Como se as coisas já não estivessem complicadas o suficiente, chega a "cereja do bolo". Como Zeke poderia explicar toda essa situação? Mais importante, será que ouviriam ele? Um garoto preto,de máscara e de moletom,e um carro com o alarme tocando... com certeza, iriam achar que ele estava tentando roubar o carro.
- TU É SURDO, Ô VAGABUNDO? EU MANDEI COLOCAR AS MÃOS NA CABEÇA! - Gritou um dos policiais, visivelmente alterado.
Zeke já estava uma pilha de nervos, e aquela situação, com certeza não estava ajudando em nada. Tinha que escolher sabiamente seus próximos movimentos, se não, eles poderiam atirar nele. Então, com um pouco de dificuldade, por conta do seu braço machucado, ele coloca suas mãos na cabeça, ficando de costas para os policiais.
Os policiais iam se aproximando com armas apontadas para Zeke, enquanto ele pensava em uma forma de escapar daquela situação. Sua mochila estava a poucos metros atrás dele. Se pudesse achar uma brecha, poderia pegá-la e sair de lá, o mais rápido que pudesse.
"O que faço? O que eu faço?" - Pensou Zeke, olhando para baixo.
Então, ele olha á sua frente e vê escuridão por toda a parte. E aí, percebe que poderia se aproveitar disso. O caminho de trevas poderia ser a sua salvação e o caminho luminoso poderia ser o seu fim. Aquilo, sem dúvida, era uma grande ironia.
Então, sem hesitar, Zeke avança até as sombras, não dando tempo para os policiais reagirem.
- EI! - Grita um dos policiais.
- PARA AÍ, MERDA!!! - Gritou o outro policial.
Eles correram atrás de Zeke, mas o garoto já não estava mais lá. Eles tentaram procurar em toda parte, apesar da escuridão,mas não conseguiam encontrá-lo. E era essa,a brecha que ele esperava.
Com cuidado,ele se moveu furtivamente, saindo da parte escura e indo em direção a mochila caída no chão. Parecia tudo correr conforme o seu plano improvisado. Porém, ao chegar na mochila, ele tenta pegá-la com o seu braço machucado, o que o faz gemer de dor e deixar a mochila cair no chão.
- Uhhg...
Um dos policiais, o ouve e se vira, apontando sua arma na direção de Zeke. E sem hesitar, dispara duas vezes nas costas do garoto. E nesse momento, suas antenas vibram mais uma vez, como se avisassem do que estava por vir. Mas já era tarde, e Zeke é atingido pelas balas.
- Ahhh... - Geme Zeke de dor.
Ele cai no chão, de bruços, aparentemente morto.
- Ai, que merda! - Disse um dos policiais.
Os policiais chegam aonde o corpo do garoto estava,e começam a discutir:
- Porra, você acha que alguém viu? - Perguntou um dos policiais.
- Não, a rua ta deserta e tá bem escuro! Não tem como ter alguém aqui! - Disse o outro policial.
- Bom, a última coisa que a gente precisa é esse pessoalzinho dos direitos humanos ver, filmar e postar online! Aí ía foder com nosso trabalho! - Disse um dos policiais.
- Relaxa, ninguém viu! - Disse o outro policial.
Eles olharam novamente para o corpo caído de Zeke, e continuaram:
- Merda, acho que ele morreu mesmo! Você acha que ele tava mesmo roubado aquele carro? - Pergunta um dos policiais.
- Porra, claro que tava! E mesmo se não tivesse, olha essas roupas! Vestido desse jeito, nessa hora da noite... certeza que era vagabundo! - Disse o outro policial.
- É, cê ta certo! - Disse um dos policiais.
O segundo policial respirou fundo, enquanto pensava e depois disse:
- Certo, mesmo esquema: o elemento era perigoso, ele tava armado, ía atirar , e a gente se defendeu! - Disse o segundo policial, tranquilamente, como se fosse algo rotineiro.
- Beleza, deixa eu colocar a arma na mão dele! Aí, a gente dá o relatório pra central e depois vai no bar do Ancelmo! - Disse o primeiro policial, igualmente tranquilo.
- Ok, eu vou dá uma olhada na mochila, pra ver se ele tem algum dinheiro ou coisa de valor! Disse o segundo policial.
O primeiro policial estava prestes a plantar a arma na mão de Zeke, quando, de repente, ela se mexe. Fazendo o policial tomar um susto, que quase o faz cair para trás.
E então, o garoto se levanta lentamente, sentindo muita dor nas suas costas. Deveria estar morto agora, mas não estava. Parece que ele era mais resistente do que pensava.
- Ai, ai, ai! - Reclama Zeke de dor.
Os policiais não podiam acreditar em seus olhos. Como aquilo era possível? E então, sem pensar muito, eles apontam suas armas na direção do garoto, se preparando para atirar novamente.
Zeke percebeu isso, e com certeza, não queria ficar ali para levar outros tiros. Então, sem perder tempo, ele rapidamente pega sua mochila, coloca nas costas e corre o mais rápido que pode.
