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Chapter 12 - 12 — O GAROTO QUE VIVE NA FLORESTA

Depois de brincarem na cozinha por alguns minutos, como um segundo tempo para o que tiveram na cama na noite passada, Augusto subiu para o quarto para se arrumar. Vestiria uma camisa social cinza com uma gravata preta. Seus sapatos, também pretos, brilhavam no chão do quarto. Após vestir a calça, colocou os lustrosos sapatos. Estava descendo as escadas, quando se lembrou de escovar os dentes. "Começar o primeiro dia matando os pacientes com bafo ruim não seria uma boa", pensou.

Ainda estava no andar de cima quando Ben bateu à porta. O médico não demorou muito para atendê-lo. Antes de abri-la, despediu-se da mulher, dando-lhe um leve aperto na bunda.

Quando saiu, pôde ver que o sol começava a brilhar no céu. Faria mais um dia ensolarado e bonito, e isso ajudaria Elisa com as mudanças. O vento ainda soprava frio, o que o agradou muito. São Paulo fazia calor demais e ele odiava como as pessoas ficavam fedidas e sujas. Cumprimentou Ben, e os dois se dirigiram até o carro do homem. De lá, partiram na direção da cidade. No máximo em uma hora, a mãe de Ben viria buscar Rob para levá-lo para o primeiro dia na nova escola.

***

Rob já estava pronto. Ficou sentado nas escadas aguardando a mãe de Ben chegar. Enquanto isso, ficou acariciando Bóris, que roncava a seus pés. Elisa se encontrava na cozinha, lavando as louças que usaram no café da manhã.

Quando bateram na porta, o garoto pegou a mochila e saiu correndo, animado com o primeiro dia de aula, mas tomou um susto quando a abriu. A mulher de seus sonhos estava lá. Ficou sem reação, olhando para ela.

— Você deve ser o Rob, certo? Acho que nos vimos por poucos segundos no dia da mudança de vocês — disse a velha, com um leve sorriso.

O garoto se forçou a sorrir também e assentiu, sem dizer uma palavra. Logo em seguida, Elisa apareceu por trás deles, com o pano de louça largado sobre os ombros.

— Ah, você deve ser a mãe de Ben. Ele disse que a senhora buscaria Rob. Muito obrigada, vai poupar um tempo meu com a mudança e a casa nova — disse Elisa.

— Por nada, querida. Caso prefiram, posso levar ele todos os dias, já que saio daqui no mesmo horário.

Elisa colocou a mochila do garoto nas costas dele e se abaixou para lhe dar um beijo na bochecha.

— Comporte-se, Rob. A mãe de Ben é sua professora. Caso você apronte algo, ficarei sabendo. — Levantou-se e estendeu a mão para a senhora. — Meu nome é Elisa.

— Roberta. Roberta Mendonça. — Correspondeu o cumprimento. — Mas as pessoas costumam me chamar apenas de Berta. Muito prazer. Acho que agora precisamos ir, ou chegaremos atrasados.

Elisa assentiu e Berta pegou Rob pela mão. Foram na direção do carro dela. Minutos depois, desapareceram de vista. "Não lembro de ter visto entradas para carros no caminho para cá", pensou. Entrou na casa para terminar de secar a louça e começar a planejar onde colocaria cada móvel e como organizaria tudo.

***

A escola era, assim como a maioria das casas na cidade, uma construção antiga. Não era uma escola grande, mas, se comparada com a população da cidade, também não era pequena. Por fora, tinha um tom vermelho e o telhado era pintado de branco.

A primeira percepção de Rob em relação à escola era que ela era um lugar assustador. Mas todo lugar assustador escondia certos mistérios que o fascinavam. Ainda acompanhado de Berta, dirigiu-se até a sua sala.

Estava meio amedrontado, a escola realmente tinha um aspecto de filme de terror. Daqueles em que, no fim do corredor, aparece um homem com uma motosserra, uma faca ou uma garra com navalhas nos dedos, e que corre atrás de você até que te pegue e acabe com sua vida. Mas isso era tudo coisa dos filmes, Rob sabia. Inclusive, esse era o tipo de filme que ele mais gostava de assistir. Augusto e Elisa não gostavam muito daquilo, pois ele sempre corria para o quarto dos dois, com medo dos monstros depois de assisti-los. Mas nunca o proibiram de ver.

Uma coisa que o garoto percebeu foi que um menino, mais ou menos da sua idade, seguia-o desde que chegara.

