Chapter 2 - O Primeiro Teste

Enquanto atravessávamos a entrada do templo, a luz do lado de fora parecia desaparecer completamente. O ar ali dentro era pesado, quase como se o próprio tempo tivesse parado. As paredes estavam cobertas de runas antigas, e o silêncio era profundo, interrompido apenas pelos nossos passos ecoando pelo chão de pedra.

Eliakim caminhava à frente, seguro de cada passo que dava, como se já conhecesse cada canto daquele lugar. Eu, por outro lado, mal conseguia respirar direito, o peso da atmosfera me pressionando por todos os lados. Sentia como se algo estivesse me observando, uma presença invisível, mas poderosa.

"Este templo foi construído muito antes de sua era," Eliakim começou a dizer, sem sequer olhar para trás. "Ele é um dos poucos lugares que restam onde o poder das Ikes pode ser canalizado e entendido. Mas cuidado... o templo testa os fracos. Somente aqueles que estão dispostos a encarar seu verdadeiro destino passam por seus desafios."

"Testes? Que tipo de testes?" perguntei, tentando parecer mais confiante do que realmente estava.

Eliakim parou diante de uma porta massiva, esculpida com mais símbolos que eu não conseguia decifrar. Ele colocou a mão sobre um dos entalhes, e a porta começou a se abrir, revelando uma sala circular iluminada por uma luz suave que parecia emanar do próprio chão. No centro da sala, havia uma pedra alta com uma fenda no topo, como se algo estivesse faltando.

"Essa é a sua prova, Ezekiel," Eliakim disse, se virando finalmente para me encarar. "Aqui, você deve provar que é digno de carregar o fragmento da Ike do tempo. Só assim poderá compreender o verdadeiro poder que habita dentro de você."

"Mas... o que eu tenho que fazer?"

Ele apontou para a pedra. "Coloque sua mão sobre a marca e deixe o fragmento guiar você. Este templo foi feito para aqueles que controlam o tempo, mas também para os testar. Ele sabe o que você teme, o que você esconde, e o que te impede de seguir em frente. Se não for forte o suficiente, o fragmento será perdido para sempre."

Me aproximei da pedra com hesitação. A marca em minha mão parecia pulsar, como se reconhecesse o lugar. Ao tocar a superfície fria da pedra, senti uma descarga de energia percorrer meu corpo. Meus olhos se fecharam involuntariamente, e quando os abri, não estava mais no templo.

Ao meu redor, tudo estava distorcido. O chão, o céu, até o ar parecia se mover em câmera lenta, e à distância, vi figuras nebulosas se aproximando. Eram sombras, indefinidas, mas vinham em minha direção. Senti o coração acelerar, e um medo primordial tomou conta de mim.

"Não se deixe enganar pelas sombras," a voz de Eliakim ecoou ao longe. "Elas são os ecos do tempo... reflexos do que você teme enfrentar."

As sombras vinham mais rápido, e eu sentia minha mente se turvar. Tentava lembrar do que Eliakim dissera sobre as Ikes, sobre controlar o tempo, mas não conseguia pensar com clareza. Tudo ao meu redor parecia uma armadilha, como se o tempo estivesse distorcido, testando meus limites.

"Eu... não consigo fazer nada," murmurei, tentando me mover, mas minhas pernas pareciam travadas.

Então, ouvi uma voz... não a de Eliakim, mas algo mais profundo, mais antigo. "O tempo não pode ser controlado por mãos incertas. Somente aquele que aceitar seu destino, sem hesitação, pode guiá-lo."

Respirei fundo, tentando acalmar a mente. Eu precisava me concentrar. Era um teste. Isso era parte da prova que o templo exigia. O poder da Ike do tempo estava dentro de mim, mas só se revelaria se eu estivesse preparado para aceitá-lo. As sombras estavam quase sobre mim, e, no último momento, fechei os olhos e soltei o controle.

Tudo parou.

O silêncio tomou conta, e quando abri os olhos, as sombras haviam desaparecido. O mundo ao meu redor voltou ao normal. Eu ainda estava na sala, a mão firmemente sobre a pedra, e Eliakim estava à minha frente, observando com uma expressão de aprovação silenciosa.

"Você passou," ele disse calmamente. "Conseguiu se libertar do seu medo. Esse é o primeiro passo. Mas ainda há muito mais que precisa ser feito."

