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Chapter 9 - Família

INTERLÚDIO - Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (4 de março, 2025 D.C.)

Depois de chorar muito, abraçada com o ursinho, Esther Wright cochila no frio chão daquele quarto escuro.

— Ei, Estherzinha! — grita o urso de pelúcia.

— Hm…

— Você não pretende dormir aqui no chão, pretende?

— Uhum…

— Você precisa se animar, tá me ouvindo!?

— Me animar? Fala sério…

— Escuta, isso não é digno de uma princesa como você. Aliás, se você ficar aqui vai acabar morrendo, sabia?

— E do que vale a minha vida agora, hein?

— Estherzinha…

— Nada! Ela simplesmente não vale nada!

— Existem pessoas que se importam com você, como eu, a Bruna e o Jim!

— A Bruna e o Jim já devem estar mortos… E você é só um delírio da minha cabeça!

— Nossa… Isso é jeito de falar com as pessoas, Estherzinha?

— Desculpa, você não me deixou outra escolha, seu esquisito.

— Olha, eu consigo ouvir aquela criatura fantasmagórica vagando pela mansão. Se não sairmos daqui agora, pode ter certeza que ela vai voltar e acabar com você.

— Mais tarde a gente faz isso… Meus ossos estão quebrados e eu nem tenho forças para me mexer direito.

— Você precisa ir logo, nem que seja se arrastando, Estherzinha! Faça isso pela Bruna e pelo Jim!

— Hm… Acho que você tem razão, ursinho. — diz Esther apertando o urso de pelúcia com ainda mais força. — Eu não posso morrer sem lutar! Esse não é o tipo de coisa que Esther Wright faria! Mesmo que meu corpo esteja coberto de sangue, mesmo que meus oss…

Nesse momento, sangue vem à boca de Esther, interrompendo o discurso.

— É melhor não falar muito, docinho!

Então, a mulher se levanta e vai até a saída do quarto com o ursinho e a lanterna em mãos. Porém, Esther nota que o corredor está com um novo aspecto.

— Mas, o quê?

— Rápido!

Diferente de antes, aqueles corpos não estão mais presentes, as paredes da mansão, agora, estão parcialmente congeladas, e é possível ver linhas negras que se espalham por todo o ambiente, como se fossem artérias ou raízes.

— Isso é…

— Rápido, Estherzinha! Não olhe para trás!

Obedecendo às palavras do ursinho, a mulher segue se arrastando rapidamente, sem olhar para trás, ignorando todos os sussurros assustadores que chegam aos seus ouvidos.

— Por que está tão frio? — Ela pergunta enquanto se apoia na parede para descansar.

De repente, diante de Esther, está uma criatura escura como a noite, mas, com olhos brilhantes como a luz da lua. Ao mesmo tempo, notam-se por todo seu corpo os tristes olhares daqueles que um dia perderam a esperança.

— Não olha pra ele, Esther!

— Tudo bem! — diz a mulher desviando seu olhar.

— Tem uma porta no final do corredor que leva ao subsolo da mansão. Tenho certeza de que lá você vai estar segura!

— Não acredito que… — Ela cospe sangue novamente. — Estou seguindo ordens de um ursinho de pelúcia.

— Confia em mim! Vai!

Então, tentando ignorar sua hemorragia, Esther se esforça para caminhar até a porta. Porém, ao abri-la, a mulher se vê sem forças para seguir e tropeça sobre suas pernas, rolando escada a baixo com o ursinho em mãos.

Assim que Esther chega ao subsolo da mansão, fica explícito que seu corpo não vai aguentar por muito mais tempo. Porém, a visão que a mulher tem ao contemplar o local enche seu coração de esperança.

— Bruna…

Logo à frente está Bruna, desacordada, amarrada a uma cadeira e com seu corpo iluminado apenas pela fraca luz de emergência do porão. Além disso, o local está quase inteiramente congelado e a presença daquelas raízes negras por todo o corpo de Bruna deixam Esther horrorizada.

— Eu vou te ajudar, Bruna!

A mulher usa suas últimas forças e se arrasta por cerca de dois metros. Porém, antes que ela se aproxime mais, o repentino som de uma escopeta sendo carregada faz Esther perder a concentração e largar o ursinho.

— Matou muita gente, menina? — diz uma voz masculina.

— O quê?

Neste momento, os olhos de Esther passam a não ver mais as raízes nas paredes, muito menos sentir o frio daquela mansão. Ao mesmo tempo, ela pode sentir algo se aproximando nas suas costas.

— Agora, eu vou te matar e pegar seu Laplace, mocinha. — diz o homem colocando o cano de sua escopeta na nuca de Esther.

— Veio finalizar o serviço dos outros, então?

Ao virar-se para olhar, Esther se depara com um homem alto, utilizando roupas velhas, um colete e uma máscara de palhaço.

— Haha, até parece que você vai conseguir matar ela, velhote! — grita o ursinho.

— Quem disse isso!?

— Lalalalala.

— Onde tá esse pirralho falando!?

— Tô aqui embaixo, seu pateta!

O homem muda seu foco para o ursinho de pelúcia.

— Espera… O urso falou? — O homem pergunta.

— Sim!

— Então, isso significa que outras pessoas também podem te ouvir! — Esther exclama animada.

— Sim! E ainda consegui ganhar um tempinho!

— O quê!?

De repente, o mesmo pardal de antes entra voando no local e, na sequência, os gritos de outro homem ecoam pelo porão.

— Esther! Fecha os olhos agora!

— Jim!?

Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (4 de março, 2025 D.C.)

Então, eu abro meus olhos.

— Esther! Fecha os olhos agora! — Uma voz masculina grita da escada.

