Chapter 11 - Capitulo 10

Passos*Passos*

— Já é noite, velho. Hora de comer. — O guarda falou, batendo impaciente na porta da cela.

Sem resposta, ele franziu o cenho e deu mais algumas batidas, agora com irritação.

— Cadê o prato, velho...? Ei, está me ouvindo? — O guarda insistiu, inclinando-se para espiar pela pequena abertura da porta, onde normalmente colocava a comida.

O que viu o fez recuar por um instante, os olhos arregalados de surpresa.

— Maldição... — sussurrou incrédulo.

Ele se afastou rapidamente, chamando por um dos outros guardas no corredor.

— Ei! Temos um problema! — Sua voz ecoou nas paredes da prisão.

O segundo guarda se aproximou, um tanto desinteressado. — O que foi? Ele está sempre acordado...

— É a primeira vez que ele não diz "obrigado" em... o quê? Trinta anos, talvez mais? — O primeiro guarda respondeu, a incredulidade ainda evidente.

O terceiro guarda, o mais velho, se aproximou, olhando com uma mistura de decepção e indiferença.

— Morto. — Ele constatou, como se o fato fosse uma inevitabilidade já esperada.

— Como? — O segundo guarda perguntou, agora mostrando algum interesse.

— Parece que caiu da cama. — O primeiro guarda respondeu secamente, tentando justificar o óbvio.

— Ele está meio sujo, não acha? — Comentou o segundo guarda, observando o corpo inerte.

— O que você esperava, depois de trinta anos sem um banho? — O guarda mais velho respondeu com um tom quase sarcástico, a rotina de décadas de trabalho na prisão apagando qualquer empatia.

— Vamos, me ajude a colocá-lo no saco. Depois falamos com o carcereiro. — O primeiro guarda ordenou, cansado da cena.

— Um... dois... três! — Com esforço, os guardas levantaram o corpo frágil de Nathaniel e o colocaram no saco de lona.

— Acabou. Vamos logo com isso. — Disse o terceiro guarda, ansioso para terminar o serviço.

O segundo guarda hesitou por um momento ao trancar a cela novamente, apesar de saber que não havia necessidade.

— Huh? Por que está trancando? Acha que ele vai se levantar e fugir? — O segundo guarda perguntou com uma risada amarga.

— Força do hábito, eu acho. — O mais velho respondeu, devolvendo o gesto com um sorriso cansado.

Todos riram brevemente, um riso frio e vazio que ecoou no corredor escuro.

Assim que os guardas se afastaram, a cela caiu no mais profundo silêncio. Foi então que Varian, até então imóvel, finalmente se mexeu. Com cautela, ele abriu o saco onde o velho Nathaniel havia sido colocado.

— Adeus, velho amigo... — murmurou, com a voz carregada de uma tristeza contida. — Você está livre agora… mais livre do que jamais estarei.

Enquanto as palavras deixavam seus lábios, um pensamento surgiu na mente de Varian, algo que ele nunca havia considerado com tanto peso antes. "Livre..."

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— Quem diria... Esse velho finalmente morreu. — Anor murmurou, quase zombeteiro, enquanto olhava para o saco de lona com o suposto corpo de Nathaniel. — Carreguem ele.

— Sim, senhor. — Os guardas responderam de forma mecânica, já acostumados à indiferença de Anor em relação aos prisioneiros.

— Vamos logo "jogar-lo" fora. — Anor continuou, dando de ombros enquanto ajustava seu manto.

— Ele parece mais pesado agora... — um dos guardas comentou, franzindo a testa ao levantar o saco.

— Anda logo com isso, não tenho a noite toda. — Anor apressou-os, e depois riu para si mesmo. — Na verdade... tenho sim. Hehehehe...

Os guardas carregaram o corpo em direção ao penhasco, o local onde Anor costumava descartar os mortos. A escuridão da noite envolvia o cenário, e o som das ondas quebrando nas rochas abaixo ecoava ao longe.

Enquanto isso, de volta à prisão, o guarda responsável por alimentar os prisioneiros se aproximou da cela de Varian, com uma expressão de desdém.

— Vamos logo... Ei! Anda logo! — Ele bateu na porta de metal, esperando alguma resposta. Mas, desta vez, nada. Um silêncio pesado preencheu o corredor.

— ... Mas o que... — O guarda empurrou a pequena abertura por onde passava a comida, espiando para dentro da cela. Seus olhos se arregalaram de incredulidade. — Você só pode estar de brincadeira comigo...

O chão da cela estava despedaçado, revelando um grande buraco, e o corpo de Nathaniel não estava mais lá.