Em contraponto, os polícias tentam acertar tiros no garoto,mas sem sucesso. O mesmo estava muito rápido para ser acertado. E então, o garoto inseto consegue escapar.
- Que porra foi essa?! Como é que aquele pivete levantou depois de levar aqueles tiros? - Perguntou o primeiro policial, espantado.
- E eu vou lá saber?? Que merda! E... e você viu a velocidade? - Disse o segundo policial, igualmente espantado.
- Vi! O que era aquilo??? - Perguntou, o primeiro policial.
- Eu não sei, mas eu vou chamar reforços! - Disse o segundo policial, correndo para a viatura.
O segundo policial o seguiu lentamente, enquanto pensava. Tinha que puxar na memória o máximo de detalhes que pudesse. Qualquer coisa que ajudasse a identificar o suspeito. Até que se lembrou de um detalhe que não o chamou atenção a princípio, mas que agora, fazia toda a diferença.
- Peraí, Silva! - Disse o primeiro policial.
- Que quié, Moura? - Perguntou Silva, nervoso e cara cheia de suor.
- Aquele pivete tinha coisas saindo do capuz! - Disse, Moura.
- É, e daí?? - Perguntou Silva, sem paciência.
- Eu acho que...acho que... Eu acho que eram antenas! - Disse Moura, com uma feição incrédula em seu rosto.
Nem mesmo ele acreditava no que estava dizendo, mas era a verdade. E ele sabia disso.
***
Quinta-feira, 1 de Março, 00:00
Zeke estava exausto. Não só tinha um ferimento no braço, como também tinha levado dois tiros nas costas. E pra completar, estava fugindo desde que escapou daqueles dois policiais. Tinha viaturas por toda a parte, então ele não pôde ir muito longe, no máximo 3 quarteirões. O estavam procurando, cortesia dos "bons" policiais.
Ele se esgeirava por onde podia e sempre que uma viatura passava se escondia atrás de um carro, ou qualquer coisa grande o bastante. Agora, estava escondido atrás de uma caçamba de lixo dentro de um beco, sentado com suas costas encostadas na caçamba.
- Arf, arf! De novo num beco! Isso já tá ficando repetitivo, tá ligado? - Disse Zeke, notando o seu hábito involuntário.
De repente, uma viatura passa e as luzes da sirene passeavam pelo beco. Ao perceber isso, Zeke puxa o capuz de seu moletom para que cobrisse mais seu rosto. Não que isso ajudasse muito, mas fazia ele se sentir mais seguro.
"Por que têm tantas viaturas? Mesmo eles achando que eu roubei um carro, isso já é ridículo! E eles ainda atiraram em mim, tá ligado? Que babacas! E o jeito que eles falavam??? Eles iam mesmo me incriminar, só pra se livrarem! Mano, isso é tão... merda!" - Pensou Zeke, revoltado com toda a situação.
...
- E...eles me viram levantar depois de levar aqueles tiros... e correr numa velocidade absurda! É, Zeke, você acaba de colocar um alvo em você! Eu sabia que isso ia dá merda! - Disse Zeke.
Ele então toca em suas costas, no local dos tiros, onde agora eram buracos em seu moletom e em sua camiseta.
- Ai, ugh!
" Pelo menos, as balas não me perfuraram. Mas ainda dói pra cacete! - Pensou Zeke.
...
Mais carros iam passando, e as luzes dançavam pelo beco.
"Primeiro um corte no braço, e agora, eu levei 2 tiros! Nesse ritmo, eu vou acabar morto antes do sol raiar, tá ligado? Eu tenho que escapar de algum jeito! Mas como? Se pelo menos, alguém me aju..." - Pensou Zeke, até que as falas do assassino foram evocadas em sua mente.
"Tal coisa não existe! Não existem heróis! E ninguém vai querer te ajudar! Ninguém virá te salvar!!!"
...
Zeke abaixa sua cabeça, desanimado, enquanto olha para suas mãos que estavam em seu colo.
- E se ele estiver certo? E se ninguém vim me ajudar? Tipo, as pessoas que deveriam me ajudar, tentaram me matar e depois me trataram como se eu não fosse nada! - Disse Zeke, triste. Sua voz saía como um susurro.
...
- Talvez heróis não existam mesmo! Talvez, ninguém... - Disse Zeke.
...
" Pensando bem, o que mais eu vejo são pessoas sofrendo alguma injustiça, e a maioria das pessoas não fazem nada, além de assistir! Quantas vezes eu já não vi colegas sendo vítimas de "bullying" e ninguém nem se mexia? Não! Nem se quer, se importavam! Preferiam fingir que não era problema delas!" - Pensou Zeke, com olhos começando a marejar.
" E eu não sou diferente! Por minha causa, o Quile... - Pensou Zeke.
...
