Deitado no banco de trás, Theodore cobria os olhos com o antebraço engolindo a angústia e a vontade de chorar. Não se permitiria mostrar-se vulnerável bem debaixo do nariz de seu pai.
Não quando tinha medo do que poderia vir depois.
O caminho fora silencioso e apressado, tendo Maggie liberado os próprios feromônios para acalmar os dois homens. Depois que a caminhoneta fora estacionada na garagem da casa amadeirada, Maggie apressou-se em sair do carro para ajudar o loiro a descer.
— Consegue se mexer? Está machucado em algum outro lugar?
— Eu consigo andar, obrigado.
Theodore conseguira sair da caminhoneta com dificuldades, suas costas doíam assim como sua face. Ainda assim seguira para dentro da casa como se aguentasse a dor do mundo. Sem dizer uma única palavra para os adultos ele seguira até seu quarto.
Ainda parados na porta assistindo o adolescente se trancar no quarto, o casal suspirava e fechava a porta.
— Não imaginava que fosse acontecer isso, Bill. Eu sinto muito, eu só queria...
— Não posso controlar a língua dos outros, quando nem consigo controlar a minha.
Maggie olhara chorosa para o noivo, recebendo o seu abraço apertado e confortável. Queria chorar e pedir desculpas ao garoto Theodore também, já que fora ela quem o convidara para a festa com a intenção de passar mais tempo com ele. Tudo o que ansiava era conhecê-lo melhor.
Mas os planos pareciam ter ido por água a baixo.
Respirando fundo e enxugando as lágrimas, a moça dera um sorriso trêmulo para o noivo.
— Deveria ir falar com ele.
Desviando o olhar para o andar de cima, Bill fizera uma careta.
— Sou a última pessoa que o garoto deseja ver agora.
— Se não for agora, isso aumentará o problema. Ele vai voltar pra casa e a mãe dele irá pensar que foi você quem fez isso de novo ao menino.
— É só contar o que aconteceu, não preciso ir até ele.
— Bill, você passou um ano inteiro ouvindo as pessoas falarem coisas maldosas sobre o seu filho. Carregou a culpa por bater nele, e ainda viu que as pessoas podem ser piores que imaginava.
— Sei o que eu fiz, não precisa me lembrar.
— Preciso te lembrar de que o garoto naquele quarto é o seu filho. — Maggie segurou o rosto do noivo, sem desviar os olhos dos dele. — Você não foi o único a ouvir esse tipo de coisas, ele também passou por isso.
Meio reticente, Bill desviou os olhos por um momento e relaxara os ombros antes de tornar a sustentar o olhar da noiva.
— O que ele comentou com você?
— Parece que esse tipo de coisa acontece na escola também.
Bill respirara fundo e olhara para cima como se pedisse ajuda de algum santo para lhe dar forças.
— Ainda acho que é melhor você ir. Ele parece ter gostado de você.
Sorrindo levemente, Maggie se afastou do noivo indo até à estante de madeira escura onde guardava uma pequena caixa de primeiros socorros. Voltando para perto do noivo, lhe estendera a caixinha com o seus olhos brilhantes.
— Ele é seu único filho. Vá.
Segurando a caixinha oferecida, Bill tornara a encarar as portas dos quartos superiores. Engolindo em seco ele respirou fundo e subira degrau por degrau indo até a segunda porta do corredor onde dera batidas leves antes de girar a maçaneta.
Abrindo uma fresta da porta, espiara o suficiente para encontrar o filho sentado na beira da cama segurando pedaços de papel higiênico para limpar o sangue da boca. Theodore erguera a cabeça para ver quem entrava no quarto, se surpreendendo com a figura paterna segurando o kit velho.
— Posso?
Theodore assentira com a cabeça, baixando os olhos para o papel amassado em suas mãos. Bill fechara a porta e se sentara ao lado do filho deixando o kit sobre seu colo. Por um instante nenhum dos dois ousara dizer algo, mas o alfa respirara fundo pigarreando para quebrar o silêncio.
— Como você está?
O loiro mantinha a cabeça baixa e balançava a cabeça.
— Vou sobreviver.
— Certo.
Theodore olhara de canto para o pai, percebendo a arma presa no cinto das calças.
— Não sabia que andava armado.
— Aprendi com o seu avô — Bill abrira a caixinha tentando se desfazer da sua vergonha — Na minha época se alguém ousasse invadir nossas casas a gente podia meter uma bala na cabeça.
— E se tivesse mesmo acertado?
Bill arrancara um pedaço de algodão e o molhara no soro fisiológico.
— Seria preso, não estamos mais na minha época.
O pai segurou o queixo do filho com uma delicadeza estranha. Seus dedos eram rígidos mesmo que tomasse todo o cuidado para não ferir ainda mais Theodore. Deslizando o algodão sobre os lábios do garoto, dava-se conta do quão ferido seu rosto estava.
— Sua mãe vai me matar quando ver tua cara.
— Eu explico pra ela o que aconteceu.
