— Que merda é essa? Tente não gamar? Quem raios ele pensa que é pra me fazer de trouxa desse jeito?
Theodore assistia seu melhor amigo andar de um lado para outro resmungando e xingando aos quatro ventos sem parar. Mesmo com um hambúrguer em suas mãos, mordendo grandiosos pedaços, o baixinho não deixava de falar.
— Eu te disse que aquele beijo iria trazer problemas, mas você não me ouviu.
— Joga na cara! Sabe muito bem o motivo de eu ter feito aquilo, e é assim que me agradece.
— Nico, sabemos muito bem que você fez aquilo mais pra irritar Milles do que pra me proteger. Além disso, Gabriel estava lá...
— Gabriel, Gabriel, Gabriel. Toda vez que tu abre a boca é pra falar daquele filho da puta. — Repentinamente Nicolas parara de andar, virando-se furiosamente para o amigo lhe apontando o indicador — Por que caralhos você está com o cheiro dele, hein?
Theodore suspirava baixo mordendo o próprio lanche tentando organizar os seus pensamentos. Não fugiria de seu melhor amigo por muito tempo, Nico era perspicaz quando se tratava de assuntos do seu interesse. O ômega sabia muito bem que nenhum segredo seria perdido no mundo por muito tempo, eles seriam descobertos em algum momento.
Seria melhor que seu amigo soubesse através de si do que de outras pessoas que poderiam distorcer os fatos.
Respirando fundo para tomar coragem, Theodore bebera um gole do guaraná antes de lançar a bomba.
— Eu fiquei com o Gabriel.
Nicolas petrificara no lugar com os olhos esbugalhados. Estaria respirando ainda? Nem saberia dizer se ele estava pálido, já que era costumeiro de seu amigo ser branco como papel.
— C-Como é? Acho que ouvi errado.
— Ouviu certo, eu fiquei com Gabriel.
— Ele te forçou, não é?
— Não Nico..
— Claro que deve ter te forçado. Eu deveria saber que aquele abutre não esqueceria o que o palhaço do Milles disse naquele dia. Argh! Não acredito!
— Nicolas!— Gritara Theodore conseguindo calar o amigo para lhe escutar — Não foi forçado, eu decidi por conta própria.
— Ele sabe que tu gosta dele e deve ter usado isso pra te manipular, tô' sacando qual a dele.
— Se for pensar em como tudo desenrolou, seria lógico dizer que isso aconteceu por culpa sua.
Nicolas arregalou os olhos apontando para si mesmo depois de dar outra mordida no lanche.
— Minha? Que caralhos eu tenho a ver com isso?
— Olha a boca... — Theodore balançava a cabeça — Foi por causa do que fez com Milles naquele dia. Gabriel ficou curioso como seria ficar com outro cara.
Finalmente Nicolas se sentara no gramado, ficando de frente ao seu melhor amigo o encarando com seus olhos cansados e esbugalhados. Percebendo o silêncio do outro, Theodore apenas sinalizava para ele comer enquanto começara a contar o começo do seu sonho que se transformara em realidade.
A história que Gabriel pedira para ler, os bilhetes trocados na sala de aula, o primeiro e o segundo beijo trocado atrás da escola ao final do treino. Até mesmo contara sobre Lilian e seu ardiloso plano para chamar atenção de Gabriel naquele dia. Fora sincero com seu melhor amigo não escondendo nenhum detalhe, sendo escutado silenciosamente.
Como se estivesse assistindo um filme do seu interesse, Nicolas almoçava sem desgrudar as vistas de Theodore. Não ousara lhe interromper, deixando que a sinceridade fosse aparecendo lentamente em sua narrativa.
Theodore se dera conta de que muitas coisas haviam acontecido desde sexta-feira. Quando terminara de falar, percebera que seu amigo já havia terminado de comer se mantendo silencioso. Estaria processando as informações? Ou será que sua cabeça criava mil e uma palavras para criar um belo sermão?
— Já estamos no outono, não é?— Sussurrava o mais baixo, inclinando a cabeça para trás fitando o céu — Já deu de sonhar e é hora de colher o que plantamos... Você se apaixonou por ele, e agora deve estar feliz por terem ficado, não é Theo?
— Seria mentira dizer que não estou feliz. Mas não posso me iludir muito.
Lembrando que Sadie estava dando comida na boca de Gabriel, estando agarrada em seu braço fazia o peito do ômega se apertar. Até Milles parecia contente brincando com sua irmã, criando uma atmosfera feliz entre aqueles três. Pareciam tão unidos, tão felizes...
Erguendo os olhos claros para seu melhor amigo, Theodore tentara imaginar aquela mesma atmosfera entre ele e Nicolas com Gabriel no meio. Franzira o nariz em uma careta do quão estranho era aquela visão.
Seria impossível terem harmonia daquele jeito.
