Chereads / Lux et tenebrae - Crônicas de Christian [Portuguese] / Chapter 35 - Presenciando o passado

Chapter 35 - Presenciando o passado

-Christian... despertai... levanta-te!

Uma voz majestosa e doce ecoou nos ouvidos de Christian repousava apoiando-se em algo. O garoto, ouvindo aquela voz lhe chamando, abriu os olhos, lentamente saindo de seu sono profundo.

Assim que abriu os olhos, se viu encostado nas paredes de uma casa, no que parecia uma cidade arruinada. Haviam edifícios quebrados e tombados, as ruas estavam uma bagunça, o asfalto tinha rachaduras espalhando-se por todas as partes, algumas casas estavam envolvidas por incêndios assim como carros e outros veículos quebrados em chamas.

Olhando rapidamente ao seu redor, Christian assustou-se, pois reconhecia aquele lugar, afinal, era ali que ele estava quando tudo começou. A casa em que ele estava encostado era na verdade o orfanato no qual viveu durante toda a sua vida.

Ele não conhecia sua origem, mas lhe foi dito que ele havia sido encontrado em destroços de uma embarcação que afundou nos mares. Quando foi resgatado, foi considerado um milagre, já que para uma criança sobreviver em cima dos destroços e ser levada até a praia em segurança, não poderia ser chamado de outra coisa. O contaram que ninguém jamais havia conseguido encontrar os corpos de sua família, e nem a embarcação que supostamente afundou. Então, ele foi levado para este orfanato, no qual viveu toda a sua infância.

Christian olhando apressadamente ao redor levantou-se assustado, afinal, ele já há muito tempo, tinha andado para bem longe dali. Enquanto se perdia em confusão, Christian ouviu uma voz suave apressadamente lhe chamar:

-Vamos Christian! O que você está esperando? Temos que ir!

Quando aquela voz entrou em seus ouvidos, lágrimas ameaçaram brotar de seus olhos. Ele reconhecia aquela voz. Virando-se para quem o chamava viu uma menina que parecia ter cerca de doze ciclos de vida, com cabelos castanhos claros e olhos verdes, que estavam fixos em Christian. Então, olhando para ela, ele tremulamente perguntou:

-Catarina?

A menina, impaciente, se aproximou do garoto, pegando suas mãos e puxando-o junto consigo para correr:

-Vamos! Não temos tempo para isso, já estão todos reunidos! Temos que fugir daqui!

Christian, um pouco atordoado, apenas começou a correr atrás dela seguindo-a. Gritos de pessoas desesperadas, rugidos de bestias e mortos, risadas enlouquecidas e zombarias dos viri sanguinium ecoavam por toda a cidade.

Correndo pelas ruas, ambos chegaram a um local onde muitos vivos estavam reunidos em um grupo. Entre eles, Christian viu todos os seus irmãos do orfanato, junto com uma belíssima mulher que vestia-se como freira.

Esta mulher era bela de uma forma inexplicável, parecia que todo o seu rosto tinha sido esculpido a partir de uma jóia de puro amor. Esta era a freira que cuidava de todos eles como uma mãe, e assim era chamada por todos, Mariana. Quando Christian e Catarina se aproximaram, Mariana imediatamente correu até eles abraçando-os e perguntando-os carinhosamente:

-Graças a Deus! Onde estavam?

Ouvindo aquela voz doce que exalava amor e carinho, Christian não pôde evitar derramar lágrimas, afinal, ele não via todos há muito tempo. Vendo o garoto chorar, Mariana se abaixou, pegou-o suavemente pelos ombros e perguntou:

-Estás bem? Se machucou?

Christian balançou a cabeça negando, mas antes que pudesse responder, uma voz grave os interrompeu:

-Mariana, não há tempo, devemos nos esconder!

A freira, ouvindo aquelas palavras, acenou a cabeça em concordância, e limpando as lagrimas da face de Christian sorriu docemente, dizendo:

-Está tudo bem! Tudo vai dar certo!

Christian não sabia o que estava acontecendo, mas limpou as lágrimas e acenou resolutamente, ao que a freira respondeu com um sorriso. Logo, os três se juntaram ao grupo.

Todo o orfanato, junto com os moradores da região estavam reunidos, o homem que os liderava era um ex militar, e era o único que estava armado com armas de fogo, sendo este, o mesmo homem que foi pedir à Mariana que se apressasse.

Então, Christian começou a se mover com todo o grupo pelas ruas, ao lado de Catarina e todos os outros irmãos do orfanato. Logo, alguém bateu em seu braço chamando-lhe a atenção. Virando-se para ver quem era, viu um garoto mais velho, com cerca de quinze ciclos de vida, de cabelos e olhos pretos, que lhe perguntou:

-Ei Christian, onde tu estava? Estavam todos preocupados!

Christian olhando para o garoto respondeu:

-Eu não sei! Na verdade estou meio confuso com tudo.