Mas então, no meio de seus pensamentos, ele começa a se lembrar de outras coisas. Coisas bobas, mas que tinham muito significado para ele, como: sua mãe trabalhando o dia todo para poder dá uma boa vida para eles, seu avô indo comprar remédio para a vizinha que estava doente, sua vó doando roupas velhas, Priscila adotando dois cachorrinhos que estavam na rua, Aquiles consolando um colega que tinha terminado com o namorado, sua vizinha, Dona Sonya,dando um pedaço de bolo para ele quando sua mãe ficava fora. Pequenas atitudes, mas que faziam toda a diferença.
- NÃO! Eu me recuso a acreditar nisso! Não tem só babacas nesse mundo! Alguém vai vir me ajudar! Com certeza vai! Eu só posso tá ficando maluco de ouvir aquele doente! - Disse Zeke, apertando os punhos, determinado.
...
- Só, tomara que não demore muito, tá ligado? - Disse Zeke!
Nesse momento, um casal se aproxima do beco,"trocando uns carinhos", e estavam de frente para Zeke. Mas como estava escuro e eles estavam distraídos, não perceberam sua presença.
"Merda! Eu tenho que sair daqui!" - Pensou Zeke.
Ele se levanta com dificuldade, ainda um pouco dolorido. Ele pensa se deveria tentar escalar a parede e se esconder em cima do prédio, mas com o seu braço machucado, isso seria doloroso e acabaria chamando atenção. Então decidiu se arriscar, andando pela rua.
Por sorte, tinha alguns carros estacionados, então ele poderia se esgueirar por eles e se esconder da polícia.
"Por favor, que não apareçam policiais!" - Pensou Zeke.
Ele continua seguindo a rua até chegar na esquina, onde ficou atrás de um carro. Mas para seu azar, tinha uma viatura estacionada do outro da rua, á sua direita. E não era uma viatura qualquer. Era um carro reforçado para operações especiais. E os policiais estavam equipados com coletes balísticos e escopetas.
- Merda! Eu disse sem polícia! E tinha que ser logo a tropa de elite, tá ligado? - Disse Zeke.
...
- Tá, talvez eu consiga passar sem que eles me vejam! Se eu for rápido eu posso conseguir! Se eu ficar aqui, vão me achar mesmo! - Disse Zeke, sem opções.
Ele então sai de trás do carro e vai na direção contrária à dos policiais. Não corria, mas andava rápido, como medo dos policiais desconfiarem.
- Beleza, ta tudo bem! É só ir na maciota e eles nem vão te notar! - Disse Zeke, tentando se encorajar.
Continuou caminhando, mas na metade do caminho, ele foi impedido por uma voz.
- EI, VOCÊ AÍ!
Era um dos policiais que estavam na viatura.
- Ahhh... e lá vamos nós! - Disse Zeke, já se preparando para o que estava por vir.
Se pensar duas vezes, o garoto corre. Porém, por causa de sua fadiga, não estava tão veloz quanto antes.
- EI, VOLTA AQUI! - Disse um dos policiais, enquanto dirigia atrás do garoto.
Zeke consegue chegar até o final da rua, e em seguida vira a esquina rapidamente. Mas notou que no fim da rua tinha outra viatura rondando.
"Não, não, não, não, não!!! E agora??? - Pensou Zeke.
Estava cercado. A outra viatura iria chegar a qualquer segundo e ele não tinha mais opções. Ele olhava fixadamente para a esquina, aguardando os seus carrascos chegarem.
De repente, um carro chega do nada em alta velocidade e para do lado de Zeke. O garoto estava tão distraído, que tomou um susto.
- ENTRA AQUI RAPIDO! - Grita uma mulher desconhecida, enquanto abre a porta traseira do carro.
Zeke fica estupefato. Por que aquela mulher estava querendo ajudá-lo? A mulher por sua vez olha para a esquina e vê a viatura se aproximando.
- ANDA LOGO! ENTRA! - Grita a mulher, tirando Zeke de seus devaneios.
Sem ter muita escolha, Zeke entra rapidamente no carro e fecha a porta, segundos antes da viatura virar a esquina. Os policiais continuaram o seu caminho, procurando o "suspeito". Sem saber, que na verdade, eles já tinham passado por ele.
Ambos, a mulher e Zeke respiram aliviados. Então, quando já estava tudo mais tranquilo, ela começou a dirigir, se afastando do local. E Zeke olhava pelo vidro,enquanto eles passavam por todas aquelas viaturas.
Os dois não falaram nada por um tempo, até que Zeke quebra o silêncio:
- Valeu! Cê me salvou!
Depois de alguns segundos, a mulher olha de canto de olho, entre seus óculos de armação tradicional, e diz:
- Não foi nada!
Apesar da loucura que tinha sido aquele dia, Zeke, agora, estava feliz. Pois, no fim, alguém veio ajudá-lo. E sua fé nas pessoas não estava errada. Mas mesmo assim, ele se perguntava o porquê daquela mulher querer ajudar ele. Então, ele pergunta:
- Por que você me ajudou? Quem é você?
- Porque te ajudei, ainda não posso explicar! Mas eu posso dizer uma coisa, meu nome é Mônica, e temos muito o que conversar! - Disse Mônica.
Continua...
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