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Chapter 41 - Capítulo 40: O Prenúncio do Caos.

Sob as águas rubras do mar vermelho, a jornada prosseguia. Renier e Aura avançavam, acompanhados pela imponente Bake-Kujira, uma baleia yokai cujo som sombrio reverberava como um sussurro ancestral. A criatura movia-se com uma graciosidade assustadora, suas ações quase imperceptíveis. A água não parecia reagir à sua presença, mas mesmo assim, sua aura aterrorizante era inconfundível. As lendas estavam certas: a Bake-Kujira carregava consigo um temor que alcançava pescadores e navios, como um presságio de desespero.

Aura observava fascinada. Pela primeira vez, sentiu algo próximo à admiração por uma entidade sobrenatural. A serenidade predatória da Bake-Kujira era intrigante. Tomada por curiosidade, ela finalmente quebrou o silêncio:

— Renier, como você sabe tanto sobre seres como esse?

Renier hesitou, surpreso pela pergunta. Seu olhar sério voltou-se para Aura, analisando-a com cuidado antes de responder:

— Você mesma é uma Oni, Aura. Não deveria saber também?

Ela deu de ombros, um sorriso melancólico dançando em seus lábios.

— Não sou como os Onis mais antigos, Renier. Minha mãe, Shuten Douji, é uma história viva, um ícone entre os nossos. Mas eu? Sou jovem. Vivi minha vida nesse mundo, presa ao território dos Demônios. Conheço o suficiente para sobreviver, mas meu conhecimento não vai além do que posso ver e tocar.

A resposta deixou Renier pensativo, mas ele logo desviou o olhar para a Bake-Kujira. Aproximando-se da criatura, tocou-a suavemente, a mão repousando em sua pele etérea. A baleia yokai reagiu ao gesto, como se aceitasse aquele toque com uma tranquilidade inesperada.

— Quando eu ainda estava na Terra — começou Renier, a voz baixa, quase nostálgica —, meu dever como Guardião Negro parecia algo simples. Achei que era apenas cuidar de seres como ela.

Aura arqueou uma sobrancelha, a curiosidade em seu tom transparecendo mais uma vez:

— E não é? Você é uma força natural. O Guardião Negro existe para ser a ponte entre o plano sobrenatural e o mundo físico, não?

Renier balançou a cabeça, um meio sorriso tocando seus lábios.

— Você está certa... mas também errada. Meu papel vai além disso.

Ele fez uma pausa, refletindo.

— O que você realmente quer saber, Aura? Sobre os seres sobrenaturais?

Aura assentiu, e ele continuou:

— Eles nascem de lendas, mitos, contos forjados pela própria humanidade. É fascinante, não acha? A imaginação dos vivos tem um poder incrível. Mas há algo mais profundo nisso. Eles não são meras criações de mentes mortais. São manifestações de algo além do entendimento humano.

Renier ergueu o olhar, contemplando o horizonte infinito.

— Esses seres existem em um plano diferente, em camadas do multiverso que poucos podem alcançar. Eles não estão limitados a corpos físicos como nós. Movem-se entre mundos como um rio que atravessa a terra, guiados por forças que nem mesmo os deuses compreendem totalmente.

Ele sorriu, os olhos brilhando com uma reverência que Aura nunca vira antes.

— É isso que os torna belos. Cada criatura, cada lenda, carrega uma verdade oculta, uma fagulha do que significa existir.

Aura ficou em silêncio, deixando que as palavras de Renier ecoassem. Por um instante, o mar vermelho pareceu ainda mais profundo, como se escondesse segredos que só a Bake-Kujira e Renier poderiam entender.

O silêncio foi rompido apenas pelo som suave da água sendo cortada pela Bake-Kujira.

Aura observava seu reflexo distorcido na superfície vermelha do mar. O tom carmesim parecia refletir mais do que apenas sua imagem; trazia à tona pensamentos profundos, como se aquele oceano carregasse as histórias de incontáveis vidas e conflitos.

De repente, ela se inclinou um pouco mais perto de Renier, apoiando as mãos em sua cintura. A pergunta veio com um tom quase desafiador:

— Você quer mesmo saber mais sobre mim, Renier?

Renier não hesitou nem por um instante. Seus olhos a encararam firmemente enquanto ele respondia:

— Quero. Nós dois fizemos um pacto, não foi? Ajudar um ao outro. Não sou o tipo que gosta de falar muito sobre mim mesmo, mas tento. Então, se estamos juntos nessa, eu quero te entender.

Aura soltou um leve sorriso e assentiu, como se as palavras dele fossem a confirmação de algo que ela já sabia.

— É verdade. Eu pedi para você usar seus poderes em benefício meu, um pedido que reconheço ser egoísta. Mas, no meu caso, era necessário.

