Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (4 de março, 2025 D.C.)
O arsenal se fecha, impedindo-me de fazer qualquer coisa, e o cheiro de gás invadindo aquela sala de segurança faz meu cérebro derreter e meus pensamentos serem rapidamente diluídos.
— Você caiu no jogo deles, fofinha! — exclama em tom de deboche uma voz infantil.
— Cala a boca! Você não sabe de nada!
— Quem diria, hein? Logo você, Bruninha. Tão determinada, tão convicta, tão desconfiada…
— Para! Quem é você!?
— Alô? — diz uma voz que sai do meu bracelete.
— Você se deixou enganar por aquela mulher e não foi capaz de perceber o óbvio.
— Sim, eu baixei a guarda, deixei ela me enganar. Não tinha como a Jessica saber que a Esther tinha perdido as memórias.
— Exatamente! E agora, todos vão morrer por sua culpa! Em alguns minutos essa sala de segurança vai ficar cheia de gás, e você vai morrer sufocada!
— Quem é você, cacete!?
— Ah, não me diga que ainda não percebeu, Bruninha.
Nesse momento, vejo diante de mim um urso de pelúcia, que repousa tranquilamente sobre o painel de Nexus.
— Você…
— Alô? — diz uma voz que sai do meu bracelete.
— O quê? Vocês ainda estão na linha?
— Sim, nós estávamos conversando e do nada você começou a falar sozinha.
— Eu… Quanto tempo se passou?
— Uns 3 minutos. Tá tudo bem?
— Não, não tá. Vocês já estão invadindo a mansão?
— Afirmativo, não daremos tempo para o alvo fugir.
— Que ótimo, eu estou na sala de segurança. Venham aqui me resgatar.
— Perdão, mas o quê? Você não está na nossa lista de prioridades.
— Como assim!? Eu ajudei vocês!
— Ajudou mesmo? Você só nos deu o nome de um cara morto.
— Escuta, se eu ficar mais tempo aqui vou morrer!
— E, infelizmente, eu não posso fazer nada. Vamos te buscar assim que nossa missão estiver concluída.
— Eu não tenho esse tempo todo, seus merdas! Vocês da EDEN são todos uns lixos!
— Sim, eu sei… Me desculpa por isso. — O homem finaliza a ligação com essas palavras.
Então, olho tristemente para o painel de Nexus.
— Isso tudo não pode ter sido em vão. Nexus, pare essa coisa imediatamente!
— Não posso atender ordens da senhorita.
— Foi o que eu pensei…
— Que bobinha, você achou mesmo que ele atenderia seu pedido? — O urso debocha mais uma vez.
— Não custa nada tentar, não é? Bem, parece que eu vou ter que dar uma "apeladinha".
Na sequência, pego a escopeta e aponto para o painel de Nexus.
— Se não vai por bem, vai por mal!
Após descarregar a arma dando tiros no painel, percebo que de nada adiantou.
— É, agora parece que não tem jeito mesmo.
— Fico feliz que tenha percebido, mocinha. Você já está perdendo a linha, ficando louquinha.
Assim que o urso termina de falar, sua cabeça começa a encher como se fosse um balão de gás, ficando grande o suficiente para tomar conta de toda a sala.
— Ei, o que tá acontecendo com você?
— Nada, eu estou ótimo. Você é quem não parece nada bem. — O urso fala com uma voz distorcida.
— É, acho que é isso…
De repente, a cabeça do urso explode, fazendo jorrar sangue por todo o ambiente. Além disso, o impacto da explosão é grande o suficiente para me fazer cair no chão e perder a consciência em instantes.
…
…
Diante de mim, está aquela mesma figura que vi dias atrás: um homem ruivo, de terno, caminhando, despretensiosamente, em meio à tempestade. Quem é ele? E acima de tudo, quem sou eu?
— Você vem comigo, não é? Não tem mais nada pra você aqui. — Ele pergunta com um sorriso suave.
…
…
— Olá… Senhorita! Espero que… Esteja… Sentindo-se bem.
— Hã?
Ainda que deitada sobre meu próprio vômito, começo a levantar. Enquanto isso, todo o gás que antes invadia a sala parece ter parado, e uma voz robótica familiar me cumprimenta.
— A senhorita… Parece surpresa e… Confusa. Maximus não disse que… Estava tudo correndo bem?
— Carry? É, acho que ele disse isso mesmo.
— Viu? Você… Precisa confiar mais… Em nós.
— A sua voz tá saindo do computador do Nexus. Como você conseguiu entrar aqui?
— Ah… Pensei que tivesse reparado… Senhorita. O pen drive… Que você usou… Estava infectado com… A melhor I.A. do mundo.