— Não quero ser o estraga prazeres, mas já sendo... O que você acha que acontecerá se aquela garota descobrir isso? — Theodore engolira em seco quando se lembrava do escarcéu que Sadie havia criado no ano anterior quando descobrira sobre ele e Jake.
— Gabriel não tem relação alguma com a família dela, até onde eu sei.
— É pior justamente por ela gostar dele também. Theodore de maneira alguma isso pode chegar aos ouvidos daquela garota mimada.
— Estamos no mesmo barco, já que você beijou o irmão dela.
— Até onde percebi, Milles não é do tipo que se deixa levar pela irmã... Ele mesmo vai fazer minha vida um inferno. Além disso, aquela garota não é besta de querer se meter comigo.
Como poderia esquecer que o seu esquentado amigo era capaz de fazer Sadie Mckenzie tremer os joelhos? Diferente de si que seria um alvo fácil de acertar.
Percebendo que seu amigo levantara para ir até a lixeira jogar a lata de refrigerante fora e então se sentar ao seu lado, Theodore suspirava focando no próprio almoço.
— Quando você ficou com o mala sem alça — Theodore arqueara a sobrancelha pro amigo, prestes a repreender o novo apelido dado à Gabriel, mas Nicolas nem o olhava parecendo perdido nos próprios pensamentos. Até mesmo sua voz estava mais baixo do que de costume. — sentiu alguma coisa diferente de quando ficou com o palerma do Jake?
Para dar uma resposta sincera, Theodore relembrava os momentos que tivera com o primo dos Mckenzie. Um rapaz alto e bonito, que sorria para si genuinamente. Diferente dos irmãos que implicavam consigo por causa do cheiro estranho que sempre lhe cercava, Jake era educado. Sempre o protegendo estando por perto o defendendo.
Jake havia compartilhado seu primeiro beijo e o seu primeiro cio. Fora a primeira vez que alguém tocou seu corpo, tomando um cuidado extremo como se Theodore fosse de vidro. Ainda tinha marcado em sua pele as sensações gostosas que seu primeiro amante havia deixado em si.
Se sentia amado.
Estava feliz por ter Jake em sua vida.
Mas não era a mesma coisa do que quando beijara Gabriel.
— Com Gabriel tudo é intenso. — Respondera por fim, olhando para suas mãos — Quando estou afastado consigo agir naturalmente, mas é só ele aparecer que meu mundo fica bagunçado. Com Jake era o contrário, eu me sentia em paz.
— O que isso significa?
Erguendo os olhos para seu amigo, Theodore notara uma pequena ponta de necessidade em Nicolas, como se estivesse desesperado para alguma explicação mais lógica. Notara que naquele momento, o baixinho não estava interessado em saber o que realmente Theodore tinha para dizer, mas sim para se identificar.
— Você lembra quando minha mãe contou pra gente quando se encontrou com o Pete? Que ela sentiu que ele seria sua alma gêmea?
Nicolas abrira um sorriso nostálgico.
— Você chorou pedindo desculpas por ter nascido de alguém que não era alma gêmea de sua mãe.
Theodore rira da própria inocência. Ora essa, ele ainda era pequenino, não compreenderia os sentimentos dos adultos com tanta facilidade.
Não como agora poderia compreender.
— Mamãe disse que sentiu completa e feliz. Estar com Pete era tudo o que precisava para sorrir, porque sentia ser o certo. — Theodore desviara o olhar envergonhado. — Eu pensei que estava sentindo coisas demais por apenas ter beijado um alfa como Gabriel, mas quando ele me beijou hoje... Foi diferente. Me senti conectado a ele, como se tivesse encontrado o meu lugar nesse mundo.
— E você nunca se sentiu desse jeito antes?
— Não.
— Né, Theo... Você acredita que almas gêmeas existem?
— Acredito, e você?
Observando Nicolas atentamente, a suave brisa balançava os cabelos escuros do capitão mostrando os olhos cansados e os ombros curvados com o peso do mundo. Nicolas baixava os olhos para os próprios pés chutando a terra com a ponta do tênis.
— Sei que existem, mas nunca quis procurar a minha já que não quero passar pelo mesmo que minha mãe. Mas os meus instintos adoram me trair, e eles devem ter buscado a maldita pessoa inconscientemente. O que posso fazer quando o encontrei?
Lentamente o ômega apertava os dedos no banco amadeirado em que estavam sentados. Theodore arregalava os olhos e abria a boca sem proferir palavras. O semblante de seu melhor amigo era dolorida e triste, como jamais vira em toda a sua vida.
Ainda assim ele abria um sorriso. Nicolas ainda sorria para seu melhor amigo.
— Encontrou sua alma gêmea... Não me diga que é...
— Os instintos de alfa já devem estar reagindo da mesma forma que os meus estão desesperados. Logo ele vai descobrir, Theo.
— Mas como? Digo... Como seria ele? E você se cuida melhor do que eu, não tem como ele saber.
— Só me resta saber o que ele vai fazer quando descobrir que eu sou um ômega também.