A Praça Celestial estava transformada. Lanternas encantadas flutuavam no ar, espalhando luzes em tons suaves de dourado e prateado, refletindo-se nas pétalas que dançavam ao sabor da brisa mágica. O perfume das flores de éter preenchia o espaço, misturando-se ao aroma de especiarias e doces que saíam das barracas enfeitadas.
Lya nunca tinha participado de nada parecido, e, pela primeira vez desde que chegara a este mundo, sentia uma empolgação genuína. Lya sentia-se confiante com o seu vestido etéreo de tecido diáfano, prateado e azulado, que se moldava ao corpo. O decote delicado revelava os ombros, enquanto a saia longa e fendida permitia vislumbres ousados de suas pernas. Estava deslumbrante.
Eren ficou imóvel ao vê-la, os olhos cinzentos refletindo uma mistura de surpresa e admiração. Lya sentiu o rosto aquecer sob o olhar dele.
— Estás a olhar para mim como se nunca me tivesses visto antes. — Lya provocou, escondendo um sorriso.
— Talvez seja porque nunca te vi assim... tão... — Ele hesitou, então abriu um sorriso travesso. — Tão encantadoramente perigosa.
Lya revirou os olhos, mas a verdade era que sentia um calor incomum subir-lhe ao rosto.
Arwen, ao lado deles, observava a movimentação do festival com um olhar experiente. — O Festival das Flores de Éter sempre foi um símbolo da renovação mágica. Antes da guerra, era um evento que unia feiticeiros e metamorfos. Havia danças, oferendas aos antigos deuses e uma aliança selada entre as famílias nobres de ambos os povos. — Sua voz carregava um tom de tristeza, mas logo se recompôs. — Hoje, ainda é um belo evento, mas perdeu parte de seu verdadeiro significado, me pergunto como seria antes.
— Então vamos aproveitar o que ainda temos. — Eren disse, puxando Lya pelo pulso com um brilho malicioso nos olhos. — Vamos dançar.
Lya olhou para Eren e percebeu o quanto ele estava elegante em seu traje. Ele usava uma túnica escura, adornada com bordados prateados que realçavam seus ombros e peito. A calça justa completava o visual, destacando sua postura imponente.
No centro da praça, um círculo mágico foi traçado no chão, emitindo um brilho suave. Casais se reuniam, preparando-se para a Dança das Estações. Ao redor, músicos encantavam seus instrumentos, criando uma melodia envolvente que misturava tons etéreos e ritmos alegres.
Lya hesitou por um momento, mas a mão firme de Eren em sua cintura dissipou qualquer receio. Ele a guiou com destreza, e logo estavam envolvidos no ritmo da dança. Seus corpos moviam-se em sintonia com a música, os passos coordenados como se fossem um só. A cada giro, as runas no chão brilhavam mais intensamente, reagindo à sua conexão.
— Acho que estamos a impressionar. — Lya brincou, percebendo alguns olhares ao redor.
— Ou talvez estejas tu a impressionar. — Eren retrucou, inclinando-se ligeiramente para sussurrar próximo ao seu ouvido.
Antes que ela pudesse responder, um som de passos firmes interrompeu o momento. Isolde surgiu diante deles, usando um vestido negro bordado com fios dourados que serpenteava pelo tecido como runas vivas. O decote ousado destacava a pele dourada sob a luz das tochas mágicas, enquanto a fenda lateral revelava um vislumbre de sua coxa. Os ombros nus eram adornados por finas correntes de ouro.
— Que surpresa ver-te tão... envolvido, Eren. — A voz dela era doce, mas carregava uma pontada cortante.
Lya sentiu a mão de Eren firmar-se um pouco mais na sua, mas ele manteve o tom despreocupado. — Isolde. Estás a aproveitar o festival?
— Estaria a aproveitar mais se não tivesse de assistir a certas... exibições. — Ela cruzou os braços, o olhar pousando diretamente sobre Lya.
Lya arqueou uma sobrancelha, mantendo a compostura. — Que pena, é um evento tão bonito para ser desperdiçado com ressentimentos.
Isolde sorriu, mas não havia calor no gesto. — Tens razão. Alguns sabem como se portar em um festival. Outros, bem... aprendem com o tempo. — Com um último olhar para Eren, virou-se graciosamente e afastou-se entre a multidão.
Lya soltou um suspiro, balançando a cabeça. — Que raio foi isso?
— Isolde é... intensa. — Eren riu, puxando-a de volta para a dança. — Mas não te preocupes, estou exatamente onde quero estar.
