Chapter 4 - A Fuga da Princesa

Oliver puxou Kayla por quilômetros, não se importando com a amiga tropeçando na grama devido aos saltos ou à barra do vestido, só decidiu parar quando se certificou de que não era possível mais ver os muros do Reino Central de Erelbron.

A Princesa tremia de medo, poderia jurar que o amigo estava prestes a matá-la. Oliver a olhava sério enquanto tentava recuperar a respiração e se sentava no chão para descansar.

A dupla permaneceu em silêncio por poucos minutos, o suficiente para parecerem séculos. Ficaram apenas se encarando com as respiração falhas até o garoto começar a rir sozinho, deixando a garota curiosa e furiosa ao mesmo tempo.

— Mas que porras você tem na cabeça, Oliver?! - Kayla se levantou e estapeou Oliver, que caiu no chão ainda na risada. — Eu não vi para onde corremos, como vou voltar para casa?!

— Você é burra ou se faz, Kayla? - Oliver recuperou o fôlego novamente e olhou a ruiva. — Estou te ajudando a escapar do plano do seu pai. Estou literalmente salvando a sua vida.

— Salvando como? Deixando-me perdida no meio da floresta?

— Não está perdida! Tem uma vila aqui por perto, é só atravessar o próximo rio e chegará lá. Vou deixar-te aqui porque o seu pai não pode saber que eu fui para o outro lado. Você vai até essa vila e vira na primeira quadra à esquerda da fonte da praça, depois na última casa tem um pequeno corredor atrás de um monte de caixotes, siga-o até o final e vai encontrar uma cabana. É onde minha família se escondia na guerra, fique lá o tempo que precisar. - tirou uma bolsinha de couro de dentro das vestes. Kayla reconheceu o barulho das moedas de ouro e o olhou confusa. — Vai precisar disso para se manter por um tempo. Há uma senhorinha florista que sempre está na fonte durante os fins de semana, ela vai te ajudar com um emprego.

— Não precisa fazer isso por mim, Ollie...

— Você salvou minha família nos dando um emprego e abrigo no Castelo. Agora é nossa hora de retribuir. Você não merece morrer nas mãos da sua família. Fuja e volte apenas para desmascará-los, ok?

— Não quero te deixar sabendo o que meu pai faz com você. - Kayla tentou alcançar o rosto de Oliver, mas ele segurou sua mão, sorrindo tristemente enquanto a acariciava.

— Eu vou ficar bem. Só me prometa que voltará para tomar o trono.

— Eu prometo.

Sorriram um para o outro e Oliver se levantou, dando um último abraço na amiga e a empurrando gentilmente em direção a floresta. Kayla deu alguns passos e olhou para trás, vendo-o acenar e sinalizar para que ela fosse logo, pois logo seu pai chegaria para verificar se o trabalho estava feito.

— E enquanto ao coração? - Kayla perguntou e o rapaz apontou para o lado esquerdo, onde um cervo se aproximava cuidadosamente em busca de comida. — Só não faça isso comigo por perto...

Oliver assentiu e Kayla voltou a correr pela floresta, segurando as lágrimas ao ouvir o choro do animal em meio a clareira em que estava. Ela odiava que ferissem animais inocentes, mas se era preciso para salvar a sua vida, teria de aturar aquela dor.

Kayla correu até chegar ao rio, onde parou para descansar e beber água. Sentia o corpo cansado e os olhos pesavam, implorando para fecharem, mas não poderia parar agora, estava próxima da vila e assim que chegasse lá poderia dormir por um tempo antes de seguir os conselhos de Oliver.

Resistindo ao cansaço, ela tirou os sapatos e jogou-os na correnteza, permitindo que fossem levados para longe e começou a caminhar em direção ao vilarejo. Seus pés pareceram lhe agradecer por ter se livrado dos saltos, Kayla sentia-se no céu por estar descalça novamente.

Não demorou muito para que finalmente chegasse ao local dito por Oliver. Era apenas um simples vilarejo próximo ao mar mas parecia estar deserta, não havia nem uma lamparina acesa, ouvia-se apenas o som das ondas se quebrando ao longe e o bater de asas de morcegos.

Seguindo as orientações do amigo, Kayla logo encontrou uma pequena cabana escondida entre duas casas ao final da rua. Entrou e impediu a entrada colocando alguns dos móveis contra a porta para que ninguém entrasse.

Era um lugar simples, grande o suficiente para que uma pessoa de tamanho médio pudesse andar sem se esbarrar na quina da mesa de jantar ou queimar as roupas no fogão a lenha. Tinham poucas coisas ali, apenas uma mesa com quatro cadeiras, um fogão de tijolos, uma cama feita de feno e um baú abaixo de uma pequena janela.

Kayla estava exausta, precisava dormir. Mas antes deveria pensar em um disfarce para não ser reconhecida pelos habitantes.

Vasculhou cada canto da construção e encontrou um vestido longo na cor branca com alguns detalhes em marrom que lhe serviu perfeitamente, um belo par de sapatos sem salto que lhe couberam como s sapatinho de cristal serviu na Cinderela, e um pouco de uma substância que as mulheres usavam para pintar os cabelos.

O cheiro do líquido era terrível, era como se alguém tivesse saído de férias e esquecera de armazenar corretamente a comida. Sua textura era semelhante às tintas que usavam na parede e tinha cor preta.

— Obrigada, família Duncan. - agradeceu à família do amigo enquanto se livrava do vestido de baile, do espartilho e das incontáveis camadas de saias extras que pareciam sufocarem suas pernas pelo calor.

