A noite chegou devagar, como se o mundo ao redor estivesse em sincronia com os pensamentos de Perséfone. O colar repousava sobre a mesa, brilhando sob a luz suave do abajur. Era quase impossível desviar o olhar da joia, não apenas por sua beleza, mas pelo peso simbólico que carregava.
Ao lado do colar, o diário de Helena permanecia aberto. Perséfone se perguntava: quantas escolhas como aquelas ela própria havia adiado? Quantas vezes seu medo de seguir o coração a tinha impedido de viver plenamente?
Decidida a não passar mais uma noite presa a reflexões, ela vestiu uma jaqueta e saiu. A brisa da noite estava fresca, e o som das ondas ecoava suavemente à distância. Perséfone caminhou até a praia, onde o colar parecia ter uma conexão especial, como se as areias e as rochas guardassem memórias invisíveis daquele romance trágico.
Sentada na beira do mar, ela se permitiu sentir tudo. A tristeza, o arrependimento, mas também a força nascente de alguém que estava determinada a recomeçar.
Um Encontro Inesperado
Enquanto contemplava o céu estrelado, um som a tirou de seus pensamentos. Era o som de passos sobre as pedras. Perséfone virou-se rapidamente, seu coração disparando.
– Não queria assustá-la – disse uma voz masculina, grave e calma.
Era Miguel, o jovem que trabalhava no café da vila. Ele segurava uma lanterna e parecia genuinamente surpreso ao encontrá-la ali.
– Não esperava encontrar ninguém aqui a essa hora – acrescentou ele, aproximando-se devagar.
Perséfone sorriu, sentindo-se um pouco constrangida. – Eu precisava de um tempo sozinha, mas parece que a praia é mais popular do que imaginei.
Miguel riu suavemente. – Este é o meu lugar favorito. Venho aqui sempre que preciso pensar... ou fugir um pouco do mundo.
Havia algo na sinceridade de Miguel que deixou Perséfone à vontade. Ela se surpreendeu ao perceber que não se importava com a interrupção.
– E você? – perguntou ele, sentando-se a alguns passos de distância. – Parece que está buscando algo mais do que apenas um pouco de silêncio.
Perséfone hesitou por um momento, mas acabou cedendo à honestidade. – Estou tentando entender uma história. Uma história que talvez me ajude a entender a minha própria.
Miguel arqueou uma sobrancelha, curioso, mas não pressionou. Em vez disso, apontou para o céu.
– Já reparou como as estrelas são mais brilhantes aqui? Acho que é porque estamos longe de todas aquelas luzes da cidade. É engraçado... quando você se afasta do barulho, começa a ver coisas que estavam ali o tempo todo.
As palavras dele ressoaram profundamente em Perséfone. Talvez fosse exatamente isso que ela precisava: afastar-se do caos para enxergar o que sempre esteve dentro dela.
Um Vestígio do Passado
No dia seguinte, Perséfone acordou com um novo senso de propósito. Havia algo na conversa com Miguel que a fez perceber que não estava tão sozinha quanto imaginava. Decidiu retomar a busca por respostas – desta vez com mais determinação.
Enquanto reorganizava os pertences que havia encontrado na casa, notou algo que antes lhe escapara: uma velha caixa de madeira, escondida no fundo de um armário. Dentro, havia cartas, algumas fotos desbotadas e, curiosamente, um mapa da vila com marcas feitas à mão.
O mapa parecia indicar lugares específicos – um X vermelho na praia, um círculo próximo à praça da vila, e outro na floresta ao norte. Perséfone imediatamente reconheceu a praia, mas os outros locais permaneciam um mistério.
Ela pegou o diário de Helena e começou a folheá-lo novamente, buscando qualquer referência a esses lugares. Finalmente, encontrou uma entrada que mencionava a floresta:
"Arthur disse que há algo que ele precisa me mostrar. Algo escondido na floresta, que ele afirma ser a prova de que nosso amor pode sobreviver a tudo. Eu não sei se estou pronta para saber o que é."
Perséfone sentiu um arrepio ao ler aquelas palavras. Era como se Helena estivesse deixando pistas para ela, guiando-a para algo que precisava ser descoberto.
A Caminhada pela Floresta
Naquela tarde, Perséfone decidiu seguir o mapa até o ponto marcado na floresta. O caminho era denso e sinuoso, mas ela se sentia guiada por uma força invisível.
Depois de quase uma hora caminhando, chegou a uma pequena clareira. No centro, havia uma estrutura de pedra coberta por musgo – uma espécie de antigo poço ou esconderijo.
Dentro, encontrou uma caixa de metal, selada mas ainda intacta. Perséfone usou uma pedra para abrir a tampa, revelando algo que a deixou sem palavras: um pacote de cartas, todas endereçadas a Helena, mas nunca enviadas.
Cada carta era uma confissão de amor, escrita por Arthur em um tom de desespero e devoção. Ele falava sobre os obstáculos que enfrentavam, sobre os planos que tinha para fugirem juntos, mas também sobre o medo de que o mundo os separasse.
A última carta, porém, era diferente.
"Helena,
Se você nunca ler esta carta, ainda assim vou escrevê-la, porque preciso acreditar que as palavras têm poder. Sei que estou indo contra tudo o que me ensinaram, mas não posso viver sem você. Se o destino quiser, estaremos juntos. Mas, se não, quero que saiba que meu amor será eterno, como o diamante que te dei."
Enquanto segurava as cartas, Perséfone sentiu uma onda de emoção invadi-la. A história de Helena e Arthur não era apenas sobre amor; era sobre coragem, sacrifício e a força de lutar por aquilo que realmente importa.
De volta à vila, com as cartas em mãos, Perséfone sabia que ainda havia muito a descobrir. Mas, acima de tudo, sentia que estava aprendendo algo fundamental sobre si mesma: que a força não vinha da ausência de medo, mas da decisão de seguir em frente, apesar dele.