posso contar os meus motivos reais por estar fazendo isso. O senhor não sabe, mas a senhorita Halayna e meu companheiro Vilkus não estão mais comigo no momento. Então, as coisas mudaram bastante. Apenas posso lhe contar que estou cumprindo a profecia da minha maneira e consegui um jeito de fazer isso. Basta confiar em mim!
— Está bem. Não gosto disso, odeio ficar confuso e sem entender as coisas, mas vou confiar em você. Só espero que saiba o que está fazendo, meu amigo. Vamos ajudar o Arkadius.
Quando todos terminaram a refeição, Kelvisk pediu um lugar para descansar primeiro, antes que começasse o ritual, pois não haviam tido oportunidade de fazer isso na última cidade que passaram.
Os homens que ficaram tiveram uma morte trágica, membros arrancados de todos os lados e cabeças rolando no chão, espalhando sangue por toda a madeira da passagem de clientes do estabelecimento.
As notícias sobre aquele ocorrido voaram como uma forte rajada de vento vindo de todas as direções possíveis, e todos os habitantes das terras nulas já estavam informados de que havia dois homens perigosos na região deles. Kelvisk sabia que isso ia acontecer, mas não estava se importando mais com isso. A partir dali, as coisas iriam mudar bastante e o rumo dos conflitos seria decisivo.
Mas os povos das terras nulas começaram a se preparar como nunca haviam feito antes. Os antigos povos das seis realezas começaram a desenterrar suas espadas com cristais elementais e a treinar para uma possível guerra.
As coisas começaram a tomar um rumo bem inesperado para Kelvisk. Ele sabia que haveria retaliações, mas não esperava que os povos estivessem dispostos a morrer tentando impedir a instauração do reinado das trevas. Todos preferiam morrer lutando do que permitir que o fim da bondade acontecesse diante de seus olhos. Até os mais jovens estavam com coragem nas veias para lutarem pela continuação da existência do bem, mas o que ninguém sabia é que as coisas seriam totalmente diferentes do que todos estavam esperando.
— Senhor Hannibal?! Vim avisá-lo que a discípula de Coldbreath chamada Sanja está viva! E, infelizmente, o meu ex-marido Goldon entregou para ela o colar verde e me traiu diante dos meus olhos, o que não deixei barato e o matei pela traição ao senhor… — diz, fazendo uma reverência.
— Sanja está viva? Então, realmente, o escolhido da profecia pretende destruir o meu reinado. Não podemos mais ficar sozinhos com as relíquias, Artana?! Você já avisou ao Tauron para que viesse o mais rápido até aqui?
— Sim, meu pai. Acredito que ele já esteja a caminho.
— Então, vamos aguardar. Espero que ele não seja alvejado durante o caminho… — Hannibal diz, levantando-se do trono.
— Grande líder? Quer que a gente siga caminho para encontrá-lo? Podemos escoltá-lo até aqui, seria mais seguro — Hácan indagou, preocupado.
— Faça isso. Não quero arriscar perder mais uma relíquia…
— Senhor Hannibal? — Mentilí fala, se aproximando — sua esposa quer vê-lo em seus aposentos. Disse que é urgente.
— Certo… — diz, deixando a sala do trono.
Enquanto Kelvisk resolvia um problema dos seus planos, Hannibal se preparava para manter o seu reinado. Quem iria vencer, apenas o tempo diria, mas cada vez mais o caminho dos dois se entrelaçava um no outro, e Kelvisk tinha planos para fazer com Hannibal. Agora, como isso iria acontecer, apenas o destino poderia resolver.