Entrou na sala e notou que havia pelo menos umas quinze crianças na sua turma e todas pararam o que faziam para olhá-lo. De cabeça baixa, dirigiu-se para uma cadeira vazia e lá ficou. Estava acostumado com os olhares focados em si por causa de seus olhos.

— Boa tarde, crianças! Esse é nosso novo colega de turma. Se apresente para a turma, Rob — disse Berta.

— Sim, senhora — respondeu o garoto.

Ele foi para a frente do quadro e se apresentou. Disse seu nome e que possuía um cachorro que crescera com ele. Disse que adorava as histórias do Harry Potter e que também gostava muito de filmes de terror. Falou que São Paulo era uma cidade grande, mas que não tinha muitos amigos lá. Terminou a apresentação assim e retornou para sua mesa.

A professora sorriu e começou a aula.

***

Rob tinha resolvido todos os exercícios, de todas as aulas, passados pela senhora Mendonça, e ficou com os olhos flutuando para fora da janela, a cabeça em mil e um pensamentos de aventuras. Em um relance, viu novamente o garoto passando pelo pátio. Agora, pôde vê-lo nitidamente. O garoto possuía uma espécie de faixa na cabeça, parecida com a das múmias dos filmes de terror. Fixou-se no pensamento de descobrir quem era o menino.

— Senhora Mendonça, posso ir ao banheiro? Já terminei meus exercícios.

A mulher o olhou por um instante e assentiu:

— Vá, meu querido, mas volte logo. Daqui a alguns minutos, começarei a correção deles.

Rob saiu da sala e foi em direção ao local onde tinha visto o menino. Não podia ter medo para sempre e precisava ter certeza de que o que vira, não fruto da sua imaginação. Quando chegou ao pátio, não havia mais ninguém. Andou abaixado por debaixo das janelas da sua classe para não ser visto, até percorrer todo o pátio. Alcançando o objetivo, avistou uma casinha velha. A casinha onde guardavam os utensílios de jardinagem.

Abriu a porta e entrou.

— Olá?

Nenhuma resposta.

— Alguém aí? Quem é você?

Silêncio.

— Ok, ou eu devo estar vendo coisas, ou ele não veio para cá.

Já estava fechando a porta, quando uma voz falou:

— Olá, Rob, tudo bem?

Um arrepio brotou pelos poros de sua pele. Afinal, ele não havia imaginado. Tinha um garoto mesmo ali.

— Quem é você e por que está me seguindo?

Ele não conseguia ver o garoto de onde estava, mas podia ouvir sua voz nitidamente.

— Sou um amigo, Rob. Me chamo Michael. Fazia tempo que eu não tinha companhia aqui em Rio Denso. Vi que você mora na casa da colina. Eu moro ali perto também.

— Lá por perto, onde? Não vi nenhuma outra casa além da nossa.

Mas, ao terminar a frase, lembrou-se de Ben e Berta, e mais uma onda de arrepios percorreu seu corpo inteiro.

— Fica no meio da mata. Acredito que você já tenha conhecido meu pai e minha avó.

Rob ficou intrigado, mas o medo havia passado. O garoto saiu de dentro da casinha, deu-lhe um sorriso afetuoso. As ataduras tapavam todo o rosto dele, deixando apenas a boca e o nariz de fora. Rob ia perguntar por que o garoto tinha a cabeça enfaixada, mas Michael falou primeiro:

— Acho melhor você voltar agora, ou vai se encrencar com minha avó. Por mais simpática que ela pareça, quando está brava até eu tenho medo. Nos falaremos mais de noite, Rob. Foi um prazer conversar com você.

Michael andou na direção da rua, e, em poucos segundos, sumiu. Rob voltou para a sala, onde encontrou uma senhora Mendonça brava:

— Que demora para ir ao banheiro — disse ela com um olhar severo.

Rob, com medo de arrumar problemas no primeiro dia de aula, mentiu:

— Desculpe, professora. Demorei pra achar o banheiro.

Aparentemente, ela engoliu a história e desmontou a cara de brava.

— Tudo bem, filho, sente-se.

***

Roberta sorria por dentro, tentando não transparecer a alegria que sentia. O garoto não tinha demorado por causa do banheiro. Ele tinha demorado por causa de Michael. Finalmente, os dois se reencontraram, e faltava pouco para que o plano dela, de Ben e de Aurora se concluísse. Esperaram anos por aquilo. Sua alma ria, gargalhava e chorava de felicidade. Rio Denso voltaria para eles e finalmente poderiam viver como uma família, graças àquele ingênuo garoto.