Aquela sexta era a mais esperada por Hector o ano todo. O último dia de aula, em dezembro, fazia com que ele ficasse tão animado que não conseguia nem dormir. Além de tudo, Giorgio resolveu liberá-los para que pudessem ir para o acampamento de fim de ano.
Julian e Starla haviam preparado aquilo o ano todo, e a turma deles foi selecionada para aquele evento. Os outros sétimos anos também foram para alguns acampamentos, mas em outros lugares.
A confusão toda com Atlas não era nada mais que um passado distante àquela altura. Apesar disto, Scott e ele ficaram com o corpo repleto de cicatrizes. Seus ombros, costas e coxas ficaram com marcas da pele que se rasgou durante a batalha. Os dois, no entanto, voltaram às atividades, e eventualmente ao treinamento após aquela situação.
Jeff e Julian se recuperaram bem, também. Mas o trauma ficou forte nos quatro. Atlas não foi mais vista por ninguém, e nenhum sinal da organização em todo aquele tempo. Alguns fins de semana, os Mirai se reuniam com Luci para debater sobre as possibilidades para o ano. Mas durante todo aquele tempo, nenhum sinal da organização.
E então, ao fim de outubro, Julian anunciou a tão aguardada viagem para um acampamento em outra cidade. Zack foi quem mais sofreu para ganhar a permissão da mãe para poder ir ao acampamento. Lynn jurava com todas as forças que alguma coisa ruim iria acontecer com ele lá.
Marshall não tentou impedir, pois após todas aquelas situações, incluindo conselhos de William, ele entendeu que não adiantaria ir contra, e Hector arranjaria algum jeito. E agora, no último dia antes das férias, Starla explicava à turma sobre como se preparar para o acampamento.
-E por fim, segunda-feira nós vamos nos encontrar aqui na frente do Moreil às 10 da manhã, e o ônibus vai sair. -Ela sorria.
Hector já ouvira aquilo há tanto tempo que já nem se importava mais com o quê ela dizia. Jeff naquela manhã, junto de Giorgio os deram um breve adeus. Mas eles todos se encontrariam novamente no sábado, na casa de Erika. E então, férias.
Starla após a explicação começou a falar sobre alguns momentos marcantes da história no passado. Superpoderes eram coisas das quais ela adorava falar. Ela falava sobre grandes heróis do passado, sobre clãs e batalhas antigas que ficaram marcadas para sempre.
-Mas como eu disse, se ninguém no mundo tivesse poderes, haveria muito menos violência e crueldade. Vocês não acham?
-Verdade. -Trixie concordou. -Mas ia ser estranho a gente não ter poder.
-Não. -Starla riu. -Você nem saberia sobre esses poderes! Eles seriam apenas uma ideia para você, como um mundo sem poderes para nós.
-Uau. Isso é...
-Esquisito.
-E se houvessem outros tipos de poderes... -Zack fez uma pausa. -Algo... Único... O quê acha?
-Interessante. Algo que ocupasse o lugar que nossos poderes ocupam. Muito interessante, Zack. Nossos poderes são muito únicos, então é uma coisa bem complexa de se imaginar.
-É. Muito únicos.
Únicos.
Hector suspirou. Ele então se lembrou de algo.
"Você, que carrega a benção de Hipérion!"
-Professora... -Hector chamou. -O quê é uma benção?
-Benção? Tem muitos significados essa palavra. O quê exatamente você quer saber? É sobre poderes? Tem algo que quer me contar?
-Meio que... Eu tive um sonho... -Ele não quis contar sobre Angeline e sua previsão no começo do ano. -Eu vi... Um cara estranho. Ele apontou para mim e disse que eu carregava uma benção. Sabe me explicar o quê pode ser?
-Interessante. -Starla ergueu uma sobrancelha, e andou até Hector. Ela deu uma volta na carteira do garoto, o estudando, com olhos sagazes. -Se a benção for como eu estou pensando, então é algo... Incrível.
