Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (3 de março, 2025 D.C.)
— Prontinho! — diz Esther colocando a planta sobre a cama.
— Então, por onde começamos?
Depois que visitamos o quarto infantil, nós voltamos ao quarto dela e estamos planejando nosso próximo passo.
— Primeiramente, pega alguma coisa pra gente comer ali naquele frigobar do cantinho.
— Vai você! Eu não sou sua empregada.
— Para de graça e pega logo, Bruna! Eu estou tentando pensar em um plano aqui.
Caminho até o frigobar e, ao abri-lo, vejo vários pacotes de biscoito e suco de goiaba em caixinha.
— Aqui, Esther.
— Uau! Suco de goiaba! Isso deve ser muito gostoso!
Nós duas colocamos o canudo e começamos a beber. Porém, o terrível gosto de goiaba me faz cuspir todo o suco.
— Eca! Que merda! É com isso que goiaba se parece!?
— Não acredito! — Ela diz gargalhando e quase se engasga com o suco. — Isso significa que você não gosta de goiaba, Bruna!
— Acho que deve ter passado do prazo de validade...
— Bem, o meu tá com um gosto muito bom. — Esther fala enquanto continua bebendo.
— Me deixa provar, então!
— Ui! Tem certeza disso, mocinha? Não acha que é cedo demais para um beijo indireto?
— Você é ridícula.
— Ai! Palavras machucam, sabia?
Em seguida, evitando o suco de goiaba, como todos os biscoitos do pacote que peguei.
— Certo, acho que pensei em um plano! — ela grita.
— Finalmente...
— O primeiro lugar que vamos dominar será a biblioteca da mansão.
— Por favor, não me diga que você está fazendo isso só para ler mangá mais uma vez.
— Na verdade, não! A biblioteca é um dos maiores cômodos e ocupa dois andares. Lá certamente é o local mais estratégico para aqueles soldados.
— Interessante. Mas, isso não faz dela um local mais difícil de invadir?
— É muito simples, Bruna. Todas as informações que precisamos estão nessa planta.
— Fala logo, então.
— Todo o nosso plano vai ser baseado em bombas de fumaça. Acho que vamos precisar de umas cinco, por aí. Você vai posicionar elas nos dutos de ventilação, o que vai facilitar a propagação pelo cômodo. Enquanto isso, eu vou entrar metendo bala nos malucos, já que sou a única armada.
— Ah, claro! O seu plano é ótimo Esther! Ele só tem um defeito: nós não temos bombas de fumaça! Você tá achando que somos o quê? Agentes do governo?
— Tenha um pouco de criatividade, gatinha. É óbvio que nós vamos fabricar nossas próprias bombas!
— Hã?
— Vamos precisar de cinco rolos de papel higiênico, fita adesiva, nitrato de potássio, açúcar, alguns pavios para acender e um isqueiro também.
— Nitrato de Potássio? É sério isso?
— Relaxa, eu sei o que fazer.
— Acho mais fácil matarmos um soldado qualquer e pegarmos uma arma pra mim também.
— Calma, Bruna. Não vai ser tão difícil assim... Nós temos até a madrugada para resolver isso.
— Por que até a madrugada?
— Bem, esse é o horário em que vamos atacar. Os portões se fecharam, ou seja, não entraram soldados novos na mansão. Eles com certeza vão estar mais cansados nesse horário.
— Ok, me fala onde você pretende arrumar essas coisas, então.
— O nitrato de potássio é muito utilizado em fertilizantes. Com certeza tem alguns pacotes em alguma despensa próxima ao jardim.
— E quem vai pra lá?
— Eu já vou ficar com a parte mais difícil do plano, então deixo essa com você. — diz Esther me entregando sua pistola. — Esse é meu voto de confiança a você, Bruna.
— Não tem medo que eu te mate?
— Você não vai fazer isso. Bastaram apenas algumas horas para eu conseguir entender o tipo de pessoa que você é.
— Você não sabe nada sobre mim.
— Então, me prove. — Ela diz olhando-me com determinação. — Faça essas onze balas valerem a pena.
— Obrigada, mas eu recuso. Não preciso da sua arma para pegar apenas alguns fertilizantes.
