Com o fim dos tremores e a terra finalmente parando de estremecer, Octávio observou a devastação ao seu redor. O eco dos estrondos ainda reverberava em sua mente, mas, pouco a pouco, o silêncio começou a dominar a paisagem, tornando-se quase ensurdecedor. A grande nuvem de poeira, que ofuscava sua visão e ocultava o que restava do mundo, começou a ceder, como uma cortina sendo lentamente puxada para o lado, revelando um cenário de tirar o fôlego.
Diante de Octávio, o que antes era uma região montanhosa havia sido transformado. A montanha que, antes era imponente e sólida, agora ostentavam fendas profundas, como se a própria terra tivesse sido rasgada e remodelada. Grandes formações de cristal começaram a emergir do solo, brilhando com cores vívidas, refletindo os primeiros raios de sol que atravessavam a névoa de poeira. Eram como joias gigantescas, irradiando uma luz que contrastava com a destruição ao redor, trazendo uma beleza inesperada ao caos.
O chão, marcado por rachaduras que serpenteavam como veias, exalava um calor residual do cataclismo recente. De algumas dessas fissuras, surgiam pequenos jatos de vapor, enquanto fontes de água cristalina brotavam, criando pequenos rios que começavam a formar novos lagos e cachoeiras em meio às ruínas. A água fluía com um brilho translúcido, refletindo o novo mundo que havia emergido.
Flores estranhas e luminosas começaram a desabrochar ao longo das margens desses rios recém-formados, suas pétalas pulsando suavemente com uma luz azulada. Pareciam ter brotado das profundezas da terra, trazidas à superfície pelo evento colossal. E ao longe, no horizonte, Octávio avistou uma grande árvore, imensa e solitária, com folhas douradas que cintilavam como ouro sob o sol fraco. Ela parecia estar no centro de tudo, como um núcleo, de um novo ciclo de vida que surgia.
Luna, ao lado de Octávio, ergueu o focinho, farejando o ar como se captasse o cheiro da mudança do mundo. Seus olhos verdes-amarelados brilhavam com curiosidade e vigilância, refletindo o cenário de mudança ao seu redor. Octávio ficou completamente encantado ao avistar a majestosa árvore de folhas douradas. O brilho delas parecia hipnotizá-lo, um vislumbre de algo antigo e poderoso no coração daquela nova paisagem. No entanto, o chamado urgente de Luna quebrou o encanto. Ao olhar para ela, percebeu que sua fiel companheira estava encolhida entre suas pernas, completamente apavorada, o que o deixou inquieto. Luna, normalmente confiante e cheia de atitude, agora tremia e baixava as orelhas como se estivesse sentindo algo muito além da compreensão de Octávio.
Sem entender o que havia assustado tanto ela, ele se abaixou para tentar confortá-la, passando a mão suavemente por seu pelo escuro. Mas foi nesse exato momento, ao se curvar, que ele notou algo estranho. Grandes sombras passaram rapidamente pelo chão à sua volta, como se uma imensa nuvem tivesse obscurecido o sol.
Octávio levantou a cabeça instintivamente, o coração disparado, e o que viu fez seu sangue gelar. No céu acima deles, uma vasta formação de criaturas reptilianas voadoras cruzava o ar, suas silhuetas sinistras contrastando contra o céu empoeirado. Eram de todos os tipos, cortes e tamanhos. Alguns tinham asas finas e longas, outros corpos robustos e escamas que refletiam a luz, com caudas serpentinas que pareciam chicotes no ar. Eles estavam indo em direção à grande árvore de folhas douradas, como se fossem atraídos por ela.
No entanto, foi uma única criatura que realmente mergulhou Octávio em um profundo desespero. No meio do enxame de répteis alados, uma gigantesca figura dominava o céu. Com cada bater de suas imensas asas, o vento se distorcia violentamente, capaz de gerar tempestades com a força de furacões. Suas escamas negras brilhavam como metal sob o sol, e seus olhos eram dois faróis brilhantes de poder e malevolência. O som que suas asas faziam ao cortar o ar era ensurdecedor, e o simples peso de sua presença fez o coração de Octávio acelerar. Nunca em sua vida ele havia sentido algo tão aterrador, como se o ar ao redor estivesse sendo drenado por aquela criatura colossal.