-Acho que é um aviso. -Max disse. -Hector pode estar perto de revelar os poderes dele.
-Aposto que ele já tem, só não percebeu. -Disse Scott. -Ele é meio burro de vez em quando.
-De vez em sempre. -David riu.
-Acho que ele sabe. -Nathan disse.
-Verdade. -Tristan continuou. -Acho que é drama.
Hector riu.
-Será que eu sei?
Starla deu uma risada também. Ainda que pouquíssimos prestassem a atenção na aula, os poucos a deixavam alegre.
-Bem, Hector, já que você quer tanto saber, eu posso dizer, do meu ponto de vista, o quê é uma benção. Há muitos anos, tenta-se classificar os diferentes tipos de poderes em várias categorias. Existem as Utilidades, por exemplo, que são poderes úteis para algumas situações. Existem as invocações, que são únicas para cada pessoa.
Hector pensou em Olívia. Ele a via quando ia a casa de Erika. Ela morava lá, ainda, sob proteção contra a organização. Todo aquele tempo, pois ela não possuía família nem amigos que pudessem ajudar ela. Uma alma perdida, como Giorgio a descreveu.
"Existem os poderes de combate, que é óbvio para quê servem. Muitos e muitos tipos e classificações existem. A Marca Etérea é a mais famosa, como bem sabem. Mas existem também as Bênçãos. Não se sabe o quê causa uma bênção a existir em alguém, apenas que elas caem sobre pessoas aleatoriamente."
Hector pensou um pouco. O quê faria de alguém um abençoado? O quê levaria ele a ter um tipo tão único de poder, se é que ele tinha algum?
"As bênçãos são consideradas os mais incríveis poderes. Existem muitos, muitos abençoados ao longo da história. E existem teorias também. As bênçãos são basicamente um poder colossal que pode ser considerado um superpoder."
Ela foi até o quadro, e desenhou alguns bonequinhos enquanto falava, que representavam sua explicação.
"As teorias sobre as Bênçãos dizem que algumas delas vão ser tão fortes que vão ser usadas por pessoas intocáveis. Por exemplo, ser capaz de correr acima da velocidade do som, ser tão forte ao ponto de erguer mais de 5 toneladas, ser capaz de multiplicar o próprio corpo... Todas essas são bênçãos de pessoas que já existiram."
Hector arregalou os olhos.
-Tá com tudo. -David riu.
-Sempre soube. -Nathan disse.
-As lendas dizem que os abençoados mais fortes vão ser capazes de fazer as mais incríveis coisas! -Starla continuou. -Usar a mente para mover coisas, usar a mente para fazer com que tudo que coisas aconteçam, ou até mesmo, a tão almejada Onipotência!
Starla deu uma risada ao ver que todos olhavam com um certo receio para Hector.
"Mas é claro, essas aqui são teorias. Até hoje, o abençoado mais conhecido e considerado o mais poderoso, é um cara muito bem conhecido por todos vocês. O nome dele é Aureus. Já ouviram falar?"
Hector riu.
-Não. Pode falar sobre ele.
Starla riu também. Ela gostava do senso de humor do garoto.
-Aureus foi a primeira, e única pessoa do mundo que foi oficialmente diagnosticada com a habilidade de voar. Ele voava muito longe, muito rápido, a isso o levava a fazer seu mais famoso ataque, a Investida do Anjo. Ele voava com tanta velocidade contra os mutantes maiores e os atropelava. O ar em volta dele se moldava, e formava um tipo de escudo, que o protegia de qualquer dano. Ele então passava, e a massa de ar que acompanhava ele se acumulava, fazendo uma onda enorme esmagar tudo!
-Nossa. -Hector deixou seu queixo cair.
Agora ele entendia porquê todos consideravam Aureus o mais forte de todos.
