Lauren obedeceu Ophelia e seguiu pelos corredores da pequena casa até encontrar uma porta de madeira escondida entre as cortinas que a levou até os fundos do terreno. Olhou para os lados, certificando-se de que não havia alguém por ali e começou a rumar em meio aos jardins das casas silenciosamente, evitando em chamar a atenção dos moradores.
Passou pela última casa da rua e escondeu-se na esquina, ouvindo os passos dos Guardas ficarem ainda mais próximos da construção. Seu coração acelerava pela adrenalina e pelo medo, esperava que não seguissem pelo quarteirão tão cedo e que algum morador os enrolasse para que conseguisse chegar até a taberna.
Os passos ficavam mais próximos a cada segundo, fazendo com que Lauren começasse a suar friamente, sentindo as pernas tremerem e implorarem para correr para longe dali. Observou novamente ao redor, percebendo que já estavam na última casa, prestes a virarem a esquina, por pouco não a viram.
— Não era para estar com sua avó, mocinha? - ouviu uma voz atrás de si e virou-se lentamente, encontrando um Guarda Real parado a poucos centímetros de si. Engoliu em seco sem saber o que responder e endireitou a postura. — Preciso que me acompanhe até o Castelo.
— Eu perdi algo na rua... estou procurando, é o anel da família. - afastou-se lentamente com a mentira, mas o homem a acompanhava, olhando-a diretamente nos olhos.
"É agora em que coloco em prática todos os anos da infância em que corri pelo Castelo pra fugir do banho?" Lauren perguntou a si mesma enquanto ainda caminhava lentamente para trás, tentando fazer com que o homem desviasse seu olhar para os companheiros para que enfim conseguisse fugir.
— O que está fazendo, Theo? - mais um Guarda se aproximou, fazendo com que o homem finalmente desviasse o olhar. Lauren aproveitou a oportunidade e virou-se, correndo para longe. — Ei! Parada em nome do Rei!
O grupo de Guardas começou a correr atrás de Lauren, que dobrava as esquinas arrastando as solas dos sapatos, sem se importar estavam começando a se desgastarem, apenas queria fugir o mais rápido possível daqueles homens vestindo gigantes armaduras de ferro.
As pernas já davam sinais de cansaço, a respiração estava falha e o suor escorria pelo rosto quando a Princesa finalmente encontrou a taberna comentada por Ophelia. Reuniu o que sobrara de suas forças e correu ainda mais rápido, ignorando os gritos e exclamações dos Guardas tentando pará-la.
Assim em que conseguiu alcançar a porta do estabelecimento, abriu-a e entrou, escondendo-se atrás de um barril ao lado de uma estante que continha garrafas de diversas formas e tamanhos com líquidos variáveis.
Os Guardas entraram segundos depois, parando na porta e passando os olhares por cada canto antes de se espalharem e começarem a mover objetos e móveis a procura da jovem.
— Ora, vão querer levar o rum também? - Lauren segurou um suspiro aliviado ao ver um rapaz vestindo roupas de couro nas cores preto e vermelho parar à frente do barril e em que estava, tampando a possível visão que o Guarda teria de si ao se aproximar mais. — Se estão procurando a Princesa, estão procurando no lugar errado, ela deve estar no alfaiate ou em uma joalheria cara.
— Estamos procurando por uma jovem de cabelos pretos, olhos verdes, vestido branco amarelado e sapatos de couro marrom. - o Guarda tentou se aproximar mais, mas o desconhecido o impediu, espalmando a mão contra o peitoral da armadura.
— Não tem garota nenhuma aqui, apenas nós. Caso tenha interesse, podemos tentar arranjar algumas para você e seus companheiros, mas duvido muito que conseguiremos... Sabe como é, ser Pirata é uma opção melhor do que a prostituição nos dias de hoje...
— Estamos de olho em você, Klaus Bart.
— Capitão Bart para você. - Lauren ouviu o som das armaduras se afastando e a porta se fechando, e suspirou aliviada, saindo de trás do barril. — Essa foi por pouco, gatinha.
— Não me chame de gatinha. - olhou séria para o rapaz e só então reparara o quão belo ele era. Os cabelos negros estavam bagunçados como se tivesse acabado de acordar, os olhos eram azuis como o mar cristalino e o sorriso sarcástico que enfeitava os lábios chamativos parecia a atrair para ele.
— Diga-me, o que uma dama como tu estavas fazendo correndo daqueles guardas? - Klaus sentou-se à mesa onde outros homens estavam debruçados sobre a mesa, completamente apagados.
— É uma longa história... - "Sou a Princesa usando um Feitiço de Disfarce que fugiu de casa para não ser morta pelo próprio pai, serve?" Lauren pensou consigo mesma, forçando um sorriso tímido para o rapaz, que apontou para a cadeira livre à sua frente.
— Sente-se, aqueles caras não vão parar de rodear o lugar até ver que está aqui. - a garota alternou o olhar entre a cadeira, o homem sentado ao lado e Klaus, que soltou uma risadinha antes de bebericar de seu canecão. — Relaxe, esse velhote é só o meu pai. Estará segura com a gente, somos amigos da Ophelia.
Lauren sentou-se e Klaus sinalizou algo com a mão, a Princesa não prestara atenção, estava distraída o bastante com os homens dormindo sobre a mesa como se estivessem em suas camas. Tentava reconhecer ao menos um deles, mas parecia não conhecer alguém naquele lugar.
— É uma Pirata também? - a pergunta fez com que Lauren sentisse o estômago revirar. Sempre ouvira dos seus pais que os Piratas eram impiedosos, matavam qualquer um que encontrassem, roubavam até dos mais pobres e uma vez chegaram a destruir uma pequena vila apenas porque o Capitão queria entreter o filho recém nascido.
