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Chapter 3 - TELEFONEMA

Kuaa!

Um grito rasgou o silêncio do corredor como uma faca, reverberando pelas paredes do prédio. Era Deniel, jogado no chão do corredor, tremendo como se o próprio ar ao seu redor fosse hostil. Seus olhos estavam fixos em uma visão que ele jamais esqueceria: um corpo.

A figura no chão estava irreconhecível, o rosto desfigurado, a cabeça decepada. Sangue seco tingia o piso de um vermelho opaco, formando uma cena grotesca. O cheiro metálico e nauseante invadiu suas narinas, provocando uma ânsia insuportável.

Deniel recuou, as pernas tremendo, até que tropeçou e caiu na parede oposta do corredor. Ali, curvado, ele vomitou, enquanto tentava desesperadamente puxar ar para os pulmões.

– Po... Polícia! – gaguejou, com a voz entrecortada pelo desespero.

Ele tateou os bolsos em busca do celular, mas logo percebeu que havia deixado o aparelho em seu quarto. Sem pensar, correu de volta para o apartamento, tropeçando em seus próprios pés, o coração disparado. Ao alcançar o celular, suas mãos tremiam tanto que ele mal conseguiu discar o número da emergência.

Alguns minutos depois, sirenes quebraram o silêncio da noite. O prédio parecia ter despertado com o tumulto, e Deniel ouviu vozes abafadas e passos no corredor. Ele permaneceu trancado no apartamento, os olhos fixos na porta, enquanto imaginava o que poderia estar acontecendo lá fora.

Quando finalmente os policiais bateram à sua porta, ele foi levado para depor. Suas palavras saíam confusas, atropeladas pelo choque e pela ansiedade.

– Escuta, garoto – disse um dos policiais, tentando acalmá-lo. – O corpo é masculino. Não pode ser sua vizinha.

Deniel ficou paralisado. As palavras do policial ecoaram em sua mente, mas ao invés de alívio, trouxeram mais perguntas. Por que um homem estaria no apartamento da vizinha? Ela não havia dito que morava sozinha?

Enquanto a polícia trabalhava, o proprietário do prédio, sempre com seu sorriso desconcertante, oferecia um suporte aparentemente cordial. Mas havia algo em sua postura que deixava Deniel inquieto. Ele parecia... distante. Como se aquilo não fosse novidade.

As semanas seguintes foram relativamente tranquilas, mas a normalidade era apenas superficial. Deniel mal saía do quarto, vivendo entre jogos e um sono perturbado. No entanto, o ambiente ao redor parecia ter vida própria.

O apartamento ao lado foi alugado novamente, desta vez para um homem de aparência rude, que Deniel supôs ser algum tipo de gangster. No 905, uma senhora excêntrica vivia rodeada de gatos, cujo número parecia multiplicar-se sempre que ele passava por sua porta entreaberta.

"As economias estão acabando." Essa era a frase que martelava na mente de Deniel enquanto olhava para a tela de seu celular. Ele havia engolido o orgulho e enviado uma mensagem aos pais, pedindo dinheiro. A resposta veio com a frieza do pai e a preocupação da mãe, que insistia em saber onde ele estava. Dois meses se passaram nessa mesma rotina, e nada mudou.

– Preciso de comida... – murmurou Deniel para si mesmo, após horas jogando.

Ao sair do apartamento, ele desceu as escadas em passos lentos. No meio do caminho, viu duas crianças brincando. Ele nunca as havia visto antes e não fazia ideia de quem eram seus pais. Mais abaixo, cruzou com um homem de terno carregando uma maleta, seu cabelo grande, preto e sedoso eram de se notar. A figura era tão deslocada quanto tudo naquele prédio, mas Deniel não deu importância.

O céu estava tingido de laranja quando ele saiu do prédio. O sol se punha no horizonte, lançando sombras longas sobre a rua deserta. Deniel caminhou em direção ao mercadinho, mas foi interrompido por um som estridente vindo do celular.

– Alô? – atendeu, relutante.

– Deniel? Aqui é da assistência social, você tem um minuto?