Gabriel não se considerava alguém ansioso.
Não até aquele momento.
Após o pedido curioso feito por ele à Theodore, imaginara que o mundo seria cruel consigo. O tempo se arrastara de tal maneira, alimentando a ansiedade para ir treinar. Durante as aulas, mexia no celular despreocupadamente até se deparar a foto tirada de Theodore dormindo na biblioteca.
Havia fotografado por impulso, pois achava o loiro muito bonito enquanto dormia. Só que não fazia sentido algum manter aquela foto, quem teria a foto do amigo dormindo em seu celular? Entretanto não queria apagar, queria mantê-la ali para admirar secretamente.
Espiando pelo canto dos olhos, via Theodore usar fones de ouvido enquanto estudava. Parecia calmo e concentrado como sempre. Não ficava ansioso assim como ele? Bem, não era ele quem estava curioso sobre como era beijar outros garotos...
Apoiando os cotovelos sobre a mesa, Gabriel fechava os olhos desistindo de suas fugas incessantes. Quem estaria enganando? Nas últimas páginas do seu caderno estavam colados todos os bilhetes que trocara com Theodore desde que se conheceram. E agora havia tirado uma foto dele dormindo.
Até quando mentiria para si mesmo?
Não queria saber como era beijar outro garoto.
Queria saber como era beijar Theodore.
Precisava fazer aquilo.
Desde o momento em que quase o fizera, Gabriel não conseguia não se perguntar como seria. Qual sabor teriam os lábios de Theodore? Será que ele gostaria do seu beijo?
Certo... Uma vez que ficassem, as dúvidas seriam sanadas e suas vidas poderiam seguir o rumo normal. Um beijo e tudo voltaria ao normal. Afinal, só queria saber como era o beijo de Theodore. Então não precisaria de mais, não é mesmo?
Continuariam a ser amigos, conversariam sobre os jogos e estudariam juntos. Nada para se preocupar.
— O que foi, Gabi? Parece estranho.
Piscando algumas vezes, Gabriel abrira seu costumeiro sorriso para a garota ômega parada na frente de sua carteira.
— Nada demais, e então o que estava falando mesmo?
Sadie arreganhava a boca em um sorriso, puxando a cadeira da frente para se sentar.
— Fiquei sabendo que foi escolhido para representar o time no concurso. Meus parabéns. Vou te ajudar a vencer o meu irmão.
Coçando a nuca estando envergonhado, Gabriel havia se esquecido por completo o concurso. Nem fora até o comitê pra saber os detalhes daquela história toda. Muito menos queria participar seriamente. Só que todos pareciam bem mais empolgados por ele.
— Não quero vencer, só estou participando por livre e espontânea pressão do time.
— Deixa de ser bobo, você tem grandes chances de vencer. Além disso não vai precisar desfilar em uma passarela.
Empertigado, o alfa cruzava os braços sobre a mesa.
— Ah é? Como sabe?
— Não sabia? Sou a presidente do comitê, a ideia do concurso foi minha.
— Sua? — Rindo baixo, Gabriel chegava a conclusão que fazia sentido a ideia ter vindo de uma garota como Sadie. — Mas por que um concurso de beleza? Os meninos do time falaram que não se importam com esse tipo de atividade.
— Eu sei que não se importam, na verdade nossa escola nunca promoveu eventos desse tipo. Mas eu precisava dar uma ideia inovadora, o corpo docente queria algo pra fazer o time ficar... Como posso dizer... motivado?
— Eles ficaram é desesperados.
— Ora essa, não seja pessimista. Vai ser divertido. Além disso... Esse será o último campeonato colegial de Milles, quero que seja inesquecível pra ele.
O olhar sereno e familiar de Sadie era uma âncora que fazia Gabriel se lembrar de que ela era apenas uma garota. Mesmo que tentasse seguir tendências como qualquer outra, ou que agisse como uma patricinha de filmes adolescente, não deixava de ser uma garota.
