Diante de tamanha desolação, a realidade parecia impossível de entender. As ruínas ao meu redor, antes conhecidas, agora eram meras sombras de um passado que parecia distante demais para ser verdade. Eu caminhava entre os destroços de um mundo que havia desmoronado, cada passo pesado, como se o próprio peso da dor tivesse se materializado em minhas pernas. Minha família, minha namorada... não havia mais sinal deles. Era como se tudo o que eu conhecera tivesse sido apagado de uma vez, de maneira cruel e impiedosa.
O grito que ecoou pelo ar não era de uma outra pessoa. Era o meu grito, um lamento profundo que rasgou a noite, um grito desesperado em busca de respostas. Não havia nada além do vazio à minha frente, e, naquele momento, parecia que até o universo tinha se voltado contra mim. Era como se o mundo estivesse se despedindo de mim, e eu mal havia notado quando a despedida começou. O que restava era apenas um eco, uma vaga memória de algo que um dia foi.
Não havia mais nada em mim além da dor. Minhas mãos tremiam, e o chão sob meus pés parecia desmoronar a cada segundo, como se, em algum ponto, o próprio planeta tivesse decidido me tragar. A sensação era insuportável, uma pressa invisível que me fazia querer desaparecer, sumir daquele lugar amaldiçoado.
— AAAAAA! Por quê? O que eu fiz para merecer isso? Por que perdi todos que amava? — Minha voz se perdeu no eco, como se a própria cidade me ignorasse, como se eu fosse uma lembrança esquecida, um pesadelo que ninguém mais se importava em lembrar. Não havia ninguém para responder, apenas o silêncio pesado que me engolia.
Cada passo me levava mais para o vazio, mais para a sensação de que não havia saída, de que o fim era inevitável. Eu não sabia mais o que restava de mim. Não sabia se ainda era o mesmo homem que entrou naquele lugar, o mesmo que amava com tanto fervor. Minha esperança de reencontrar minha família, de abraçar novamente minha amada, tinha se esvaído, dissolvida nas cinzas da destruição que agora dominava o que antes foi meu lar.
Eu sentia como se estivesse me afogando em um abismo sem fim. A dor se expandia dentro de mim, como uma ferida aberta, sangrando minha alma. Uma dor que não se tratava apenas de perda, mas da compreensão cruel de que a vida, como eu a conhecia, não existia mais. A cada pensamento, a cada suspiro, eu me via mais distante de quem eu era antes.
O tempo, que antes parecia ter uma fluidez constante, agora se arrastava lentamente, como se até o próprio mundo hesitasse em seguir em frente. O peso da solidão me esmagava, e o desespero tomava conta de cada fibra do meu ser. A realidade ao meu redor parecia se desfazer, e não havia nada que eu pudesse fazer para impedi-la.
Foi então que, em meio a toda aquela solidão, uma força mais sombria parecia se manifestar. O vento começou a soprar com uma força sobrenatural, cortante e implacável, como se fosse uma presença viva, capaz de consumir tudo o que tocasse. Ele uivava, arrastando os restos daquilo que havia sido um dia a vida, como se estivesse transformando a própria paisagem em um monumento da morte.
Eu me agarrei ao que restava de minha sanidade, tentando me manter firme, mas o vórtice negro que se formava ao meu redor era incontrolável. Ele girava com tal intensidade que parecia ter vida própria, e os restos dos corpos, quase como um pó, os pedaços do que um dia foi uma cidade próspera, foram arrancados do chão e puxados para dentro daquela tempestade sem fim. Era como se a própria morte tivesse sido liberada para devorar tudo o que fosse possível.
Eu observava, impotente, enquanto aqueles que um dia haviam sido como eu eram engolidos pela escuridão. O ar estava carregado de um silêncio mortal, como se tudo o que restava do mundo tivesse sido subitamente silenciado, engolido pela tempestade que agora tomava conta do espaço ao meu redor. O som do vento era como um sussurro de algo além da compreensão humana, algo que não deveria ser ouvido, mas que, ainda assim, se infiltrava em minha mente, como uma ameaça invisível.
No centro daquela tempestade, eu me sentia pequeno, perdido, como uma folha ao vento, sendo arrastado sem rumo. Eu estava sendo consumido, engolido pela escuridão que tomava conta de tudo. Minha mente lutava para se manter à tona, mas o desespero era forte demais, e cada pensamento parecia ser arrastado junto com os corpos no vórtice. A escuridão, como uma entidade viva, parecia querer devorar não apenas o mundo, mas também a mim, me reduzindo a um nada.
Mais não parou por aí. Eu pude sentir novamente uma presença ao meu redor. Algo me observava de longe, estava rindo. Seja lá o que fosse, parecia rir de mim. A sua risada estranha me causava desconforto e terror. Ele parecia vir de todas as direções, até mesmo de dentro da minha mente. O vórtice parecia ficar cada vez maior na presença daquela coisa, como se a sua alegria alimentasse o vórtice e o tornasse mais forte e violento.