— Sei… Você e aquele velho tem formas bem estranhas de resolver as coisas, né?
— O que importa… É que funciona… Não acha?
— É, acho que sim… Droga, a minha cabeça tá doendo.
— Deve ser… O efeito… Do gás. Bem… Não vamos… Perder tempo. Agora tenho… Acesso a toda a interface… Nexus. Então… Permita-me oferecer-lhe… Algumas armas e… Munições.
Em seguida, as portas do arsenal se abrem novamente.
— Bem, acho que só vou pegar bastante munição para minha escopeta.
— Não… Pretende levar… Alguma arma para… O senhor… Jim Crooks?
— Você conhece ele? Ah, tanto faz. Ele tem muitas armas, mas eu vou levar um fuzil só pra garantir.
— Muito bem!
— Outra coisa, me deixa dar uma olhada nas câmeras. Você tem acesso a elas agora, certo?
— Claro! Pode… Olhar. Mas, já vou… Avisando… Que a bateria das câmeras… Está… Acabando.
Ao observar as câmeras, vejo vários soldados da Corporação EDEN correndo pelos corredores, enquanto um homem tão forte e alto que chega a nem parecer humano caminha próximo a eles.
— Quem é esse cara? Ele deve ter mais de dois metros.
— Esse é o… Warlord. Confia… Em mim. Ele é uma… Máquina de matar… Quase ilimitada. Você… Não vai querer comprar… Briga com ele.
— Um braço desse tamanho com certeza não vai servir pra fazer carinho.
Do outro lado, o homem que afirma ser George e Jessica correm, atirando nas câmeras pelo caminho.
— Esses desgraçados estão levando a Esther…
— Mais um… Motivo para você ir. Vou… Estar em contato… Pelo… Bracelete. Agora, vai!
Nesse momento, saio da sala de segurança e corro até o porão da mansão, na esperança de encontrar Jim Crooks lá.
— Jim!
Ao descer as escadas, vejo o jovem soldado da EDEN, amarrado pelos pulsos a um cano de metal. Além disso, ele possui feridas na cabeça e um tiro no abdômen.
— Bru…
— Você me enganou, seu merda!
— Eu… Te enganei?
— Você sabia que aquele homem não era George Wright! Você sabia que era ele o alvo da EDEN! Você sabia e mesmo assim não falou nada!
— Bruna, por favor, não é hora pra isso.
— É melhor você falar se não quiser que eu meta um tiro na sua boca.
— Escuta, seu eu tivesse te contado, você teria dado um jeito de estragar tudo, tenho certeza!
— O quê?
— Isso mesmo que você ouviu, sua corna. Você quase matou ele sem motivo nenhum! O que você teria feito se eu tivesse te contado que ele tava tentando enganar a gente!?
— Seu merda…
— Nós não teríamos conseguido nem metade do que conseguimos se você tivesse se intrometido.
— E você não teria levado um tiro!
— Olha, se tudo der certo, esse cara vai se tornar um pesadelo para a EDEN, e levar vários soldados de elite com ele.
— Mas, é isso que você quer? Você deveria querer o bem da EDEN!
— Não, desde que aqueles putos foderam a minha vida.
— Quê?
— Eu falei que você não iria entender, mulher.
— E a Esther, hein? Eles vão acabar matando ela.
— Não, eles não vão. Não seria nada inteligente, e, mesmo que tentassem, eu não iria deixar. Eles sabem que a cilada que eles armaram não vai segurar a gente por muito tempo, então, vão tentar usar a Esther como moeda de troca.
— Não seja idiota! O refém não vai fazer diferença alguma para a Corporação EDEN.
— Sim, é por isso que temos que alcançar eles antes.
— Mas, isso é impossível! Olha pra você! Eles roubaram seu traje, seu colete, suas armas. E esse tiro aí? Não temos tempo para remover a bala!
— Só me tira daqui logo, ficar com os braços pra cima assim tá doendo pra porra.
Então, removo as amarras de Jim cuidadosamente.
— Obrigado, finalmente estou livre. Escuta, quando eu entrei aqui pensei que seria só mais uma missão no meu caminho para destruir os caras que estão no topo dessa empresa maldita. Mas, a situação mudou quando eu encontrei a Esther. Eu decidi que deveria tirar vocês duas desse lugar de qualquer jeito, levando o máximo de filhos da puta que eu conseguisse.
— Isso é…
Nesse momento, o jovem soldado da Corporação EDEN olha no fundo dos meus olhos e diz:
— Eu nunca disse que sobreviver fazia necessariamente parte do plano.
