Assim que a marca desapareceu, o rei louco perdeu aquela conexão que o permitia sentir as intenções de Nuntio e sua localização. Logo que a marca saiu de seu peito, uma esfera de névoa negra veio dos céus da torre na direção do rei, igual àquela que havia sido expelida por sua boca.
Ela desceu na direção de De Avarum, parando acima de sua cabeça e logo se dissipando. Assim que acabou-se todo o processo, Nuntio rapidamente se afastou de De Avarum dizendo:
-Muito bem, meu rei, porém, não pense que já baixei a guarda. Fico feliz que não tenha quebrado seu juramento! Também tenho informações sobre esta esfera, a um tempo atrás houve um julgamento com muitas testemunhas oculares! A pessoa que o fez estava sendo acusada de traição, e foi levada a fazer o juramento diante do rei, De Paganus. Porém, o acusado quebrou seu juramento feito à torre, e esta esfera, ao invés de dissipar-se como fez agora acima de sua cabeça, voltou para o acusado e envolveu-o, consumindo-o inteiramente, logo, levando-o para as profundezas da torre.
Logo, ele continuou:
-Por isso, sei que cumpristes teu juramento! Porém, dissestes que não farias nada comigo enquanto ainda fazias o processo, agora que terminastes, não darei ensejo para que me ataques com a guarda baixa.
De Avarum ainda estava furioso, e rosnando falou para Nuntio:
-Seu rato! Eu vos livrei da marca, agora diga-me! Onde estão esses servos malditos?
Nuntio olhando para o rei enraivecido respondeu:
-Acalme-se rei ganancioso! Achas que eu seria tolo o suficiente para vos entregar as informações antes que eu esteja seguro?
O rei cerrando os dentes rosnou:
-O que mais tu queres?
Nuntio respondeu com calma:
-Quero que faças outro juramento à torre!
De Avarum respondeu furioso:
-NÃO! Como posso eu ter certeza de que farás tua parte do acordo?
O viri sanguinium, aturdido continuou em um suspiro:
-Huff... Não tem jeito, és realmente um rei tolo como dizem! Só não estais morto ainda, porque ficas trancafiado em seu reino sem permitir que entrem. Sua inexperiência em negociar, sua tolice e falta de planejamento só mostram que tu não és apto para reinar!
Mais uma vez perdendo o controle, o rei gritou enlouquecido:
-O QUE DISSESTE?
E logo começou a sussurrar, porém Nuntio, em um tom um pouco irritado, como se já estivesse cansado de todo aquele teatro, respondeu:
-Poupe-me de suas ameaças De Avarum! Sabes que não estais disposto a pagar o preço de me matar. Caso não esteja lembrado, todos os que habitam na torre, e todos os que nela estão, podem usar o juramento! Adivinha onde estamos agora, meu rei tolo? Sabes, tu podes não nos ter permitido que aprendêssemos sobre o teu reino, mas advinha. Com um pouco de esforço e muita riqueza, não é tão difícil encontrar informações como estas com informantes de outras facções!
De Avarum entendeu onde Nuntio queria chegar, mas enfureceu-se ainda mais ouvindo suas palavras finais. Porém, sem opção, apenas cerrou os dentes, dos quais já colocava tanta força, que suas gengivas já sangravam. Logo, Nuntio continuou:
-O acordo é simples, tu fazes um juramento de que me deixarás em paz por três sóis, e não tentarás neste período nada contra mim, nem me atacarás direta, ou indiretamente, não me perseguirás ou enviarás algum perseguidor atrás de mim pelo período de três sóis, contanto que eu vos diga como achá-los. Enquanto eu vos faço um juramento comprometendo-me a falar a verdade!
Ouvindo aquilo, De Avarum acrescentou:
-E irás jurar não dissipar os sinais até que eu encontre esses servos!
Nuntio replicou:
-O farei por apenas um sol, já que, se tu apenas os deixasse quietos para sempre e nunca os encontrasse, eu teria que manter o sinal por toda minha vida, e sou incapaz de fazê-lo, e tu sabes muito bem disso!
