O que fazer quando você percebe que alguém está te evitando?
Retribuir o silêncio criando um espaço que deve ser respeitado, enquanto se espera a pessoa tomar a iniciativa em resolver o problema? Ou então ir atrás dela e perguntar o que raios estava acontecendo?
Theodore ponderava sobre a primeira, já que ele não tinha tanta coragem em erguer o queixo e encabeçar uma discussão. Principalmente quando alguns dias atrás ele mesmo queria que Gabriel se distanciasse. Agora conseguiu.
Deveria estar contente por ter conseguido, não? Contudo, Theodore se pegava constantemente olhando na direção do seu novo colega de classe. Olhadas rápidas e discretas, só pra saber o que ele estava fazendo.
Na sala de aula Gabriel parecia concentrado nos estudos, fazendo anotações sem se importar em ser vigiado. No pátio ele se reunia com seu grupo de amigos, com Sadie grudada em seu braço rindo escandalosamente jorrando felicidade e o seu cheiro.
O único momento que Theodore conseguia uma desculpa perfeita para olhar o seu novo colega eram os treinos da tarde. O time de vôlei se reunia logo após o almoço, começando os treinos com força total. E para a sua sorte, Nicolas havia pedido sua ajuda para analisar o desempenho dos jogadores antes do amistoso.
Lá estava ele. No calor infernal do final do verão, dentro de um ginásio, com um caderno e uma caneta em mãos e os olhos grudados nos doze garotos em quadra lutando para manter a bola no ar.
A concentração de Theodore era imensa graças ao comprimidos supressores que tomara ates, sendo capaz de ignorar os diversos aromas que emanavam na quara. Prestava atenção no tempo de movimento, a reação perante ataques rápidos, como o bloqueio montava uma estratégia em último tempo e as técnicas usadas em quadra.
Só que de vez em quando seus olhos claros escorregavam no rapaz alto de cabelos escuros grudados na testa por conta do suor.
Sua intenção era desviar o olhar antes que fosse pego, mas aquela visão tornara tal missão impossível. Gabriel balançava a cabeça sacudindo os cabelos molhados, respigando o suor. Seus olhos estavam focados na bola, sem piscarem um segundo. Até umedecera os lábios com a ponta da língua, como um predador planejando emboscar a sua presa.
E então o movimento de sua garganta ao engolir em seco antes de saltar fazendo um bloqueio fora o suficiente para Theodore prender a respiração. Finalmente livre daquela visão, as bochechas do loiro pegavam fogo junto com seus pensamentos.
— Se acalme, Theo... Se acalme. — Sussurrava o garoto para si mesmo, baixando a cabeça disfarçando o rubor que lhe tomava conta.
O grito dos jogadores ao marcarem ponto ecoara pelo ginásio, ganhando novamente a atenção de Theodore. O rapaz pigarreara baixo se ajeitando no banco, tornando a fazer as análises para o seu melhor amigo. Dessa vez seus olhos não lhe traíam para buscar uma nova vista, em compensação seus pensamentos foram traiçoeiros em relembrar – ou talvez criar – detalhes marcantes de uma gota de suor escorrendo pela testa de Gabriel.
Ou então a forma como a ponta da língua havia umedecido os lábios, com aqueles olhos tão atentos...
— Como está indo aí, Theo?
Forçado a recobrar a consciência, Theodore respirou fundo para se acalmar, coçando a nuca visivelmente envergonhado. Tentara disfarçar novamente, relutando em olhar Nicolas nos olhos. Portanto lhe estendera o caderno sem dizer nada.
Nicolas pegara o caderno lendo as detalhadas anotações, erguendo os olhos para observar os respectivos jogadores por alguns instantes. E então ele assentira ao devolver o caderno.
— Quando terminar me empresta pra eu fazer o plano de treino, quero trabalhar as falhas deles.
— Não seria melhor deixar isso para depois do amistoso? Jogar com outra equipe irá mostrar falhas mais precisas...
— Eles tem muito o que melhorar ainda, principalmente o novato. Por isso vou corrigir isso antes do amistoso, pra depois focarmos em outra coisa. — Nicolas baixou os olhos para o amigo, cerrando o cenho ao reparar nas bochechas rosadas. — Você está bem?
— Estou ótimo! — Respondera rapidamente Theodore, com um sorriso amigável.
— Você está vermelho. Não é o cio, é?
Nicolas erguera a franja loira para tocar a testa do amigo, checando sua temperatura.
— Eu realmente estou bem, Nico.
— Que marido dedicado esse, cuidando de sua esposa.
Theodore encolhera os ombros quando os olhos cansados de Nicolas se tornaram sombrios, ainda que os dois amigos estivessem se encarando. Lentamente Nicolas retirou a mão da testa de Theodore ajeitando sua franja.
— Theo, me diga já fez análise de desempenho do Mckenzie?
