Chapter 38 - O Rei

Logo, o Sol começou a irradiar uma luz ainda mais intensa, que cobriu toda a cidade, inclusive o prédio em que Christian se encontrava. Assim como aconteceu no edifício anteriormente, a luz era tão intensa que cobria cada canto, tornando impossível discernir o espaço ao seu redor.

O chão que ele pisava era luz, os céus eram luz, tudo era luz e em meio a luz, não parecia haver limites materiais que o prendessem ali. Ele sentia que se caminhasse para cima, assim o poderia fazer, já que em todas as direções que andasse, eram compostas de pura luz, todas as linhas que limitavam o espaço não estavam mais lá.

Porém, havia algo que Christian ainda claramente conseguia discernir, que era a Fonte de toda aquela luz. A própria Fonte brilhava ainda mais intensamente que a luz que o cercava. Então daquela Fonte, a Voz Majestosa mais uma vez soou, desta vez tornando claro para Christian em seu coração sobre quem falava com ele:

-Criança, em vossos tempos que são tão maus, Eu mostro a Luz mais que nunca para os que estão curvados pela poeira e seus corpos esmagados pela lama. Sou conhecido por tudo o que de não ser passou a ser...

Christian reconhecia aquela Voz Majestosa. Era a Voz de Verbum, Aquele que derramou sua Luz sobre todos para salvá-los da escuridão que os cercava. Reconhecendo aquela Voz, Christian com entusiasmo voltou seus olhos na direção da Fonte da luz, que por mais que irradiasse um brilho tão intenso ainda não feria seus olhos e não o impedia de olhar na Sua direção.

Porém, quando Christian estava prestes a gritar alegremente para a Verbum, da mesma direção, brotou uma Voz cheia de doçura que parecia encher de mel sua boca quando ecoava em seus ouvidos:

-Criança, para tirar-Vos de vossa dívida e fora da lama, tenho-vos derramado Minha Luz! Vossa época tem mais mortos que vivos, cobertos pelas trevas e distantes de Minha Luz, o mundo deixou de existir. Porém convido mais uma vez à existência todos aqueles que não mais existem! Saiba criança, que ao primeiro sinal de arrependimento da humanidade, eu teria voado até ela, e antes que tivesse a chance de acabar de se arrepender, Eu gritaria batendo no chão com Meu Cetro Real: "absolvida!" dissipando assim toda a escuridão que a rodeia! Porém, os mortos mantêm-se calados, a morte está na esquina, mas, mesmo assim, o mundo permanece em silêncio!

Assim que essa doce Voz ecoou, Christian presenciou diante de seus olhos uma imagem belíssima, como a obra de arte mais perfeita que poderia haver. Uma ave apareceu diante da Fonte que irradiava Luz. A própria ave tinha um brilho resplandecente e possuia em si, uma beleza incomparável. Suas penas eram como o branco incorruptível que dava paz ao coração de Christian só de presenciá-la.

A ave diante da Fonte, não se sobrepunha a Fonte, nem sua Luz competia com a Luz irradiada pela Fonte, na verdade era como se Christian presenciasse diante de si uma só Fonte de Luz. A ave ao mesmo tempo que aparecia em frente à Fonte brilhante como mil sóis, não se sobrepunha a Ela, mas parecia se tornar um com ela. Era inexplicável, um não se sobrepunha ao outro, era como se ambos fossem dois porém, um.

Christian estava maravilhado com aquela cena, e sabia muito bem quem era aquela ave que brilhava junto à Fonte, Album, a ave que deu aos homens Suas Instruções. Christian ainda estava perdido e admirado diante de tamanha beleza, e enquanto a contemplava, mais uma Voz, que parecia mergulhá-lo em um Rio de Amor, soou em seus ouvidos, ecoando até seu coração:

-Minha semente está morta por falta de irrigação, muitos jardineiros falharam comigo, atraindo consigo milhares de jardins para o Abismo escuro. Não se surpreendendas por Eu vos ajudar! O mundo inteiro está cheio de escuridão, e a humanidade se surpreende com a Presença da Luz? Deveria Eu ver-vos escravizados e morrendo? Vi tantos descendo a alameda da morte e ficando tão distantes do caminho da Vida. Se tropeçam em Meu Corpo, não reagirei? Descerei em breve como o sol da Justiça! Este solo que o mundo já cultivou, em breve, dará sua impudente colheita. Porém, nuvens podem cobrir a humanidade agora, mas Minha Mão Poderosa está sobre vós, derramando Vida constantemente e vos envolvendo com Luz! Minha Presença é Luz e Minha Luz incomoda as Trevas; as Trevas estão agora em guerra contra a Luz e desejam que a Luz se extinga e não mais vos dê a luz do dia; mas Eu sou como um Sol eternamente brilhante que nunca se põe.

Logo, diante da ave e do sol, uma figura de um belíssimo cordeiro, resplandecente, branco imaculado surgiu. Seu corpo irradiava um brilho dourado e de seu peito brilhava uma belíssima luz avermelhada, que brilhava em harmonia com a luz dourada, brilhando também como um só junto à Verbum e Album.

