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Chapter 5 - ÁGUA E ÓLEO

Os dias após o velório se arrastavam em um ciclo interminável de monotonia e incertezas. No pequeno apartamento, Deniel vivia preso em um limbo entre o passado e o presente. Sem o dinheiro que sua mãe costumava lhe enviar, a realidade começou a se impor de maneira cruel. Ele se perguntava: Ela me enviava dinheiro por medo de que eu contasse tudo ao meu pai? Ou talvez ela realmente me amasse? Era uma dúvida que nunca teria resposta.

O aluguel estava atrasado, e a comida na despensa diminuía a cada dia. Deniel, que há muito havia se isolado do mundo, não sabia por onde começar. Quando tentou conseguir um emprego no mercadinho do bairro, tudo o que recebeu foi um vago "Deixe seu telefone e entraremos em contato".

Deitado em sua cama, encarando o teto manchado, ele murmurou para si mesmo:

— Que dia é hoje?

A resposta não importava. Os dias pareciam idênticos, um borrão de solidão e desespero. Todas as manhãs, ao abrir os olhos, uma única pergunta ecoava em sua mente: Será que serei despejado hoje?

Mais tarde, Deniel lembrou-se da garota do apartamento 402. Um flash de sua imagem — o cabelo ruivo, os olhos gentis — invadiu sua mente. Talvez conversar com ela fosse o que ele precisava. Uma conexão humana, por menor que fosse, poderia quebrar a solidão esmagadora.

Decidido, desceu até o quarto andar. Diante da porta, hesitou por alguns instantes antes de tocar a campainha. O som reverberou pelo corredor vazio, e ele esperou, os olhos fixos no teto.

— Ela não deve estar em casa... — murmurou, quase desistindo.

Mas a porta se abriu. Não era quem ele esperava. Um homem alto, magro, com cabelo lambuzado de gel e um cigarro pendendo dos lábios, surgiu na soleira. Seu olhar era frio e intimidador, carregado de algo sombrio... Impossível se esquecer dele, seu vizinho gangster.

Deniel deu um passo para trás, alarmado.

— O... O que você fez com a... — gaguejou, mas parou. Qual era mesmo o nome dela?

O homem deu um sorriso de canto, cruel, e colocou a mão pesada no ombro de Deniel, apertando com força. A dor foi instantânea, como se seu ombro fosse esmagado por um torno de ferro. As pernas de Deniel começaram a tremer, e o medo tomou conta dele.

— Ei, garoto. Você está me acusando de quê? — A voz do homem era grave e cortante, cada palavra fazendo o corpo de Deniel se arrepiar.

Quando Deniel pensou que aquele seria seu fim, uma mão surgiu e agarrou o braço do homem. O aperto foi tão firme que o obrigou a soltar Deniel.

— Não sabia que incomodar os mais fracos fazia parte do seu estilo — disse uma voz rouca e, ao mesmo tempo, serena.

Deniel levantou o olhar e viu um homem vestido impecavelmente com um terno escuro, segurando uma maleta de couro. Seu cabelo negro e longo caía sobre os ombros como um manto, e seus olhos brilhavam com uma intensidade quase sobrenatural. "O cara de maleta do outro dia" pensou Deniel aliviado.

O homem e o gangster se encararam por alguns segundos que pareceram horas, eram como um Tigre e um Dragão se encarando naquele momento. Finalmente, o gangster jogou o cigarro no chão, pisou nele e saiu sem dizer mais nada.

Deniel tentou agradecer ao estranho, mas antes que pudesse dizer algo, o homem murmurou:

— