No domingo de manhã a casa amadeirada estava silenciosa e fresquinha. A mulher que passava o café no coador erguia os olhos castanhos para a janela ao ouvir o som do motor da caminhoneta. O alfa bronzeado descia com sacolas com pães fresquinhos e quentinhos, soltando um bocejo silencioso.
Quando Bill entrara na casa deixando a sacola na mesa da sacada, fora até a cozinha depositar um selar na bochecha da noiva, a fazendo sorrir.
— Por que levantou tão cedo hoje? Poderia ficar mais tempo na cama já que é domingo.
— Tenho que passar na cooperativa pra resolver algumas coisas, mas quero voltar pro almoço.
Abrindo um sorriso brincalhão, Maggie voltava a se concentrar em coar o café na garrafa.
— Agora que se resolveram não quer perder um minuto, não é?
Escondendo a vergonha, Bill pigarreou olhando a vista da janela.
— Theodore não vai levantar tão cedo. Você deu os remédios para dores não?
— Uhum, antes de ir te ver no escritório passei na frente do quarto dele e escutei o pobre garoto gemendo de dor. É bom deixá-lo descansar bastante. Mas e você? Conversou com a mãe dele?
Fazendo uma careta desgostosa, Bill apoiava as mãos na cintura ao ficar de costas para a janela e se encostar na bancada da pia.
— Fui xingado e devo ter ficado surdo do tanto que ela gritou comigo. Parece que na medida em que Aline fica velha, vai se tornando histérica.
— Não fale assim dela, Bill.— Ria Maggie se divertindo com as caras e bocas do noivo. Terminado de coar o café, ela servira um pouco na xícara de porcelana a estendendo ao alfa — E o que deu a conversa?
— No final acabei conversando com Pete, ele vem buscar o garoto de noite depois do jantar. Amanhã ele tem aula.
— Não seria melhor ficar em casa? Se implicam com ele normalmente, imagina se verem Theodore daquele jeito...
Bebendo um gole do café preto, Bill suspirava com o sabor amargo e gostoso.
— Depois converso com o garoto.
O casal aproveitou a manhã silenciosa para tomarem o café da manhã na varanda da casa. A brisa suave, o pasto ao longe, a calmaria que tanto amavam. Mais tarde Bill saíra de casa, deixando Maggie cuidando de Theodore.
Já o ômego loiro dormia feito pedra devido o medicamento para dor, conseguindo acordar somente depois do meio dia. Quando tomara banho fizera careta para o seu reflexo no espelho, por conta dos hematomas que marcavam sua pele pálida.
Após vestir uma bermuda jeans e uma camisa escura, descera para a cozinha onde o almoço já estava sendo posto na mesa da varanda. Sorrindo desconcertado, o rapaz coçara a cabeça quando sua futura madrasta aproximou-se preocupada.
— Oh céus, esse roxo estraga essa carinha bonitinha.
— Tá bem feio, não é?
Maggie fizera uma careta dolorida ao concordar com a cabeça.
— Está sentindo dores ainda?
— Um pouco, mas é suportável. — Theodore passara a olhar em volta da casa, arqueando a sobrancelha — Cadê o meu pai?
— Foi na cooperativa, deve voltar logo.
Baixando os olhos quando se lembrava do que acontecera na noite anterior, Theodore tentava não se lamentar de ter arranjado mais problemas. Apesar que dessa vez nada fora culpa sua, já que em nenhum momento flertara com o peão da família.
Seu pai havia pedido desculpas pela briga que tiveram um ano atrás, no entanto Theodore não havia se desculpado por ter causado problemas no trabalho de seu pai. Precisava saber os detalhes antes de tomar alguma iniciativa, apesar de ter receio de estragar a trégua recém instaurada.
— Ei, não faça essa carinha triste.
Erguendo a cabeça para olhar a ômega, Theodore tentara esboçar um sorriso apesar da leve pontada de dor em sua mandíbula.
— Sabe Maggie, eu fico feliz que você tenha me convidado pra vir aqui. Obrigado.
A moça parecia estupefata com o súbito agradecimento, tendo suas bochechas rosadas no mesmo instante. Rindo, balançara a cabeça dispensando palavras, apenas puxando o garoto para a varanda onde poderiam almoçar.
Quando se serviram, a caminhoneta estacionara na garagem e Bill se juntara aos dois para comerem. Theodore se sentira estranho naquela nova atmosfera, já que agora não evitava seu pai por estarem brigados, mas por não saberem como agir amigavelmente.
Não por muito tempo.
Graças à Maggie, os dois conseguiram ultrapassar a estranheza ao conversarem sobre o casamento. Theodore aproveitara a oportunidade para saber mais sobre como eles haviam começado a namorar, se divertindo em descobrir que Bill era desajeitado e envergonhado. Uma imagem um tanto quanto estranha quando se vê aquele alf alto e forte, que era capaz de intimidar qualquer um só com o olhar.
A conversa ficou tão boa que perdurou até a tarde. Depois de ajudar a lavar a louça, Theodore voltara para o quarto fazer o dever de casa e a arrumar suas coisas para voltar para sua casa à noite. Já havia sido avisado pelo pai que Pete viria buscá-lo, e questionado se queria ir para a escola.
Mesmo que quisesse ficar em casa até os hematomas desaparecerem, Theodore se lembrou que era a primeira semana de provas. Não teria como escapar.