Luna, sentindo o mesmo terror, se apertou ainda mais contra as pernas de Octávio, quase incapaz de se mover. E enquanto ele olhava para o céu, sem fôlego, a mente de Octávio disparava em busca de soluções.
Mas o perigo iminente o forçou a agir apressadamente. Sem tempo para hesitar, Octávio agarrou Luna nos braços e começou e correu para dentro do abrigo que agora se encontrava em ruínas, lá dentro ele pegou tudo que poderia ser salvo, e sem hesitação alguma partiu para o mais longe possível daquela área, a imagem da gigantesca figura e sua presença avassaladora, ficaram gravados na mente de Octávio.
.....
Semanas se passaram desde que Octávio e Luna haviam abandonado o abrigo na montanha, eles viveram por grande partes destes dias como nomades, nunca parando firmemente em um local para levantar um abrigo, muito diferente do que Octávio fazia anteriormente, e o motivo disto e a sombra do medo que aquela gigantesca figura pós sobre ele, não importa o quanto ele havia andado ou se distanciado daquele local, ele sempre sentia que não tinha sido o suficiente, isso apenas mudou após ele adentrar em uma região pantanosa. Onde ele finalmente sentiu uma diminuição do seu medo pela figura.
Luna por sua vez não ficou atormentada por tanto tempo quanto Octávio, mas ela nunca discordou ou mostrou insatisfação com as constantes mudanças de locais que eles fizeram, afinal ela por instinto sabia que ainda estava em área de risco mesmo estando e kilometros de distancia daquela Figura.
Ao adentrarem a região pantanosa, Octávio e Luna mantiveram-se constantemente alertas. Cada passo dado era realizado com muito cuidado, pois o terreno desta região era traiçoeiro e escondia armadilhas naturais, como eles podiam ver através dos corpos sem vida de algumas que tiveram a infeliz sorte, de caírem em uma delas. O silêncio era opressor, quebrado apenas por sons distantes de criaturas ocultas na vegetação, Octávio mantinha os sentidos aguçados. pós ele sabia que era apenas questão de tempo até algum novo perigo, se mostrar entre as sombras ou na água turva.
Luna, ao seu lado, seguia seus instintos, farejando o ar úmido em busca de qualquer sinal de ameaça. Ambos tinham o conhecimento táctico e estavam acostumados a viver em tensão constante, mas o pântano era um diferencial para eles, pois eles nunca antes haviam se aprofundado em um ambiente similar a este antes.
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Após horas adentrando na região pantanosa, Octávio percebeu uma mudança preocupante no terreno. O solo, que já era úmido, tornava-se cada vez mais lamacento e instável, dificultando seus movimentos e tornando a locomoção um verdadeiro desafio. A cada passo, seus pés afundavam mais profundamente, e ele sabia que se continuassem assim, poderiam se encontrar presos em algum ponto mais traiçoeiro ou vulneráveis a ataques inesperados.
Refletindo sobre a situação, Octávio decidiu arriscar uma abordagem diferente. Prendeu Luna com segurança em suas costas, usando as cordas que sempre levava consigo, e voltou sua atenção para as grandes árvores que cobriam o pântano. Com a lama dificultando o avanço no solo, sua única opção era ganhar altura. As árvores imponentes, com suas raízes expostas e troncos grossos, ofereciam uma rota potencial.
Respirando fundo, ele começou a escalar uma das árvores mais próximas, usando seus conhecimentos e agilidade para evitar galhos podres e partes escorregadias. Luna, com seus sentidos aguçados, ficou quieta, confiando plenamente no julgamento de Octávio. Subir pelas árvores poderia ser arriscado, mas se isso os mantivesse fora da lama traiçoeira, talvez fosse a melhor chance de atravessar o pântano com segurança e encontrar um caminho menos perigoso.
Enquanto subia pelo tronco da Árvore, Octávio e Luna notaram algumas "rochas" se movendo lentamente pelo pântano, essas "rochas" tinham um aspecto estranho, elas sempre se moviam em direção a onde tinha ondulações na agua, Octávio não sabia o que elas eram, mas de uma coisa ele poderia ter certeza sobre elas, que quem que as encontrasse, não teria um dia agradável.
