Ao fechar-se em sua sala antes de começar seu atendimento, a euforia da manhã passou, ao olhar o nome da clínica nas letras em relevo atrás de sua mesa.
Dr. Kim suspirou. Havia muito trabalho a fazer.
Jun Hyeon foi ao closet se trocar, passando pelo pequeno corredor que separava a parte privada de seu consultório, da área de atendimento. Ali, uma foto dele e de Ji Hyeon, abraçados e sorridentes, ambos de aparelhos nos dentes com sorrisos adolescentes e olhos límpidos, lembrava-lhe sua missão diária na Fundação que levava o nome dela.
O interfone tocou com um timing preciso quando ele retornava já com seu jaleco médico. Tinha momentos que o Dr. Kim desconfiava que a Secretária Sênior Sra. Ma, tinha instalado uma câmera escondida na sala. Ou isso ou ele era mesmo muito previsível e metódico.
"Sim, Secretária Ma?" Ele atendeu, intrigado com esta pergunta em sua mente para a qual não tinha uma resposta agradável, em nenhum dos casos.
"Dr. Kim, o Sr. Go, seu avô, está na linha. Antes disso, posso confirmar com o Sr. Lee Dae Won o jogo de squash na sexta-feira, no clube?"
"Ah… Sim. Confirme." Kim não se sentiu muito entusiasmado, de repente, de ver um amigo antigo com quem quase não se encontrava mais, mas racionalmente sabia que não tinha motivos reais para evitar vê-lo. A ideia pareceu bem melhor quando recebeu o convite, do que quando se tornou um evento na agenda.
A ligação do avô foi transferida.
"Bem."
"Bem?" Kim perguntou, sutilmente provocando o avô por seu tom condescendente e imperial ao telefone.
"Sua secretária me ligou, dizendo que você está enviando duas dúzias de rosas para a Srta Ye Rim."
"Sim, pedi isso."
"Recomendei que ela mandasse as flores para Ye Rim direto para o Pérola, onde ela canta. Eu não sei o endereço pessoal dela."
"Tudo bem, avô, isso já é o bastante, obrigado."
"Você fez apenas o certo."
Jun Hyeon sorriu no meio da ligação. "Então estamos bem?"
"Uhn… Eu não sei. Você interrompeu algo importante e significativo para mim e para meus amigos, ofendeu uma jovem a quem estimo muito, gratuitamente, e me deixou plantado aquele outro dia te esperando no teatro."
"O quê?! Avô?! Seu tom subiu, surpreso com a reviravolta do assunto. O avô estava trazendo de volta um assunto de três meses atrás. Mas claro, por que será que as pessoas depois de uma idade são tão apegadas e rancorosas? Ele se perguntou.
"O quê, o quê, moleque? O avô fingiu estar tão confuso quanto o neto. " É verdade. Você me deve, Dr. Kim Jun Hyeon! Era meu presente de aniversário, e você me deixou plantado no restaurante!"
"Mas, avô, eu tive uma emergência médica aquela noite!"
"Não importa, e seus débitos apenas se acumulam, rapaz! Meu único neto…"
Ah, lá vamos nós novamente... Dr. Kim conhecia o senso de humor de seu avô, e que ele era de fato um sentimental. Naquele momento, provavelmente Kim estava no limiar entre ser passado pra trás, ou magoar seu querido avô chantagista.
Certo. Já corrigi o meu erro com a Srta Nam, e agora, quanto ao senhor, o que eu poderia fazer?
"Vou pensar em algo."
"Ok, fui pego."
O que?
"Nada, avô. Nos vemos hoje? Podemos jantar juntos, talvez?" Isso implicava em desmarcar um compromisso com amigos, mas todos os que eram próximos sabiam o quanto Kim Jun Hyeon era próximo de sua família, principalmente de seu avô materno.
"Ehhh. Vou ver." o idoso do outro lado da linha não estava fazendo esforço para não soar caprichoso, mas Kim sentia muito por não ter cumprido sua promessa de aniversário naquela ocasião, então apenas achava engraçado. "Ligo depois. Agora volte ao trabalho, Dr. Kim."
"Sim… Até mais, avô."
"Uhum." O Sr. Go desligou, deixando o neto pensativo sobre o quão envolvido com essas pessoas do seu clube preferido, o Pérola, o avô estava, para ter ficado tão bravo com ele.
Apertou o botão do interfone, para avisar a Secretária Ma que deveria trazer o primeiro paciente do dia.
…
Por volta deste mesmo horário, Ye Rim voltava de sua corrida matinal, subindo as escadas do prédio simples e suburbano, de dois em dois, até chegar no segundo andar, onde ficava o apartamento que dividia com Eun Ha. Mais cedo, enquanto corria, pensava se deveria aumentar suas séries, depois de ver aquele abdômen definido de um mero médico. Devo me empenhar mais? Será que ele viu alguma celulite? Bom, ele é um médico especialista em cirurgias plásticas, celulites não o assustam. Talvez apenas lhe causem desejo por lucro… Será que eu deveria fazer uma lipoaspiração? Será que ele recomendaria uma lipoescultura?
Abriu a porta do apartamento com estardalhaço.
"Unnie, bom dia! Você acha que eu devo fazer lipoescultura?"
"Se for no cérebro, talvez. Bom dia." Eun Ha passou do banheiro para a cozinha, aplicando seu grosso eyeliner enquanto andava. Ye Rim sempre se maravilhava com esse talento de sua unnie. "Vamos comer?"
"Você vai a algum lugar, unnie?" Ye Rim sentou-se à mesa, conferindo os pratos que a amiga tinha preparado em sua ausência, mas também percebendo que Eun Ha estava vestida para sair, com suas pesadas e sombrias roupas pretas.
