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Chapter 9 - VIII. DIFERENÇA

Certa noite, enquanto preparava o fogo para que meus pais pudessem cozinhar, minha mãe me assistia entoando um cântico que eu havia aprendido recentemente. Sem perceber sua presença, recitava distraído, batendo um graveto contra o outro:

"Lady Lacklez guarda, em seu vestido negro,

Sete mistérios, segredos do ego.

Um anel, não para adornar,

Uma palavra ardente, não para desafiar.

Perto da vela do marido, oculta e secreta,

Uma porta sem maçaneta.

Numa caixa sem tampa ou chave,

Descansam as pedras do marido, suave.

Há um enigma que ela mantém guardado:

Lacklez não sonha, mas vive um sonho encantado.

Em uma estrada que não se pode percorrer,

Enredada em mistérios, a encanta sem se mover."

Essa canção infantil, ouvida apenas duas vezes, fixou-se em minha memória como um carimbo. Mamãe me ouviu e se aproximou do fogo.

― O que você estava cantando, querido? ― Seu tom era suave, mas não escondia a insatisfação.

― Uma canção que ouvi em Villow ― respondi, evasivo. Passear pela cidade era proibido, como meu pai sempre nos advertia.

Ela permaneceu em silêncio por um momento, antes de falar:

― Não é uma canção apropriada. Já refletiu sobre o tema?

Na verdade, não tinha pensado nisso até então, mas ao reconsiderar, percebi a conotação sexual óbvia.

― Sim. Não havia percebido isso antes.

A expressão de minha mãe suavizou, e ela acariciou meu cabelo com ternura.

― Sempre pense nas palavras que canta, meu amor.

Senti que havia escapado do sermão, mas não pude deixar de perguntar:

― E como isso é diferente de alguns trechos de "Apesar da espera dele"? Como aquele onde George pergunta a lady Dinah sobre um chapéu: 'Ouvi tantos homens falarem dele que eu mesmo gostaria de experimentá-lo, para ver se serve.' É bastante claro o que ele realmente está insinuando.

Mamãe ficou em silêncio por um momento, antes de uma nova expressão surgir em seu rosto. Talvez falar aquilo tenha sido demais para um garoto beirado os nove anos de idade.

― Diga-me você, qual é a diferença?

Desprezava essas perguntas traiçoeiras. A diferença era clara: uma causaria problemas, a outra não. Esperei um instante antes de negar com a cabeça.

Mamãe se ajoelhou suavemente diante de mim.

― A diferença... vá buscar o suporte para mim, por favor? ― Dei-lhe um leve empurrão e corri para pegá-lo na parte de trás da carroça. ― A diferença está em falar algo a alguém e falar algo sobre alguém. A primeira pode ser uma grosseria, mas a segunda é sempre mexerico. ― Ela prosseguiu: ― Além disso, lady Dinah é apenas um personagem. Lady Lacklez é uma pessoa real, cujos sentimentos podem ser feridos. ― Levantou o olhar para mim.

― Eu não sabia ― protestei. Deve ter mostrado uma expressão desolada, pois mamãe me puxou para um abraço e um beijo carinhoso.

― Não há motivo para chorar, querido. Apenas lembre-se de sempre pensar no que faz. ― Passou a mão em minha cabeça e me ofereceu um sorriso radiante. ― Acho que você pode se redimir com lady Lacklez e comigo se for procurar umas urtigas-brancas para eu colocar na panela do jantar de hoje.

Qualquer desculpa para escapar do julgamento e brincar um pouco nas árvores à beira da estrada era bem-vinda. Já estava longe antes mesmo que ela terminasse de falar.

Devo esclarecer que a maior parte do tempo que passei com Marcy era durante minhas horas de folga. Continuava a cumprir minhas obrigações na trupe, mas não lamentava a perda dessas horas. A energia incessante de uma criança e meu desejo insaciável de conhecimento tornaram aquele ano uma das épocas mais felizes que já vivi.