Seria possível alguém morrer de puro nervosismo?
De onde ele havia tirado toda aquela calmaria quando sentira Gabriel segurar seus pulsos e conversar consigo? Pelos céus, havia desenvolvido novas habilidades por acaso?
O coração batia desenfreado dentro do peito de Theodore. Lilian havia lhe aconselhado a ser indiferente com o alfa, agir como se nada tivesse acontecido. Dentro da cabeça do ômega aquilo seria apenas uma provocação para extrair uma reação esperada. Queria saber como Gabriel reagiria ao vê-lo tão diferente.
— Você tem que admitir que ele ficou babando quando te viu.
Lilian era a mais empolgada, mesmo que os dois estivessem enchendo as garrafas no bebedouro com água gelada. O lugar era afastado da bagunça entre os participantes do campeonato, dando vista para o time que usava o uniforme preto e dourado.
— Seu plano deu certo, estou surpreso.
— Hm... Então estão armando um plano?
Os dois loiros ergueram as cabeças e os olhos esbugalhados para o capitão marrento de braços cruzados. Engolindo em seco, Theodore apenas suspirava sem começar a se justificar. Voltara a encher as garrafas entregando para Lilian tampá-las e colocar na bolsa térmica com gelo.
— Desde quando guardamos segredos um do outro, Theo?
— Não é um segredo.
— É um plano. Para quê? Que mudança repentina é essa?
— A classe de Lilian me convidou pra representá-lo no concurso da escola. E como eu aceitei, ela disse que mudaria meu visual para que pudessem vencer.
— Quanta bosta estou ouvindo agora. Você caiu nessa, Theo? Desde quando uma turma inteira iria querer se aproximar de você?
— Ei! Por que desconfia tanto de mim? — Intervinha a garota baixinha, piscando os olhos claros com mágoa.
— Ninguém daquele maldito lugar é capaz de se aproximar de nós sem segundas intenções.
— Nico...
— Não conhece as pessoas da minha turma, então não diga que eles sejam ruins desse jeito!
— Se são pessoas que evitam Theodore por ouvirem boatos ridículos, é claro que são um bando de imbecis que só se aproximariam com segundas intenções!
Theodore segurara o ombro de Nicolas quando ele se aproximara ameaçadoramente de Lilian.
— Nico, meça suas palavras, certo? — Tendo os olhos vazios sobre si, Theodore sorria para o amigo — Você melhor do que ninguém sabe que os rumores à meu respeito são verdadeiros. Sou um ômega e sou gay, não tenho vergonha de mim mesmo.
— Sabe muto bem que me refiro ao que não condiz à realidade. Estão espalhando que você seduz os caras do time só pra transar...
— O querubim não é assim! — Explodia a garota com beicinho, ganhando a atenção dos dois rapazes. Parecendo uma pequena garota infantil, as lágrimas escapavam do seu controle na medida em que suas bochechas ficavam avermelhadas. — Theodore é uma pessoa gentil e honesta! Sempre disposto a ajudar os outros sem esperar nada em troca, um verdadeiro príncipe.
Nicolas soltara um riso abafado.
— Qual é garota, você não me engana.
— Você é malvado demais com o Theodore. Ele está todo feliz por se sentir bonito, então qual o problema dele continuar assim? Não me importo em usar o concurso como desculpa pra fazê-lo se sentir bem. Eu não me importo!
Prestes a responder a garota, Theodore dera uma cotovelada no braço do amigo baixinho impedindo-o de falar. Então o ômega fora até a garota tirando a bolsa que era esmagada em seus finos braços a deixando em seus pés.
Como poderia deixar aquela garota chorar daquele jeito? Ela lembrava muito a sua querida irmã mais nova quando fazia birra. Será que quando Lisa crescesse, seria como Lilian? Até mesmo seus nomes eram parecidos.
Theodore abraçara a garota contra seu peito, suspirando baixo enquanto se questionava como poderia acalmá-la. Quando sua irmã ficava de manha, doces e abraços a acalmavam. Mas não tinha nenhum doce consigo naquela manhã.
Tudo o que poderia fazer era acariciar seus cabelos dourados e macios, deixando que chorasse contra seu peito. Então, os dedos finos e compridos se agarraram às costas de Theodore, onde ela continuou a chorar manhosamente.
— Está tudo bem, Lilian. Nico está sendo protetor, isso é normal. Apesar de suas palavras serem rudes, ele é um cara legal.