Catarina ao lado se intrometeu dizendo um pouco irritada:

-Marcos! Quando eu encontrei o pequeno Christian lá em casa, ele estava dormindo encostado na parede do quintal, você acredita? Inicialmente me assustei, achando que ele tinha batido a cabeça, mas como não encontrei nenhum ferimento em seu corpo, a única explicação é que ele estava dormindo.

Ouvindo aquilo, Marcos, o garoto de cabelos pretos ficou atordoado, mas logo começou a rir:

-No meio de tudo isso, tu estava dormindo?

Porém, imediatamente um dos adultos chiou com a boca mandando-lhes fazer silêncio, fazendo com que Marcos parasse imediatamente de rir. Christian estava atordoado ao ouvir alguém chamá-lo de pequeno Christian e replicou sussurrando:

-Primeiramente, eu não estava dormindo! Bem, mesmo que eu explicasse para vocês, vocês não acreditariam, e em segundo lugar, que história é essa de, pequeno Christian? Eu já tenho doze ciclos!

Marcos e Catarina, se entreolharam atordoados, e logo, se seguraram para não começar a rir. Então Catarina falou:

-Parece que nosso pequeno Christian está amadurecendo.

Enquanto que Marcos acrescentou zombeteiramente:

-Não só está amadurecendo como também, está enlouquecendo! Já até se esqueceu da sua própria idade. Tem certeza de que não bateu a cabeça?

Christian ficou atordoado ouvindo aquilo, porém, lembrando-se de um detalhe perguntou:

-Quantos ciclos eu tenho?

Catarina, ouvindo aquilo, parou de rir e olhou para Christian com preocupação, dizendo:

-Agora você está me deixando preocupada de verdade! Tu não bateu a cabeça mesmo não foi? Já se esqueceu de que tu tens nove ciclos de idade?

Assim que ouviu aquilo, o choque tomou conta de seu olhar, porém, logo, ruídos mais a frente no grupo os interrompeu.

(Paff paff paff.)

Sons de tiros ecoavam da dianteira. O homem com a voz grave e parecendo em pânico gritou:

-Voltem imediatamente, tem uma horda dessas coisas na nossa frente. Não vamos ser capazes de passar por aqui! Arrgh...

Enquanto ordenava que todos recuassem, das sombras, uma fera semelhante a um lobisomem pulou sobre o homem e o matou. Logo, olhando para o grupo de vivos com seus olhos bestiais e presas manchadas com sangue, uivando.

(Uivos)

Que logo foram respondidos por uivos de outras direções na cidade.

(Uivos...uivos...uivos...uivos)

Entre os moradores reunidos, o pânico, logo começou a se espalhar, e muitos começaram a se dispersar, correndo para diversas direções tentando salvar as suas vidas, empurrando-se desesperadamente para tentar escapar.

Vendo aquilo, Marcos e Catarina rapidamente pegaram Christian pelas mãos e começaram a puxá-lo para correr na direção oposta. Porém, Christian gritou:

-Não, Mariana ainda está lá! E muitos de nossos irmãos fugiram em outra direção!

Marcos ouvindo aquilo respondeu com a voz cheia de frustração:

-Não podemos fazer nada agora, se ficarmos, morreremos Christian!

Christian, lembrando das Palavras da Vida, tentou chamar o capacete e a espada, mas não conseguia. Na verdade, nem o sentimento de seu coração ele conseguia sentir. Porém, sem desistir, ele soltou suas mãos das mãos de Marcos e Catarina e correu em direção à frente do grupo, onde Mariana estava.

Correndo contra a corrente, Christian foi derrubado pelas pessoas que corriam cegamente em outra direção, mas levantou-se todas as vezes correndo em frente resoluto. As pessoas que corriam, estavam sendo caçadas por bestias de todas as direções, que pulavam das sombras por entre os prédios em direção ao grupo, caçando-os e se divertindo.

Christian, continuou seu caminho correndo com todas as suas forças, e passando a multidão o que viu, o chocou. Haviam corpos espalhados por todas as partes, que bestias e mortos devoravam vorazmente. Olhando para aquela cena, ele murmurou cheio de tristeza:

-Não, Mariana...

Porém, quando lágrimas estavam prestes a brotar de seus olhos, uma mão o pegou gentilmente, dizendo em uma voz doce:

-O que está fazendo Christian?

Voltando-se para quem o chamava, Christian viu Mariana, a belíssima freira que tinha um sorriso gentil e carinhoso dirigindo-se a ele. Tirando-o de seu estupor, imediatamente Mariana começou a conduzi-lo para correr junto com ela. Logo, eles chegaram até Marcos e Catarina que os esperavam na esquina e todos juntos começaram a correr.

As pessoas corriam para todos os lados e eram caçadas de todas as partes pelas bestias, e o pequeno grupo avançava neste caos, conduzidos por Mariana.