— Foi o que eu pensei... Vai querer ao menos o mapa?
— Vou.
Começo a retirar-me do quarto. Porém, antes de sair, uma dúvida surge em minha mente.
— Uma pergunta, Esther. Onde você aprendeu essas coisas?
— Que coisas?
— Como atirar, fabricar bombas de fumaça, essas coisas. Uma pessoa da realeza normalmente não tem esse tipo de conhecimento.
— Por que isso tão de repente?
— Não acha que eu tenho direito a algumas perguntas também?
— É, realmente.
— Então?
— Bem, eu não faço ideia. É como se eu já tivesse acordado com esses conhecimentos.
— Pelo visto nossas situações são um pouco parecidas... — dizendo isso, eu saio.
Dessa maneira, observo a planta da mansão e percebo que a maneira mais segura de chegar à despensa é por meio da tubulação. Então, me esgueiro dificultosamente entre os dutos, enquanto posso ouvir alguns soldados conversando coisas casuais do lado de fora. Chegando lá, começo a pegar alguns sacos de fertilizante e equipamentos de proteção como máscaras, óculos e outros, retornando calmamente ao quarto de Esther no fim. Porém, não consigo vê-la.
— Esther? Cadê você, Esther!?
— Tô aqui na cozinha, sua boba! — Ela grita ao longe
Logo após seguir o som de sua voz, chego na cozinha e me deparo com uma zona.
— Foi você quem fez isso?
— Ah, relaxa! Ninguém vai usar essa cozinha depois de mim. Pode ter certeza! — Esther reponde como se a bagunça não importasse.
— Você é mesmo uma selvagem...
— Bem, já tá quase tudo pronto! Me passa o nitrato de potássio.
— Toma aí, peguei vários sacos para não ter problema. Mas, e agora?
— Bem, agora eu vou colocar o nitrato e o açúcar em uma frigideira. Aí é só deixar os dois aquecendo por um tempo.
— E o que eu faço?
— Você vai cobrir com fita adesiva a ponta desses rolos de papel higiênico enquanto isso.
— Certo.
— Também vou adicionar um pouco de bicarbonato de sódio na mistura. Desse jeito a bomba vai durar mais.
Então, cubro com fita adesiva a ponta de cada um dos rolos de papel higiênico e, esperamos a mistura aquecer por cerca de quinze minutos. Passado esse tempo, Esther corre para despejá-la nos tubos antes que endureça.
— Ufa... Acho que deu certo. — diz Esther aliviada enquanto insere os pavios nos rolos.
— Só esperar a mistura esfriar, não é?
— Sim! Agora é hora de voltar pro quarto!
Após separarmos os itens em sacolas, retornamos silenciosamente pelos corredores. Porém, repentinamente, Esther me questiona em voz baixa:
— Tá sentindo isso?
— Isso o quê?
— Acho que estamos sendo observadas...
— Para com isso, Esther!
— É sério, Bruna!
— Não é sério não! Isso é coisa da sua cabeça!
— Eu...
— Você o quê?
— Acho que você tem razão...
Depois de alguns minutos, chegamos ao quarto e ela coloca novamente a mesa de cabeceira em frente à porta.
— Desculpa por aquilo de antes, Bruna. Acabei deixando um clima estranho no ar.
— Não importa, vamos só focar na missão.
— O que pretende fazer até anoitecer?
— Tem algum espelho no banheiro?
— Tem sim.
— Certo, então vou dar uma olhada.
Na sequência, caminho até o banheiro e o meu rosto no espelho deixa-me encantada, ao mesmo tempo em que me instiga a entender o passado que se esconde por trás dele. Apesar de ser gratificante poder enxergá-lo com nitidez pela primeira vez desde que acordei, a sensação de não reconhecer a mim mesma causa um certo frio na barriga. Desta forma, a visão daquela mulher morena e de longos cabelos prateados faz-me encarar o reflexo por alguns minutos...
— Ei, Bruna. Não deixa esse negócio te abalar poxa... — Esther fala abrindo a porta do banheiro.
— Eu não estou abalada.
— É difícil pra mim também, sabia? Me sinto da mesma maneira que você. Esqueceu que eu também não tenho minhas memórias?