— Como pode considerá-lo seu amigo se ele te trata desse jeito? Theodore é um garoto muito legal, e eu não estou aqui para enganá-lo.
Theodore lançou um olhar preocupado para Nicolas, que observava a cena com as mãos na cintura. Os dois amigos se encaravam e então o mais baixo resmungou.
— Garota, você deve ser nova na escola e não sabe como as coisas tem funcionado há um ano. Pare de chorar e solte o Theo.
— Não! Você vai brigar com ele. — Lilian apertara Theodore em seus braços, e o ômega a confortava da melhor maneira que podia.
— Ei... Solte ele. — Rosnava Nico arqueando a sobrancelha, sem ter respostas da garota. — Eu mandei você soltar o Theo agora!
O grito de Nicolas surpreendera os dois loiros, assim como o alfa moreno que acabara de chegar ali. A presença de Gabriel fora percebida, tornando a situação intensa. O ômega desviou o olhar para a garota agarrada à sua cintura, retomando a missão em acalmá-la.
— O que está acontecendo aqui?
Nicolas passava a mão entre os fios escuros e lisos, respirando fundo tentando se acalmar. Percebendo que um quinto elemento estava aproximando, a situação poderia perder o controle.
— O que quer?
— O técnico está te procurando...
Virando-se para a garota, Nicolas apontara para ela.
— Estarei de olho em ti pirralha. Se ousar fazer algum mau ao meu amigo...
— Nico, não viaja.
— Eu não vou fazer nada pra magoar o Theodore, porque eu gosto muito dele.
A declaração repentina de Lilian surpreendera três híbridos atletas. Nicolas arregalava os olhos com olheiras arroxeadas, respirando fundo. Seus braços tremiam, seus dedos se fecharam em punho. Estava prestes a explodir quando Milles intervira segurando a nuca do capitão.
— Quer atrasar a porra da partida, seu baixinho filho da puta? Anda logo que eu tenho mais o que fazer.
E assim Nicolas fora simplesmente arrastado pelo alfa loiro, que diferente de antes não tinha o seu costumeiro sorriso estampado no rosto.
Ficando para trás, Gabriel petrificara no lugar sem desgrudar os olhos daqueles dois que se mantinham abraçados. Theodore o olhara sem deixar de tentar afagar os cabelos de Lilian, e em seguida descera os olhos para a bolsa térmica.
Precisava ir para o ginásio entregar as garrafas para os jogadores antes deles irem pra quadra. Lilian ao menos parara de chorar, porém escondera o rosto contra o seu peito se agarrando em sua blusa.
— Está tudo bem, Lilian. Ninguém mais irá pensar isso de você.
— Ei Jones! Anda logo! — Gritava Thunder do ginásio.
— Theodore, eu...
— Não precisa se preocupar, eu me viro por aqui...
— Mas ela...
— Eu vou ficar com ela até que se acalme, não se preocupe.
Percebera que Gabriel estava relutando em ir, porém tivera de entrar no ginásio antes que fosse chamado novamente.
Estando devidamente sozinhos, Lilian erguera o rosto espiando a área e se afastando de Theodore.
— E então?
— Uau você é terrível. Como sabia que o Nico agiria desse jeito?
— Meu amigo que participa do time disse que tinha a impressão do capitão ser bem enciumado. Se ele não agisse desse jeito, como poderíamos fazer o seu paquera se sentir preocupado? — Ria Lilian ao pegar um lenço de sua bolsa para enxugar as lágrimas que escorriam.
— Será que não exageramos muito? Quero dizer... Tenho receio que ele vá atrás de você.
— Continuarei com o meu papel, não se preocupe haha. Mas a grande questão é o Gabriel... Como ele reagiu à minha declaração?
— Não sei dizer, ele pareceu bastante surpreso. Enfim, vamos entrar se não a galera ficará com sede.
Como se nada tivesse acontecido, Lilian e Theodore entraram no ginásio com a bolsa térmica. Aproximaram-se do técnico entregando as bebidas e logo se afastaram para a entrada do ginásio.
Apenas Theodore poderia ficar ao lado do técnico nos bancos como assistente, e por isso tivera que se despedir de Lilian. Estava receoso de deixar a garota sozinha, mas o alívio viera quando encontrara alguns colegas de sua classe a esperando.
— Uaaaaaau, ele é bonito...
— Eu disse! — Respondia Lilian pomposa com os elogios, mesmo deixando o mais velho envergonhado.
