Sentado no banco com uma blusa perfumada e uma sensação acalorada em sua cabeça, Theodore tentava não ficar envergonhado na frente dos demais. Só que era impossível.
Doce perfume que lhe envolvia como um verdadeiro convite para sonhar. Se não estivesse em público, provavelmente afundaria seu rosto no tecido e inalaria aquele perfume como uma droga viciante. Teria de se conter.
Contenha-se!
Dobrando a blusa e a deixando em seu colo, Theodore obrigara-se a focar na quadra quando o time da outra escola havia chego no ginásio. O treino estava prestes a começar, e como lhe fora pedido que analisasse os jogadores, então teria de se concentrar.
Após o aquecimento dos jogadores eles formaram fileiras e se cumprimentavam estabelecendo as regras daquela partida. Fariam três sets de vinte e cinco pontos, e depois os técnicos conversariam com os times adversários para lhe darem conselhos. Em seguida eles fariam um treino físico em conjunto.
A partida dera início e Theodore logo anotava os jogadores em suas posições. Os olhos meticulosos acompanhavam os atletas com exímia atenção, sem precisar olhar o caderno enquanto escrevia rapidamente.
Tanto Gabriel quanto Nicolas não participaram do primeiro set. E pelo jeito que o capitão sussurrava alguma coisa pro novo jogador sem tirarem os olhos da quadra, imaginava que ele já fazia seus apontamentos e conselhos. O ômega não deixara de ficar aliviado que seu melhor amigo tivesse deixado a picuinha de lado, pelo menos em quadra.
Apesar do primeiro set dando a vitória ao time visitante, Milles havia encerrado a partida com um excelente ataque. Os gritos eufóricos das meninas na arquibancada rechearam o ginásio, causando uma onda de reclamações por parte dos jogadores adversários.
Dois jogadores saíram da quadra e deram lugar para Gabriel e Nicolas. No instante em que ele pisara em quadra, a mesma parecera pegar fogo. Theodore apertava a blusa em seu colo junto com o caderno lembrando-se de não deixar enganar pela fisionomia sonolenta de Nicolas.
O outro time começara sacando e o jogo para manter a bola no ar se iniciara. Milles continuava em quadra sendo alvo dos gritos das meninas, principalmente quando ele começara a ser mais exibido. Ele e Gabriel formavam uma boa dupla de bloqueio devido suas alturas, ainda assim o primeiro ponto fora para o time adversário.
Se antes aquela quadra estava pegando fogo, agora era o próprio inferno. Os gritos das meninas diante do biquinho manhoso de Milles enfurecera o capitão do time. Quando o outro time fizera o saque, um jogador recebera a bola e Gabriel se preparava para levantar.
Em questões de segundos Gabriel analisara a quadra encontrando um rapaz de pele pálida e ombros curvados, com suor escorrendo em sua testa grudando os fios escuros em sua pele. Aquele mesmo rapaz cuja aparência era tão desleixada e preguiçosa, tinha um ódio profundo em seus olhos.
Fora para aquele sujeito, da qual chamava de capitão, que Gabriel direcionou a bola.
Da mesma forma que o novo jogador fora ligeiro em escolher o seu companheiro de corte, Nicolas fora rápido para tomar a decisão.
As meninas da torcida se agitavam em perceber que Milles, estando o mais perto de Gabriel, se preparava para pular e cortar a bola.
Porém a bola fora cortada pelo jogador mais baixo.
E fora espetacular.
Theodore mau piscara, ficando boquiaberto junto com o seu professor de educação física quando Nicolas correra tão rapidamente e saltara bem mais alto que sua altura cortando a bola com tamanha força. Força essa que ecoara o som por todo o ginásio, silenciando absolutamente todo mundo.
O time adversário não se movera. Encaravam o outro lado da rede como se ainda esperasse por algum ataque. Fora tudo tão rápido e grotesco que não haveriam neurônios suficiente pra compreender como aquilo acontecera.
O capitão virara para a arquibancada, fuzilando o grupo de garotas emudecidas.
— Se eu ouvir mais um pio acabo com a raça de vocês e ainda coloco aquele demônio no banco por todo o campeonato.
— Ei, não precisa falar assim com elas!
— Isso aqui não é um desfile de moda, seu imbecil. — Rosnava Nicolas segurando a gola da camisa de Milles, que havia se aproximado ameaçadoramente. — Se quiser se exibir feito um modelo de revista cai fora, está atrapalhando.
— Rapazes voltem ao jogo ou eu expulso os dois! — Gritava o técnico, aproveitando quando os demais jogadores afastavam os briguentos.
A partir de então a partida fora silenciosa na arquibancada, mas barulhenta em quadra. Nicolas havia perdido por completo sua paciência fazendo questão de descontá-la em todos os cortes que poderia fazer.
Theodore suspirava baixo em anotar no caderno que seu melhor amigo deveria trabalhar mais o seu temperamento quando estivesse em quadra. O problema disso era que o baixinho era incomparável quando irritado.
Sempre que assistiam as partidas e acontecia de Nicolas ficar irritado, ele jogava acima de sua capacidade. Certamente gastava mais energia, o que o fazia dormir por mais de doze horas, mas era a peça chave do time. Por conta disso era difícil encontrar um levantador que pudesse lhe passar a bola com tamanha precisão, a ponto de acompanhar a alta velocidade de Nicolas.
