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Sabe, eu gosto bastante das obras em que o protagonista vai para outro mundo, reencarnação pra ser mais específico, mas depois de um tempo, todas as obras ficaram iguais, 'protagonista morre por um erro de Deus; Deus fica envergonhado por ter errado e matado ele sem querer; Deus manda o protagonista pra outro mundo com poderes completamente desbalanceados.'
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Sei lá, falta alguma coisa.
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Não tô dizendo que precisa ser nada incrivelmente bem elaborado nem nada desse tipo, era só fazer alguma coisa diferente ou inesperada. Pra falar a verdade, eu nem sei porque eu tô divagando tanto... hum... divagando, palavra engraçada. Entretanto, por que entre todas as coisas possíveis, eu estou pensando nisso? A resposta é simples jovem mancebo; eu não quero ficar biruta.
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Monólogos aparte, eu realmente não estou sentindo nada. Não vejo nada, não ouço nada, não sinto nada, se bem que eu já não sentia nenhum tipo de cheiro antes. É como se meus 4 sentidos tivessem sumido e só tivesse sobrado minha consciência, consciência essa que parece sumir aos poucos, sempre que eu paro de pensar... Mas olhando pelo lado bom, pelo menos eu tô vivo, ou quase isso.
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Será que é isso que as pessoas sentem quando se vêem em uma situação de desencarno? Acho que não. As pessoas dizem que se vêem em um 'modo de câmera livre', como olha-se pra si mesmo pela perspectiva dos outros. Ou seria isso síndrome do aprisionamento?
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Que se foda tudo isso, só preciso me importar em sair "daqui".
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Droga... Quanto tempo eu já tô nessa situação? Esse cansaço que só aumenta, me chamando pra dormir, é quase irresistível.
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Será que minha percepção de tempo ficou alterada depois de perder os sentidos? É como se o tempo não passasse nesse lugar.
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Eu sinto como se fosse enlouquecer. Esse vazio crescendo dentro de mim, a sensação de ter um buraco crescente no peito, parece que vai me engolir. Nossa... isso soou incrivelmente emo.
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O que... está... havendo? Meus pensamentos não querem... pensar. Se me perder aqui, não vai restar mais nada, literalmente. Até mesmo os lapsos de consciência estão se tornando menores.
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eu...
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quero...
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viver...
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'Zaap!' O que foi isso? Eu senti, senti algo. Foi... como se um choque tocasse meu dedo por um segundo. Depois de sabe se lá quanto tempo, eu finalmente senti alguma coisa. Porém, isso irá acontecer de novo? E se forem apenas esperanças vazias?
QUE ESSA MERDA VÁ PRO CARALHO.
Não importa quanto tempo não passe, quantas vezes eu tenha que suportar essa vontade de sumir e virar mais nada do que eu já sou agora. Eu vou aguentar essa tortura e sobreviver, nem que eu tenha que tacar fogo na Babilônia.
O destino parece ter ouvido minhas preces, por que, no momento que eu pensei nisso, uma luz absurdamente clara, tomou conta do nada infindável que me abraçava por tanto tempo.
Seu brilho foi tão intenso que minha visão parecia ter retornado. Eu senti como se uma super nova tivesse explodido bem na ponta do meu nariz. Eu fiquei entorpecido por poder sentir qualquer coisa que fosse, mesmo que fosse uma luz dolorosamente brilhante.
Sem pensar duas vezes, cego pela possibilidade de sair desse lugar, ou pela claridade forte, fui em frente, em busca da luz. Como me movi, eu não sei. Eu só queria ir para frente e fui. Mesmo que muitos digam para não seguir a luz no fim do túnel, "essa" luz era minha primeira, única e talvez última esperança de escapar desse túnel atormentante.
A sensação envolvente que me cercava enquanto me aproximava da fonte de toda aquela luz, era calorosa, um tanto nostálgica, mas não me lembro o que causou essa nostalgia.
Pois bem, para todas as vozes da minha cabeça que acompanharam meu breve monólogo esquizofrênico, se eu morrer de verdade, adeus, se eu escapar daqui com vida, eu espero não ter que revê-las ou ouvi-las. Tanto faz. O importante é o que importa e o que importa é que eu vou pra casa.
Sigo sendo puxado para luz, minha consciência gravita intensamente até ela, turvando minha, já esbranquiçada, visão. Minha mente se esvai, mais e mais, enquanto o calor em meu peito aumenta.
Não sei o que vai acontecer, o nervosismo contínuo que sinto diminui conforme essa sonolência reconfortante aumenta, agora posso deixar de lutar contra ela e apenas seguir seu fluxo.
Quanto tempo fazia que eu não sentia essa felicidade genuuí...
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Ah...
Parece que eu consegui escapar da morte, mesmo que por pouco.
Todo meu corpo dói, como se um caminhão tivesse batido em mim, coisa que já aconteceu comigo, só que isso não vem ao caso. Além dessa dor incômoda, eu não consigo mover meu corpo, ele não responde a nenhum dos comandos que eu dou, nem mesmo um dedo se move e minhas vias aéreas doem um pouco sempre que respiro. Tudo isso faz sentido já que uma casa em chamas caiu em cima de mim e eu com certeza sofri queimaduras graves e devo ter respirado muita fumaça preso sob os escombros.
Pelo menos eu tô vivo né? Tô só a capa da gaita, mas tô vivo.
Na tentativa de ver onde estava, provavelmente uma UTI de hospital, junto forças para abrir meu olhos, lenta e vagarosamente, abro os olhos e tenho as retinas bombardeadas por luzes e cores, em sua maioria branco e tons frios. Mesmo que no momento minha visão ainda esteja borrada, pude ter certeza de que estava em um quarto de hospital, suspirei aliviado.
Tentando acostumar meus olhos ao ambiente iluminado, olho em volta, buscando qualquer coisa que pudesse ver com clareza. Apenas movimentar os olhos de um lado para o outro, está consumindo muita força do meu corpo. Talvez eu tenha subestimado os danos que sofri.
Em minha formidável pesquisa pude perceber algumas coisas, primeiro: o quarto em que estou é estranhamente grande para um quarto de hospital, então é provável que eu esteja na ala médica do pronto socorro, o que significa que meu acidente ocorreu a pouco tempo, ou seja, todo o tempo passado naquele espaço preto dos infernos foram poucas horas, no máximo.
Segundo: um pano marrom está enrolando meu corpo, cobrindo minhas ataduras. Talvez seja algum tipo de tratamento novo à queimaduras? Visto que apenas meus olhos e nariz não estão cobertos, grande parte do meu corpo sofreu queimaduras graves, ou seja, eu tô bem passado. E tem essa coisa estranhamente mastigável na minha boca.
Terceiro: aqui tá um frio da miséra. Alguém com certeza exagerou no ar-condicionado. Meu rosto tá congelando e eu não posso me mover para cobrir e impedir esse vento frio de bater no meu rosto.
Aaah... É de lascar. Eu tô aqui, só o carvão e não tem ninguém pra aumentar a temperatura desse quarto frio.
... O-O ...
Peraí... Quarto frio? Peeraí. Enrolado em bandagens sem conseguir me mover, uma coisa tampando minha boca, um quarto branco e muito frio!?
Todas essas peças estavam se encaixando, levando o resultado a um único lugar. Eu não queria pensar nisso mas, é muito provável que esse lugar seja um...
Após a constatação que tive, minha espinha gelou e calafrios percorreram cada centímetro do meu corpo.
AAAAAAAAAH! eu não quero morar no IML! Alguém, me, AJUDAAAAAA!!!!
Após poucos segundos me debatendo, tentando escapar, novamente, da foice da dona morte, minha estamina acaba, me deixando, novamente, nesse estado deplorável em que me encontro.
Graças à, seja lá o que esteja na minha boca, nenhum grito saiu, nem mesmo um barulhinho que fosse.
Talvez eu esteja mastigando uma rolha muito macia?
Ceeerto. Deixa só eu cuspir essa 'coisa' primeiro. "Pft!"
Agora vai. Agora alguém vem me tirar desse frigorífico.
Para ter certeza que seria ouvido, respirei o mais profundamente que consegui, tentando não me concentrar na dor aguda em minhas vias aéreas. Esse grito vai ser o mais estrondoso que já escapou da minha garganta, então seria melhor vocês cobrirem os ouvidos.
Lá vai. 1, 2, 3.
"Uwaaaah!" (Tradução: TEM ALGUÉM AÍ?)
'Uwah?' isso foi parecido com um choro de criança? Não importa o quão louco eu possívelmente esteja, isso já é humilhação. Deixa eu tentar de novo, só pra ter certeza.
"Uwaaah!" (Tradução: testando, testando.)
Incrédulo, me questionando sobre, se o que estava acontecendo ali era real ou uma pegadinha do malandro muito bem elaborada. Particularmente, voto fortemente na segunda opção. Entretanto, eu não poderia estar mais enganado. Enquanto minha visão ficava mais precisa e nítida a cada momento, as extensas cortinas brancas a minha frente, que eu acreditava serem divisórias dos leitos, transformavam-se em grandes árvores cobertas por grossas camadas de neve macia.
Só acredito vendo, pensei.
Eu vendo: Não acredito.
Demorou alguns minutos até meus pensamentos se estabilizarem e a ficha finalmente cair, mas... Mesmo após isso, eu, estranhamente, consegui manter a calma. Como eu vim parar aqui? Essa pergunta até passou pela minha cabeça, só que eu nunca encontraria resposta para isso.
Essa sensação de calmaria na minha cabeça, era tanto reconfortante, já que eu poderia analisar minha situação com calma, mas também, muito inquietante. Que tipo de pessoa nessa situação, que tivesse o mínimo de bom senso, ficaria tão relaxada com tudo isso? Eu com certeza não estaria, mas aqui estou, não é?
Mas olhando pelo lado bom, eu pelo menos tô vivo, até quando eu não sei, já que eu sou um bebê e tals.
"Druuum."
A terra ao meu redor tremeu de leve, balançando as árvores ao meu redor. Não acho que tenha sido um carro, muito menos um terremoto, visto que o tremor parece ter começado perto de mim.