— Pela primeira vez eu acho que conseguimos vencer esse concurso.
— Nossa representante de turma tinha razão.
Theodore estava surpreso com aquele pequeno grupo de amigos que interagiam em grande respeito com Lilian. Eram dois rapazes e três garotas que lhe encaravam de cima à baixo surpresos, lhe cobrindo de elogios quanto à sua aparência.
— Quando ouvi os rumores, não imaginei que se tratasse de um cara bonito...
— Estou duvidando da minha sexualidade nesse momento. — Murmurava um outro garoto, recebendo uma cotovelada de Lilian.
— Mas você é mesmo...?
— Eu disse que isso não importa! — Repreendia a representante loira — Nosso querubim gostando de homens ou mulheres, alfas ou betas, não importa desde que ele nos ajude a vencer o concurso, certo?
— Certo... Então já que está acompanhada de seus amigos, eu vou indo pra quadra. Qualquer coisa me avisem, tudo bem?
Era a primeira vez que um grupo de estudantes da sua escola conversava com ele daquela maneira. Geralmente as pessoas o ignoravam com maestria, temendo ficar no mesmo lugar que Theodore por muito tempo. Já havia se esquecido de como era a sensação de estar com um grupo de pessoas que pudessem conversar normalmente.
Lilian era uma caixa de surpresas.
De qualquer maneira a grande questão era outra.
A primeira partida iria começar, e Theodore estava ansioso para saber quais seriam os resultados do pequeno teatro montado à pouco. Uma coisa era descobrir como Gabriel teria se sentido com o beijo entre eles, outra era lidar com a proteção de Nicolas.
Se Theodore fosse cuidar de um plano daqueles, não iria pensar no seu melhor amigo. Lilian fora geniosa em englobá-lo na sua trama.
Estaria devendo uma bebida doce a ela por isso.
Quando se sentou ao lado do técnico no banco perto da quadra, Theodore sentia um incomodo na barriga. Estava ansioso pela partida, observando atentamente o time se organizar para ouvir as últimas instruções.
— Enfrentamos esse time ano passado, e acredito que pouca coisa deve ter mudado. Eles são desorganizados com ataques rápidos, e geralmente seus saques são muito bons. Por isso focaremos na recepção e bloqueio, certo? Mas quero que Jones e Howard estejam prontos para trabalharem juntos em seus ataques rápidos.
Nos alto falantes eram anunciados o início das partidas. Os jogadores arrumavam seus uniformes e se aqueciam, logo indo para a quadra tomar suas posições. O apito da primeira partida soara, e então a bola fora jogada ao alto dando início ao primeiro turno das eliminatórias.
Certamente Theodore torcia para que o time de sua escola vencesse. Faltou pouco para conseguirem no ano anterior, mas o técnico mudara os treinos para garantir o sucesso nesse ano. Até imaginara que ficaria nervoso quando pisasse naquele lugar novamente.
Só que sua ansiedade estava centralizada em uma única pessoa. Mais precisamente no alfa que jogava na rede, focado na bola com uma expressão fechada. Gabriel estava diferente do que havia visto nos treinos, parecendo perseguir a bola com toda a sua força e energia.
Não tinha como desgrudar os olhos dele.
Cada movimento de Gabriel parecia seduzir Theodore de um jeito incontrolável. Principalmente quando balançava os cabelos que começavam a ficar suados. O ômega estava completamente hipnotizado, levando inconscientemente seus dedos a tocarem sua boca.
Pelos céus, sonhara com o beijo de Gabriel desde sexta-feira. Sentira uma conexão tão profunda com ele que era insuportável de lidar. Precisava de mais, muito mais.
E tê-lo próximo de si, mas longe de seu toque era agonizante.
Poderia mandar às favas o plano ardiloso de Lilian, mas precisava de respostas. Se agisse indiferente, Gabriel procuraria por si? Se estivesse sofrendo como ele sofre, então iriam se encontrar mais uma vez para ficarem.
Caso contrário a amizade retomaria seu curso natural, e Theodore não precisaria se humilhar na frente de Gabriel.
Sim, seria humilhante se fosse atrás do alfa perguntar se sentiu algo. Se gostaria de tentar de novo. E se Gabriel mudasse? Ficasse com nojo e se afastasse?
Não, Theodore não queria aquilo de maneira alguma. Preferia ser cuidadoso e observar atentamente as reações do alfa antes de concluir alguma coisa.