— Eh? A-Ahn... Não fiz ainda..
— Então anota aí pra eu pegar pesado, porque nosso atacante parece ter tempo livro pra falar bosta.
— Estou seguindo o capitão apenas — Zombava o rapaz alto. — Além disso você não pega pesado comigo, capitão.
Dando alguns passos até o alfa, Nicolas sorria de lado ao pegar a toalha jogada no banco. A girando no ar, enrolou a toalha e a chicoteara na barriga de Milles, que fizera uma careta de dor.
— Ei seu tampinha! — Nicolas movia a toalha novamente, atacando Milles na barriga sem desfazer o sorriso travesso do rosto. — Ei! Chega disso!
— Por quê? Está doendo? Estou te machucando? Você aguenta, já que eu não sei pegar pesado com você, não é mesmo?
Milles dava alguns passos para trás tentando fugir da maldita toalha, mas Nicolas diminuía a distância continuando a lhe acertar.
— Isso vai ter volta!
— Cale a maldita boca e volte pra quadra, Mckenzie!
O grito do técnico foi a única coisa que fez Nicolas cessar o ataque, mas jamais em desfazer o sorriso zombeteiro. Nem mesmo quando Milles lhe mostrara o dedo do meio e uma careta. Na verdade ele apenas rira diante da raiva do mais alfa.
Retomando o lado de Theodore, Nicolas se sentava no banco cobrindo a cabeça com a toalha.
— Vocês dois vivem brigando por minha causa, me sinto culpado por isso.
— Não esquenta Theo, às vezes eu penso em dez formas diferentes de matar Mckenzie, e quando ele provoca eu simplesmente... Coloco em prática.
— Que horror, Nico. — Ria Theodore voltando a fazer as anotações em seu caderno.
— Mas então... Por que você estava todo corado? — Theodore erguera os olhos para o amigo com surpresa, reparando que Nicolas já havia baixado os ombros em cansaço, continuando a lhe fitar intensamente. — Seja sincero, porque eu vi.
— Se você viu então por que me pergunta?
— Porque eu quero a sua sinceridade.
Suspirando baixo, Theodore coçou a cabeça e então lhe segredou.
— Estou incomodado apenas. Depois do dia em que fizemos o trabalho, Gabriel não falou mais comigo.
— Isso não é bom?
— Deveria ser, não é? — Engolindo em seco, Theodore olhava para as próprias mãos, acariciando as veias que apareciam saltadas na pele. — Não consigo não reparar nele.
— Desde quando?
Receoso com a possível bronca que levaria de Nicolas, Theodore apertou os dedos e não ousara lhe olhar novamente. Apertara os lábios antes de sussurrar...
— Eu fui sincero com ele, e Gabriel disse que não se importava. Mas tenho a impressão de que Sadie disse alguma coisa.
— Provavelmente... — Concordou Nicolas esticando as pernas e se inclinando para trás no banco — Vi ele conversando com Milles esses dias, eles tem se tornado bons amigos.
Theodore fechara os olhos ao imaginar o assunto sendo tratado com Gabriel. Seu coração acelerava em medo e receio só de pensar que ideias erradas poderiam estar sendo contadas e espalhadas mais uma vez.
— Então, respondendo à minha pergunta, você só está preocupado com a opinião de Gabriel? — Nicolas tornara a se apoiar nos joelhos, cerrando os olhos escuros sobre o amigo que lhe retribuía. Naquela troca de olhares entre os dois, o capitão do time arregalava os olhos lentamente — Ah não, de novo não Theo.
Rapidamente Theodore desviou os olhos tornando a comprimir os lábios. Encolhendo os ombros, queria sumir dali. Sabia muito bem que aquele tom de voz só queria dizer que seu pequeno segredo fora visto por seu melhor amigo.
Um segredo que Theodore queria esconder.
Desejo.
— Isso vai dar merda, sabe disso. Da última vez você não sabia que o cara era da família de Sadie, mas dessa vez você sabe que eles são próximos. Não goste daquele cara, Theo. Ele já está nas garras da bruaca.
— Não se ninguém souber. — Sussurrava Theodore cabisbaixo, com os olhos marejados. — Engolirei cada sentimento como uma doce sobremesa. E ninguém deverá saber.
O olhar de canto que Theodore deu ao seu amigo o fizera estender a mão para bagunçar os fios loiros, puxando sua cabeça para deitá-la em seu ombro.
— Tudo bem. Vamos fazer isso juntos, eu te protejo.
Theodore não deixara de sorrir agradecido pelo amigo que lhe estendia a mão mais uma vez.
Da quadra, Gabriel observava aquele abraço sentindo mais uma vez o gosto amargo em sua boca. Enxugando o suor da testa e respirando fundo, voltara sua atenção ao treino. Pulara o mais alto que conseguia, reunindo toda a sua força em sua destra para dar um corte na bola, descontando a sua fúria.