-E eu já vi de perto, era assustador. -Starla contou, com uma expressão de quem queria assustar uma criança. -Você via as janelas quebrando, o vendaval vindo, o barulho fazia você se encolher de medo, e aí... BUM! Ele venceu. Nada podia parar aquele cara, todos os vilões da época se renderam por puro medo. Os mutantes eram a única coisa que ousavam enfrentar ele. Alguns heróis até largaram seus empregos por medo de ter todo o trabalho feito por ele.
-Ele era O Cara. -Zack completou.
Hector pensou em Aureus. O quê quer que tenha deixado aquele homem naquele estado, não era coisa boa. Ele olhou para Zack, Max, Scott e então David. Os cinco aparentemente estavam em um consenso: O Rei do Mal era algo MUITO assustador.
-Isso é muito louco. -Hector disse. Ele escondeu o medo para que Starla não suspeitasse. -Espero que minha bênção seja forte igual a dele.
Starla riu.
-Calma, menino, eu sei que ele morreu. Mas você sabe, Aureus sumiu por anos. Ele provavelmente estava impedindo o reator do Projeto Saturno de mandar a cidade toda para o esquecimento.
-Obrigado. -Hector riu, menos nervoso.
No fundo, ele sabia bem que alguém havia feito aquilo. Alguém muito perigoso.
-Agora só a gente fazer o Hector mostrar a Bênção dele. -Scott disse. -Acho que dá pra forçar.
-Deixem, gente. -Tristan disse. -Vai vir naturalmente.
-Aposto que vai. -David concordou.
-Mas é bom a gente fazer ele despertar. -Max disse. -Vai que algum maníaco tenta matar mais algum de nós...
-Você vislumbrou algo? -Hector perguntou.
-Não. Ainda não. A Luci me ajudou a tentar me localizar no tempo durante meus vislumbres. Sempre que eu tenho algum, eu converso com ela. Mas nenhum que mostre algo importante.
-Sei. -Hector disse. -O Zack acha ruim você falar tanto com a Luci.
Max riu.
-Calma, Zack, somos só amigos.
-Vão se fuder. -Zack respondeu.
-Tudo isso por causa de mulher. -Nathan balançou a cabeça. -E nem é uma tão bonita.
-CALA A BOCA NATHAN! -Zack gritou.
Nathan segurou a risada. A turma toda ficou em silêncio.
-Vai lá, bate nele! -Aaron gritou.
-Que foi, Aaron, quer atenção? -Hector perguntou.
-Tava demorando hein. -Scott provocou.
-Quieto aí, Joelhinho. -Denis gritou.
-Daqui a pouco eu quebro sua cara e você vira o dentinho, seu merda. -Scott disse de volta.
Denis se levantou da cadeira.
-Como é que é?
Scott ficou em pé, e ativou a marca.
-Só mais um passo. Experimenta.
Nathan se levantou também.
-Deixa Scott. Faz tempo que eu quero fazer o Denis fechar a boca pra sempre. Eu pego ele.
Nathan começou a andar na direção dele.
Denis recuou, junto de Aaron.
-Sai, cara! -Denis gritou. -A gente não bate em ninguém de verdade!
-Quietinho. -Nathan disse.
James recuou também.
-Chega, Nathan. -Hector disse. -Esses bostas já aprenderam a lição deles. Não vale a pena.
-Mas...
-Só relaxa.
Nathan parou e voltou.
Denis deu uma risadinha, e abriu a boca para falar, mas Starla o interrompeu.
-Não ouse! Hoje é o último dia de aula, sem confusão na minha aula, por favor.
-Desculpa. -Denis disse.
-Desculpa. -Nathan disse.
-Obrigada, meninos.
Hector suspirou outra vez. Ele olhou para Max. A próxima semana seria incrível. Mas também, ele queria ter certeza daquilo. Se Max pudesse ao menos ajudar tentando forçar um vislumbre...
A aula foi interrompida pelo sinal anunciando seu fim. Apenas mais três aulas, e ele não voltaria para o colégio tão cedo.
Ele sorriu, ansioso.