Deitou-se na cama e suspirou aliviada. Estava livre por um tempo da sua família mas tudo acontecera muito rápido, em uma hora ela era a Princesa mais cobiçada do País de Erelbron que era amada pelos pais e seu povo, e agora era uma filha que fugira de casa para salvar a própria vida e teria de se infiltrar entre seus súditos para não ser pega.

Kayla teria de pensar em uma maneira de desmascarar seus pais para os habitantes. Contudo, era uma tarefa difícil, seria a sua palavra contra a deles, seria facilmente condenada e morta em praça pública, ela precisaria de mais pessoas para contar os podres de sua família que nem a mesma sabia que tinham.

Seus pensamentos a rondavam, deixando ainda mais sonolenta, os olhos pesaram pedindo por descanso novamente. Mas dessa vez ela não resistiu, estaria segura naquele lugar até o momento em que alguém descobrisse que a Princesa de Erelbron estava agora dormindo em uma cama de feno vestindo apenas as roupas íntimas.

Permitiu-se render ao cansaço, entrando em um sono profundo mesmo estando em um ambiente totalmente diferente do que está acostumada. Alguns galhos secos pinicavam suas costas, mas ela não parecia se importar, estava exausta o suficiente para dormir em qualquer condição.

Durante o sono, Kayla sonhara que estava sendo caçada por todo o reino, seu pai havia oferecido uma recompensa enorme em troca de sua cabeça. Ela não tinha mais um lugar seguro, queimaram a cabana enquanto estava fora e ninguém seria capaz de abrigar uma Princesa fugitiva. Todos a acusavam de bruxaria, a chamavam de nomes terríveis e lhes jogavam pragas de diversas formas. Não sabia o que o Rei havia dito para estar sendo procurada dessa forma, até o momento em que encontrou um cartaz com um retrato seu escrito:

"Procura-se, viva ou morta:

Kayla Elliot

Crimes: Falsa morte, deslealdade ao Rei e Pirataria."

A palavra Pirataria estava circulada com tinta vermelha e sua imagem tinha chifres desenhados além de vários xingamentos escritos. Kayla não tinha mais para onde correr, estava cercada por uma multidão furiosa ordenando que fosse queimava viva no centro do Reino.

Foi então, no momento em que ateavam fogo no seu corpo, que Kayla acordou gritando, sentindo o suor escorrer pelo rosto, pingando em suas vestes enquanto o corpo tremia pelo frio da maresia. Suspirou aliviada ao perceber que apenas sonhara com tudo aquilo, mas mesmo assim fizera questão de olhar discretamente pelas janelas em busca de uma multidão enfurecida ou algum cartaz querendo a sua cabeça.

Espreguiçou e vestiu-se com o vestido simples que havia encontrado. Teria de ir às ruas em busca de comida e não poderia sair com os cabelos ruivos e traje de baile, então passou a substância fedorenta no cabelo e esperou algum tempo antes de seguir até um poço aos fundos do terreno e jogar certa quantidade de água na cabeça para retirar o excesso.

Pegou a sacolinha de veludo e afastou os móveis, abrindo a porta e assim saindo do esconderijo e seguindo até o centro da vila.

O cenário a deixou maravilhada. A luminosidade do sol deixava o vilarejo ainda mais bonito, com o mar brilhando ao fundo, o chão de cascalho reagindo com sons aos passos apressados das pessoas e as rodas das carruagens passando, a fonte com uma estátua de Erel feita de bronze parecia brilhar e as pequenas barracas de vendas estavam sendo postas em frente as casas simples feitas de madeira.

Kayla percorria o olhar por cada canto com um brilho nos olhos, nunca havia saído para tão longe do Castelo, estava encantada em ver como o mundo era fora dos enormes muros de pedregulhos.

— Bom dia, minha jovem. - uma senhora idosa se aproximou de Kayla com um sorriso simpático no rosto. — Primeira vez no Reino Norte?

— Bom dia, madame. - fez uma referência em sinal de respeito, arrancando uma risadinha tímida da mulher. — Sim, é a minha primeira vez por aqui.

— E de onde é, minha cara?

"Droga! O que eu respondo agora?" perguntou Kayla para si mesma enquanto olhava para a idosa, que esperava pacientemente por uma resposta.

— Sou do Reino Sul, sai da casa dos meus pais e me mudei para cá pois gosto muito do mar. - sentiu as bochechas coraram ao perceber o olhar desconfiado da senhora. Kayla havia se enganado, o único Reino em que não era possível ver o mar era o Central.

— Ora, é o que dizem: o mar do Norte é o mais puro de Erelbron. - a Princesa suspirou aliviada ao ver o sorriso voltar para o rosto da mulher e retribuiu o ato. — Você é amiga do Oliver, não é? - Kayla foi puxada para baixo para que a idosa pudesse sussurrar ao seu ouvido. — Ele me falou que você viria me ver, é impossível não reconhecer esses olhos da realeza.

— "Olhos da realeza"? O que quer dizer com isso? - foi puxada novamente para uma pequena casa onde no lugar da porta havia um manto roxo com estrelas amarelas espalhadas.

— Eu só abro durante os fins de semana, mas como é a Princesa, farei-lhe um favor de abrir em plena segunda-feira. - afastou o manto, revelando apenas a escuridão e deixando Kayla curiosa. — Entre minha cara, vamos dar um jeito de você se disfarçar melhor nessa cidade e ver o que o futuro lhe reserva.