Até a chegada de Gabriel.
Todo contente fora um Theodore fazer anotações sobre como aqueles dois poderiam, e deveriam, trabalhar como uma dupla chave do time. Se Gabriel conhecesse melhor sua capacidade como levantador, poderia deixar o bloqueio com Milles e ajudar o capitão no ataque.
Ah... As ideias simplesmente surgiam em sua mente. Theodore rabiscava tanto naquele caderno que mau vira as horas passarem. Somente sentira os dedos doerem de tanto escrever, quando o apito final do segundo set soara e os times foram descansar.
— Conseguimos empatar, mas já estou cansado demais pra aguentar um terceiro set. — Reclamava o professor aproximando de Theodore. — As bebidas estão aí?
— Aqui.
Marcus se agachara pegando a alça da bolsa térmica, parando logo depois de dar as costas ao aluno.
— Ah... Faça ele dormir. Quero testar o líbero no lugar do capitão.
— Sim senhor.
Os jogadores se dispersavam da quadra e o barulho das conversas retornaram. No segundo banco amadeirado estava o professor distribuindo as garrafas geladas e as toalhas para enxugarem os suor. Theodore observava-os de longe, ficando feliz por seu trabalho ser bem aproveitado pelo time.
— Ah, estou tão cansado!
Virando a cabeça para o lado encontrara Nicolas sentado no banco com os cotovelos apoiados nas pernas. Tendo duas toalhas guardadas consigo, Theodore usara uma delas para cobrir a cabeça de seu amigo enxugando o suor de sua nuca.
— Perdeu a paciência de novo cara.
— Não reclame comigo.
— Eu reclamo, a sua sorte é que o Gabriel foi genial em te acompanhar. Se não o professor estaria puxando a sua orelha.
Nicolas rosnara estendendo a mão pro amigo. Bufando, Theodore entregava uma garra de água pro amigo, que a virou de imediato bebendo um grande gole. Desviando o olhar, o ômega percebera a chegada de Gabriel com seu sorriso gentil e bem humorado de sempre.
O rapaz alto vinha em sua direção se sentando do outro lado livre de Theodore, também se apoiando nas pernas. Silenciosamente o loiro lhe entregara uma toalha e a outra garrafa d'água, que foram bem recebidos.
— Valeu, Theodore. Eaí, como me saí?
— Muito bem eu acho. O professor quase sai pulando de alegria. — Ria o loiro.
— É muito mais intenso que os nossos treinos. Curti muito a adrenalina.
Theodore arqueara a sobrancelha, reprimindo o riso ao olhar de canto pro amigo que estava silencioso à sua direita.
— Vai se acostumando, as partidas oficiais podem ser piores que isso.
A conversa fora interrompida pelo grito eufórico das meninas. Milles conversava com elas, tendo a proeza de fazê-la se aglomerarem perto da quadra.
— Moleque exibido, tomara que quebre essa maldita cara...
— Está resmungando de novo, Nico. — Reclamava Theodore, tornando a esfregar a toalha nos cabelos escuros do amigo. — O professor mandou você ir dormir. Deita aí e bons sonhos.
— Como você quer que eu durma como esse griteiro digno de um puteiro?
— Mate ele nos seus sonhos.
— Boa ideia.
Balançando a cabeça, Theodore ia para o lado dando mais espaço pro amigo deitar no banco, porém ele já estava se encostando em Gabriel quando Nicolas o segurou.
— Fica aí, eu deito no teu colo.
— O quê?
Nicolas percebera a blusa de Gabriel sobre o colo do amigo e rapidamente a segurou jogando-a na cara de seu dono. Resmungando ele se deitara no banco aconchegando a cabeça no colo de Theodore, fechando os olhos e cruzando os braços.
Balançando a cabeça, Theodore não ousara contradizer o baixinho irritado. Apenas ajeitara o boné dele em sua cara e jogara o moletom sobre seus braços para não pegar friagem.
E então virou-se para o outro jogador ao seu lado quando ele o questionara.
— Ele não vai jogar mais?
— Pode dar briga.
Apontando com o queixo para o jogador alto que paquerava ao lado da quadra, Theodore deixava claro a mensagem. Gabriel assentira compreendendo, mesmo não gostando muito de ver a facilidade que aquele capitão baixinho tinha de ignorar os rumores e permanecer tão próximo do seu salvador.
Sem dizer uma única palavra, Gabriel teve que voltar para a quadra e participar do último set da partida treino. Mas seus olhos, de vez em quando, fugiam para um certo banco de madeira onde havia um garoto dormindo no colo de um certo ômega loiro.
E vendo-o zelar aquele sono, fez com que um sentimento novo surgisse no peito daquele aluno transferido. Sem saber exatamente o que lhe desagradava tanto, aquele aluno alto e gentil dava lugar à um jogador irritadiço, mas silencioso se comparado ao seu capitão.
Fora a vez de Gabriel ser agressivo no jogo, mesmo usando uma máscara da bom moço. Seus bloqueios eram certeiros, seus levantamentos eram precisos, e seus cortes eram fortes. Não chegava ao nível de Nicolas, mas era o melhor da quadra naquela rodada.
Toda vez que marcava um ponto e comemorava com os seus colegas de time, Gabriel dava uma espiada naquele banco se amargurando cada vez mais com a visão.
A inveja fora o motivo para a grande vitória do time da casa.