Sem saber quanto tempo se passou, Christian abriu os olhos e se viu envolto por uma escuridão sem fim. Não havia nada lá, só se via escuridão.
-Olá?...
Sua voz ecoou na escuridão:
-Onde estou? lembro-me que estava… isso! Correndo... as bestias. Então, eu percebi que amanheceu e...
Antes que Christian terminasse, uma fome e uma sede intoleráveis, somadas a uma exaustão extrema, caíram sobre ele. Era algo tão insuportável, que Christian caiu ao chão gemendo de dor, e rangendo os dentes com desconforto que sentia. Minutos se passaram e aquele sofrimento não cessava. Então, por entre os dentes cerrados em agonia, entre gemidos dolorosos ele disse:
-O que é isso? Eu nunca senti nada assim antes, ainda nem fazem nem 3 sóis completos que não sacio minha fome e minha sede.
Deste modo, enquanto se encolhia dolorosamente no chão, segundo após segundo, sua mente começava a se perder na fome, na sede e na exaustão, até que uma bela voz entrou em seus ouvidos lhe chamando em sua direção:
-Venha a mim, tenho um abundante banquete para saciar sua fome e sede, tenho os melhores luxos e confortos para aliviar sua exaustão. Venha, venha...
Christian pensando que aquela voz lhe era familiar, com muita dificuldade, levantou-se olhando ao seu redor, e logo percebe uma fraca luz em determinada direção. Pensando que poderia ser Agnus novamente querendo ajudá-lo, ele faz o seu melhor para seguir em direção à luz.
Só que, desta vez, ele não sentia o entusiasmo que sempre sentiu quando encontrou Verbum, Album e Agnus como nas outras vezes. Porém, a fome, a sede e a exaustão o impedia de perceber tais detalhes, de modo que seu discernimento estava entorpecido como os olhos de um cego.
Conseguindo Christian chegar à fonte da luz, viu ali uma grande e bela mesa de madeira, sem nenhuma cadeira disposta ao seu redor. Mas o que atraía Christian não era a mesa, mas sim o que havia nela.
Um farto banquete, com belos pratos servidos em bandejas, pratos, taças e talheres de ouro. Naquele momento, a fome e a sede de Christian tomaram conta de sua mente, fazendo-o freneticamente se dirigir à mesa.
Porém, quando chegou a um metro de distância dela, Christian se viu impedido de avançar mais além, como se houvesse ali um muro invisível separando-o daquela mesa. Loucamente, Christian tentava avançar em direção a mesa, mas sem nenhum resultado; aquilo o estava enlouquecendo, e o aroma da comida parecia propositalmente ser levado em direção ao seu nariz, estimulando ainda mais a sua fome. Então a mesma voz soou mais uma vez em seus ouvidos.
-Eu posso saciar sua fome, que tal?
Christian já fora de si, respondeu em desespero:
- Sim, sim por favor, eu não consigo me aproximar da mesa, me ajuda!
A voz em um tom carinhoso diz:
-Claro, querido, basta que me aceites. O que me diz? Ajoelha-te a mim, sirvas a mim, e jamais passarás por isso novamente! Eu posso te conceder tudo o que desejar.
Christian, tomado por seus desejos, com seu discernimento entorpecido, sem pensar duas vezes, estava prestes a se colocar de joelhos. Porém seus movimentos foram interrompidos por uma luz muito forte, que de repente brilhou em todo o ambiente, tornando impossível abrir os olhos habituados à escuridão, diante de tal brilho radiante.
Por onde a Luz passava, dispersava a escuridão, e quando tocava Christian, parecia lhe trazer de volta de sua loucura e dar paz e clareza ao seu coração. Logo, sentindo-se tomado pelo entusiasmo, diante daquela Luz, Christian alegremente exclamou:
-AGNUS!!!!
E uma majestosa voz respondeu:
-Eu Sou. Não há nada oculto que não venha a descobrir-se, e nada há escondido que não venha a ser conhecido. Considera com atenção quem está diante de ti: restringi tua garganta se tu sentes muito apetite; não cobice seus manjares que são alimentos enganosos.
Quando a voz de Agnus ecoou, aquela voz que anteriormente soava carinhosa gritou, mas agora cheia de dor e ódio:
-SAI... MALDIÇÃO !!!!!!!!!!!! DEIXAI-NOS...
A voz parecia se afastar, como se aquele que falava, caísse em um abismo profundo de silêncio e desolação. Então, a Luz resplandecente voltou aos poucos em direção à sua fonte, permitindo que Christian abrisse seus olhos.
Olhando à sua frente, logo, seus olhos contemplam a mesa do banquete em sua verdadeira face. O alimento estava apodrecido e das bebidas não se aproximavam nem os insetos que se banqueteavam na mesa, pois estavam todas envenenadas. A mesa estava toda rachada, mal se aguentava em pé, e o belo ouro havia se tornado cobre. Enojado com o que via, Cristian afastou-se da mesa e desviou o olhar.
Então, apressadamente olhando ao seu redor, fixando seus olhos na luz que fluía até sua fonte. A alegria que aquela Luz lhe trazia, fazia com que Christian desejasse estar diante dela eternamente e em seu coração, ele era tomado pelo desejo de ver Aquele que nela habitava. Então, como se lesse os pensamentos de seu coração, a voz de Agnus cheia de amor disse:
-Minha criança, vinde e vede!
Ouvindo-o Cristian alegremente exclamou:
-Sim!
E dirigiu-se em direção à Luz. Adentrando à luz que formava um sol e iluminava a escuridão, seus olhos pousaram em uma imagem, que instantaneamente foi selada em sua alma.
