Havia sido incumbido de uma missão complexa e desafiadora, que exigia que eu me aventurasse em um posto avançado, situado no distrito Leste, para resgatar algumas fêmeas que estavam sendo forçadas a trabalhar sob condições deploráveis em casas de prazer. Esta tarefa se mostrou mais complicada do que eu havia inicialmente previsto, e encontrar as fêmeas em questão provou ser uma tarefa hercúlea. Devido à dificuldade e à complexidade da missão, não foi possível para mim retornar prontamente para Osíris. Alguns dias depois, logo após retornar de uma missão tão intensa e desgastante, fui forçado a dirigir-me ao centro médico. Durante a missão, uma das fêmeas, aterrorizada, acabou me ferindo com um objeto pontiagudo que ela tinha escondido para se proteger. Embora surpreendente e doloroso, eu não poderia culpá-la por sua reação, pois ela estava apenas tentando se defender de uma situação desconhecida e ameaçadora. Para seu alívio, logo percebeu que não éramos os inimigos e que estávamos ali para ajudá-las. Entretanto, isso resultou em um ferimento substancial e em minha roupa totalmente arruinada devido ao derramamento de sangue.
No centro médico, o ambiente estava impregnado com o cheiro estéril de desinfetante e o som suave dos monitores cardíacos. O doutor Bronson, com seu jaleco branco impecável e um semblante sempre calmo, se aproximou de mim com um uniforme da guarda em mãos.
"Aqui está," ele disse gentilmente, estendendo o uniforme para mim. "Isso deve servir para substituir sua roupa danificada."
Agradeci com um aceno de cabeça e me dirigi a um pequeno vestiário adjacente para me trocar. Enquanto eu lutava para ajustar o cinto do uniforme, pude ouvir uma conversa do outro lado da porta entre o senhor Bronson e um dos guardas.
"Traga a fêmea humana," ordenou o doutor Bronson, sua voz firme e autoritária.
Meus ouvidos se aguçaram. Essa poderia ser a oportunidade perfeita para interagir com ela. Com o coração acelerado, saí do vestiário e me dirigi rapidamente ao senhor, quase tropeçando no processo.
"Doutor Bronson, eu posso ir buscar a fêmea," falei, talvez mais rápido do que pretendia. Ele levantou os olhos de sua prancheta, arqueando uma sobrancelha em surpresa.
"Oh? E por que você gostaria de fazer isso?" perguntou, sua voz carregada de curiosidade. Tentei parecer casual, embora minha mente estivesse a mil por hora.
"Eu... estava indo naquela direção de qualquer maneira," respondi, tentando manter o tom despreocupado. Senhor Bronson me estudou por um momento que pareceu uma eternidade. Finalmente, ele deu um leve aceno de cabeça.
"Muito bem. Vá em frente," disse ele, voltando a se concentrar em sua papelada.
Saí da sala com uma mistura de alívio e ansiedade. Caminhei pelos corredores iluminados, tentando ensaiar o que diria quando a encontrasse. Ao chegar ao local designado, parei por um momento para respirar fundo. Meus pensamentos estavam em turbilhão. Como deveria abordá-la? O que deveria dizer para não parecer um completo tolo? A simples ideia de estar ali, à espera de conversar com ela pela primeira vez, deixava-me inquieto e nervoso. Um sentimento estranho e desconfortável, algo que nunca havia experimentado antes. Uma curiosidade intensa sobre ela me consumia, e quando não a via, sentia como se algo estivesse faltando.
