Elisa desceu a colina da casa e foi até a cidade. Deixou o rádio do carro tocando e se distraía com a paisagem enquanto não chegava na escola. Tivera quase uma semana inteira de tranquilidade com o marido e o filho, e isso acalmou seus pensamentos. O tempo nublado a deixava feliz. Disse a si mesma que, quando chegasse em casa, sentar-se-ia debaixo da árvore e escreveria. Já sabia o que fazer com o protagonista e aqueles pensamentos a fizeram mergulhar em um mar momentâneo de paz.
Levava e buscava Rob na escola há quatro dias. Tudo porque queria estar sempre perto do filho para caso avistasse a lua. O padre disse que ela apareceria logo. Inerte naqueles pensamentos, nem se deu conta de como tinha chegado na escola. Estacionou o carro, ainda olhando para o céu.
Já estava ficando desacreditada quando, ainda dentro do veículo, esperando o sinal da escola tocar, avistou os primeiros vislumbres dela. Estava ainda escondida quase que por completa por entre as nuvens, mas ela viu. Uma pequena parte vermelha da lua. Seu coração disparou. Ela correu para a porta da sala do filho. Assim que o sinal tocou, ela entrou e o pegou pelo braço. Rob protestou, dizendo que queria se despedir de Berta antes de irem, mas Elisa não ouviu. Continuou arrastando o garoto até o carro. Agora, a lua estava completamente à vista e as crianças e adultos do lado de fora ficaram paralisados olhando para ela. Alguns pais berravam com os filhos para que fossem embora. Outros diziam que precisavam ir para a igreja. Elisa sabia o que aquilo queria dizer.
Assim que Berta saiu de dentro da escola, um arrepio subiu por seu corpo todo. Um sinal de alerta tocou dentro da cabeça. Finalmente chegara o dia. Finalmente seu neto e seu filho teriam a vingança que planejaram há tanto tempo. Porém, o mais importante, finalmente, reunir-se-iam e poderiam ser uma família feliz, como foram no passado. Quando viu Elisa segurando Rob, temeu pelo pior. Ela estava fugindo com ele. Não estava indo embora e levando-o para a colina. Algo dentro de sua cabeça dizia que ela o levaria para o padre. Saiu correndo até o carro, enquanto berrava para que ela não fizesse aquilo. Berta chegou a abrir a porta do veículo e pediu, por favor, para que ela a escutasse. Mas Elisa não escutou. Deu um chute na mulher, fazendo com que Berta caísse e batesse com a cabeça.
— Fique longe de mim e do meu filho, sua vagabunda. — Bateu a porta do carro e arrancou para a igreja.
Berta passou alguns segundos atordoada no chão, com crianças e adultos correndo ao seu redor. Volta e meia, recebia chutes e cuspidas de alguns.
— Sua vadia, você vai morrer hoje! — berrava uma voz.
— Toma isso, sua porca. Hoje, você vai pro Inferno! — falava outro, desferindo-lhe um chute no estômago.
Berta se encolheu em posição fetal, sentindo cada pedaço dos ossos e dos músculos doerem. Queria se deixar desmaiar naquele chão tão aconchegante. Sentia o sangue quente escorrer da cabeça ao rosto abaixo e pensou que morreria ali. No fundo, queria morrer. Pôr um fim naquilo tudo. Mas então se lembrou de Michael, Ben e Aurora. De tudo que sofreram por causa daquela gente. Achou forças nas lembranças de sua família. Aos poucos, foi se apoiando nos braços fracos e ficou de joelhos. Rastejou até o carro, cortando os joelhos e cotovelos em diversas partes. Teve de parar algumas vezes para tomar fôlego. Não os deixaria morrer daquele jeito. Iria o mais rápido possível até a casa de Ben e o avisaria do perigo. Diria que Elisa havia escolhido um lado e que Rob corria perigo.
Levou apenas dois minutos para chegar ao carro, o que pareceu uma eternidade. Assim que abriu a porta, subiu e se deixou jogar no banco do motorista. Agora, o corpo todo doía. Os joelhos e cotovelos latejavam com algumas pedras enfiadas profundamente na carne. Berta suspirou por alguns segundos e então deu partida no veículo.
Correu com ele o mais rápido que pôde. No caminho para casa, avistou alguns moradores indo em direção ao centro da cidade. Algo importante aconteceria lá para eles. Não hesitou ao vê-los. Passou com o carro por cima de um, dois, três… Sentiu o barulho de ossos sendo esmagados e miolos estourados para fora do corpo. Começou a gargalhar com aquilo. As pessoas que viram a cena começaram a se colocar acima da calçada, onde Berta não poderia alcançá-los. Ela pôs a cabeça para fora e berrou.
— O Diabo espera vocês! Estão vendo a lua dele? Ela veio reivindicar a alma de vocês. Logo estarão ardendo no Inferno, e, daqui alguns anos, eu estarei lá para torturá-los por toda a eternidade!
Foi-se embora mostrando o dedo do meio para os que pararam para ouvi-la.
Sentia-se renovada. A adrenalina levou a dor embora e agora ela se sentia motivada a dar fim naquilo tudo. Ela mesma pediria permissão para dar cabo de alguns com as próprias mãos. Michael não negaria aquilo à sua avó.
Porém, sua esperança se esvaiu quando encontrou o carro de Ben capotado na beira da estrada de barro. Não teria nada lá em cima para ajudá-la. Acreditava que Augusto estivesse com ele. Fazia a volta para ir na direção da igreja, quando ouviu um latido. Pelo retrovisor do carro, viu um grande São Bernardo vindo em sua direção. Era o cachorro de Rob. Abriu a porta do carro para deixá-lo entrar. Acreditava que o animal podia sentir o perigo que seu amigo estava passando e provavelmente serviria de alguma ajuda.
Acelerou o carro o mais rápido que pôde. Teria de ser esperta como fora no passado. Aparentemente, ela era a única esperança de todos ali. Se falhasse, o padre mataria a todos eles, e então seriam enviados para o Inferno para sempre.