Se bem que tendo Milles no time, sempre haverão garotas que aparecerão nos ginásios para torcer pelo time. Mesmo que vão para perto dele apenas para ver o alfa loiro. Contudo, Gabriel não reclamaria dos esforços de Sadie em emocionar o próprio irmão.
Nesses momentos ele enxergava uma face doce nela.
Estendendo a mão para afagar sua cabeça, o rapaz sorria para Sadie fazendo suas bochechas ganharem um tom rosado.
— Seu irmão irá adorar esse presente.
Com o sinal findando o intervalo os estudantes retornavam para seus lugares quando o professor entrara em sala de aula. Percebendo o vazio na carteira ao seu lado, Gabriel atentou-se na ausência de Theodore. Checou as horas no celular um tempo depois, concluindo que o ômega estaria, de fato, cabulando uma aula.
Varrendo a sala com os olhos, também encontrara a carteira do seu capitão vazia. Os dois estariam cabulando aula juntos? Por quê? O que estariam fazendo então?
Cerrando os dedos em punho, Gabriel fechava os olhos quando aquele sentimento tão estranho e inquietante se alastrava dentro de si. Detestava se sentir daquele jeito, como se tivesse força o suficiente para destruir o mundo. Isso sempre acontecia quando aqueles dois estavam juntos de alguma forma.
Por que se incomodava tanto?
Por que sentia raiva em saber, ou ver, que Theodore e Nicolas estavam juntos?
Teria Theodore contado sobre o seu pedido para o capitão? Se tivesse feito, Nicolas iria impedi-los? Não poderia, certo? Não era de sua conta, afinal. À menos que estivesse gostando de Theodore.
A sensação estranha aumentara, trazendo um gosto amargo em sua boca. Passara toda a aula imaginando onde raios aqueles dois estariam, e o que poderiam estar fazendo. Nenhuma ideia fora boa o suficiente, pois saber que estão juntos já lhe irritava.
Ficara ainda mais irritado quando os dois culpados entraram na sala de aula depois. Gabriel espreitara os olhos acompanhando o ômega ir até sua carteira. Theodore parecia cansado e até mesmo bocejava. Quando se sentou na carteira, tratou de deitar a cabeça parecendo ir dormir.
Ora essa... Se os dois estivessem juntos romanticamente, Theodore estaria mais animado, não é mesmo? Ou então Nicolas não era nada estimulante...
Observando o capitão do time também deitar a cabeça e dormir, Gabriel formava um leve bico nos lábios. Como poderiam aqueles dois estarem tão sonolentos assim? Se bem que era esperado de Nicolas, mas não diria o mesmo de Theodore.
De toda forma era um verdadeiro alívio ter o ômega em seu campo de visão. Mesmo que dormindo. Somente dessa maneira Gabriel pudera se acalmar e voltar a estudar.
Com o final das aulas, Gabriel mau tivera tempo de tentar falar com Theodore. Esperando na porta da sua sala estava Milles e Thunder, que o arrastaram para a quadra esportiva onde almoçariam e iniciariam o treino do dia. Sendo abraçado por Milles, percebia que seu novo amigo parecia ter voltado ao humor rotineiro, fazendo suas brincadeiras e distribuindo sorrisos para as garotas.
No dia anterior o alfa deixara estampado em seu rosto o quão desconfortável estava com Nicolas. Uma boa noite de sono poderia ter resolvido os seus problemas? Não, Gabriel realmente não sentia que seu amigo deixasse aquele assunto de lado.
Mesmo enquanto faziam o primeiro treino, não notara nada de estranho no seu amigo. Até o momento em que o capitão pisara na quadra ofegante. Imediatamente o semblante de Milles se tornara sério sem deixar de fuzilar o baixinho.
— Você está bem, Milles?
— Algo me incomoda nele.
Gabriel ajeitava a barra da camisa dentro do calção escuro enquanto observava o capitão seguir para o vestiário.