A mesma sensação foi sentida por Christian em seu coração. Ele sabia muito bem quem era o Magnífico Cordeiro, Agnus. Assim como a ave não se sobrepunha ao sol, o cordeiro não se sobrepunha a ambos.

Não era possível discernir uma figura da outra, e a luz vermelha também parecia não só irradiar do coração de Agnus, mas também do coração da ave e do coração do sol, que alinhados fundiam-se em um só. Diante dos olhos de Christian, na mesma figura, um cordeiro poderia ser visto, mas ao mesmo tempo uma ave e um sol. Não havia como explicar aquela imagem diante de seus olhos. As imagens não se sobrepunham, e ao mesmo tempo que diante de seus olhos haviam Verbum, Album e Agnus, ao mesmo tempo um só Ser podia ser visto, como se fossem três, porém, um.

Logo então, uma só Voz soou, a Voz Majestosa de Verbum, a Voz Doce de Album e a Voz cheia de Amor de Agnus, ecoavam em sincronia, em um só timbre, soando como uma bela música:

-A humanidade tornou-se morta para Minha Luz e prefere viver nas trevas, que lhes dá tudo que é oposto à Luz. Muitos pensam ser livres e independentes, quando estão escravizados pelas trevas e atolados na lama. As trevas governam o mundo; seus corações, habitados por toda espécie de plantas venenosas, são apenas motivados pelas trevas que consomem seu coração. Minha Luz não só têm autoridade e poder mas, elas queimam colocando em chamas vosso vale, desintegrando as ervas daninhas e iluminando, ao mesmo tempo, o vosso jardim. Os animais selvagens em manadas correm pisoteando brutalmente os Meus jardins, mas nossos vigias são cegos e nada percebem...

Logo, continuou:

-Nossos jardineiros vão por seu próprio caminho, e ao invés de cuidar de nossas flores, cada um vai atrás de seu próprio interesse... Eles se tornam, sem o saber, colaboradores da torre e de seus seguidores. Se estás perseguindo o vento, vento vos tornareis, se persegues as trevas, logo deixarás de ser. Saiba criança, que com Minha Luz, Eu ressuscito os mortos, erradico a doença e dissipo a escuridão que prende e consome o coração de cada um. Minha Palavra é Luz, Minha Boca é como uma espada afiada. Lembre-se criança, se pertenceis à Luz, então pertenceis ao dia, e durante o dia deveríeis permanecer despertos! Mas se adormeceres e parares para conversar com a Torre, escutando as riquezas corruptíveis que ela vos oferece, tu te voltarás para a escuridão e enredado nas trevas, ficarás preso nos espinhos que permitistes crescer em vosso jardim, e logo serás esmagado pela poeira que se acumulará sobre vós e secarás pela aridez de seu coração, junto com os espinhos.

Então, prosseguiu dizendo:

-Estes espinhos que cultivaste, quando secos, serão arrancados e jogados ao fogo, e se tu estiverdes enredado neles, te tornarás cinzas junto com eles.

Christian ainda estava perdido, já que por mais que ouvisse três vozes, ainda a ouvia como uma. Porém, mesmo não compreendendo, sentia um fogo tomar conta de si, junto a um sentimento indescritível de completude, estando tão próximo daquela intensa Luz que não só parecia preencher completamente o espaço ao seu redor, tornando o espaço não mais limitado pelos limites físicos, como também parecia preencher todo o seu ser, fundindo-o e unindo-o à luz, como se a luz também removesse os limites de seu corpo físico, tornando-o luz.

Sentindo um sopro suave em seu ouvido, lembrou-se da explicação de Archus sobre o Rio, que derramando-se sobre a poça de água, a preenchia e a fundia junto de si, fazendo com que a poça se tornasse rio com o Rio.

Neste momento, Christian parecia ser dissolvido, desaparecendo na radiante Luz e tornando-se luz com a Luz. Ele sentia uma paz indescritível em seu coração, quando as palavras que como música ecoavam em seus ouvidos como uma só voz e pareciam ser talhadas em sua alma.

Christian já não sabia mais como deveria se dirigir á Eles, já que ao mesmo tempo que via Album, via Verbum e via Agnus, também, os via como um. Então, Christian perguntou:

-Quem sois?

Novamente em uníssono, as três vozes soaram como uma:

-Eu Sou.

Escutando um sopro em seu coração, Christian ouviu como se alguém lhe sussurrasse carinhosamente a palavra Rei. Logo Christian sussurrou para si como se recordasse de algo:

-Rei...

As vozes soaram novamente como uma:

-Eu sou o Rei, como disseste, filho; Eu sou Rei, assim como Meu Sopro sussurrou em teu ouvido para que o declares... Eu sou a fulgurante água purificadora da Fonte doadora da Vida, cujas águas purificam, renovam e insuflam a Vida em vós. Eu sou a Luz que trás os mortos a Vida, logo, Eu sou a Ressurreição, o Elixir da Vida.