De Avarum cerrou os dentes rosnando:
-Não!
Porém, Nuntio com tranquilidade continuou:
-Muito bem! Quanto mais tempo demoramos aqui, mais tempo outros reis têm para agir. E no final, ambos acabaremos perdendo muito!
O rei, rosnando com sua voz desagradavel, furiosamente falou:
-Eu, De Avarum, o rei do reino da ganância, juro por operis tenebrae, que deixarei em paz Nuntio, o viri sanguinium que neste salão se encontra, e não tentarei nada contra ele, nem o atacarei, perseguirei ou enviarei algum perseguidor atrás dele pelo período de três sóis, contanto que o mesmo me diga como achar os seus servos com seus sinais e não tente se por contra mim e meus planos, ou roubar o que é meu!
Assim que terminou, como da última vez, uma esfera de névoa negra saiu de sua boca aos céus da torre. Logo, Nuntio começou a proclamar:
-Eu, Nuntio, ex ancião da facção de De Avarum, o rei do reino da ganância, juro por operis tenebrae, que as informações que pretendo contar a De Avarum são verdadeiras, e direi a ele como encontrar os servos sobre os quais falei a ele anteriormente! Também juro que não irei ordenar por meus pensamentos, nem irei tirar minha vida para dissipar o sinal dado aos meus servos por um período de um sol.
Ao contrário de De Avarum, duas pequenas esferas de névoa negra, já que ele havia feito dois juramentos, saíram da boca de Nuntio dando a ele uma sensação nauseante e desconfortável. E logo as esferas voaram para os céus da torre. Assim que o processo terminou, Nuntio com um sorriso tranquilo falou ao rei:
-Meu rei, se tu encontrastes o mordomo, deves ter visto que atrás dele estava uma parede, certo? Atravesse aquela parede com a senha do portal, atrás dela, encontrarás as descrições de meus servos com o sinal em uma carta, retratos desenhados, além de suas localizações. Na verdade, um deles está no corredor. A carta está em sua mão, basta pegá-la e saberás onde todos estão e quem são!
De Avarum, ouvindo aquilo gritou:
-MALDITO! PORQUE NÃO ME DIZES LOGO SUAS LOCALIZAÇÕES? JURASTES QUE O FARIAS A TORRE, ESTAIS LOUCO QUEBRANDO SEU JURAMENTO?
Porém, enquanto gritava, do alto da torre, uma esfera de névoa negra veio na direção de Nuntio, parando acima de sua cabeça e lentamente se dissipando. Vendo que Nuntio não havia sido consumido pela névoa, De Avarum ficou atordoado e o viri sanguinium com um sorriso astuto em seu rosto, continuou:
-Em teu juramento, a condição era que eu te dissesse como achar os servos com meus sinais, eu vos disse como, mas não preciso vos dizer onde achá-los! Quanto ao meu primeiro juramento, disse que as informações que vos contaria são verdadeiras. E são, e disse que vos diria como encontrá-los, e assim o fiz!
Furiosamente a névoa negra que cercava o manto do rei, imediatamente explodiu:
-MALDITO! ME ENGANASTES!
Nuntio, zombeteiramente respondeu:
- E o que podes fazer rei idiota? Estás disposto a quebrar o juramento que fizestes à torre?
De Avarum imediatamente reprimiu sua fúria, olhando para o rato que não só o mordeu, como também o enganou e o fez dançar na palma de sua mão.
Só de pensar nisso a fúria de De Avarum ameaçava explodir ainda mais. Seus olhos estavam injetados de sangue, seus dentes rangiam, ameaçando rachar, assim como os ossos de seus punhos, que estavam fortemente cerrados. Nuntio então pronunciou:
-Ás trevas ofereço sangue.
Mordendo seu dedo para que sangue dele escorresse continuou pronunciando:
-Ex serpentis radix vipera pullulabit. Et fructus eius erit velox serpens. Anguis velox!