— Certo… Entendi.
Então, Jim pega o fuzil da minha mão e caminha até as escadas.
— Outra coisa, Bruna. Quando eu te conheci, eu te achei um pé no saco. Mas, acho que estou começando a mudar a minha opinião. No fim das contas, você não parece uma pessoa tão ruim.
— É melhor não criar expectativas.
— Não vou criar. E aí, vamos?
Em seguida, subimos as escadas e corremos pelos corredores da mansão. Enquanto isso, podemos ouvir ao longe passos e gritos de soldados da EDEN.
— Cuidado, Bruna! — diz Jim, empurrando-me para uma cobertura.
E assim, ele elimina rapidamente dois soldados que estavam prontos para nos matar.
— Esses merdas queriam atirar em nós, mesmo sabendo que não somos a droga do alvo deles!
— É por isso que não dá pra confiar na porra da Corporação EDEN. Me diz aí, seu bracelete já detectou alguma coisa?
— Alguém com Laplace alto nas proximidades, Carry?
— Negativo… Senhorita.
— Que I.A. bosta que você foi arrumar, hein, Bruna? — diz Jim em um tom provocativo.
— Por favor… Jim… Delete-se à sua própria insignificância imediatamente.
— Me passa o mapa aí, Bruna.
— Toma.
— De todos esses lugares, tenho certeza que esses filhos da puta estão indo para a garagem da mansão. É o melhor lugar para fugir daqui.
— Pegar um carro e fugir? Até que não é um plano ruim.
— Pois é, eles só não contavam que a gente fosse prever isso. Vamos!
…
…
Após mais alguns minutos correndo pela fétida mansão, Jim faz um comentário.
— Esses corpos no chão são recentes, Bruna.
— Eles devem estar próximos…
— Sim! Acabei de… Detectar… Uma anomalia de… Laplace… Logo à frente.
— Na sala de estar?
— Esse lugar é perfeito, Bruna. Vamos aproveitar a oportunidade para encurralá-los.
— Encurralar quem? Eu gostaria de saber, de verdade. — A voz de George ecoa por todo o corredor. — Vamos, entrem. Vamos conversar pacificamente.
Então, nós entramos no cômodo e, ao contemplar o local, vejo George, segurando Esther em seus braços, e Jessica logo ao lado.
— Você tentou me matar, sua vadia.
— Acalme-se Bruna. Isso tudo ficou no passado, certo? Agora estamos aqui para negociar. — diz George de maneira estranha.
— Vejo que ainda não abandonou a máscara de palhaço, George. Ou será que eu deveria te chamar por outro nome? David, talvez? — Jim comenta.
— Então, vocês perceberam… Fico feliz! — o homem gargalha de maneira histérica. — A partir de agora fiquem à vontade para me chamar de David. Sobre a máscara, acho que ela já virou parte de mim, sabe? Faz parte da minha identidade agora.
— Bem, se quisermos fazer uma boa negociação, acho melhor não usarmos máscaras, velhote. Seria um desrespeito com todos os negociadores que vieram antes de nós.
— Certo, certo. Você me convenceu.
— Então, significa que a negociação já começou. Mas, eu tô curioso. Como você é tão parecido com o pai da Esther?
— Não faça perguntas idiotas. Acho que não estamos aqui para discutir isso, certo?
— Claro. Antes de começarmos, me informa que horas são Bruna.
Nome: Não consta nos registros
Idade: Estimativa de 19 anos
Tipo Sanguíneo: AB+
Frequência Cardíaca: 116 bpm
Quociente de Laplace: Menor que 1%
Data e Hora: 08:23 AM, 04/03/2025
— São oito e vinte e três.
— Obrigado, acho que ainda temos algum tempo.
— Olha, vocês querem essa coisinha aqui na minha mão, e eu quero fugir. — diz David, apontando o fuzil para a cabeça de Esther.
— A dois passos da loucura, e você ainda quer fugir? Olha para o seu estado, acha mesmo que vai conseguir?
— Eu sou mais inteligente que todos vocês! É por isso que eu vou conseguir! Eu sou um gênio! — George grita.
— Se você diz… Nos entregue a Esther com vida e podemos te deixar fugir.
— Eu já vi um homem assim antes, Jim. Ele é como uma bomba prestes a explodir. Você sabe que não dá pra deixar ele fugir. Não depois de tudo isso…
— Sim, eu sei. Isso é o que acontece quando pessoas de mente fraca lidam com algo como o Laplace. Mas, é a vida da Esther que está em jogo aqui, Bruna.
