De manhã cedo na Sede da Torre em Brasília.
Ava entrou na sala de reuniões, onde Koji e Saik já estavam esperando. Sua postura era séria e assertiva, transmitindo a importância da conversa que estava por vir. Eles estavam bem vestidos com coletes brancos, calça preta e sapato social, e claro, com seus cabelos penteados.
— Vamos começar com você, Koji — disse Ava, sentando-se à mesa.
Koji se ajeitou na cadeira, cruzando os braços.
— Quero falar sobre sua cooperação com a Torre. Temos um inimigo em comum e isso pode nos beneficiar. Mas primeiro, quero saber sobre seus inimigos pessoais. Alguém específico que possa nos atrapalhar?
Ele pensou por um momento antes de responder.
— Leal. Ele é um portador criminoso, magnata e mandachuva do crime organizado em todo norte e nordeste do país.
— E por que ele te vê como um alvo? — Ava perguntou, inclinando-se para frente.
— Eu estou em dívida com ele. Ele me contratou para cuidar de um desafeto dele, mas devido ao caos em Dynami, não fiz o trabalho. Certeza que ele não deve tá nada feliz com isso.
Ava anotou as informações.
— E qual é o seu objetivo de vida, Koji? A Torre pode te ajudar como gratidão pela sua cooperação.
— Quero saber a verdade por trás do meu pai. E consertar o meu pacto.
— O que te faz querer saber mais sobre seu pai?
— Eu só estou aqui hoje por causa dele, e não sei se é positivo ou negativo. É isso que eu quero saber dele, se as intenções foram realmente boas ou premeditadamente ruins.
Ava anotou tudo e fez um gesto para que Saik se aproximasse, pois era sua vez de responder.
— Saik, agora é a sua vez. O que acha da situação atual entre a Torre e você?
Saik, calmo e despretensioso de certo modo, respondeu.
— Entendo que temos inimigos comuns. Estou ok com isso.
— E sobre inimigos pessoais?
— Não tenho nenhum diretamente
— Então, qual é o seu objetivo de vida?
Saik respirou fundo e disse num tom ainda calmo, mas agora mais sério.
— A grande maioria dos portadores conhecem uma escrita, que é bem famosa até. O pacto dela tem até nome, o Pacto Utópico.
— O que isso significa? — Ava perguntou, curiosa, mantendo sua postura profissional.
E ele explicou.
— O pacto oferecido pelo demônio dessa escrita disponibiliza uma técnica tão perfeita quanto uma utopia. Eu preciso porque o pacto que tenho hoje não me favorece totalmente. Eu tenho energia interna, mas não energia externa, e isso é necessário para todo portador, ainda mais para mim por ser vulnerável devido à minha saúde.
Ava franziu a testa, intrigada.
— O que há com a sua saúde?
— Eu realmente preciso contar? — o desconforto em seu rosto era nítido.
— Não precisa.
Num clima tanto quanto estranho e constrangedor, Ava levantou, sinalizando o fim da conversa.
Enquanto isso…
No estacionamento da sede da Torre, o agente Tovah, responsável pela prisão de Tahiko, estava colocando algumas malas no porta-malas de seu carro. Seu movimento era ágil e eficiente, mas ele foi interrompido por uma presença inesperada. Nikki Williams, o soldado das Forças Especiais da Torre e filho do Capitão Williams, se aproximou com roupas casuais, gesticulando com o braço esquerdo.
— Quem é esse? — pensou Tovah, enquanto tentava guardar a última mala com a mão direita e não derrubar seu picolé de morango.
Tovah não entendeu de imediato a aproximação do rapaz, pois não o conhecia, já que não faziam parte do mesmo setor do departamento.
— Oi, eu sou Nikki Williams — apresentou-se o soldado.
Tovah, com seu picolé habitual na boca, levantou uma sobrancelha e iniciou a conversa.
— Oi, Nikki. É alguma ajuda? O que posso fazer?
— Estou tentando obter informações sobre um dos três jovens portadores que acertaram a cooperação com a Torre — respondeu Nikki, ele estava sério.
Tovah fez uma pausa, retirando o picolé da boca.
— Três portadores? Vai ter que ser mais específico.
— Tahiko — disse ele, sem hesitar.
Tovah soltou uma rápida e descontraída risada, quebrando o gelo. Um pouco de picolé espirrou no braço de Nikki, que deu um leve sorriso, mais forçado do que genuíno.
— Desculpa por isso — disse Tovah, limpando a boca — Mas, por que você quer saber sobre Tahiko? Conhece ele? Até onde sei aquele cara não vai com a cara de ninguém.
— Ele foi supostamente a última pessoa que viu meu pai vivo. Isso pode me ajudar a descobrir quem foi o assassino — explicou Nikki.
— E por que eu deveria confiar em você para levar até ele? — questionou Tovah, com um olhar mais penetrante.
— O motivo de eu ter voado de Dynami até Brasília foi unicamente para descobrir o assassino do meu pai.
— É um bom motivo.
Convencido, Tovah andou e fez um gesto para que Nikki o seguisse. Eles caminharam até a Central de Contenções, uma prisão anti-portadores equipada com Nullite S1 Puro, onde humanos precisavam estar inteiramente equipados com materiais específicos para contrariar os efeitos do Nullite no corpo humano.
A estrutura completa da Central ficava no subterrâneo dentro do vasto território da base da Torre, com inúmeros grandes e largos corredores que levavam a várias salas de interrogatório, isolamento extremo e prisões consideradas as mais seguras do planeta.
No caminho pelo corredor principal da Central até os elevadores, Nikki reiniciou a conversa.
— Quanto de poder e capacidade a Torre e a Alliance ainda não usaram contra os portadores?
Tovah ponderou por um momento, mas respondeu.
— Para mim, é uma aposta. A Torre e a Alliance possuem um orçamento aparentemente infinito a cada escalada nas tensões entre humanos e portadores. Então é tudo uma aposta
sobre o que vai instigar o uso de poder. Acredito que querem ter certeza de quando, como e em quem usar.
Nikki refletiu sobre a resposta, então perguntou.
— O tamanho do poder ainda imensurável dos portadores mais poderosos do mundo não assusta os chefes dos dois departamentos? Porque me parece algo bem distante de nós.
— Com certeza deve assustar — respondeu Tovah, de forma direta — Portadores são ligados diretamente a demônios e isso é assustador. Mas a arte da persuasão bélica não funciona mais; o combate prático diz muito mais do que o combate de persuasão.
Eles chegaram a um dos elevadores, que os levou para o degrau mais baixo da Central, e Tovah explicou.
— Amamos este degrau. Ele foi feito tão baixo porque será, especialmente no futuro, o lugar para os portadores criminosos que integram a Fundação.
O que os olhos de Nikki contemplavam era algo que nunca foi mostrado para ninguém fora da Torre, e isso era um dos privilégios de ser funcionário de algum setor do departamento.
Pouquíssimos metros depois, chegaram à cela de Tahiko. Ele estava no fundo escuro da cela, sentado na cama, concentrado enquanto riscava o chão com um graveto de madeira. Nikki olhou para Tahiko, que ainda não havia percebido sua presença, e sentiu uma mistura de esperança e determinação.
Na sua percepção, ele estava mais próximo de descobrir quem havia matado seu pai.