Com o olhar sério e levemente nervoso ao mesmo tempo, Nikki apenas observava a calma e silenciosa postura pensativa de Tahiko, que riscava o solo da cela com o graveto.
Diante do comportamento supostamente tímido ou precavido do soldado, Tovah entendeu que precisava dar espaço para que a conversa fosse iniciada.
— Ele não vai te escutar se não abrir a boca — disse Tovah numa tentativa de quebrar o gelo, ironicamente com o seu picolé descongelando enquanto lentamente andava para trás.
— Quem é você? — perguntou Tahiko, ainda sentado e somente com o seu olhar direcionado seriamente ao soldado.
— Oh, Tahiko. — disse Nikki desprevenido, mas rapidamente continuou com postura — Meu nome é Nikki Williams. Faço parte das Forças Especiais da Torre e, também, sou filho de um homem que você conheceu.
— Ham?
Tahiko inclinou sua cabeça um pouco para esquerda e levantou sua sobrancelha exageradamente, como de sua característica.
— Eu conheci muitas pessoas — ele certamente não parecia estar tão paciente para uma conversa, e sua expressão indiferente intimidava.
— Ele era conhecido como Capitão Williams. Tenho certeza absoluta que ele esteve com você nas bases militares no sul de Dynami.
— Acha que eu matei ele? — perguntou Tahiko, em tom de ameaça enquanto levantava-se da cama.
— Nada disso. Já fui informado dos relatórios militares pelo departamento de inteligência, vi que você não teve legitimidade alguma com a morte do meu pai. Não sei se tentou protegê-lo ou se nem mesmo isso estava ao seu alcance.
Nikki aproximou-se firmemente e sem medo da cela, enquanto Tahiko não estava longe para o soldado ter tanta confiança repentina assim.
— Eu só quero que me diga quem o matou. Vim até aqui apenas para isso e nada mais — o comportamento de Nikki havia mudado, e sempre mudava quando o nome de seu pai encontrava-se em jogo.
— Eu não sei. O que sei é que ele tem cabelo branco, estava com uma vestimenta preta quando o vi e que faz parte da Fundação.
— Merda! — Nikki xingou e virou-se para a cela.
— Acha mesmo que aqueles malditos passariam alguma coisa para mim? Eles são canalhas, não burros — afirmou Tahiko, andando de volta para sua caminha.
Nikki dava passos para frente e para trás, pois sentia-se confuso e pensou particularmente.
— É… preciso ter informações da Fundação de alguma forma. A ação militar da Torre é muito devagar para mim, não vou conseguir esperar eles.
— Olha… — Tahiko chamou atenção e, instantaneamente, Nikki olhou para ele.
Sentado na cama e segurando o cordão do garotinho Riley. Tahiko disse ao militar ao mesmo tempo que retirava o pingente do cordão.
— Caso decida fazer algo contra os desgraçados da Fundação, quero que salve esse menino. — Tahiko rebolou o pingente que passou entre as grades de Nullite, e finalizou — O nome dele é Riley. Ele perdeu toda família e foi capturado pelo mesmo cara que matou seu pai.
Nikki agachou-se, pegou o pingente e falou para Tahiko.
— Eu vou tentar — guardando o pingente no bolso da calça.
Tahiko apenas gesticulou com a cabeça, voltando sua atenção para o chão da cela. Ele parecia imerso em seus próprios pensamentos, como se o ato de entregar o pingente tivesse sido um pequeno alívio na sua situação atual.
— Espero que isso mude algo lá na frente — pensou ele.
Tovah, que havia observado tudo de uma distância segura, deu um passo à frente, indicando que era a hora de partir.
— Acabou o tempo. Acho que já tem o que precisa por agora — disse Tovah, com a voz mais séria do que o habitual.
Nikki deu um último olhar para Tahiko antes de se virar e seguir Tovah. Eles caminharam em silêncio pelos corredores frios e sombrios da Central de Contenções, cada passo ecoava nas paredes de concreto.
Ao entrarem no elevador, Tovah tirou o picolé da boca e falou.
— Eu não sei o que tá pensando em fazer, mas se é ir atrás da Fundação sozinho e ainda salvar um menino… Recomendo que pense mais. Você é só um humano, eles são portadores. Não é uma decisão tão simples.
— Eu só quero justiça pelo meu pai. Salvar o garoto é parte disso — Nikki estava determinado.
— Só acho que você precisa ter cuidado. A Fundação não é um inimigo fácil.
Quando o elevador chegou ao nível superior, eles saíram e caminharam de volta ao estacionamento. O sol estava começando a se pôr, lançando longas sombras sobre o asfalto.
— O que vai fazer agora? — Tovah perguntou, enquanto abria a porta de seu carro.
— Vou analisar o que tenho de informação até agora, e começar a agir.
Tovah ligou seu carro, e quando estava indo embora, deu um aceno de cabeça e ressaltou.
— Pense bem, Nikki. Para que não se arrependa depois.
— Eu não vou me arrepender, Tovah.
Em uma das várias e grandes salas cheias de pessoas e computadores no departamento de inteligência da Torre, um funcionário qualquer, estava averiguando os últimos relatórios militares recebidos digitalmente dos estados da região Centro-Oeste.
— Essas coisas não param de chegar pra mim — resmungou o rapaz, se esforçando para pegar sua xícara de café e pão para perto.
Ele estava concentrado, apesar da camisa amassada e cansaço visível. Seus olhos percorriam a tela do computador, enquanto mastigava lentamente um pedaço do pão.
Ao deslizar para o próximo relatório, ele notou uma marcação de urgência no canto superior direito.
— Opa… isso aqui nunca é coisa boa.
Ele se aproximou ainda mais da tela, e com a mão direita, ele pegou sua xícara de café e levou-a aos lábios, tomando um gole enquanto começava a ler o relatório.
— "A cidade de Cuiabá encontra-se sob um sistema averso ao governo nacional, instaurado por um grupo de portadores perigosos autodenominados Conclave. A situação na região está se tornando insustentável, com a brigada militar local em seus últimos dias de resistência."
Era o que dizia no resumo de cenário atual escrito no relatório. No entanto, o funcionário, surpreso e cuidadosamente, leu as poucas especificações escritas no documento.
— "Identificação do grupo invasor... Nome: Conclave. Natureza: Grupo de portadores com habilidades sobrenaturais. Objetivos: Dominação territorial e controle absoluto da região Centro-Oeste."
— "A cidade está isolada midiaticamente e logisticamente. O Conclave bloqueou todas as vias de acesso e meios de comunicação. A população enfrenta escassez de recursos e aumento da violência. Temos recursos limitados e praticamente perto de acabar. Nossas tropas estão acabando, perdemos muitos homens e nossa defesa está extremamente comprometida. Podemos ser mortos a qualquer momento."
— "Exigimos o envio das Forças Especiais o mais rápido possível. Venham logo, eles não param de expandir."
Ele respirou fundo, se endireitou na cadeira e pensou.
— A comandante precisa saber disso…