Olhei para minha mão, onde a marca da ampulheta agora brilhava com uma luz suave. Algo dentro de mim havia mudado. Eu não sabia exatamente o quê, mas podia sentir que tinha dado um passo importante em direção ao controle do fragmento.

"A Ike escolheu você por um motivo," Eliakim continuou. "Mas lembre-se... o poder do tempo não é algo que deve ser usado sem sabedoria. Ainda há dois fragmentos por aí, e outros também estão procurando por eles. Se cair nas mãos erradas, o mundo pode nunca mais ser o mesmo."

Engoli em seco. A responsabilidade parecia esmagadora, mas havia uma chama acesa dentro de mim, uma determinação que eu não sentia antes.

"O que vem a seguir?" perguntei, determinado a continuar.

Eliakim sorriu levemente. "Agora, você deve aprender a controlar o que foi dado a você. Mas primeiro, há alguém que você deve conhecer."

Ele se virou e começou a caminhar em direção a outra porta no fundo da sala, mais estreita e menos imponente do que a anterior. Eu o segui, sentindo que cada passo que dava me levava mais fundo nessa jornada inesperada.

O templo tinha mais segredos do que eu imaginava, e, ao atravessar essa nova porta, sabia que estava prestes a descobrir o próximo.

O Mapa Ampulheta

Enquanto Eliakim caminhava em direção à porta, a tensão no ar parecia se dissipar lentamente. A cada passo que eu dava atrás dele, sentia meu corpo um pouco mais leve, como se a pressão da sala anterior estivesse finalmente me soltando. A marca da ampulheta na minha mão ainda emitia um leve brilho, mas já não me causava desconforto.

— Há muito tempo, esse templo foi um dos centros de poder das Ikes — disse Eliakim, sua voz ecoando nas paredes de pedra. — Aqueles que eram escolhidos pelos fragmentos vinham aqui para aprender a controlar seus dons. Mas isso foi antes... antes da queda.

Eu continuei a segui-lo, tentando absorver as informações.

— Queda? — perguntei. — O que aconteceu?

Eliakim parou por um momento, suas mãos se cruzando nas costas. Ele olhou para o chão, pensativo.

— O pecado original — respondeu, sua voz grave. — A humanidade perdeu seu vínculo com o Criador. E com isso, o equilíbrio do mundo foi rompido. As Ikes foram despedaçadas, e seus fragmentos se espalharam, escolhendo novos portadores ao longo dos séculos. No entanto, muitos fragmentos caíram em mãos erradas. Desde então, esse lugar tem sido protegido por guardiões... até que o momento certo chegasse.

"Momento certo?" pensei, tentando entender o que isso significava para mim. "Será que ele se refere a mim?"

Antes que eu pudesse formular outra pergunta, chegamos à sala seguinte. Ao contrário da anterior, essa era mais iluminada e bem mais simples. Havia uma mesa de pedra no centro, com alguns objetos antigos sobre ela — mapas, pergaminhos, e o que parecia ser uma pequena ampulheta dourada.

— Aqui você aprenderá o que precisa saber — disse Eliakim, fazendo um gesto para que eu me aproximasse da mesa. — O conhecimento é sua primeira arma. Sem ele, nem mesmo o poder da Ike será suficiente.

Eu me aproximei hesitante, observando os pergaminhos amarelados pelo tempo.

— Todos esses mapas e documentos... eles mostram o caminho para os outros fragmentos? — perguntei, tentando entender o que eu estava vendo.

Eliakim acenou com a cabeça.

— Em parte, sim. Mas também há registros antigos sobre os primeiros portadores das Ikes. Alguns deles sabiam controlar seu poder, enquanto outros foram destruídos por ele. A chave está em aprender com seus erros e acertos. Para dominar a Ike do tempo, você deve entender como ela afeta o mundo ao seu redor. E, mais importante, você deve encontrar os outros fragmentos.

Eu toquei um dos mapas com a ponta dos dedos, sentindo a textura do papel antigo.

— Então... há mais fragmentos? Quantos?

— Três — respondeu Eliakim com firmeza. — A Ike do tempo foi dividida em três partes. Você possui uma, mas há duas outras por aí. Se quiser restaurar o poder completo, terá que encontrá-las.

A revelação me deixou inquieto. "Três fragmentos... e eu só tenho um. O que isso significa para mim? E quem mais está atrás deles?"