— O quê? Ele me parece normal, até passou as últimas aulas dormindo como sempre.
— Não tem como eu ter me sentido daquele jeito com um beijo de um beta. — Murmurava Milles girando a bola em suas mãos.
— Ele é um beta?
— Alfa que não é.
Milles empurrara a bola contra o peito de Gabriel e lhe dera as costas para entrar na quadra. Nunca havia sentido algum cheiro vindo de Nicolas, o que fazia sentido pensar que sua classe seria beta. Mas poderia um beta se interessar por um ômega?
Percebendo o rumo que suas preocupações seguiam, Gabriel olhara em volta sem notar a presença de um certo ômega loiro. E mesmo durante o treino e o almoço, não vira Theodore no ginásio.
Desde que trocaram bilhetes nas primeiras aulas o loiro simplesmente desaparecera da sua vista. Teria ficado assustado com o seu pedido? Mas ele havia aceitado o ajudar. Será que se sentira pressionado a dizer sim só pela amizade, ele dissera que gostava da amizade que tinham.
Não... Theodore não era o tipo de pessoa que aceitaria fazer algo por pressão. Ele sabia dizer não. Além disso, ele saberia que Gabriel entenderia a sua recusa. Afinal, fora um pedido de ajuda inesperado.
Sendo assim, por que não havia olhado para si desde então? Parecendo sempre longe. Como se fugisse... Será que Theodore não estaria no lugar marcado?
O nervosismo e ansiedade retornaram com força. Gabriel contava as horas para o treino acabar, recebendo a sorte de o técnico finalizar antes do tempo apenas para explicar sobre o campeonato das eliminatórias que fora decidido.
Mesmo recebendo o novo uniforme e a novidade de que seria um titular do time Gabriel não se empolgara. Quer dizer, estava feliz, é claro, mas não se comparava a sua vontade de correr para um certo lugar onde esperaria por um certo alguém.
— Saibam que seremos a segunda partida do dia, onde jogaremos contra dois times. Por isso descansem bastante, nada de dormirem até tarde e peçam para suas famílias virem assistir para torcer por nós.
— Nos encontraremos aqui na escola?
— Sim, já reservamos um ônibus pra nos levar até o ginásio onde acontecerá a partida. Ah, e antes que me esqueça, uma partida será de manhã enquanto a segunda será mais à tarde. Passaremos o dia fora então — O técnico olhara em volta coçando a cabeça — Conversarei com o Moss para planejarmos a dieta de vocês, nada de coca-cola e salgadinhos.
— Não quero comer a comida feita por ele, professor!
— Então fique com fome, não estamos obrigando a nada — Retalhava Nicolas.
— Sempre pronto pra defender a esposa...
Nicolas lançara um olhar afiado para Thunder, que se encolhera na direção de Milles e Gabriel. Cutucando o braço do alfa loiro, aproximou-se para sussurrar.
— Vai falar nada não?
— Por que eu deveria?
Empertigado, Thunder choramingava.
— Qual é, você não perderia a chance de falar a mesma coisa.
— Não fode, Thunder.
— Já terminaram de discutir a relação? — Retalhava o técnico ao cruzar os braços já ficando irritado. — Se não quer comer a dieta específica para atletas, então peça para os seus pais prepararem. Os olheiros de times oficiais vão levar em conta esse péssimo hábito seu. Estamos entendidos? Onde está Moss? Precisamos decidir isso logo...
— Pode deixar que eu falo com ele depois — Avisava Nicolas.
— Deixo contigo, capitão. Descansem molecada.
Os jogadores se espreguiçavam e seguiam para o vestiário, Gabriel checava as horas sorrindo satisfeito por estar adiantado para o seu pequeno compromisso. Seguira os seus colegas de time para o vestiário, porém não trocara de roupa. Apenas pegara sua mochila e saíra de fininho antes que notassem sua presença.