Então, o grupo que agora contava com mais dois irmãos do orfanato que haviam conseguido encontrar no caminho, chegou próximo de um grande prédio, o mais alto da região central da cidade, próximo ao orfanato que ficava quase no centro da cidade.

Logo, entraram no prédio cautelosamente e continuaram seguindo em frente. Vendo que não parecia haver vida lá dentro, entraram em silêncio e se dirigiram para as escadas de emergência. Então, Mariana falou:

-Devemos seguir pelas escadas. Os elevadores não irão funcionar! Não será possível ir direto ao terraço.

Então, aproximaram-se cada vez mais das escadas de emergência, contando com a condução de Mariana, que os guiava, segurando-os firmemente pelas mãos atravessando a escuridão e, chegando aonde as luzes vermelhas de emergência iluminavam fracamente o ambiente. Logo, Mariana voltou-se para as crianças dizendo:

-Não se aproxime da escuridão! Não sabeis o que está lá, e se algo que se esconde lá deseja vos devorar!

As crianças acenaram a cabeça em resposta, e Mariana soltou-os gentilmente, aproximando-se da porta. Quando ela estava prestes a abri-la, uma das crianças ignorando seus avisos anteriores, se aproximou demais da região coberta pela escuridão.

As luzes de emergência iluminavam somente uma pequena área circular próxima da porta. A criança, porém, pisando fora da região iluminada pela luz, foi rapidamente atacada por uma bestia que emergiu das trevas avançando sobre ela. Logo, a criança do orfanato, sem tempo de reagir, foi devorada pela fera.

Vendo aquilo, imediatamente, as crianças se assustaram, e quando Mariana abriu a porta para as crianças subirem as escadas de emergência, viram ali um belo jovem, sentado calmamente sobre os degraus, com o queixo apoiado nas mãos, cabelos loiros, olhos azuis brilhantes, olhando para eles com um pequeno sorriso.

O jovem vestia roupas pretas e finas, completamente limpas, detalhe que contrastava com o sangue espalhado para todos os lados nas escadas e corpos humanos encostados nas paredes e caídos ao chão. Aquela cena imediatamente causou horror a todos, e o jovem, olhando para eles, falou em uma voz gentil:

-Ohh temos mais visitantes! Por favor, tu podes parar de assustá-los?

Questionou o jovem na direção da bestia coberta de sangue, que imediatamente se arrepiou e se escondeu na escuridão, amedrontada, deixando para trás o corpo da criança. O jovem, então, olhando para Mariana e para as crianças falou em um pequeno sorriso:

-Vocês veêm? Eu estou jogando um jogo! Olhe para esses corpos aqui, eles pertenciam a grupos que chegaram para subir as escadas assim como vocês. Porém, há um preço para subir as escadas! Um de vocês deve ficar para trás, os outros podem subir. Quanto a voltar atrás, não é mais uma opção, já que bestias como aquela estãos nas sombras por todos os cantos deste andar!

Assim que ouviram suas palavras Christian não hesitou e falou:

-Eu vou fi...

Porém, foi impedido por Mariana, que continuou falando em seu lugar:

-Eu fico!

O jovem, vendo aquilo, sorriu e falou:

-Muito bem. Os outros podem continuar!

Porém, Christian, não aceitando aquilo, gritou:

-NÃO! EU FICAREI!

Mariana, olhando para ele docemente, acariciou sua cabeça e respondeu:

-Christian, querido. Preciso que tu cuides de teus irmãos, tá bem? Tu deves fazer esse caminho. Eu estarei com você sempre aqui!

Mariana falou a última parte, tocando-lhe o coração. Era possível perceber a extrema tristeza e angústia que a voz de Mariana carregava por ver tantos de seus filhos se perderem no caminho diante de seus olhos.

Christian, chorando junto com as outras três crianças, acenou com a cabeça resolutamente, gesto que Mariana respondeu com um gentil sorriso. Então o jovem que guardava as escadas abriu espaço, permitindo que as crianças continuassem em frente. Passando pelo jovem loiro, Marcos voltou seus olhos cheios de ódio para ele.

Assim que subiram as escadas, Mariana voltou seus olhos gentis, cheios de tristeza para o jovem e perguntou:

-Eles estarão seguros lá em cima?

O jovem sorrindo maliciosamente respondeu:

-Eu nunca disse isso! Se eles vão sobreviver ou não, depende deles!

Ouvindo suas palavras, lágrimas saíram de seus olhos. Então voltando seu olhar para o jovem, ela perguntou:

-Filho, porque fazes isso contigo mesmo?

O jovem olhou para ela em confusão e questionou:

-Do que falas?

Fechando os seus olhos, sem respondê-lo, ela sussurrou, rogando:

-Proteja aqueles que ainda não devem ir...

E de seu peito uma luz intensa começou a brotar.