Minha espécie é conhecida como uma das mais temíveis do universo, mas quando estou perto dela, consigo manter minha agressividade sob controle. É como se eu não quisesse que ela visse quem eu realmente sou. Sinto como se me transformasse em uma pessoa completamente diferente quando estou perto dela, e isso me confunde. Lá no fundo, sei que se ela realmente soubesse do que sou capaz, nunca olharia para mim novamente. Cálix, jamais aceitaria uma humana como companheira. Ele certamente preferiria a solidão à ideia de ter alguém como ela ao seu lado. Se ele descobrisse os sentimentos que tenho por ela, provavelmente iria querer deixar Osíris o mais rápido possível. Foi por isso que me mantive afastado dele durante esses dias, fui observando ela durante os dias e meus sentimentos foram ficando cada dia maiores e mais confusos em relação a ela, até cheguei a bloquear nossa conexão para que não percebesse o estranho sentimento que crescia em mim e viesse me questionar sobre isso, foi extremamente difícil e doloroso fazer isso e ver seu olhar carregado de surpresa preocupação pelo que tinha feito me deixou ainda pior, mas apenas me deu mais certeza de que eu tinha que lidar com isso antes que ele retornasse. Ele não me deixaria retornar ao nosso planeta até que tivéssemos uma companheira adequada. Encontro-me em um dilema, pois não sei o que fazer e Cálix logo voltará para Osíris. E terei que ser mais cuidadoso com minhas visitas ao local de alimentação a partir de agora.
Eu estava completamente absorto em meus próprios pensamentos, tão perdido que, de fato, não percebi quando ela silenciosamente deixou o quarto que havíamos designado para ela. Quando finalmente a vejo, sinto como se todos os meus temores tivessem evaporado em um instante. Tudo que consigo fazer é fixar meu olhar na figura dela. Ela está vestindo um vestido azul, um estilo que nunca vi antes, que nunca vi ser usado por nenhuma outra fêmea. Era diferente, único, e acentuava perfeitamente o seu pequeno e delicado corpo. Ela me olha com aqueles olhos castanhos incrivelmente lindos, uma expressão de curiosidade evidente em seu rosto, tentando decifrar o porquê de eu estar ali. Suponho que na mente dela, eu não deveria estar ali, e a possibilidade dessa suposição me deixa um tanto triste. É dolorido pensar que ela não deseja minha presença ao redor dela, especialmente quando ela está em repouso. Será que ela tem medo de mim?
Mas, quando olho mais profundamente em seus olhos, vejo um lampejo de saudade. Descarto rapidamente essa ideia, convencendo-me de que estou errado. Ela não poderia sentir saudades de mim, não da mesma forma que eu sinto saudades dela. Logo, ela começa a se mover e por um breve momento, sinto um pulo de esperança no meu peito ao pensar que ela está vindo em minha direção. No entanto, ela passa direto por mim.
" Oi, Lucy não é? O Sr. Bronson pediu para você ir vê-lo " Eu chamo a atenção dela, explicando o motivo de eu estar ali, parado. Ando em frente, esperando que ela me siga, e ela o faz.
"Sim, isso mesmo. Pode deixar, eu vou agora mesmo até lá." disse ela, baixando o olhar para as próprias mãos.
"Estou indo para lá também" expliquei, enquanto seguimos o caminho à nossa frente.
Eu a conduzo até o centro médico, mesmo sabendo que não havia necessidade de tal acompanhamento. Provavelmente, ela sabe onde o centro médico fica, mas mesmo assim, decidi acompanhá-la. Ela não faz objeções, não insiste que pode ir sozinha e isso, de algum modo, me alivia. O nervosismo que sinto agora é indescritível. É agradável estar ao lado dela, mas ao mesmo tempo, sinto um desconforto. Nunca antes tive dificuldades em começar uma conversa com uma fêmea, mas com ela, é diferente. Nunca sei o que dizer, nunca sei como ela pode reagir. Hoje, no entanto, é minha oportunidade. Somos apenas nós dois aqui, então talvez não seja tão embaraçoso se ela me ignorar. Mas quando paro para falar com ela, percebo que ela não está ao meu lado, mas atrás de mim. E quando paro abruptamente, ela se choca contra mim. Penso que posso tê-la machucado. Ela me encara, mas não diz nada, o que me preocupa ainda mais. Tento falar com ela, mas ela parece distante, como se estivesse revivendo alguma lembrança triste e dolorosa. Faço o possível para não entrar em pânico, culpando-me por ter causado tal desconforto nela.
