Ainda era noite quando Ava tomou a decisão de não deixar a sede. Em vez disso, ela resolveu ir ao quarto dos jovens, onde Koji e Saik estavam. Ao se aproximar da porta, hesitou por um momento, sentiu um leve tremor de ansiedade em seu peito.
— Pode entrar! — gritou Koji.
Com a permissão para entrar, ela abriu a porta com cuidado, encontrando Koji e Saik no meio de sua rotina noturna, ambos se preparando para dormir.
— Alguma coisa? — Koji estava sentado na beira de sua cama.
— A jornada de trabalho já acabou — disse Saik, enquanto estava se enrolando na cama.
— Boa noite, meninos.
Ava, ainda hesitante, fechou a porta atrás de si e deu alguns passos para dentro do quarto, mantendo o envelope firmemente em suas mãos.
— Desculpe incomodar vocês a essa hora — falou ela com a voz num tom sério — Mas eu precisava entregar isso a você, Koji.
Ela estendeu o envelope em sua direção, seus dedos tremiam ligeiramente enquanto fazia isso. Koji franziu a testa, intrigado, mas pegou o envelope sem questionar.
O ar tenso que envolvia Ava foi sentido por Koji, que olhou para ela receoso. Cuidadosamente, ele abriu o envelope.
Dentro, havia dois papéis, dobrados de forma meticulosa. Koji abriu o primeiro lentamente, como se temesse o que poderia encontrar. No topo da folha, estava escrito "De Sam para Koji"
— Sam?
A expressão de Koji mudou imediatamente, pois ele não esperava isso.
Sam, o portador que o havia criado e cuidado por cinco anos após a morte de seus pais, era alguém em quem Koji sempre confiara. Sam havia sido uma figura paterna para ele, guiando-o durante sua infância tumultuada, e até recentemente, no caos de Dynami, Sam, junto com S. James, havia liderado a resistência que forçou os portadores da Fundação a saírem da cidade.
Com as mãos um pouco trêmulas, começou a ler o conteúdo da primeira carta.
"Koji, há algo que preciso te contar, algo que guardei por muito tempo. Eu conheci seu pai, Norman Fuller, anos antes de ele... bem, antes de ele tirar a própria vida. Nós nos tornamos muito próximos, a ponto de Norman confiar em mim com um segredo sombrio, um plano que ele havia traçado, um plano suicida. Sei que isso pode ser difícil de entender, mas ele acreditava que isso era necessário, e eu, de alguma forma, compreendi seus motivos. Desde o início, eu sabia que Norman acabaria cumprindo o que prometia, e por isso me preparei para o que viria. Foi essa preparação que me permitiu aparecer tão rapidamente na noite do incidente, para cuidar de você. Eu sabia que, quando aquele momento chegasse, meu dever seria te proteger e te criar, como ele teria querido."
Logo, ele pegou a segunda carta e leu.
"Sei que isso é muito para absorver, mas preciso te pedir algo importante: não nutra raiva ou qualquer sentimento negativo pelo que seu pai fez. Norman tinha seus motivos honrosos. Ele lutava contra ameaças que o atormentavam profundamente, e tudo o que fez foi pensando em você. Antes de partir, ele deixou comigo informações cruciais, coisas que me pediu para guardar e revelar a você apenas agora, mais de uma década após sua morte. Agora que chegou o momento, você tem a chance de seguir o caminho que seu pai estava trilhando antes de morrer. Esse caminho, Koji, vai te levar às respostas que você tanto busca – sobre o pacto que deu errado e a verdade sobre Norman. E esse caminho te leva a um lugar: Aurora. É lá que você vai encontrar a verdade sobre seu pai e a solução para o pacto."
Após terminar de ler, ele sentiu uma onda de emoção atravessar seu corpo. Pela primeira vez, talvez, ele tinha uma pista clara sobre seu passado e o que deveria fazer a seguir. Seu rosto, antes carregado de incertezas, agora se iluminava com uma determinação renovada.
Ele levantou a cabeça, encarando Ava com um brilho nos olhos.
— Eu preciso ir! — exclamou Koji com uma animação discreta, mas muito perceptível.
— Onde fica Aurora? — Ava, no entanto, se colocou à frente dele, impondo ordem.
Saik, que até então permanecia em silêncio, franziu a testa, pensativo.
— Acho que é uma metáfora — ele arriscou, tentando decifrar o significado oculto por trás das palavras de Sam.
Koji balançou a cabeça, um sorriso fraco, mas resoluto, surgindo em seus lábios.
— Aurora é uma metáfora, sim, mas também é uma cidade real — explicou, com sua voz num tom de urgência — Ela fica no pico do Monte da Serra Branca, na região central do estado de Wüst. E eu tenho que ir até lá.
Ava cruzou os braços e olhando fixamente para Koji, tentou encontrar uma maneira de convencê-lo a não partir tão precipitadamente.
— Você não pode simplesmente sair assim, Koji. Você tem um acordo de colaboração com a Torre.
— Essa é a minha chance de descobrir a verdade sobre meu pai e de consertar meu pacto. Eu não posso ignorar isso.
Koji havia levemente se exaltado, seu tom de voz subiu e estava nítido que sua vontade era de sair. Contudo, Ava se manteve calma e pensou.
— Convencê-lo a esperar será quase impossível, mas não posso ignorar o que ele está querendo fazer… Eu preciso mantê-lo aqui para ao menos tê-lo ao nosso favor em algo.
Depois de um momento de silêncio, ela finalmente cedeu.
— Ok, você pode ir. Mas antes, preciso que faça um favor para mim.
— Que favor? — Koji ergueu uma sobrancelha, ele estava um pouco desconfiado.
Ava deu um passo à frente e disse.
— Há um grupo de portadores estrangeiros e criminosos chamado Conclave. Eles estão agindo como terroristas e imperialistas na região centro-oeste do país. Eu preciso da sua ajuda para lidar com eles.
— Hmmm…
O olhar de Koji voltou-se para Saik, que agora estava distraidamente mexendo no controle da televisão do quarto. Apesar da urgência que sentia em partir, ele pensou.
— Eu não posso sair daqui sem fazer algo por eles, acho que é isso que querem de mim.
E respondeu a proposta da Ava.
— Tá bom, eu ajudo.
Ele então olhou novamente para Saik, que parecia mais interessado em encontrar um canal decente na TV do que na conversa.
— Eai? Tá comigo nessa? — perguntou Koji, com um leve sorriso no rosto.
Saik levantou o olhar e, com um sorriso preguiçoso e uma cara de sono, ele respondeu.
— Por que não?