...
Ao alcançar o topo da Grande árvore, Octávio foi surpreendido por uma visão que, por um momento, tirou-lhe o fôlego. Diante dele, estendia-se um vasto mar de árvores que parecia se fundir com o horizonte. As copas das árvores formavam um grande tapete verde acinzentado, com algumas partes cobertas por uma leve neblina que pairava sobre a paisagem pantanosa.
Ainda maravilhado com a deslumbrante vista do mar de árvores que se estendia diante dele, Octávio foi subitamente arrancado de seus pensamentos ao ouvir um rosnado irritado vindo de Luna. Ela, sempre vigilante, sentia algo que ele não havia notado. O som baixo e feroz que ela emitia era um claro aviso: um inimigo estava se aproximando.
Octávio imediatamente se virou, seus instintos aguçados pela sobrevivência já preparados para o combate. Olhando ao redor, ele procurou qualquer sinal de movimento entre as copas das árvores ou do tronco abaixo. mas infelizmente para ele, a ameaça vinha de outro ponto que ele não havia considerado, o céu.
Antes que Octávio pudesse reagir uma enorme sombra se projetou sobre ele. Descendo rapidamente das copas das árvores, uma criatura gigante e emplumada mergulhou em sua direção, cortando o ar com um bater de asas feroz. Em questão de segundos, garras poderosas o agarraram, puxando-o violentamente do topo da árvore.
O impacto foi abrupto, e Octávio mal teve tempo de segurar firmemente Luna antes que ambos fossem arrastados para o ar. A criatura, uma ave de proporções imensas, possuía penas escuras que se mesclavam com a névoa do pântano, tornando-a quase imperceptível até o momento do ataque. Suas garras eram afiadas como lâminas, apertando com força os ombros de Octávio, enquanto o vento gelado soprava ao redor deles.
Suspenso no ar, Octávio lutava para respirar, o peso do momento e a altitude o desorientando. Luna, em um movimento rápido e instintivo, se soltou das cordas que a prendiam às costas de Octávio. Em um ato desesperado, ela cravou suas mandíbulas na pata da criatura, mordendo com toda a força. O ataque foi eficaz. A grande ave soltou um doloroso grasnado e, sem opção, liberou Octávio e Luna de suas garras.
Enquanto caíam em queda livre, Octávio segurou Luna firmemente nos braços, esperando pelo impacto brutal contra o solo. O vento rugia ao redor deles, e sua mente corria, preparando-se para a dor que inevitavelmente viria. No entanto, ao invés de um choque violento, o que o aguardava foi uma surpresa.
Ao invés de cair diretamente no chão lamacento, Octávio e Luna foram suavemente amortecidos por um mar de folhas e galhos densos, que formavam um manto natural entre as árvores. As copas espessas, que antes pareciam distantes e inatingíveis, agora serviam como uma rede de segurança, desacelerando a queda e evitando um desastre.
Ainda atordoado, Octávio respirou fundo, sentindo o alívio percorrer seu corpo. Ele olhou para Luna, que parecia igualmente surpresa, mas ilesa. As folhas e galhos os haviam protegido, e o impacto foi tão leve que, por um momento, ele achou que estava sonhando.
Agora, seguros entre as árvores, Octávio e Luna precisavam tomar uma decisão rápida. A grande ave, furiosa após ser ferida por Luna, havia retornado com ainda mais agressividade. Ela mergulhou em um ataque devastador, suas garras afiadas rasgando o ar. Sem tempo para pensar, Octávio, com reflexos rápidos, agarrou Luna em seus braços e se lançou para o lado, evitando por pouco o golpe mortal da criatura.
O coração de Octávio batia acelerado enquanto ele corria sobre os galhos grossos das árvores, saltando de um tronco para outro. A ave não recuava; pelo contrário, a perseguição se intensificava. Ela mergulhava através das copas, suas asas poderosas derrubando folhas e galhos, quebrando tudo em seu caminho. O som de madeira se partindo e o bater furioso das asas criava um caos ensurdecedor ao redor deles.