Enquanto eu refletia sobre isso, Eliakim se afastou um pouco, observando-me com atenção. Parecia que ele estava esperando algo, como se estivesse testando minha reação.

— Por que você está me ajudando? — perguntei, finalmente rompendo o silêncio. — Quem é você realmente?

Eliakim sorriu levemente, mas seus olhos permaneceram sérios.

— Sou apenas um guardião. Meu dever é proteger o que resta das Ikes e guiar aqueles que são escolhidos por elas. Mas... — ele hesitou, olhando diretamente para mim. — Há coisas que você ainda não está pronto para saber, Ezekiel.

Senti uma mistura de frustração e curiosidade. "Sempre esse mistério. Por que ninguém me dá respostas diretas?"

— Certo — disse, tentando controlar o tom. — O que eu preciso fazer agora?

Eliakim apontou para a ampulheta dourada na mesa.

— Esta ampulheta é um artefato antigo. Ela pertenceu ao primeiro portador da Ike do tempo. Você deve tocá-la. Ela o conectará com o passado, mostrando-lhe um vislumbre de quem veio antes de você. Mas lembre-se... você não pode interagir com o que verá. É apenas um eco. Um reflexo do que já aconteceu.

— Eu não posso mudar nada? — perguntei, confuso. — Então, qual é o propósito disso?

— O propósito é você entender o fardo que carrega. O tempo é uma força incontrolável para aqueles que não compreendem sua verdadeira natureza. E o primeiro passo para dominá-lo é aceitar que nem tudo pode ser alterado.

Olhei para a ampulheta com hesitação. "Aceitar o que não posso mudar... mas e se algo precisar ser mudado?"

— Tudo bem — disse finalmente, estendendo a mão.

No momento em que meus dedos tocaram o vidro frio da ampulheta, senti uma energia percorrer meu corpo, como se algo estivesse se ativando dentro de mim. O brilho suave da marca na minha mão aumentou, e, de repente, o mundo ao meu redor começou a distorcer.

Fechei os olhos instintivamente, e quando os abri novamente, não estava mais no templo.

A paisagem ao meu redor era completamente diferente. Estava em um campo aberto, cercado por colinas e montanhas distantes. No centro do campo, havia um acampamento militar, com barracas alinhadas e soldados marchando em filas. No horizonte, uma enorme muralha de pedra se erguia, e eu reconheci imediatamente onde estava.

— Sansão... — sussurrei, a palavra escapando dos meus lábios.

Era impossível não reconhecer. Estava na época de Sansão, o guerreiro lendário, o homem que destruiu um exército inteiro com suas próprias mãos. Eliakim não tinha mentido. Eu estava vendo o passado, através dos olhos de alguém que presenciou essa era.

Ao longe, vi uma figura se aproximando. Um homem alto, de corpo musculoso e imponente. Ele usava uma armadura simples, mas sua presença era esmagadora. Não havia dúvida — aquele era Sansão.

Senti meu coração acelerar. "Estou realmente vendo isso. Estou aqui, no passado."

Sansão caminhava com confiança pelo acampamento, seus olhos brilhando com determinação. Ele parecia estar se preparando para a batalha. Ao seu redor, os soldados o reverenciavam, mas havia algo mais em seus olhares. Respeito, sim, mas também medo. A força de Sansão era lendária, mas algo em seu semblante sugeria um peso que poucos compreendiam.

De repente, uma explosão de luz à distância chamou sua atenção — e a minha. Um brilho intenso no céu, como se o próprio tempo estivesse se rasgando. A cena começou a se fragmentar diante dos meus olhos, e a realidade ao meu redor desmoronou.

A visão desapareceu tão rápido quanto começou, e, antes que eu pudesse reagir, estava de volta ao templo, respirando pesadamente.

Eliakim me observava em silêncio.

— Você viu, não é? — perguntou ele.

Eu assenti, ainda processando o que acabara de acontecer.

— O que... foi aquilo? — perguntei, tentando recobrar a compostura.

— Você testemunhou uma memória antiga — disse Eliakim. — Um momento perdido no tempo. Há muitos como esse. E é através dessas memórias que você aprenderá o que precisa para restaurar a Ike do tempo.

"O que isso significa? E por que Sansão estava lá?"

— Qual é a ligação de Sansão com as Ikes? — perguntei, ainda confuso.

Eliakim deu um sorriso enigmático.

— Isso, Ezekiel, é algo que você terá que descobrir por si mesmo.