E quando me dei conta, ele já estava imensamente grande, a ponto de tocar o céu negro com tons de vermelho. Tudo estava sendo arrastado para dentro dele, nada escapava. Parecia a cena de um filme de terror, as ruínas, os escombros, a poeira, o asfalto — tudo estava se descolando do chão e flutuando em direção ao centro do vórtice. Ver essa cena me paralisou. Meus olhos não acreditavam no que estava acontecendo. Eu sentia como se até o ar dos meus pulmões estivesse sendo puxado para fora deles.
Eu tentei me segurar a uma viga de ferro presa ao chão com todas as minhas forças. Eu sabia que, se eu soltasse ou fosse puxado, seria o fim. Eu estava desesperado, desolado, profundamente triste e, acima de tudo, com medo. Sim, com muito medo. Eu não sabia o que ia acontecer, não sabia se ia ser puxado ou não. Meu coração batia tão rápido que me causava uma dor aguda no peito. Minhas veias ficaram visíveis de tanta força que eu colocava tentando me agarrar à vida.
A força foi tanta que o contato do ferro com a minha mão fez ela começar a sangrar. Até mesmo o meu sangue parecia ser puxado do meu corpo. Minha mente começou a esvair. Meus olhos começaram a escurecer e, de repente, senti como se alguém estivesse abrindo a minha mão. Eu conseguia sentir meus dedos sendo abertos, um por um, enquanto lutava para fechá-los, mas era inútil. O vórtice já estava muito perto, e, seja lá o que fosse, estava prestes a abrir os meus últimos quatro dedos, que estavam firmemente agarrados à viga de ferro. E então, meus dedos se abriram, e eu fui puxado para o vórtice.
Mas, enquanto era puxado, olhei para o local onde estava, e uma sombra distorcida parecia estar em pé, rindo, como se estivesse se divertindo com tudo aquilo. Nessa hora, minha consciência tremeu, e eu fui puxado para dentro do vórtice.
Mas, no último momento, algo mudou. Uma voz suave e profunda, como um sussurro distante, penetrou minha mente. Não era uma voz humana, mas algo mais. Algo que estava além de tudo o que eu já havia conhecido. Não era um resquício da minha sanidade, nem um eco da minha própria alma, mas uma presença antiga, uma força primitiva que, de alguma forma, me tocava.
— Você estar muito longe do fim.
As palavras penetraram minha alma, como uma corrente elétrica atravessando meu corpo, despertando algo dentro de mim. Era uma mensagem. Uma mensagem de que eu não havia sido totalmente derrotado, que, por mais que eu estivesse perdido, ainda havia algo dentro de mim que me impedia de sucumbir completamente. Algo que me fazia resistir, mesmo quando tudo parecia perdido.
Eu fechei os olhos por um momento, sentindo o peso daquelas palavras ecoando em meu interior. Eu ainda não tinha morrido, e estava muito longe do fim. Não importava o quanto o mundo tivesse mudado ou o quanto eu tivesse perdido. Havia algo em mim, uma força que não podia ser destruída, algo que não poderia ser apagado por essa tempestade, por esse abismo de escuridão.
Eu ainda tinha algo a fazer. Algum propósito, algum destino a cumprir. O que era isso, eu ainda não sabia, mas sentia que aquele momento não era um simples suspiro do fim. Era um chamado. Algo em mim dizia que havia mais por vir, que a minha história não terminava ali.
E, naquele momento, uma nova chama de esperança se acendeu dentro de mim. Fraca, ainda, mas suficiente para manter minha esperança de pé, em meio ao caos. Eu não estava mais sozinho. Eu não sabia de onde vinha, mas sentia que aquela sombra continuava me observando, enquanto ria.
A tempestade continuava ao meu redor, mas, agora, uma estranha sensação de que algo estava prestes a acontecer tomou conta de mim. Algo maior, mais poderoso, estava prestes a ser revelado. E eu não podia deixar de sentir que o que eu tinha perdido ainda estava ao meu alcance, que a resposta estava mais próxima do que eu imaginava. Algo me dizia que o destino estava se aproximando.
Eu não sabia o que o futuro me reservava, mas uma coisa era certa: eu estava apenas começando.
Mas então vigas de ferro e vidro vieram em minha direção, arrastadas pelo vórtice. E, quando me dei conta, elas já haviam atravessado meu corpo. Era estranho, a sensação, todo aquele barulho, a tempestade o vórtice, os escombros sendo atirados... Até mesmo as risadas pareceram sumir. Minha visão se apagava aos poucos, enquanto sangue escorria pelas perfurações e pela minha boca, fazendo aquela cena, apesar de dolorosa e triste, ter um tom de beleza. O céu negro misturava-se ao vermelho lentamente enquanto minha visão se apagava. Era estranhamente bonito. "Então... morrer é assim".