Assim que Nuntio terminou de pronunciar essas palavras, seu sangue começou a enegrecer e formar uma névoa escura, que logo começou a envolvê-lo. Olhando para De Avarum por entre a névoa que ainda não o havia ocultado inteiramente, ele falou com uma voz zombeteira:
-Se não te apressares, creio que não terás tempo de implementar os seus planos, afinal, até vós, os reis, estão restritos a sair apenas pela porta da torre.
Então, a névoa terminou de envolvê-lo, logo, imergindo-o completamente e tomando a forma de uma serpente de névoa que se pôs velozmente a rastejar no chão em direção à saída da sala do trono.
De Avarum via aquilo, mas sendo incapaz de fazer qualquer coisa, cerrou os dentes e começou a sibilar como uma serpente, e logo, chamas negras começaram a envolvê-lo e como um vulto saiu da sala, indo em direção à saída, passando por Nuntio e se dirigindo rapidamente ao portal, ordenando às armaduras negras, gritando com sua voz irada:
-Escolte-o até o portal para que não pegue nada!
As armaduras negras, bateram todas juntas com a mão direita no peito, fazendo um som de metais se chocando ressoar pela sala do trono, e velozmente correram em até a serpente de névoa negra, alcançando-a em poucos segundos e acompanhando-a até o portal.
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Algum tempo antes de todos os eventos atuais acontecerem. Em uma sala escura que cheirava fortemente a sangue, sentada em uma cadeira de balanço de madeira, uma pequena senhora de aparência gentil e inofensiva, que parecia ter cerca de setenta ciclos de idade, se balançava serenamente.
Ela tinha cabelos brancos curtos, soltos e meio desarrumados, que iam até seu pescoço e olhos meio fechados cor âmbar. Ela era um pouco gordinha, mas nada muito exagerado, tinha a pele enrugada e tinha estampado em sua face um sorriso gentil.
Usava uma camisa preta e um casaquinho de lã vermelho com botões pretos por cima da camisa. Uma saia preta que ia até a altura dos joelhos, e em seus pés uma sandália também preta. Tinha as unhas pintadas intercalando entre preto e vermelho para cada uma das unhas de seus pés e de suas mãos.
Um detalhe estranho, era que de suas roupas vermelhas uma leve névoa vermelha era emitida, e de suas roupas pretas, uma leve névoa preta era emitida, até mesmo suas unhas emitiam essa névoa, como se tudo que a vestisse fosse formado desta estranha névoa sangrenta e escura.
Em seus lábios, havia um batom vermelho intenso, e sobre seus olhos, um pequeno óculos de armação preta. Tinha pendurado em seu pescoço um colar de pérolas e em seus dedos da mão direita estavam anéis de ouro com jóias incrustadas, enquanto que na sua mão esquerda algumas pulseiras de ouro eram encontradas.
Em cada uma das orelhas havia um pequeno brinco de rubi e em sua cabeça havia uma coroa incrustada com diversas jóias valiosas. Em sua cabeça, um detalhe que era ainda mais chamativo que a coroa, era um chifre que saia da cabeça daquela senhora.
A idosa que tinha um sorriso gentil junto a olhos sorridentes, tricotava enquanto se balançava na cadeira. Em suas mãos agulhas de tricô de metal afiadas, eram usadas para tricotar o que parecia um cachecol vermelho, porém algo parecia errado naquela cena, já que as agulhas de tricô estavam manchadas de sangue.
Diante da senhorinha, de joelhos, estava Narcisa, a jovem sedutora de cabelos e olhos pretos, que anteriormente falava com Proditor em um dos estabelecimentos de Peccáta. Ela estava com a cabeça baixa e imóvel, como se diante de um predador brutal e feroz.
Então, a senhora, voltando levemente seus olhos cor de âmbar na direção de Narcisa, enquanto ainda fazia seu trico e se balançava, abriu sua boca que possuia dentes afiados, porém, brilhantes como o fio de uma lâmina, e perguntou com uma voz gentil de avó, mas que por algum motivo, para qualquer um que a ouvisse, sentiria uma frieza percorrer toda a sua espinha:
-Tens algo a me dizer, Narcisa?