Cada movimento de Octávio era calculado em um milésimo de segundo. Ele sabia que um erro poderia ser fatal. Enquanto corria, ele sentia os galhos se partindo sob seus pés, e Luna, agora mais alerta do que nunca, olhava para trás, rosnando em desafio à criatura. Que em resposta os atacou com uma furiosa rajada de vento de suas assas, a força do ataque os arremessou para fora da cobertura das árvores.
Luna caiu próxima a margem da agua onde viu uma das "rochas" parada silenciosamente sobre a agua, e vendo a "Rocha" uma ideia se formou em sua mente.
Ela começou a mancar, fingindo que havia quebrado a pata na queda, e choramingou de forma lastimosa, como se estivesse em dor. Suas orelhas abaixadas e a cauda entre as pernas completavam a encenação perfeita. Ao ouvir o lamento de Luna, a grande ave grasnou em satisfação, orgulhosa de sua vitória iminente. Com suas asas imponentes, ela desceu lentamente ao solo, observando sua presa com olhos penetrantes. Para a criatura, Luna parecia derrotada e frágil, uma presa fácil.
Com passos leves e calculados, a ave começou a se aproximar de Luna, que recuava lentamente a cada passo dado pela predadora, fingindo ainda mais fragilidade. O orgulho da ave crescia a cada segundo, vendo que aquela pequena criatura, que antes a ferira, agora não oferecia mais resistência.
Porem, quando Luna sentiu a agua em suas patas, ela parou de recuar, dando a ave uma falsa ideia de rendição da outra parte.
Decidida a acabar com a presa que ousara machucá-la, a grande ave ergueu seu bico afiado e desferiu um golpe rápido e certeiro, mirando a cabeça de Luna. No entanto, no último instante, Luna saltou para fora do caminho, e o ataque falhou. A ave, foi pega totalmente de surpresa pela súbita agilidade de Luna.
E Foi então que, em um movimento rápido e brutal, a "rocha" sob a água se revelou. Uma gigantesca boca em forma de bico, camuflada no pântano, emergiu e se fechou violentamente sobre a ave. O antes grasnado de triunfo da criatura foi rapidamente substituído por um grito agudo de pânico e dor. A ave lutou, agitando suas asas e tentando escapar, mas a força da criatura aquática era implacável. Suas garras poderosas e afiadas, que tantas vezes haviam causado destruição, agora não tinham qualquer chance contra o ataque feroz e implacável do predador submerso. O pântano, traiçoeiro e silencioso, revelava sua verdadeira natureza. Em questão de segundos, a grande ave, que antes dominava os céus, foi arrastada para as profundezas escuras e lamacentas.
Os grasnados desesperados da ave foram abafados pelas águas enquanto suas asas agitavam a superfície, criando pequenas ondas que logo se acalmaram. O pântano engoliu tudo, e o silêncio voltou a reinar, exceto pelo som suave da água se movendo.
Luna, que havia assistido a batalha com a ave desde o início até o último grasnado de dor, estava satisfeita com o fim de sua adversária. Porém, antes que pudesse procurar por Octávio, uma gigantesca boca em forma de bico se projetou para fora da água em sua direção. A criatura emergiu rapidamente, pegando Luna de surpresa. Sem tempo de reagir, ela apenas fechou os olhos, esperando o mesmo destino cruel da ave.
Porém, segundos se passaram e nada aconteceu. Confusa, Luna abriu os olhos e viu a enorme boca convulsionando à sua frente. Foi então que notou Octávio, parado ao lado da fera, com sua espada profundamente enfiada em um dos olhos do Tarragante — um monstro colossal, semelhante a uma tartaruga mordedora, que usava o pântano para caçar silenciosamente.
Com um movimento controlado, Octávio retirou a espada dos olhos da criatura, que recuava com convulsões de dor antes de desaparecer novamente nas profundezas do pântano. Ele então se virou para Luna, ofegante, mas com um sorriso de alívio.
"Vamos," disse ele, apontando para uma direção. "Eu encontrei uma área menos... úmida por aqui."
Luna, repleta de alegria e alívio, saltou sobre ele. Octávio a recebeu de braços abertos, abraçando-a com ternura, grato por sua segurança. Juntos, eles deixaram para trás as águas traiçoeiras do pântano e se dirigiram para uma área mais seca, onde a terra firme predominava sobre as poças de água lamacenta.