92 anos depois, o mundo era um lugar drasticamente diferente. Os portais que uma vez haviam devastado a Terra agora eram apenas lendas, e as batalhas travadas contra criaturas monstruosas tinham se tornado histórias épicas contadas em livros. Mas, para muitos, esses relatos não passavam de mitos distantes – fragmentos de uma era de heróis que ninguém mais acreditava ser real.
Johan cresceu em uma dessas cidades modernas, um lugar cercado de tecnologia e progresso, onde a ciência reinava como única verdade. Com apenas 19 anos, ele era conhecido como um jovem solitário e introspectivo, alguém que preferia observar o mundo à sua volta em silêncio, com uma mente analítica e calculista. Era um estudante exemplar, um exímio investigador de padrões e mistérios, alguém que via o mundo com um ceticismo inabalável. No entanto, algo dentro de Johan parecia estar sempre à espreita, um vazio que ele nunca conseguia preencher.
Era uma noite comum, e Johan caminhava pelas ruas escuras de Nova Paris, a reconstrução moderna da velha cidade que havia sido devastada décadas antes. Ele estava voltando da biblioteca, onde passara horas pesquisando antigas lendas sobre os portais, mais por curiosidade do que por fé. Algo nessas histórias o intrigava, especialmente a ideia de que existia uma força que transcendia a compreensão humana. Mas, no fundo, ele achava que tudo não passava de invenções antigas.
Foi nesse momento que sentiu a primeira dor.
Ela começou como uma pressão leve em seu peito, mas logo se intensificou, espalhando-se por seu corpo como fogo. Johan caiu de joelhos no meio da rua deserta, tentando respirar, mas o ar parecia escapar-lhe dos pulmões. Seus olhos se fecharam involuntariamente, e em sua mente começaram a surgir visões desconexas: imagens de batalhas, de monstros grotescos e de uma figura distante, um homem com as mãos brilhando em dourado, que parecia observar Johan como um espectador silencioso.
Quando Johan abriu os olhos novamente, sentiu uma estranha energia percorrendo seu corpo. Ele se levantou, ofegante, notando que suas mãos tremiam, mas não de fraqueza. Era algo diferente. Sem entender o que estava acontecendo, ele tentou se acalmar, mas o mundo ao seu redor parecia mais vívido, mais intenso. Ele podia ver o brilho de cada lâmpada com clareza, ouvir sons ao longe que jamais teria percebido antes.
Foi então que ouviu o grito.
Um grito agudo e desesperado ecoou na rua próxima, tirando-o de seus pensamentos. Movido por um instinto que mal conseguia controlar, Johan correu em direção ao som. Ao chegar ao local, ele viu algo que desafiava a lógica: uma criatura, semelhante às descritas nas antigas lendas, estava de pé diante de uma mulher, com olhos vermelhos e um corpo deformado, que parecia saído de um pesadelo.
Johan paralisou. Aquilo era impossível. Os portais haviam desaparecido há quase um século. Mas ali estava ele, encarando uma criatura que não deveria existir. Antes que pudesse processar a situação, a criatura virou-se em sua direção, farejando o ar, como se sentisse sua presença.
Nesse instante, algo despertou dentro de Johan. Um poder bruto e inexplicável emergiu, percorrendo seus músculos e dominando sua mente. Suas mãos começaram a brilhar levemente, e ele sentiu uma força que jamais imaginou possuir. A criatura avançou, mas Johan, quase instintivamente, ergueu as mãos e um pulso de energia saiu de seus dedos, lançando o monstro para longe. Era um poder que ele desconhecia, mas sentia-se em controle, como se aquela habilidade sempre estivesse à espera para ser usada.
Atônito, Johan olhou para suas mãos. O que estava acontecendo? Como ele, alguém que jamais acreditara nas lendas, poderia possuir aquele tipo de poder?
A mulher, ainda em choque, o encarou com olhos arregalados, como se ele fosse uma aparição. Antes que ela pudesse dizer algo, Johan deu as costas e desapareceu pelas ruas escuras. Sua mente girava, confusa e atormentada pelas dúvidas. Ele sabia que, a partir daquele momento, nada em sua vida seria igual.
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Na manhã seguinte, Johan não conseguiu evitar a sensação de que alguém o observava. Nas semanas que se seguiram, ele percebeu que estava sendo seguido por estranhos de capuz, figuras que o espreitavam pelas sombras, sempre observando seus movimentos.
E então, uma carta chegou até ele, misteriosamente deixada sobre sua mesa. Sem remetente, apenas um selo dourado que emanava uma aura estranha. Ao abrir, leu:
"Johan, o sangue de heróis corre em suas veias. Você despertou, e a batalha pela Terra não terminou. Se deseja entender o que é, e o que representa, venha até o local marcado abaixo."
Johan sentiu seu coração acelerar. Esse era o início de algo maior, algo que ele nunca imaginara. Ele sabia que, para encontrar as respostas que tanto buscava, teria que enfrentar o desconhecido.