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Chapter 15 - 15 — A MENSAGEM

A cidade ia acordando aos poucos, conforme o homem era arrastado pelas ruas. Os berros incessantes faziam com que as luzes das casas se acendessem, mas logo que os olhos das pessoas encontravam a fonte dos gritos e o porquê deles, apagavam-se (embora os curiosos continuassem na penumbra, espiando a horrível cena).

O homem implorava por perdão enquanto seu corpo era puxado pelo asfalto. O sangue começava a surgir nos cotovelos, mas Ben permanecia impassível, como se não fizesse nada demais. O homem pesava mais de cem quilos, e aquilo não representava desafio algum. Ben puxava a vítima com facilidade hercúlea, por uma corrente presa ao seu tornozelo.

O homem chorava, gritava e pedia perdão, ninguém vinha ajudá-lo. Ben percebeu como as pessoas acendiam as luzes e tão logo as apagavam. Tinham medo, o que era muito bom. Deixaria uma mensagem bem clara, não só ao padre, mas a todos que porventura pensassem em se opor a ele mais uma vez.

Não demorou muito até chegar na frente da igreja. A casa do gordo, que Ben arrastava, ficava ali perto. Fora o maldito quem havia segurado Ben naquele dia. Com vários quilos a mais e uma força muito superior, o gordo fora incumbido de deixá-lo imóvel enquanto torturavam seu pequeno Michael. Ele não o mataria. Pelo menos, não naquele momento. Mas faria com que sofresse, e isso o acalmava por ora.

Ao chegar na frente da porta da igreja, largou a corrente no chão e disse:

— Nem pense em fugir, seu asqueroso, ou as coisas serão muito piores para você.

O homem olhou Ben, as bolas dos olhos quase se destacando da face, sacudiu a cabeça um sem-número de vezes sinalizando um sim, a boca largando gemidos. Imaginou que aquilo talvez um dia viesse a acontecer. Estavam aprisionados naquela cidade, e, se ainda estavam vivos, era porque algo pior aconteceria em algum momento. Ele se arrependia do que fizeram, não por peso na consciência, mas por medo do que viria. Fechou os olhos e começou a chorar.

Ben tirou um canivete do bolso da calça jeans. Aproximou-o da face do homem, apertou um botão e deixou a lâmina saltar para fora. A vítima, ainda de olhos fechados, ouviu o sacar da lâmina e se sobressaltou.

— Se lembra disso, Valter? Eu fiz questão de guardar para um momento como esse. Talvez você não goste do que farei com ela.

O homem gordo soltou outros gemidos baixos, não conseguia abrir os olhos, apertando-os tão forte, que, por um instante, pareceu que explodiriam. Ben gargalhou ao vê-lo daquele jeito.

— O que se passa pela sua cabeça? Arrependimento? Medo? Pela minha, só passa vingança.

Bem se abaixou para ficar cara a cara com ele.

— Imagino que saiba o que te espera. E isso não é de perto nem o mínimo que pessoas como você merecem, Valter. Isso é só o começo.

O homem reagiu, empurrando Ben para trás. Ele se levantou para tentar fugir, mas a corrente em seus pés o traiu, fazendo-o cair no chão de forma brutal. Não tentou levantar novamente. Começou a rastejar, fazendo a corrente tilintar no silêncio da noite. Ben ficou parado, assistindo à cena cômica. Ele deixou Valter rastejar por alguns metros, permitindo que a esperança de fuga se fortalecesse na mente do homem. Valter quase alcançava o final da praça da igreja, quando sentiu o corpo gelar. Por mais que tentasse se mover, não conseguia.

Ouviu passos vindo às suas costas e não conseguia mover a cabeça para olhar para trás. Um calafrio percorreu sua nuca. Quis, de novo, fechar os olhos para que não pudesse mais ver a face de Ben. Por algum motivo, eles não fechavam mais.

A voz veio primeiro.

— Valter, Valter, vocês mexeram com a pessoa errada. Vocês quebraram um elo de amor verdadeiro. E sabe o que substitui um amor roubado? O ódio, a vingança, o rancor, a escuridão. Eu fui tirado do Céu, Valter, como Lúcifer, e jogado no Inferno. Vocês tiraram o que mais me importava nessa vida. Vocês me chamavam de demônio, e eu acabei decidindo por cumprir seu desejo. Foi para ele que me entreguei, e vai ser para ele que eu vou mandá-los também.

O gordo queria chorar, mas as lágrimas não caíam. O corpo todo estaria tremendo, se ainda tivesse movimentos. Urina escorreu sem controle. Ben colocou o canivete na frente dos olhos dele, e, por fim, disse:

— Pois sinta agora o que meu filho sentiu, seu filho da puta fedido. E saiba que depois eu irei atrás daquela puta da sua mãe também. Ela nos chamava de demônios e ela sempre esteve do lado desse padre imundo. E se você acha que aqui é um inferno, Valter, você não sabe como realmente é lá. Ele espera por vocês. Todos esses anos, ele me cobra suas almas e eu digo para ter paciência. Ele está feliz em saber que logo receberá todos vocês.

Ben passou a lâmina do canivete pela bochecha do homem, e uma linha de sangue começou a se formar. Seus lábios sorriram ao perceber o terror nos olhos de Valter. Levou a lâmina na direção do olho direito do gordo e a enterrou no espaço entre ele e a carne, girou-a aos poucos para desprender o globo ocular dos nervos. Retirou o canivete e o enfiou de novo; dessa vez, direto no olho, espetando-o como alguém espeta uma azeitona para retirá-la de dentro do vidro de conserva.

Não se ouviram gritos naquele momento, pois a voz de Valter também estava congelada. Mas a dor não, e ele a sentiu com todas as forças. Fedor de merda começou a tomar o ar da praça. Ben repetiu o mesmo com o olho esquerdo. Quando terminou o serviço, pronunciou algumas palavras e o gordo berrou. Jogou-se no chão com as mãos sobre as cavidades onde outrora estiveram os olhos. Berrou tão alto, que as sombras que xeretavam através das cortinas das casas se esconderam. Berrou de forma tão estridente, que o padre acordou com um pulo de seu sonho. Um sonho onde não existia nem Ben, nem Aurora Mendonça.

Ben deixou o gordo jogado no chão da praça e foi até a porta da igreja, segurando os olhos na mão. Deixou-os lá, esperando que o padre os encontrasse. Sabia que ele despertara e sabia que ele o espiava agora. E por mais que Ben quisesse acabar com a vida dele, prometera a Michael que não o tocaria.

Deu meia-volta, fez seu caminho até o carro. Ao passar por Valter, berrando de dor, falou em alto e bom som, para que todos os que assistiam escutassem.

— Quem ajudá-lo, de qualquer forma, terá um final pior.

E se foi, satisfeito com o ocorrido. Nem de perto, fora a vingança que quisera, mas, por agora, estava satisfeito. O padre não sossegaria diante daquilo, sabia disso. Talvez se encorajasse até mais. Mas era com as pessoas que ele estivera preocupado. Se o padre conseguisse reuni-los de novo, talvez pudessem atrapalhar os planos. Mas, com aquela mensagem, estava confiante de que tudo daria certo. Sentia-se bem, como não se sentia há muito tempo.