Além disso, estava ansioso para receber o bom dia de uma certa pessoa. Não apenas queria ver Gabriel, mas questionava-se como seria a sua reação se o visse naquele estado. Seu lado dramático era curioso demais para saber cada reação do garoto pelo qual estava se apaixonando.
Após o jantar o carro de Pete chegara na frente da casa amadeirada. Theodore fora com Maggie até o quarto pegar suas bolsas enquanto os dois homens conversavam na porta de entrada.
O homem ruivo encarara o bronzeado, cruzando os braços ao se encostar no carro. Eram completamente opostos um do outro, já que Pete tinha uma aura tranquila e calma. Geralmente os dois somente se encontravam quando Theodore visitava a casa de Bill, mas depois da briga uma estranheza instaurara entre os dois homens.
Estranheza essa que foi resolvida na ligação da noite passada. Bill fizera questão de esclarecer com sua ex-esposa e Pete que havia conversado com o ômega. Baixar as muralhas do orgulho era complicado de se fazer, entretanto ficava nítido o quão sincero eram suas palavras.
— Como estão as coisas por aqui?
Bill balançara a cabeça, deixando as mãos no bolso do jeans surrado.
— Sobrevivendo a cada dia.
— Resolveu as coisas no trabalho?
O homem negou com a cabeça com pesar. Uma coisa seria responder por ter ameaçado alguém com uma arma, e outra seria ter de lidar com as mentiras que seu antigo peão ousara contar para se fazer de vítima.
— Por Theodore ainda ser de menor, terei de lidar com a situação.
— Aline e eu podemos te ajudar nisso. Você disse que ficou de olho em Theodore o tempo todo na festa, então é prova ocular de que foi o outro quem tentou abusar do garoto.
— Mesmo que eu diga ter vigiando o garoto durante a festa, vão dizer que estou o protegendo por ser meu filho.
— É o que se espera dos pais. — Pete apoiara a mão no ombro de Bill dirigindo o seu carismático sorriso — Já que é para o bem do menino, iremos te ajudar no que puder.
A conversa fora encerrada quando Maggie surgira carregando uma mochila. Pete foi ajudá-la tratando de abrir o porta malas para carregar o carro. No instante em que erguera a cabeça e vira Theodore com o rosto todo machucado, o ruivo engolira em seco.
— Meu Deus.
Abrindo um sorriso envergonhado, Theodore acenava para o padrasto.
— Eu sei, to horrível.
— Ainda bem que vim te buscar de noite, se não Lisa iria chorar de novo. Vamos então?
Theodore concordara a cabeça, virando-se para ir até Maggie e lhe abraçar em despedida. Ela tivera todo o cuidado ao apertá-lo e acariciar suas costas para não machucá-lo, e ao olhá-lo não deixara de sorrir com aqueles olhos brilhantes de alegria.
— Adorei ter te conhecido, Theodore. Obrigada por ter aceitado meu convite egoísta.
— Digo o mesmo. Tirando a noite, até que foi divertido passar o final de semana aqui.
— Ah, antes que eu me esqueça — Maggie pegara um pequeno envelope lacrado do bolso o entregando à Theodore — Estaremos te esperando.
Olhando o envelope em suas mãos, o loiro arqueara a sobrancelha para o nome dos noivos escrito no convite de casamento. Surpreso Theodore encara a madrasta, que lhe dera uma piscadela. Haviam conversado sobre o casamento mais cedo, mas não se atentara sobre a data. Na verdade, o loiro nem se lembrara de perguntar para Maggie.
De toda forma, não esperava ganhar um convite tão prontamente. Tudo bem que ele seria convidado uma vez que era o filho do noivo, só que não tivera muito tempo para se acostumar com a ideia de que seu pai iria casar novamente.
Parece que o próprio Theodore também precisaria de tempo para se acostumar com coisas novas.
— Nos vemos em breve, tudo bem?
— Certo!
Maggie dera um passo ao lado dando espaço para que Theodore se aproximasse de Bill. Pai e filho pareciam envergonhados na frente um do outro, sem coragem de se olharem nos olhos e dizerem palavras amáveis. Ainda assim o loiro sorria timidamente encostando a testa no ombro do pai, tendo a grandiosa mão de Bill afagando-lhe os cabelos.
Ainda que houvessem dois pares de olhos bisbilhotando a cena comovente, Bill deixara o orgulho de lado ao abraçar seu filho apertado e depositar um breve selar no topo de sua cabeça.
— Se cuide garoto.
Theodore assentira ao se afastar, aproximando do carro para entrar no passageiro. Antes de se sentar no banco, o loiro olhara para o pai e para a madrasta dando um último aceno de despedida.
Quando o carro prateado chegara na cidade noturna, Pete relaxara os ombros olhando de canto para o enteado.
— Que bom que tudo terminou bem, não é?
Theodore que encarava a paisagem pela janela apenas alargava o sorriso e assentia silenciosamente. Diferente de antes onde não fazia a menor ideia do motivo de sua vinda, e achava que terminaria ainda mais ressentido com o pai, o seu retorno era coberto de alívio.
Baixando os olhos claros para o envelope em mãos, tornara a abri-lo ao ver a data do casamento religioso. Dentro do convite havia um pequeno pedaço de papel com a letra de seu pai, em um pedido simples e significativo. Provavelmente teria de ser arrastado por sua mãe para encontrar um terno, já que Bill pedira que ambos usassem a mesma cor de terno para destacar o parentesco deles.