Olhei ao redor, buscando a possível causa disso, dessa vez, consegui mover um pouco o pescoço, aumentando meu curto campo de visão. Com sorte, não encontrei nada além de muitas árvores altas cobertas por neve, com troncos que ultrapassam os 4 metros de altura e muita, muita neve, neve brilhante como cristal, refletindo os raios de sol.
"Druum."
Outro tremor se repetiu, mais perto, logo abaixo de mim. Dessa vez, alguma coisa realmente aconteceu, algo rígido tocou minhas costas, espalhando-se por baixo de mim. A coisa que havia se espalhado pelas minhas costas, agora me segurava, erguendo-me pouco mais de um metro do chão. Eu não posso ver o que é, mas seja o que for, espero que não esteja com fome.
Presumindo pela forma dessa coisa e por como ela se move, é muito possível que ela seja uma espécie de serpente. Não vou mentir, se meu palpite estiver certo, além de surpreso, ficaria muito feliz, já que as serpentes são, de longe, meus animais favoritos.
Os olhos expressivos, a língua bifurcada que funciona como uma antena, os movimentos, muitas vezes inquieto, as presas venenosas, o aperto constritor, o corpo esguio coberto por escamas brilhantes, a... Não é o que vocês estão pensando, sério... Não me entendam mal, sério.
Ao que parece, não fui apenas eu que senti os tremores. A neve acumulada nos galhos secos da árvore que me apoiava, começou a cair derrepente, vindo em minha direção. Preso no corpo de uma criança, não havia nada que eu pudesse fazer para impedir a pilha de neve, mas ao que parece, isso não era problema.
A neve que caía foi rapidamente acertada por um golpe rápido, tão rápido que nem pude ver o que a havia golpeado, antes que parasse a minha frente. Uma raiz. Era isso que estava me segurando, e que acabara de me proteger. Uma grande raiz marrom apenas parou em frente aos meus olhos, como se me encarasse. Seu formato não parecia completamente natural, assemelhava-se mais a um tentáculo sem ventosas.
Eu tinha muitas perguntas sobre aquelas coisas, inclusive sobre esse formato duvidoso que possuíam, mas agora não era hora para isso.
As raízes começaram a se mover, me levando cada vez mais fundo na floresta. Eu estava um tanto nervoso sobre isso, visto que eu não tinha ideia sobre o que uma floresta tão grande abrigava. A velocidade do percurso se manteve constante e sem nenhuma turbulência, as raízes quase pareciam conscientes da fragilidade corporal de um recém nascido.
Enquanto era carregado por aí, pude notar partes da fauna e da flora dessa região. É meio óbvio que eu não tô mais no Brasil, muito menos no nordeste. Isso já era meio óbvio, dada a quantidade de neve aqui. Outra coisa óbvia, é que este não é o planeta Terra. Acho que não preciso explicar o porquê dessa dedução, certo? Algumas das árvores pelas quais passei, eram incrivelmente altas, pareciam chegassem aos 30 ou 40 e poucos metros de altura, talvez mais. Outras eram mais baixas, possuindo troncos retorcidos, serpenteando a si mesmo.
Haviam muitas árvores diferentes, com certeza ficarão melhores e mais fáceis de distinguir quando tiverem folhas.
Os poucos animais que vi, também chmavam atenção a sua própria maneira. Uma pequena raposa branca com 2 pares de olhos no rosto, pássaros de asas azuis, semelhantes ao gaio-azul, a única diferença desses pássaros, para os pássaros que eu conheço, seria o fato deles se tornarem transparentes. De resto, só ouvi pássaros cantando e pequenos roedores saindo de suas tocas.
Após alguns minutos, as raízes finalmente desaceleraram, indicando que já havíamos chegado ao nosso destino final, encerrando o passeio. Não consigo dizer o tempo exato que o percurso levou, mas acredito ter sido em torno de uns 40 minutos.
Mais a frente, por entre as árvores, uma cortina de gotas congeladas em vinhas, formam uma cortina natural, para o que se revelou, uma bela clareira, onde a grama crescia em meio a neve, um aviso prévio do fim do inverno.
As raízes abriram caminho pela persiana translúcida, separando-as como um véu. As gotas congeladas brilharam como cristais e seu som resoava pelo ar, lembrando centenas de pequenos sinos dos ventos.
Essa é a hora da verdade. Minha sorte, aparentemente inexistente, irá decidir se eu vivo ou não.
A sensação que tive ao entrar dentro da clareira foi diferente de tudo que já experienciei em toda minha vida, o ar parecia mais puro, mais leve. Borboletas com asas transparentes voavam por alí, soltando um tipo de pó brilhante que desprendia-se delas, com cada bater de asas. Pelo chão, bolas de pelo rolavam pela grama rasteira, parecem estar se divertindo.
E no meio da pequena clareira, sentada em um tronco de árvore, uma pessoa acariava uma das raposas que vi antes.
Vendo mais de perto, notei que a raposa também possui dois pares de orelhas, duas grandes e duas pequenas, à frente do par maior.
A pessoa à minha frente...