A música aumentou em intensidade, e eles voltaram a girar sob as luzes do festival, deixando para trás qualquer interferência indesejada. Era uma noite para celebrar, e nada mais importava.
Cansados de dançar foram para um canto observar o festival e Eren observava Lya com atenção, os olhos penetrantes como se tentassem decifrar algo que ela ainda não tinha dito. A sala estava silenciosa, exceto pelo som suave da brisa que passava pela janela.
— Você nunca me contou de onde veio, Lya. — Ele falou, sua voz baixa e curiosa. — Sempre falei do meu mundo, mas... o seu? O que tem a ver com tudo isso?
Lya desvia o olhar, uma sombra de desconforto cruzando seu rosto. O silêncio que se seguiu parecia pesar mais do que palavras poderiam carregar. Ela suspirou, como se estivesse reunindo coragem para compartilhar algo que sempre preferira manter guardado.
— Eu... eu cresci em um orfanato. — Ela começou, a voz mais suave do que ela gostaria. — Nunca soube quem eram meus pais biológicos. Quando era mais nova, queria entender o porquê, mas... nunca obtive uma explicação.
Eren inclinou-se ligeiramente para frente, como se as palavras de Lya fossem um mistério que ele desejava resolver.
— E então? O que aconteceu? — Ele perguntou, com uma leve insinuação de empatia na voz.
Lya olhou para as mãos, os dedos entrelaçados de maneira inconsciente. A dor de sua infância parecia distante, mas ainda muito viva em sua memória.
— Fui adotada por um casal rico. Eles me deram tudo o que eu precisava, mas... — Ela pausou, procurando as palavras certas. — Mas nunca me deram o que realmente importava. Eu... eu nunca senti que éramos uma família, sabe? Eu me senti... sozinha, apesar de ter tudo o que queria.
Eren a observava com uma expressão pensativa, como se tentasse entender cada palavra e cada pausa.
— Você sempre teve tudo o que precisava, então... como isso te afetou? — Ele perguntou, a curiosidade em sua voz misturada com uma leve preocupação.
Lya soltou um suspiro profundo, tentando afastar as lembranças que ainda a incomodavam.
— Eu sou grata por eles. Eu nunca passei por privações materiais, nunca passei fome ou frio. Mas... por mais que tivessem dinheiro, nunca consegui me sentir realmente conectada com eles. Nunca senti amor, Eren. Era só... uma troca de favores. Eles me davam o que eu queria, e eu... nada. Não sei se era porque eles estavam muito ocupados ou se era só quem eles eram.
O silêncio tomou conta novamente da sala. Eren, agora mais atento, percebeu o peso que aquelas palavras carregavam. Era algo que ela ainda não tinha dividido com ninguém, algo que a consumia sem que ela percebesse.
— Isso deve ter sido difícil para você. — Ele disse, a voz mais suave agora, mais compreensiva. — Mas então, o que te fez seguir em frente? Como dançarina, como estudante...
Lya sorriu levemente, mas o sorriso não alcançou completamente seus olhos. Ela olhou para o chão, como se ali houvesse alguma resposta que não queria admitir.
— A dança... a dança era minha forma de me expressar. No palco, eu não precisava de palavras. Só o movimento e a música. — Ela falou, a voz mais suave, como se evocasse o passado que lhe era mais confortável. — E eu também me dediquei aos meus estudos... Relações internacionais me fascinavam. Aprender como o mundo se conecta, como as pessoas, as culturas, se entrelaçam... mas nunca senti que tivesse um lugar. Eu sempre soube que algo estava faltando.
Eren a observou com um olhar penetrante, como se tentasse compreender a essência daquela mulher que tinha se tornado um enigma, mesmo para si mesma.
— Talvez o que falta... seja mais do que só uma explicação sobre seus pais. Talvez seja algo que você só descobrirá aqui, neste novo mundo. — Ele disse, a voz carregada de uma intensidade que Lya não havia esperado.
Ela o olhou, uma expressão melancólica nos olhos.
— Talvez... ou talvez seja algo que nem eu mesma consiga entender. Mas vamos voltar?
A noite continuou com mais danças, risadas e brindes. Lya e Eren experimentaram vinhos encantados que mudavam de cor conforme a emoção do bebedor, e até participaram de um jogo de adivinhação com cartas místicas. O clima era leve e festivo, e pela primeira vez em muito tempo, Lya sentiu-se simplesmente feliz. Mesmo com a presença de Isolde pairando como uma sombra distante, nada poderia estragar aquela noite.