— Hm?... Essa não... — O guarda murmurou, sentindo o desespero subir pela espinha. Ele então gritou: — Senhor Anor!!!

No penhasco, Anor e seus guardas continuavam a carregar o saco onde, supostamente, o corpo de Nathaniel estava.

— Mãe celeste, nos entregamos à sua misericórdia... os restos de seu humilde servo... ou algo assim. — Um dos guardas disse, sem convicção, enquanto lançava um olhar indiferente ao saco. — Não me lembro do resto, mas... bem, não importa. Ele está morto agora.

Anor, por outro lado, parecia imerso em seus próprios pensamentos, refletindo sobre o tesouro que Nathaniel havia prometido, mas que nunca fora encontrado.

— Será que ele realmente sabia onde estava o tesouro? — Anor ponderou em voz alta, casualmente. — Não importa mais. Se ele sabia ou não, a lenda morreu com ele.

De repente, o som de passos apressados ecoou pelo corredor da prisão. O guarda responsável corria desesperadamente em direção ao penhasco.

— Saiam da frente, droga... Senhor Anor!!! — O guarda empurrava os outros soldados, sua voz alta e cheia de urgência.

Perto da beira do penhasco, os dois guardas que seguravam o saco com Varian começaram a discutir.

— Como assim, a gente joga no "três" ou depois do "três"? — Um dos guardas perguntou, confuso.

— Depois do "três"! — O outro respondeu, impaciente.

Anor, de pé ao lado, estava distraído, absorto em seus pensamentos.

— Senhor Anor! — O guarda que corria finalmente gritou, tentando se aproximar.

— Hm? Ouviu isso? — Um dos guardas perguntou, preparando-se para lançar o saco.

— O quê? — Anor franziu o cenho, ainda longe de entender o que estava acontecendo.

— Não importa. Um... — Os guardas começaram a contar.

— Senhor Anor, pare! — O guarda continuou a gritar, agora desesperado.

— Dois... — Os guardas se prepararam para lançar o corpo.

— Não jogue o corpo no penhasco! — O guarda gritou uma última vez, mas era tarde demais.

— Três! — E os guardas lançaram o saco ao abismo.

De repente, algo aconteceu. Uma mão emergiu pelo vão do saco, agarrando as chaves que pendiam da cintura de Anor no exato momento em que Varian foi jogado pelo penhasco.

— Ghaaaaa!!! — Anor gritou, chocado, quando a mão de Varian o puxou de surpresa, desequilibrando-o.

Anor caiu com um grito desesperado, seu corpo despencando até as rochas afiadas abaixo. O impacto foi mortal, e seu corpo ficou inerte sobre as pedras.

Varian, por outro lado, caiu no mar. As águas estavam ferozes, e ele afundou rapidamente, seus pulmões queimando enquanto lutava contra a correnteza. Desesperadamente, ele trabalhou para destravar as algemas que o prendiam a pesos, seus dedos ágeis manipulando as chaves com uma precisão nervosa.

Sentindo o ar se esvair de seus pulmões, Varian finalmente conseguiu se libertar. Com um último esforço, nadou até a superfície, ofegante. As ondas continuavam a arremessar seu corpo para os lados, mas ele conseguiu se manter flutuando.

Olhando para a costa, Varian viu o corpo de Anor estraçalhado nas rochas. O homem que havia causado tanta dor em sua vida agora estava morto. Varian, porém, não sentia a satisfação que esperava. Apenas um vazio o consumia.

Ele então olhou ao redor. Ao longe, uma ilha se erguia sobre o horizonte. Sem pensar duas vezes, ele começou a nadar em sua direção, determinado a deixar tudo para trás.

—Isso não é bom não é ?

Disse um dos guardas.

—Não brinca!.

Respondeu o outro.

"Varian seria o primeiro e o último prisioneiro a escapar daquele lugar sombrio. Embora seu nome permanecesse desconhecido, sua fuga despertaria o interesse das autoridades, especialmente da Inquisição, que o caçaria em segredo. 

Ele se tornaria conhecido apenas como 'O Homem Sem Nome', com descrições vagas e fragmentadas de sua aparência sendo compartilhadas entre os inquisidores. 

Ninguém sabia quem ele realmente era, e menos ainda o que ele planejava fazer a seguir. Varian, agora um fantasma para o mundo, carregava consigo a promessa de um futuro incerto — um mistério que os caçadores temiam descobrir."

ele era um Æthar, uma criatura cuja simples presença trazia consigo mudanças drásticas, sejam elas para o bem ou para o mal. Onde seu povo aparecia, o equilíbrio do mundo era perturbado, gerando temor e desconfiança.

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