— Eu não sou como vocês. - ditou ríspida e se levantou, pronta para sair. Klaus fez o mesmo e segurou os seus ombros, a impedindo de sair.
— Se sair, vão levá-la direto para uma execução em praça pública e levarão todos aqui contigo. Não vou permitir isso, o maldito Rei já destruiu minha vida uma vez, não vou com que ele faça isso novamente!
Lauren olhou para Klaus, percebendo os olhos marejados. Suspirou antes de livrar-se do aperto em seus ombros e sentar-se novamente ao lado do homem que agora dava sinais de que acordaria a qualquer momento.
O rapaz seguiu até os fundos do estabelecimento com passos pesados enquanto o dono da taberna se aproximava da mesa com um canecão parecido com o de todos naquela mesa com um líquido de cor mista de amarelo e marrom com um cheiro doce.
A Elliot analisou a bebida por alguns segundos antes de bebericar um pouco, sentindo o gosto adocicado e alcoólico invadir seu paladar, a fazendo tossir um pouco e fazer uma careta feia, arrancando um riso leve do homem ao seu lado.
— Primeira vez bebendo rum, senhorita? - Lauren assustou-se com a voz rouca, fazendo o desconhecido rir novamente. — É amiga da Ophelia, certo? Ela avisou que viria um dia ou outro... Mas não contava que seria quando eu estivesse mais bêbado do que o meu pai nas batalhas.
— Essa garota é uma fugitiva do Rei, pai. - Klaus voltou a sentar-se, parecendo ainda mais sério. — Ela estava fugindo dos Guardas quando entrou aqui.
— E mesmo assim você a protegeu, como deveria. - o homem suspirou e endireitou a postura. Lauren olhava a cena com curiosidade e confusão. Como seria possível ele saber o que aconteceu se estava dormindo? — Ophelia teve essa previsão anos atrás. Temos que cuidar da garota por um tempo.
— Eu não vou ficar de babá de uma criança!
— Eu tenho dezoito anos, seu palerma bêbado! - a risada rouca do desconhecido ecoou ainda mais alta.
— Ora, a Princesa tem um ótimo senso de humor, nunca insultaram meu filho assim na minha frente. - o corpo de Lauren congelou no lugar e os olhos de Klaus se arregalaram em direção à jovem a sua frente. — Não precisa ficar com medo, estará segura conosco até o momento em que estiver pronta para tomar o que é seu por direito. Nossa velha amiga bruxa havia previsto anos atrás que precisaríamos ajudá-la, mas não sabia que esse dia chegaria tão cedo.
— Pai, é impossível ela ser Kayla Elliot! - Klaus retrucou. — A Princesa é ruiva e tem olhos cinzas, ela tem cabelos pretos e olhos verdes.
— Seu palerma bêbado! Ela está com um Feitiço de Disfarce muito mal feito! És um Pirata filho de feiticeira ou um plebeu com problemas de visão?! - o homem estapeou a cabeça do filho, voltando-se a se sentar. Lauren segurou uma risadinha quando seu olhar encontrou com o de Klaus, que massageava a parte atingida. — Ora, onde estão meus modos? - virou-se para a garota e fez uma referência exagerada. — Sou Billy Bart, mais conhecido neste país como Espada Vermelha e em outros como Billy do Chá. Está segura em meus cuidados, Alteza.
— Pode me chamar de Lauren, não há necessidade de utilizar esses termos, não sou mais uma Princesa. - a garota sorriu gentilmente, sendo retribuída por Billy.
— É um ótimo nome para o seu disfarce. Acredito que o sobrenome da minha família combinaria certamente. Então agora és uma Pirata?
— Acredito que sim, fugi de casa, renunciei temporariamente meu direito à Coroa e provavelmente me aliei aos inimigos do Reino.
— Pois seja bem-vinda à bordo, Pirata Lauren Bart.
"É isto! Agora sou oficialmente uma Pirata adotada ilegalmente pelo inimigo do meu povo!" Lauren pensou consigo mesma enquanto via Billy levantar-se novamente e acordar os outros homens á mesa com um tapa em suas cabeças. "Onde será que isso vai parar?"
— Acordem, marujos! Hoje será um dia de glória! - os desconhecidos despertavam aos poucos, curiosos ao verem uma garota em veio aos Capitães. — Temos uma nova companhia à bordo! Saúdem, Lauren Bart!
— Klaus tem uma irmã, Capitão? - um perguntou desnorteado e Klaus estapeou-o novamente, sorrindo satisfeito com a risada de Lauren.
— Eu sempre fui filho único, seu bêbado idiota! Esta é uma prima distante de minha mãe que fugiu de casa e se aliou a nós. Decidimos mudar o sobrenome dela para não levantarem suspeitas. - o rapaz ajeitou as vestes e se afastou da mesa, dando espaço para os companheiros fazerem o mesmo. Avistou o copo de Lauren ainda cheio e a olhou desafiador. — Vai ter de aprender a beber como uma Pirata se quiser ser uma.
— Uma coisa de cada vez, Klaus. - Billy advertiu o filho, envolvendo-o pelos ombros com o braço. — Há muitas coisas para ensiná-la, então começaremos imediatamente! - começou a empurrar os marujos e o filho para fora da taberna, estendendo sua mão para Lauren. — Filha.
— Se pense que eu vou te chamar de pai, estás devidamente enganado, Tio Billy.
— Já é um bom começo, minha jovem sobrinha.
— Vocês dois são muito estranhos para quem acabou de se conhecer... - Klaus apoiou-se no batente da porta com os braços cruzados, segurando um sorriso com a careta séria do pai. — A barra está livre, os Guardas voltaram para o Castelo por enquanto.