Este era o tipo de roupa que Eun Ha usava desde o final da adolescência, quando abandonou os uniformes escolares, e ambas vieram juntas para a capital fazer a faculdade. Ye Rim sequer se lembrava o que tinha feito Eun Ha decidir-se por este estilo tão extravagante, chamativo e estrangeiro, mas de fato, ela chamava atenção em qualquer lugar que fosse… mesmo que não fosse sempre o melhor tipo de atenção. Porém, como Eun Ha era uma talentosa estilista formada pela Faculdade de Moda, Ye Rim achava justo e adequado que ela tivesse um estilo exótico de se vestir, que combinava com seu estilo único de pensar e agir. Ao contrário do que poderia parecer com seu estilo sombrio, Eun Ha era doce e bem humorada, mas de fato, era cheia de manias e excentricidades.
"Vou novamente até a Park & Zhang. Da última vez aquela sua sunbae da época de trainee, Cha Eun Mi, que agora trabalha para a Zhang, me barrou com uma desculpa esfarrapada. Ai que ódio!" Eun Ha serviu-se com movimentos violentos, frustrada. Já era a sétima vez em que era a tratavam como uma louca apenas porque ela insistia em marcar um horário para conversa com um dos principais e mais conhecidos estilistas do país. "Quem ela pensa que é? Acha que eu estaria ali, tentando agendar uma conversa com o Sr. Zhang, se ele não tivesse me dado este direito?"
"Unnie, talvez haja outra maneira de tentar, se esta não deu certo. Esses assessores apenas não sabem quem você é e porque o Sr. Zhang está ansioso para ver o seu material."
"Ele disse, não disse? E foi enfático, aliás. Ele falou:..."
"Quando você tiver uma coleção, venha me procurar. De verdade. Eu quero te ajudar. Eu sinto muito, você devia ter ganhado este concurso." Quem citou as palavras de Alexander Zhang foi Ye Rim, pensando que faria coro com a amiga, mas falou sozinha, enquanto Eun Ha mastigava. A amiga olhou para Ye Rim com olhos bem abertos:
"Não foi isso?! É o que eu estou dizendo. O assessor pessoal dele sabe quem eu sou. Mas aquela novata acha que está fazendo um favor a todos me impedindo de vê-lo. Ela realmente é... IRRITANTE!"
Ye Rim bateu no ombro da amiga, consolando-a. "Hoje é quarta-feira e você já disse que ele sempre vai às quartas. Monte uma… emboscada no estacionamento. Sim! Chega de ir pelos caminhos convencionais!"
"Ye Rim?!"
"Hahahaah, seria engraçado, não seria? Mas essas coisas não funcionam bem na vida real e você pode acabar estragando tudo. Não deve parecer que está mendigando a atenção dele, unnie!"
"Você acha que eu não devo ir hoje?"
"Bom, Unnie, acho que hoje é dia de…" Ye Rim levantou-se e foi até a janela da cozinha, que tinha uma vista estratégica para a rua lateral, onde havia uma quitanda e mercearia que atendia as quadras adjacentes. Ela olhou o relógio: "Já está na hora. Corre! Lá vem ele!"
Eun Ha levantou-se e veio juntar-se à amiga na janela. Uma camionete estacionou próximo ao portão de serviço da quitanda, e um jovem homem alto e atlético saltou, ajeitando o lenço que protegia sua cabeça. Ele arrancou a camiseta e foi até a parte de trás da camionete, tirar caixotes de verduras e frutas, deixando ver um torso definido por trabalho físico. "Hoje é dia… É dia de visitar seu futuro namorado. Precisamos de cenouras e perila." Elas observaram o esforço físico do jovem alto e disposto Yoo Kang Dae, da quitanda. Elas sabiam que ele sabia que estava sendo observado, mas não se importavam.
Eun Ha riu, da provocação, mas balançou a cabeça, quando a visão paradisíaca que as alegrava quase todas as manhãs desapareceu atrás do portão. "Aeee… Eu não sei. Ele sempre quer me dar as coisas de graça ou quase isso…"
"Espero que ele dê logo aquele corpo dele todo pra você, unnie! "Ye Rim riu. "Como pode ser tão bonito e tão tímido?" Desta vez Eun Ha sentiu-se verdadeiramente embaraçada e uma aproveitadora por aceitar as pequenas gentilezas de Kang Dae toda vez que ia até a quitanda, sem retribuir sinceramente. Ele não era tão tímido como Ye Rim pensava, mas talvez ele fosse a combinação errada de um corpo estonteante com uma personalidade muito cômica. Eun Ha balançou a cabeça, voltando ao assunto anterior:
"Certo, talvez eu não deva parecer tão desesperada. E não pareceria se aquela Cha Eun Mi não insistisse em me barrar."
Ye Rim suspirou, sem conseguir pensar em nada que pudesse ajudar Eun Ha a passar este injusto bloqueio.
"Mas, e você, se candidatou àquela vaga de locutora?"
"Sim, me inscrevi ontem a noite. Gravei algumas locuções e mandei junto com meu portfolio. Sei que será concorrido, mas acho que meu material ficou bom. Acho que tenho chances. Se eles me chamarem."
"Eles vão, você vai ver. Vai ser bom se você não depender somente de freelancers e da miséria que ganha no Pérola."
Ye Rim deu um sorriso levemente constrangido, mas não se ofendendo realmente com o comentário de Eun Ha. "Será ótimo, Unnie! Assim vamos pagar um almoço caro para aquela sonsa da minha sunbae Cha Eun Mi, e ela não vai mais nos olhar de cima só porque está empregada numa marca prestigiada. Quem ela pensa que é? Um fracasso como qualquer uma de nós!"
Isso mesmo!!!"
Elas gargalharam com a ideia, voltando à refeição já fria com ânimo revigorado.