Então o Rei continuou com um toque de tristeza em Seu Tom:

-Derramo Luz sobre a Terra, nestes dias de escuridão e tristeza, de aflição e angústia, de opressão e grandes perturbações, em que os demônios são deixados soltos para ir em todas as direções e enganar não somente os miseráveis, mas também a elite.

Christian ouvindo aquilo perguntou confuso:

-Demônios? O exército corrupto?

O Rei lhe respondeu:

-Minha criança, por trás de toda marionete há um marionetista. Não são estes que pensas, que são os demônios, estes são homens que tornaram-se escravos da Torre. A traição seduziu tantos á loucura.

Logo, Christian perguntou:

-Estes não são demônios? Como podem não ser quando agem como um?

Com um tom cheio de ternura o Rei respondeu:

-O marionetista reflete na marionete suas próprias ações. Se agem como demônios, não são porque o são, mas porque entregaram suas cordas nas mãos deles. Porém, toda marionete pode ser livre, e a liberdade se encontra no Espírito! A marionete não contém vida em si mesma, e por isso se não enxertada na Vida, torna-se incapaz de se mover. Então, presa pelas trevas que a amarraram, a marionete se vê incapaz de se mover sem cordas. Porém, a Luz pode desamarrar as cordas e dar Vida a marionete, tornando-a capaz de se mover sem elas. Somente então, há verdadeira liberdade, quando ela não mais necessita mover-se através de cordas, mas quando a Vida habita nela, e ela se move a partir de então, através da Vida, unida à Vida.

Logo, Ele continuou:

-Criança, saiba que ninguém é bom exceto a Fonte da Bondade, aqueles que bebem desta Fonte, se tornam bons porque a Fonte os alimenta com a Sua Bondade, mas ninguém é bom por si mesmo sem a Fonte. Por isso, bons e maus igualmente precisam se arrepender. Os bons, porque mesmo bebendo da Fonte, não agem de acordo com a Luz, e muitos deles, aproximam-se da Fonte apenas com palavras. Os maus, por causa de suas más ações, e por sua indiferença á Minha Luz. Esses que deixaram de ser, que caíram no abismo e se entregaram às trevas, são escravos dos seres que pelos séculos dos séculos habitam as trevas. Seres que já deixaram de ser a mais tempo que o tempo, perdidos no abismo e na corrupção. Essas pessoas são apenas peões que usam para seus planos obscuros e ímpios. Porém, estes peões acreditam ser reis, quando na verdade nunca poderiam ser.

Logo, o Rei prosseguiu, ecoando com profundidade:

-Aquele que reina na escuridão é o pai da escuridão. Ele reina na mentira, ele foi homicida desde o princípio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele; quando, ele profere mentira, fala do que é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira. Estes estão cegos pelo pai da mentira, que os envolveu na escuridão, para que não vissem, e endureceu seus corações, para que não compreendessem. O demônio não tem poder sobre ninguém que esteja bem enraizado na Luz, e por isso se esforça para que a humanidade não se aproxime da Luz. Em sua ânsia por reinar, o mentiroso cavou sua perdição, pois construiu seu reino sobre areia movediça. Não pode um reino se sustentar sobre o vazio, alguém que reina sobre o que deixou de ser, reina sobre o que não mais existe. Os ramos sem a Videira não tem vida em si mesmos, e se não estão ligados à Videira, secam! O reino que se desligou da Videira, está fadado a secar, e quando o fizer, o seu castelo de impiedade cairá em pedaços sobre todos aqueles que no seu reino habitam, já que suas fundações são vazias.

Christian ficou chocado com tantas informações, ainda mais por descobrir, que haviam seres, que governavam acima dos Et Cornibus. Não que nunca tivesse ouvido sobre os demônios, afinal, a freira os havia ensinado muito no orfanato, porém, nunca havia ligado os acontecimentos à eles. Logo, o Rei continuou:

-Criança, a luz e a escuridão não tem nada em comum. A Luz não é aliada da Treva! Por isso aqueles que estão nas trevas furiosamente perseguem os que estão na Luz. Por isso se escolheres o caminho da Luz, significará que Me escolhestes para ser teu Rei, a fim de reinar sobre ti, e Minha Luz se derramará sobre vós, pois escolhestes caminhar no caminhos do bons, persistindo no Caminho reto. E eu como Rei digo, irriga esta terra árida com Minhas águas, ilumina a escuridão com Minha Luz que vos foi entregue; aquele que irriga será irrigado pelo Próprio Rei; aquele que ilumina será banhado de luz pela própria Luz.

Logo, prosseguiu:

-Se andares no Caminho da Luz, as trevas vos odiarão. Os que andam na Luz, caminham na Verdade, e o pai da mentira, colocará seus esforços em derrubá-los. Serão perseguidos por suas ações, e sua existência será considerada pelos mortos como uma ameaça. Porém, como já vos disse, o demônio não tem poder sobre ninguém que esteja bem enraizado na Luz, e o que tentará fazer, é arrancá-los da Vinha, antes que criem raízes. Mas não tenhas medo. A Luz dissipa todas as trevas, e a menos que tu te afastes da Luz, as trevas não vos arrancarão da Vinha.