Em outro canto da cidade, Kim Jun Hyeon tinha um sono agitado, em seu quarto de dormir.
Era um sonho recorrente, então ele tinha, no fundo de sua mente, uma confusa consciência de como era a sequência dos acontecimentos. Ainda assim, parte do seu pesadelo era justamente saber como as coisas se passariam.
Era dia 25 de julho, ele sabia pois estava marcado no calendário em cima de sua escrivaninha de estudo. Era o dia do seu encontro com Na Ra. Lá estava ele, parado com suas roupas de estudante, em choque, com a sensação de que podia mudar tudo desta vez. Como sempre começava, descia as escadas convicto de que desta vez o faria. Desta vez ele mudaria o destino.
Então, o cenário da casa de seus pais na capital mudava conforme ele assim que ele punha seus pés no andar de baixo. Já não era a elegante casa, mas um cenário cheio de fumaça e horror. O corredor estreito não correspondia em todos os detalhes ao cenário real onde a tragédia tinha acontecido, mas representava muito bem a casa de campo da família, perto do lago. Jun Hyeon ficou um pouco confuso para onde ir e como prosseguir, até entender que devia chegar no fundo da casa, onde enfim encontraria sua irmã Ji Hyeon. Ao olhar para o fundo do corredor, via as chamas escapando pelo vão da porta, junto com a fumaça negra que rapidamente preenchia o ambiente. Tirando o casaco do uniforme, enrolou em seu rosto, tampando a boca e nariz, e seguiu em frente resoluto, pronto para entrar no inferno e tirá-la de lá. Podia ouvir em seus ouvidos as batidas de seu coração acelerado.
Aguente firme Ji Hyeon! Era seu pensamento. Estou chegando, desta vez eu estou aqui!
Em seu pesadelo, era como se ele tivesse voltado no tempo e pudesse alterar tudo. Era o que ele queria.
Embora seu foco fosse chegar até lá, Jun Hyeon sabia que isso já havia acontecido algumas vezes antes, sem que ele tivesse realmente conseguido apesar de suas tentativas. Ele tinha poucos momentos antes de ser tarde demais. Mas sempre, no fundo de sua mente, parecia que ele tinha uma decisão difícil a fazer. Ele passava pela escada que levava para o porão, e ele tinha a impressão que, se ele se desviasse por um momento do seu caminho até a sala onde Ji Hyeon estava, provavelmente desmaiada e prestes a ser queimada, talvez as coisas mudassem o rumo.
Mas ele tinha somente uma chance, poucos momentos, e se ele não pudesse alcançar a sala a tempo, ele não poderia tirar sua irmã de lá. Então ele seguia focado em seu objetivo, mesmo que o corredor parecesse longo e difícil de atravessar. Quando finalmente ele alcançava a porta e se agachava, evitando as chamas altas e a fumaça, avançando para dentro de gatinhas, ele conseguia ver a mão de sua irmã, caída no chão… Rapidamente a alcançava e a virava para si, esperançoso de ver seu lindo rosto…
Jun!
Gritou em horror, acordando, sabendo que havia falhado, sem nem mesmo precisar ver a imagem em sua mente.
Rolou para o lado em sua cama, acendendo o abajur e vendo as horas. Passados alguns minutos das 3 da manhã de um dia vários anos depois do incidente. Novamente rolou, de barriga para cima, e respirou fundo, sentindo-se derrotado. Sentia algo na barriga, arrastou o travesseiro para cobri-la. Era dor e culpa, ele sabia dar nomes ao sentimento.
Não podia controlar os sonhos, isso era fato. Este pesadelo sempre deixava uma sensação estranha de incompletude, um incômodo que atravessava o dia.
Jun Hyeon levantou-se, sabendo que não conseguiria nada de útil ficando na cama com esses pensamentos. Atravessando seu apartamento, não olhou de propósito para o porta-retratos em cima do móvel em frente ao seu quarto. Não queria exacerbar o sentimento ruim e acabar com a noite. Também ignorou o carrinho de bebidas na sala, apesar de ponderar sobre a ideia por um momento. Foi para o escritório, acendeu a luz, olhando em volta como se procurasse algo. Mas apenas procurava paz de espírito e algo com o que se distrair até pegar no sono, se fosse capaz disso.
A tela do computador iluminou-se, e o papel de parede estrelado pareceu muito melhor que a realidade. O que fez com que ele fosse até a janela, afastando as cortinas, para ver o céu noturno, e comparar com a fantasia da foto editada.
Neste momento, sua cabeça coçou um pouco, num ato reflexo ele levou a mão aos cabelos, pescando de lá um objeto pequeno que pinicava seu couro cabeludo. Trouxe para frente para ver o que era, e deparou-se surpreso e deliciado ao perceber tratar-se de uma lantejoula dourada.
As lembranças do dia voltaram a sua mente, em contraste com seu pesadelo terrível e lúgubre. A Srta Nam e todas as faces que fizera no breve e patético encontro dos dois. Jun Hyeon não pôde conter o sorriso.
Com os dedos em pinça, levantou a pequena lantejoula contra o cenário do céu noturno, como se fosse uma estrela. Girou daqui e ali, captando o brilho das luzes, divertido.
A lantejoula-estrela em seus dedos escapou, caindo no chão. Jun cogitou deixá-la ali, mas um ímpeto fez com que pegasse o pequenino objeto brilhante, e resolvesse guardá-lo em sua carteira, ainda com um sorriso.