— Isso, isso, exatamente. É a vida da Esther que está em jogo. Se bem que eu não acho que ela vai durar muito tempo também. E mesmo que ela sobreviva, não deve servir pra muita coisa. É claro que ela pode servir pra ser sua boneca sexual, Jim. Tudo que você sempre quis…
— O quê você falou, seu merda!?
— Puff… Boneca Sexual! — Esther ri alto.
— Ela tá acordada!? — grita o velho com surpresa.
Nesse momento, Esther chuta os testículos do homem, correndo na nossa direção em seguida.
— Garota maldita!
Porém, ele atira em sua perna, fazendo-a cair no chão.
— Que merda! Isso dói muito! — Ela geme de dor.
— Eu vou meter um tiro na sua cara, seu filho da puta! — grita Jim.
— Não, Jim! É como você disse. É a vida da Esther que está em jogo aqui. — digo enquanto seguro seu braço.
— Aí, não acha que estamos passando um pouco do ponto, D? — Jessica decide falar algo após um bom tempo quieta. — Não acho que precisamos disso…
— Passando do ponto!? Você acha que estamos passando do ponto!? Você disse que me amava! Que morreria e que mataria por mim!
— Calma aí pessoal. A Jessica não era a minha esposa? — Esther indaga.
— Acho que tudo tem um limite. Já matamos gente demais, não acha? Justamente porque amo você, acho que deveríamos por um fim nisso tudo.
— Por um fim nisso tudo?
Então, Jessica se aproxima de David, o homem que até agora se passava por George, e colocando a mão sobre seu rosto pede pelo fim daquele pesadelo.
— O Quociente de Laplace é amaldiçoado, D. Todos que adquirem ele acabam cedendo à loucura. Tenho certeza de que se você se entregar, a EDEN vai ter algum meio não letal de tirar isso de você. E assim, poderemos viver felizes.
— Eu só não atiro em você por causa da nossa história, Jessica. No fim, eu aceito sua escolha. Pode ficar aqui e perecer junto com esses imbecis.
Na sequência, David pega sua mochila e lança duas bombas de fumaça, acesas previamente, saindo pela porta logo depois.
— Mas, eu… — Jessica fica sem palavras para dizer.
— É com você, Bruna. Vai matar esse filho da puta. — diz Jim.
— Nem precisa pedir.
INTERLÚDIO - Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (4 de março, 2025 D.C.)
Assim, que Bruna sai pela porta, Jim dá um suspiro de alívio.
— Que bom que conseguimos te recuperar com vida, Esther.
— Também tô feliz de te ver, Jim. Acho que você vai ter que voltar a ficar me carregando por aí. — Ela fala enquanto ri. — Tem uma arma pra me emprestar aí?
— Eu tenho essa pistola aqui! Não tá feliz de me ver? — pergunta Jessica.
— Olha, acho que eu tô, né?
— Espera aí, significa que você realmente perdeu suas memórias?
— É, eu não lembro de nada. Só sei que você é minha esposa porque ouvi os outros comentando.
— Bem, não tem problema. Acho que vamos ter que reescrever a nossa história do zero, então.
— Calma, você não acabou de me trair com aquele cara?
— Ah, isso… Eu só estava fazendo ele de trouxa, sabe? É assim que eu lido com os homens.
— Acho que entendi…
— Só estava enganando ele para que se rendesse logo. Quem eu amo de verdade é você.
Então, Jessica se abaixa e beija Esther romanticamente.
— Não demorem muito, valeu? — Jim comenta constrangido.
— Ah… Pode… Deixar. — Esther responde.
De repente, Esther saca a pistola e dá um tiro na cabeça de Jessica.
— Viu? Foi rapidinho.
— O que você tá fazendo!? Você ficou maluca, Esther!?
— Eu não.
O corpo de Jessica cai para trás, e Esther descarrega o resto do pente até o rosto dela ficar totalmente irreconhecível. Enquanto isso, seu sangue mistura-se ao carpete da sala de estar.
— Beija mal pra caralho.
— Por que você fez isso!?
— Olha, eu não sou do tipo que se apega a paixões antigas, sabe? Além do mais, não vai me dizer que tu pensou que eu tivesse acreditado naquele papinho de "só tava engando ele".
— Não, mas…
— Essa ratazana ainda sujou o meu boot. Filha da puta…
— Cara, eu tô sem palavras.
— Por quê? Não gostou?
— Pra falar a verdade, isso foi do caralho...
— Fico fel…
Antes de terminar a frase, Esther cai no chão convulsionando.
— Esther!? Esther!?
Enquanto isso, o som dos passos dos soldados pode ser ouvido do outro lado da porta.
— Merda! Merda!