— Eu já disse que estou bem!
No momento em que saio do banheiro, olho para meu bracelete.
Nome: Não consta nos registros
Idade: Estimativa de 19 anos
Tipo Sanguíneo: AB+
Frequência Cardíaca: 71bpm
Quociente de Laplace: Menor que 1%
Data e Hora: 02:37 PM, 03/03/2025
— Você é sempre tão fechada, poxa! — Ela reclama.
— O que vai fazer agora?
— Olha, eu estou com um baita sono, então vou aproveitar essas horas que temos para tirar uma soneca.
— Sério que você vai dormir por tanto tempo?
— Pode crer que eu vou! Dormir é a melhor coisa que tem! — Ela grita enquanto se joga na cama.
— Pelo visto, só me resta ficar de guarda então...
Ao sentar no chão, me esforço ao máximo para vigiar a porta pelo tempo necessário. Porém, o cansaço desse dia estressante faz minhas pálpebras pesarem cada vez mais, até que chega o momento em que adormeço completamente.
...
...
...
De repente, um toque em meu pulso me faz abrir os olhos.
— Acordou?
— O que você pensa que está fazendo, Esther?
— Por que não me mostra o conteúdo desse seu bracelete?
— Sem chance.
— Ah, para de graça, me deixa ver isso logo! — ela exclama enquanto puxa o meu braço com força.
— Eu já disse que não!
Apesar de minha resistência, Esther não parece disposta a desistir. Então, ela puxa meu braço com ainda mais força.
— Uau, você tem só dezenove anos, que novinha!
— Para!
— Hmm... Quociente de Laplace? O que é isso?
— Já chega!
Irritada, puxo o braço de volta com toda a minha força! Porém, Esther aparentemente não estava esperando isso e tem todo o seu corpo puxado com facilidade, caindo em cima de mim.
— Hummmmmm — ela faz barulhos sorrindo de forma irônica. — Nossa, Bruna, eu não sabia que você era desse jeito...
— Você poderia por gentileza sair de cima de mim?
— Claro, também acho que podemos deixar esse tipo de coisa pra mais tarde. — Esther se levanta com uma leve risada. — Vamos? Já são onze da noite.
— Eu dormi esse tempo todo?
— Pode acreditar, e ainda por cima foi sentada. Mas, veja pelo lado bom, você parecia bem cansada antes.
— Entendo...
— Bem, eu já preparei tudo, então não precisa se preocupar. — diz ela me entregando uma caixa de fósforos.
Na sequência, Esther remove a barricada e abre a porta daquele quarto rosa.
— Isso vai ser complicado, Bruna.
— Eu sei...
— Acho que onze balas são mais que o suficiente, mas me deseje sorte.
— Não morra, Esther.
— Não vou, gatinha! — Esther grita enquanto corre na direção oposta.
Neste momento, estou carregando cinco bombas de fumaça caseiras, a planta da mansão e uma caixa de fósforos, todos esses itens em uma sacola. Além disso, não pretendo abrir brecha alguma para falhas. Então, corro pelos corredores utilizando o mapa como referência.
Ao me aproximar do duto de ventilação, lanço a primeira bomba e, imediatamente, corro para o próximo. Simultaneamente, o meu bracelete começa a apitar, mas não perco tempo tentando descobrir o motivo. Assim como da primeira vez, consigo lançar a próxima sem problemas e ainda escuto o som da fumaça se espalhando.
Em pouco tempo, alcanço a terceira entrada de ar e lanço a bomba, fazendo restar apenas duas. Naturalmente, chego no quarto duto de ventilação e me abaixo para lançar a penúltima fumaça. Porém, subitamente, sinto como se algo pesado agarrasse meu corpo e em poucos segundos um saco é posto sobre minha cabeça.
— Sai de cima de mim! Seu mer...
Em seguida, um cheiro terrível atinge as minhas narinas...
— Me deix... Ver... Seu rosto, babaca!
Merda, merda, merda! Isso vai me fazer desmaiar.
— Sai de cima de mim!
Apesar dos vãos esforços, a fraqueza rapidamente toma conta do meu corpo e a minha consciência se esvai.
...
...