Renier inclinou levemente a cabeça, um sorriso intrigante surgindo em seus lábios.

— Eu não vejo isso como egoísmo. Você é uma Rainha, Aura. E uma Rainha precisa olhar além do que é comum. Usar e ser usada faz parte do seu papel. Esse controle e força é o que te coloca acima dos seus súditos.

Aura piscou, surpresa pela clareza com que ele compreendia sua posição. Por um momento, não soube como reagir. Nunca imaginara que Renier, com toda a sua impulsividade e aparente descaso por responsabilidades, pudesse ter um entendimento tão profundo sobre o que significava liderar.

— Você... entende isso? — ela perguntou, o tom genuinamente admirado.

Renier deu de ombros, desviando o olhar para o horizonte.

— Entendo mais do que gostaria, talvez. Mas não vamos mudar de assunto. Quero saber.

Aura respirou fundo, o brilho leve de felicidade que iluminava seu rosto deu lugar a uma expressão séria. Havia algo pesado em suas palavras quando ela finalmente falou:

— Vou te contar porque preciso de você, Renier.

O tom dela mudou, carregado de um peso que parecia se misturar com a vastidão do mar vermelho ao redor. Renier permaneceu em silêncio, ouvindo, como se soubesse que o que viria a seguir era algo que moldaria ainda mais o vínculo entre eles.

Aura falou com um tom sombrio, sua voz carregada de memórias dolorosas.

— Minha história não é de vitórias, Renier. Não ultimamente.

O silêncio entre os dois foi preenchido apenas pelo som distante do mar vermelho, como se o próprio oceano compartilhasse do peso de suas palavras.

— Tudo começou após a queda da antiga Guardiã Negra — continuou ela. — Makoto Kanemoto, sua avó. Quando ela desapareceu, o território dos Demônios mergulhou no caos. Minha posição como Rainha deveria ter mantido a ordem, mas algo surgiu... algo que nem mesmo eu poderia enfrentar.

Renier manteve-se atento, mas seu olhar estreitou-se ao ouvir o nome de sua avó. Ele sabia de sua importância, mas nunca imaginou que suas ações tivessem repercussões tão longínquas.

Aura apertou os punhos, como se a memória fosse um fardo insuportável.

— Ela apareceu como uma mulher, mas não era uma mulher comum. Quando a vi pela primeira vez, senti uma onda de amargura e raiva como nunca antes. Não era apenas o que ela era, mas o que ela representava: a ruína.

Aura respirou fundo, tentando controlar as emoções que transbordavam.

— Ela me desafiou, e eu aceitei. Como poderia não aceitar? Mas foi uma humilhação. Uma batalha que ela tratou como uma brincadeira. Eu, com o sangue de Shuten Douji, a Primordial da minha espécie, fui derrotada sem qualquer chance de vitória.

Renier notou o amargor nas palavras dela. Para Aura, aquela derrota não era apenas uma questão de força; era uma mancha em sua honra.

— Fui usurpada, arrancada do meu trono e forçada a fugir. Fugir! — Aura cuspiu a palavra com desdém. — Isso vai contra tudo o que sou, tudo o que deveria representar.

Ela fechou os olhos por um momento, como se o simples ato de recordar fosse doloroso demais.

— Mas eu não vou parar. Não é apenas vingança. É sobre recuperar o que é meu por direito.

Renier permaneceu em silêncio, absorvendo cada palavra. Depois de um momento, sua voz cortou a quietude:

— Quem é essa mulher?

Aura o encarou, seus olhos sérios e determinados.

— Eu sabia que você viria, Renier. O Guardião Negro sempre viria. Era como uma profecia, e ela se cumpriu.

Renier franziu o cenho, confuso com a implicação.

— O que você quer dizer?

— Apenas um Guardião pode derrotar outro Guardião.

Renier sentiu o peso das palavras dela. Seus olhos estreitaram-se, e sua mente começou a processar o que parecia impossível.

— Um Guardião? Além de mim? — Ele balançou a cabeça. — Isso é impossível. Yggdrasil criou apenas um Guardião Negro. Eu sou único.

Mas Aura não recuou, continuando com firmeza:

— Ela se autodenomina a Guardiã do Caos. E sua força... faz jus ao título. Contra ela, eu não tinha chance.

Renier ficou em silêncio, seus pensamentos girando em espiral.

— A Guardiã do Caos... — ele murmurou, o nome carregado de um significado sinistro.

Por um momento, o peso da verdade parecia esmagar até mesmo Renier. Se havia outro Guardião, alguém que usava um título tão oposto ao equilíbrio que ele representava, isso significava que sua missão não se limitava apenas à Sombra.

Era um prenúncio de algo muito maior. Algo que ele talvez ainda não estivesse pronto para enfrentar.

Continua…