Narcisa ouvindo a voz que parecia soar gentil mas que lhe trazia arrepios saudou:
-Salve De Sicarium! Venho lhe trazer informações importantes, meu rei.
A senhorinha, acenando com a cabeça respondeu:
-Continue.
Narcisa recebendo aprovação, voltou seus olhos para os olhos cor de ambar da senhora e continuou seu relato:
-De Avarum fará um movimento para sair da torre! Ele tem um grande objetivo, algo valioso o suficiente para fazê-lo sair de seu reino.
A avózinha, ouvindo aquilo, parou de tricotar e colocou sua atenção nas informações que Narcisa lhe trazia. Parecia que aquelas palavras haviam despertado seu interesse. Então, a bela moça continuou:
-Nossos espiões relataram que provavelmente um dos servos dele havia adentrado na torre, e eu recebi de um de nossos agentes a confirmação que necessitava. Um dos anciãos da facção da ganância, foi até a torre e recebeu ordens diretas do rei para reunir todos os seus servos confiáveis.
Logo, ela continuou:
-De Avarum está sendo cauteloso no seu agir, tentando atrasar o máximo possível as informações para que não cheguem em nossas mãos, uma pena que ele não volte seus olhos nunca para sua facção, permitindo que entre seus anciões, se infiltrem nossos espiões. Não houveram mais informações reveladas, mas eles se unirão em um salão subterrâneo, no qual só se tem acesso através de portais. Porém, temos o caminho e a senha para entrar!
Então, com um olhar pensativo, Narcisa prosseguiu:
- De Avarum provavelmente irá se transportar para outra localização a partir deste salão, junto aos servos lá reunidos. Já que o transporte deixa rastros, duvido que ele queira dar a chance de que outro rei seguisse seus passos. Afinal, se outros reis descobrirem o plano de De Avarum, e se ele deixar rastros em lugares de fácil acesso, os outros reis podem usá-lo para se transportar para o mesmo local que ele. Por isso, creio que ele irá de outra forma até o grande salão, provavelmente a pé, já que se ele se transportasse para o grande salão, outros reis conseguiriam, seguindo o rastro, fazer o mesmo.
Então, ela acrescentou dizendo:
-E se chegassem no grande salão, haveria outro rastro, que os dirigiria diretamente para onde eles pretendem ir. Isso seria o mesmo que dar aos rivais uma maneira fácil de encontrá-lo. E sei que ele é idiota, mas não imagino que, ao ponto de cometer um erro tão bobo!
Ouvindo aquelas informações, um sorriso assustador substitui o sorriso gentil que a velha senhora carregava em seu rosto, porém, seus olhos ainda sorriam gentilmente, criando um contraste ainda mais assustador. Falando mais uma vez com a voz arrepiante, a senhorinha disse entre estranhas risadas:
-Muito bem, minha querida! E nas mãos de quem está toda a informação completa?
Narcisa respondeu:
-Um ancião da facção da ganância, Nuntio!
Ouvindo-a, a senhora falou:
-Muito bem, sabes o que fazer! Inicie os preparativos para caçar um grande rato! Não o assuste para que não relute sair da toca, espere que pense estar longe dos olhos dos predadores. Assim que o rato sair, mande que me avisem, porém, não deixem rastros. Antes, deve-se deixar o rato ir para bem longe de sua toca para que possamos agir, ainda mais um rato tão escorregadio! Quanto a este servo, siga-o pessoalmente e se houver uma chance, traga-o até mim!
Ouvindo aquelas palavras Narcisa respondeu:
-Sim! Salve de Sicarium!
E levantou-se para sair da pequena sala. Voltando seus olhos para a sala, podia-se entender o motivo do cheiro de sangue. Na verdade se tratava de uma sala de tortura onde sangue e carne eram espalhados por todos os lados.
Então, com um frio na espinha, Narcisa saiu rapidamente dali, deixando a velha senhora continuar suas atividades sozinha.