" Me desculpe, eu me distraí" ela diz, enquanto continuo observando-a. Quando ela percebe que estava falando, ela abaixa os olhos, como se estivesse envergonhada pelo que aconteceu.
"Você não tem que se desculpar! Eu devia ter sido mais cuidadoso ao parar em sua frente" digo, olhando para ela de cima a baixo, preocupado machucado ela de alguma forma. Ela tenta se desculpar, mas a culpa é inteiramente minha por ter parado sem aviso. Ela não diz mais nada, e tento pensar em algo agradável para falar, mas ela parece perdida em seus pensamentos. Não consigo entender o que aconteceu para deixá-la tão perturbada.
Quando saímos juntos, ela parecia bem, mas agora, ela parece tão distante, como se estivesse em outro lugar. E quase consigo sentir a saudade, a tristeza, o arrependimento que ela parece estar sentindo agora. Isso é assustador, porque mal consigo entender o que meu irmão, Cálix, sente. Mas, de alguma forma, sinto que consigo perceber os sentimentos perturbadores que essa fêmea está sentindo agora. Não, isso deve estar errado. Não pode ser. Há muito tempo, ninguém da minha espécie encontrou sua verdadeira companheira. E agora, estou sentindo os sentimentos dela como se fossem meus próprios.
Ela me olha, esperando que continuemos nosso caminho ao centro médico, mas estou paralisado com o que está acontecendo. Não posso acreditar. Isso só pode ser coisa da minha cabeça. Ela não pode ser minha verdadeira companheira. Mas logo percebo que não estou mais sentindo os sentimentos perturbadores que eu estava antes. Agora, não sinto mais nada. Estou confuso, atordoado e incrivelmente curioso sobre o que está acontecendo.
Adotando a melhor postura que consigo no momento, estou empenhado em minimizar o estranhamento que paira no ar, já que a situação atual parece mais confusa do que o usual. Com cuidado, conduzo-a até o centro médico. Durante toda a jornada, ela permanece em silêncio, sem proferir uma única palavra, e eu, por outro lado, também não tento iniciar uma conversação. Apenas seguimos, envoltos em um silêncio que parece preencher o espaço ao nosso redor. Ao nos aproximarmos do destino, decido me despedir e seguir para outra direção. Não consigo perceber nenhuma consternação em seu semblante pela minha decisão de não acompanhá-la até o final. Pelo contrário, ela me presenteia com um sorriso polido, a expressão amigável que frequentemente carrega consigo, antes de seguir em direção ao prédio do centro médico.
Enquanto ela se afasta, noto que ela não olha para mim. No entanto, ao chegar à entrada do centro médico, ela pausa e me dá um último olhar, uma expressão de confusão pintada em seu rosto. Eu me pergunto se ela conseguiu perceber o quanto eu estava perturbado durante nosso trajeto até aqui. Será que ela acredita que eu fiquei irritado com ela em algum ponto do caminho? Seu olhar não dura muito, e logo ela entra no prédio. Quando ela desaparece de vista, tenho que lutar contra o impulso de segui-la, de estar perto dela por mais alguns momentos. Mas como eu justificaria minha presença lá? E como lidaria com a reação do Senhor Bronson? Além disso, ficar aqui parado também não está me ajudando a parecer menos obsessivo. Estou tentado a compartilhar minhas suposições sobre ela com meu irmão, mas já sei que seria inútil. Ele jamais a veria como uma possível companheira. Mesmo que ela se revelasse nossa verdadeira companheira, isso não seria um motivo suficiente para ele querê-la. Sinto-me perdido, sem saber como lidar com a ideia de que ela possa ser a pessoa que acredito que ela seja. Mas mesmo que eu compartilhasse minhas suspeitas, ele não acreditaria. E mesmo se por um milagre ele acreditasse, sei que ele rejeitaria qualquer vínculo com ela.