Ava andava apressadamente em direção aos elevadores e, ao alcançar o elevador, foi acompanhada por um executivo da Torre, que seguia com passos rápidos.
— Rod Sugg já está esperando por você na sala presidencial — informou o executivo.
— Ok — respondeu ela, com um aceno rápido de cabeça.
Ela entrou sozinha na sala presidencial, onde encontrou Rod Sugg, o presidente da Torre Brasileira. Ele estava sentado em sua cadeira de couro luxuosa, atrás de uma mesa imponente, com um notebook de luxo à sua frente.
— Sabia disso? — Ava perguntou de forma direta, retirando o relatório militar do bolso e mostrando-o para Rod.
Rod ergueu uma sobrancelha, estranhando a situação. Ele olhou para o papel por alguns segundos antes de responder, com uma expressão levemente confusa.
— O que tem nesse papel?
Com um tom mais intimidador, Ava continuou.
— Este é um relatório militar de uma brigada indefesa e derrotada na cidade de Cuiabá. A brigada está lutando há 10 dias contra um grupo de portadores chamado Conclave. Por que isso não chegou a mim?
Rod permaneceu calado por alguns segundos, analisando a situação.
— Como soube disso?
— Isso pouco interessa. O que eu quero saber é por que não fui informada sobre esse caso.
Rod suspirou, pois sua impaciência estava nítida mesmo por trás de uma face pouco expressiva.
— Ava, você não precisava saber. O caso de Dynami e a Fundação causaram consequências desastrosas. Precisamos manter o foco em uma única ameaça maior, e o Conclave não representa o mesmo nível de perigo.
Ava franziu a testa, claramente contrariada.
— Eu sou a comandante de dezenas de agentes especializados e treinados unicamente para combates com portadores. Sou uma das figuras de maior respeito e influência na Torre Brasileira. Devo saber de tudo que envolva casos práticos, territoriais e de confrontos.
— Não me arrependo de ter nomeado você como comandante geral deste departamento. Mas entenda, Ava, se eu, como seu superior, não te notifiquei desse caso, é porque realmente há um motivo para isso. Por favor, não ultrapasse os limites que estabeleci para saber o motivo. Entendido?
Ava respirou fundo, controlando a irritação. Ela suavizou os ombros e perguntou.
— Então, é assim que vai ser? Sem comunicação direta, sem transparência e sem confiança?
— Entre nós, existe confiança. Quanto às outras questões que citou, usarei delas quando for realmente necessário. Até lá, cuide de Koji e Saik e trate de convencer Tahiko a cooperar conosco. Espero que tenha entendido. Agora, por favor, retire-se.
Koji e Saik, agora banhados e vestidos com roupas casuais, caminharam pelo corredor do ginásio do Centro de Treinamento. Quando se aproximaram dos galões, encontraram dois novatos, como Ava disse, segurando grandes pacotes de gelo.
— Eles são os novatos? — perguntou Saik, levantando uma sobrancelha enquanto olhava para os dois rapazes.
Koji estreitou os olhos, tentando reconhecer alguém.
— Olha, a gente já viu o cara da direita. — Ele apontou discretamente com a cabeça.
— É, reconheci agora — concordou Saik, com um pequeno aceno de cabeça.
Cole Fuller, um jovem de aparência nervosa e um tanto desajeitada, sorriu um pouco forçado ao ver os dois se aproximando. Ao lado dele estava Nicolas, um rapaz de olhar atento e postura mais confiante, que já havia tido uma breve interação com Ava sobre o relatório militar.
— Boa tarde, senhores — cumprimentou Nicolas, tentando parecer profissional, mas com um toque de nervosismo na voz. — Ava pediu para que preparássemos tudo para o castigo.
— Ah, o famigerado castigo — disse Koji, soltando um suspiro exagerado. — Mal posso esperar.
Saik soltou uma risada curta.
— Pois é. Bom, vamos acabar logo com isso, então. — Ele olhou para os galões cheios de gelo com uma expressão de resignação.
Cole e Nicolas começaram a abrir os pacotes de gelo e despejá-los nos galões. O som dos cubos de gelo caindo na água gelada ecoava pelo corredor, intensificando a sensação de frio. Koji cruzou os braços e observou a cena, balançando a cabeça com um sorriso irônico.
— Então, é só entrar e ficar lá por uma hora? — perguntou Koji, tentando confirmar os detalhes enquanto olhava para os novatos.
— Isso mesmo. Temos que garantir que vocês cumpram o tempo inteiro — respondeu Nicolas, ajustando seus óculos com uma expressão séria.
Enquanto se preparavam para entrar nos galões, Cole olhou para eles e perguntou.
— Vocês já fizeram algo assim antes? — claramente tentando quebrar o gelo, de maneira literal e figurativamente.
— Já enfrentamos coisas piores — Koji respondeu, fazendo uma careta ao sentir o frio começar a invadir seus pés descalços.
Os dois se colocaram dentro dos galões, e um calafrio percorreu seus corpos. A água gelada os envolveu, e ambos fizeram caretas de desconforto, tentando se acostumar com a temperatura.
— Essa é uma das piores partes do treinamento, com certeza — murmurou Saik, com os dentes já começando a bater.
— Sim, mas pelo menos é algo que a gente pode sobreviver — respondeu Koji, tentando usar o humor para maquiar o desconforto.
Os novatos, agora mais relaxados, decidiram acompanhar o castigo de longe, dando aos dois agentes algum espaço. Eles se afastaram, deixando Koji e Saik sozinhos para enfrentar o frio intenso.
Koji e Saik, agora mergulhados até os ombros na água gelada, sentiam o corpo tremer incontrolavelmente. Seus dentes batiam, e os braços estavam cruzados apertadamente sobre o peito, tentando conservar o mínimo de calor possível.
Koji olhou para Saik e disse.
— Eu ouvi algo... sobre aquela entrevista particular com a Ava. — Koji falou pausadamente, a tremedeira dificultando a articulação das palavras. — Não quis... falar sobre sua... saúde pra ela, né?
Saik levantou o olhar, encontrando os olhos de Koji. Ele sabia que Koji não estava apenas curioso, mas também preocupado.
— Quando eu era criança... nasci com um tempo limite. — Saik fez uma pausa, sentindo a frieza intensificar-se com cada palavra. — Insuficiência cardíaca... e uma série de mal súbitos incessantes. A medicina não podia me curar. Então... os médicos, desesperados, sugeriram aos meus pais uma opção arriscada. E minha mãe concordou.
— Os médicos, de forma ilegal e desumana... usaram uma escrita para me salvar. Como sacrifício, uma mulher sequestrada foi usada no ritual, mas ela não sobreviveu. Durante a negociação, eu pedi ao ser sombrio da escrita... que tirasse toda a dor dela na sua morte para que morresse sem dor.
Saik fez uma pausa, como se precisasse de força para continuar.
— Mas o demônio fez um contraponto. Para isso eu deveria receber toda a dor e ruína humana que a mulher teve em vida. Como castigo, eu sobrevivi… e renasci como um portador. Mas com um pacto deficiente que não me dá energia externa. E, de sobra, uma doença não humana que acaba gradativamente com meu corpo de dentro para fora... a cada mês que passa.
O silêncio caiu entre eles por um momento, interrompido apenas pelo som do gelo e suas respirações ofegantes.
— Cara... eu não sabia que era tão sério. — Koji disse para Saik, com o olhar levemente preocupado — Sinto muito por ter perguntado.
— Agora tá cê tá devendo a sua história — brincou Saik.
— Tsc. Se é que eu saiba minha própria história...