Dois magos se aproximaram do cristal negro flutuante, movendo-se com uma mistura de reverência e cautela. Com mãos enluvadas por magia, começaram a desativar a cúpula de contenção que o envolvia. As runas ao redor diminuíram de intensidade, como estrelas se apagando no espaço, enquanto o cristal pulsava mais forte. Cada vibração parecia sincronizada com uma batida de tambor que ecoava em meu peito, como se aquele objeto estivesse me estudando.
— Senhor, tem certeza de que o corpo dele suportará a fusão? — Um cientista, um homem magro com cabelos grisalhos e óculos manchados, deu um passo hesitante à frente. Havia suor brilhando em sua testa.
— Ah, mas é exatamente isso que estamos prestes a descobrir, não é? — Martin respondeu com um sorriso cruel, sem desviar os olhos do cristal. Ele parecia encantado, como se estivesse diante de uma obra-prima que ele mesmo criara. — Se sobreviver, teremos o espécime perfeito. Se não... teremos mais dados para analisar.
Eu queria cuspir na cara dele. Queria gritar algo sarcástico, algo que o fizesse pelo menos hesitar, mas a mordaça em minha boca me silenciava. Tudo o que eu podia fazer era cerrar os dentes e encará-lo com um ódio que fervia no fundo do meu estômago.
"Espécime perfeito... Você não sabe com quem está lidando, desgraçado."
Com a cúpula finalmente aberta, um mago estendeu as mãos e segurou o cristal. As luvas encantadas que usava brilhavam em tons de azul, mas mesmo assim ele hesitou por um instante. O cristal negro parecia quase vivo, pulsando como um coração. Eu observei aquilo com um misto de fascínio e terror. Algo dentro de mim dizia que nada naquele mundo era natural.
— Coloque-o sobre o peito dele — Martin ordenou, gesticulando impacientemente.
O mago obedeceu, aproximando-se de mim. Sua expressão era de desprezo misturado com pena, como se ele quisesse deixar claro que, para ele, eu não passava de lixo. Quando o cristal tocou minha pele, um calafrio atravessou meu corpo inteiro, como se gelo líquido tivesse sido injetado diretamente em minhas veias.
"Merda... o que é isso?"
Meu coração começou a acelerar, martelando como se quisesse escapar do meu peito. Eu fechei os olhos por um momento, e uma imagem invadiu minha mente: minha irmã mais nova, rindo enquanto corria pelo corredor de casa. Ela usava aquele vestido vermelho que a mãe adorava costurar. Fazia anos que não via aquela cena, mas, por alguma razão, ela parecia tão viva quanto o cristal agora pressionado contra meu corpo.
— Conjurem as runas estabilizadoras! — A voz de Martin trouxe-me de volta à realidade.
Os magos ao redor começaram a entoar cânticos. Suas vozes graves ecoavam pela sala, criando uma harmonia sinistra que parecia crescer em intensidade. Runas brilhantes surgiram no ar, dançando ao redor do cristal. Cada símbolo flutuava por um momento antes de se fixar, como peças de um quebra-cabeça incompleto.
A dor veio de repente, como uma faca que atravessa a carne. Começou no peito e se espalhou, atingindo meus braços, pernas e até a cabeça. Minhas veias começaram a escurecer, os traços negros se ramificando como raízes por baixo da pele.
— Senhor, algo está errado! — Um mago interrompeu os cânticos, olhando desesperado para uma tela que exibia leituras instáveis.
— Interessante... — Martin murmurou, inclinando-se para ver melhor. Ele parecia quase... feliz? — Isso está acontecendo mais rápido do que eu imaginava.
"Filho da puta..." Eu tentei lutar contra as amarras, mas meu corpo não respondia. O cristal parecia estar sugando cada gota de energia que eu tinha. A dor era insuportável, mas o pior era saber que, no fundo, eles estavam esperando por isso.
— Aumentem a contenção! Não podemos perder o controle! — Martin gritou, mas havia excitação em sua voz.
Os magos conjuraram novos feitiços, suas mãos se movendo em padrões complicados no ar. Runas adicionais apareceram, mas o cristal reagiu violentamente. Ele emitiu uma explosão de luz negra que fez as máquinas ao redor tilintarem e piscarem.
— Ele está absorvendo a energia! — gritou um dos cientistas, seus olhos arregalados em pânico.
"Absorvendo?" Minha mente girava. Será que era por isso que eu ainda estava consciente? Porque meu corpo estava... assimilando aquilo?
— Isso... Isso é magnífico! — Martin riu, mas havia algo na risada dele que parecia à beira da loucura. — Continuem! Não parem agora!
Antes que pudessem fazer algo, senti uma onda de energia percorrer meu corpo. Era como se algo dentro de mim estivesse prestes a explodir, uma força que não conseguia ser contida. Meu peito queimava, as runas ao redor tremulavam, e o cristal pulsava mais rápido, como se estivesse vivo.
Uma última explosão de energia me atravessou, mas dessa vez não foi só dor. Era poder. Um poder bruto que não pertencia a este mundo. Tudo ao meu redor desmoronou. Máquinas estouraram, luzes se apagaram, e uma onda negra se espalhou, consumindo tudo em seu caminho.
Os magos e cientistas foram lançados ao chão, como folhas ao vento.