Uma figura de um belíssimo cordeiro, resplandecente, branco imaculado, elevado ao alto. Seu corpo irradiava um brilho dourado e de seu peito brilhava uma belíssima luz avermelhada, que brilhava em harmonia com a luz dourada e transmitia puro amor a todo aquele a quem tocava.
Quando Christian o viu, ficou atordoado com tamanha beleza e docilidade que emanava daquele cordeiro. Assim, caindo de joelhos, o garoto apenas contemplou-o, deliciando seus olhos com aquela visão. Era como se fosse mergulhado em um mar de puro prazer. Neste momento, Agnus, fixou seus brilhantes olhos nos olhos de Christian e falou:
-Criança, Eu Sou o Verdadeiro Banquete. Meu Corpo é a verdadeira comida, e o Elixir da Vida que corre por Ele é a verdadeira bebida. Quem deles se alimenta, tem a Vida em si mesmo. Eu permaneço nele e ele em Mim. Então, ele viverá pela Luz e a Luz nele habitará! Minha Presença é vosso alimento, mas quando te afastas de mim, a fome mais uma vez vem a ti. Porém, há momentos em que precisas passar fome, para que valorizes o Alimento que te dou. Mas não tenhas medo. Pedi e recebereis! Se tens fome, peça comida, se tens sede peça bebida. Buscai e achareis! Se queres Minha Presença, procurai-a. Se a procurardes, a encontrarás, e Minha Presença vos preencherá e vos saciará.
Então, após uma breve pausa, Agnus continuou em uma voz amorosa e profunda:
-Saiba criança, que se alguém me ama, guardará minha palavra...
Ouvindo-o, Cristian confuso perguntou:
-Como devo eu fazê-lo?
A voz de Agnus ecoou nos seus ouvidos novamente:
- Gravai-as, pois, profundamente em vosso coração e em vossa alma.
Enquanto refletia sobre essas palavras, Agnus continuou:
- Ide pois ao Leste, naquela direção encontrarás um sábio que vos instruirá!
Logo, um brilho muito forte irradiou de Agnus, tornando Christian incapaz de manter seus olhos abertos. Quando finalmente abriu os olhos, viu-se no seu COR, em frente a seu coração que era envolvido por calorosas chamas.
Olhando a sua volta, e não vendo nada além de si, do Livro e do seu coração, logo, ele colocou-se em meditação sobre as palavras de Agnus. Com o passar dos minutos, Christian percebeu novamente sua fome, sede e exaustão retornarem aos poucos e exclamou:
-Eu esqueci completamente disso tudo no momento que a luz me tocou, não acredito! Eu esqueci de pedir ajuda a Agnus. Como eu posso esquecer que eu estava quase morrendo de agonia?
Enquanto ainda lamentava-se por sua estupidez, o Livro da Vida que estava ao seu lado, começou a brilhar levemente, lembrando-se de que o mesmo ocorreu quando recebeu auxílio contra as bestias.
Notando aquilo, Christian com interesse toca o livro, que ao seu toque novamente abre-se em uma página preenchida pelos escritos incompreensíveis, em que parte deles ele misteriosamente compreendia. Logo sua boca pronunciou:
- Eis que vos dou toda erva que dá semente sobre a terra, e todas as árvores frutíferas que contêm em si mesmas a sua semente, para que vos sirvam de alimento.
Quando sua boca pronunciou tais palavras, Cristhian saindo de seu COR e abrindo seus olhos, percebeu que permanecia deitado, no mesmo lugar que havia caído inconsciente na floresta desolada. Olhando a sua volta, logo, seus olhos presenciaram uma luz irradiando da terra e envolvendo as árvores e plantas que o cercavam.
As árvores em que aquela luz tocava, pareciam ganhar vida, seus galhos como se em alegria, se contorciam e de seus ramos rapidamente cresciam belos frutos. As flores, como se para demonstrar o seu prazer naquela luz que as envolvia, exalavam fragrâncias pelo ar, que pareciam transmitir suas emoções.
E as diversas plantas que a sua volta estavam, naquele momento pareciam gritar de alegria ao tocar a luz; e logo, cada planta produzia seus frutos e sementes segundo a sua espécie. Maravilhado com aquela visão, Christian alegremente se põe a rir, correndo para as árvores para se saciar com seus frutos.
Quando Christian deu a primeira mordida, seus olhos brilharam intensamente, após provar aquele bom fruto que parecia um bocado de mel. Logo o prazer dominou o seu paladar.
O sabor que ele sentiu naquele fruto era tão doce e refrescante, que Christian foi tomado pelo êxtase, e a cada mordida que dava, parte de sua fome, de sua sede e de sua exaustão eram imediatamente aliviados.
Minutos se passaram, e Christian agora já saciado e renovado, continua a devorar vorazmente todo fruto em seu caminho. O sabor era tal, que ele não sentia vontade de parar. Mas então, uma voz gentil pareceu soar do leste, ecoando em seus ouvidos e interrompendo sua euforia:
- Achastes mel? Come o que for suficiente: se comeres demais, tu o vomitarás.
Quando Christian ouviu o que a voz lhe disse, como se despertasse, interrompeu imediatamente o que fazia e voltou-se para o leste, mas ali não havia ninguém. Em seu coração, logo repetiram-se as palavras de Agnus: "Ide pois ao Leste, naquela direção encontrarás um sábio que vos instruirá!"
-Foi a essa voz a quem Agnus se referiu?
Olhando à sua volta para as belas árvores carregadas de frutos, que agora pareciam refletir a luz do sol, Christian pegou alguns dos frutos para guardar em sua trouxa envelhecida e relutantemente, se dirigiu ao leste, deixando todo o resto para trás.