Olhando em volta, vejo Esther, caída, enquanto o palhaço que me sequestrou segura uma escopeta logo atrás dela. Isso dura por apenas um instante, pois uma forte luz toma conta do porão logo em seguida, acompanhada do forte barulho de uma explosão.

Ao recuperar meus sentidos, vejo um soldado da EDEN caminhando próximo à Esther e ao palhaço, que agora está desacordado.

— O que você fez, Jim? — Esther pergunta.

— Granada de luz e uma boa porrada na cabeça dele, gostou?

— Caramba! Você é brilhan… — Ela tosse.

— Tenta não falar muito, ok?

— Eu não sabia que você estava envolvida com esse tipo de gente, Esther. — digo isso mostrando minha preocupação em relação àquela situação inusitada.

— Você deve ser a Bruna, não é? — diz o homem retirando uma faca tática de seu traje.

— Sim, sou eu.

— Esther me falou muito de você. — Ele ri enquanto corta as minhas amarras. — Jim Crooks, Corporação EDEN. Agora você está livre.

— Hm?

— Que cara é essa? Não gostou de ser salva, mulher?

— Eu iria dar um jeito de me livrar dessas amarras uma hora ou outra. Se você fosse mais inteligente e realmente quisesse ajudar, teria fugido da mansão com ela. — digo levantando-me da cadeira.

— O quê? Quem você acha que eu sou!?

— Não sei… Um soldado treinado?

— Sim, mas ela queria te encontrar de qualquer jeito! O que esperava que eu fizesse!?

— O mínimo que se espera de um soldado treinado é que ele tenha táticas melhores do que as de duas civis.

— Ah, vai tomar nesse teu cu.

— Claro, claro. Agora me dá uma arma.

— Pra quê?

— Pra que eu possa finalizar o serviço. Você deixou o palhaço vivo.

— Ei, espera aí… Chegou agora e já quer sentar na janelinha? Vai que o cara é morador da mansão. Não podemos matar ele assim, sem nem saber quem é.

— Só pra constar, foi você quem chegou agora e, eu não dou a mínima se ele é morador da mansão ou não.

— Mas, deveria… Escuta, vou te deixar só com uma faquinha por enquanto. Sabe como é né? Só pra garantir que não teremos nenhum acidente. — O homem sorri ironicamente.

— Idiota…

Então, Esther tenta se levantar para me cumprimentar.

— Bruna, eu estou tão feliz… — Ela tosse mais uma vez, enquanto mancha o chão de sangue.

— De onde vem todo esse sangue, Esther!?

— Que merda! As suas feridas se abriram! — O homem grita.

— O quê?

— Ela vai ter um choque hipovolêmico! Bruna, amarra aquele cara na cadeira e deixa que eu cuido dela! — diz o homem rasgando um pedaço da roupa de Esther para estancar o sangramento.

— Ei, a minha rou…

— Calada!

Seguindo as ordens de Jim, aproximo-me do homem com máscara de palhaço e começo a amarrá-lo na cadeira. Enquanto isso, o meu bracelete apita sem parar.

Nome: Não consta nos registros

Idade: Estimativa de 19 anos

Tipo Sanguíneo: AB+

Frequência Cardíaca: 105bpm

Quociente de Laplace: Menor que 1%

Data e Hora: 03:13 AM, 04/03/2025

Por que ele não para de apitar!? Não tem nada de errado com o bracelete!

Após ignorar o barulho e amarrar o homem na cadeira, retiro cuidadosamente sua máscara, revelando o rosto de um homem branco, com cabelos grisalhos e uma respeitosa barba.

— Droga! Eu vou precisar fazer mais uma transfusão de sangue! — O soldado grita.

Espera… Eu conheço o rosto desse homem…

— Bruna, me fala o seu tipo sanguíneo rápido!

— Aí, Jim. Tem uma foto polaroid bem no bolso da Esther, dá pra você pegar pra mim?

— Responde minha pergunta, caralho! Ela tá morrendo!

— O meu é AB+, serve?

— Não, o dela é A+, e tenho certeza de que não sobrou nenhuma bolsa de sangue compatível lá na enfermaria.

— Que pena. Pode me entregar a foto?

— Toma logo essa porra.

Então, pegando a foto suja de sangue, comparo o rosto do homem da foto com o palhaço e, imediatamente, percebo que eles são idênticos.

— Me responde um negócio, onde você aprendeu tudo isso, Jim? — Eu pergunto.

— Eu fiz enfermagem, por quê?

— Você acha que o sangue do pai tem boas chances de ser compatível com o do filho?

— Olha, eu realmente não sei te dizer. Por que essas perguntas?

Nesse momento, não consigo conter minha risada e começo a gargalhar histericamente.

— Por que você tá rindo, sua maluca!?

— Será que isso foi um golpe de sorte? Ou será que foi muito azar?

— Do que é que você tá falando!?

— Jim, meu caro. Tudo indica que encontramos o pai dessa doidinha aí no chão.

— Calma aí… O palhaço é pai da Esther!?

— Sim!

— O sangue do pai dela é A+! É o doador perfeito!

Enquanto isso, é possível ouvir os baixos gemidos de dor emitidos por Esther, que clama por ajuda.

— Papai…

— Que conveniente, não? — A minha voz treme em excitação.

— Bruna, acha que consegue dar uma passada na enfermaria e pegar o equipamento pra transfusão?

— Consigo sim.

As feridas de nossos corpos apodrecidos são queimadas enquanto rastejamos em direção ao futuro. Nossas mentes presas a espiral da loucura e nossas almas guiadas pelo medo gritam pelo fim desse ciclo interminável.