— Deixa isso. Vou ligar mais tarde — Bill resmungava concentrado em sua pequena tarefa. — Tenho que assumir minhas presepadas.
— Por quê?
Bill encarara os olhos de Theodore, parecendo ver sua ex esposa jovem na sua frente. Ainda se assombrava com a semelhança que o garoto tinha com a mãe, o que era um tanto quanto invejável.
Pegando outro pedaço de algodão e o molhando para continuar com a limpeza das feridas, Bill tornara a pigarrear antes de sussurrar.
— Porque eu sou seu pai.
— Foi o meu pai que fez algo parecido antes.
Bill congelara a mão a deixando cair em seu colo.
— Isso mesmo, fui eu quem lhe deu uma surra por descobrir que meu filho não era homem.
— Eu sou um homem, apesar de ainda ser novo, mas sou homem. — As pérolas azuladas lacrimejavam quando as palavras saíam de seu peito para ganharem liberdade. — Ou vai me dizer que isso me torna menos homem? Que sou um pervertido que irá seduzir qualquer outro homem por puro prazer? Não acha que fui eu quem começou tudo isso? Que eu seduzi o seu peão pra fazer isso comigo, porque eu gosto?
Bill engolira em seco em ver Theodore irritado. Certamente não por ter medo dele, mas por finalmente perceber que aquele já não era a criança que costumava correr entre a plantação e se divertir escalando árvores. O tempo fizera questão de lhe mostrar que algo mudou em sua vida, mas um pai nunca está preparado para aceitar que um filho crescera.
Porque é solitário.
— Eu sei que você não fez nada com Beto. Mas isso não significa que seja fácil aceitar que você seja desse jeito.
— Que jeito? Diga! — Pedia Theodore cerrando os punhos sobre os joelhos. Da mesma maneira que evitara abrir a boca para ser beijado, o loiro não permitira que as lágrimas caíssem em seu rosto. — Não é desse jeito. Eu sou seu filho, sou um homem ômega e sou gay.
Respirando fundo, Bill deixou sua mão sobre o punho fechado de Theodore.
— Tem razão. Você é meu filho, já que está sendo teimoso feito uma mula igual ao seu velho pai. Acha mesmo que naquela noite eu não tenha me arrependido? Que pai iria preferir esbofetear o próprio filho sem sentir remorso?
Theodore engolira suas lagrimas e desviara o olhar para o chão, sem coragem alguma de sustentar os olhos melancólicos de Bill.
— Escute Theodore, não vou te dizer que o que fiz foi certo. Só Deus sabe o quanto me arrependi de ter chegado aquele nível. Mas também não me peça pra aceitar tudo tão depressa, porque eu não consigo te acompanhar mais. Eu preciso de um tempo pra me acostumar.
— Eu só peço o mínimo de respeito. Se preferir que eu nunca mais venha aqui, tudo bem. É melhor que receber uma surra toda vez em que pisar nessas terras.
Bill então pegara uma pomada do kit de socorros e abrira a mesma pegando uma pequena quantidade em seu indicador. Novamente segurou o queixo do seu filho o fazendo lhe olhar, e então espalhava a pomada branca sobre os hematomas.
— Não quero que fique longe, Theodore. Ver você crescendo longe de mim já é castigo suficiente pra esse velho homem. Mas não chega a doer mais do que a dor que senti nessa noite.
Encolhendo os ombros com a ardência que sentia nas feridas, Theodore comprimia os lábios tentando não fazer careta. Não quando percebia que seu pai estava sendo sincero pela primeira vez desde que brigaram.
Era uma rara oportunidade que não poderia perder.
— Que dor? — Ousara questionar.
— De vê-lo sendo machucado por outra pessoa. — Afastando a mão do rosto do filho, Bill baixava a cabeça enquanto arrumava o kit em seu colo — Maggie me contou que a escola tem sido difícil pra você.
Prendendo a respiração pelo assunto sendo trazido à tona, Theodore balançava a cabeça engolindo em seco.
— As pessoas apenas me evitam, nada de mais.
— Vou saber mais quando conversar com sua mãe. De qualquer forma, apenas quero pedir seu perdão pelo que fiz.
Encarando o seu pai com surpresa, Theodore sentia os olhos queimarem mais uma vez naquela conversa. Bill o olhava com serenidade e paciência, mesmo que sua presença continuasse intimidadora. Nada que não esperasse de seu pai, que parecera sempre um homem grande e forte.
Era a primeira vez que ele pedia desculpas por algo.
Umedecendo os lábios, Theodore concordara com a cabeça várias vezes antes de baixar a cabeça escondendo as lágrimas que escorriam de seus olhos. Bill suspirou e abraçara a cabeça do loiro, o fazendo encostar em seu peitoral.
Observando da pequena fresta que abrira, Maggie olhava para o teto contendo a emoção. Infelizmente não poderia enxugar as próprias lágrimas, já que segurava uma bandeja de leite quente e biscoitos de chocolate.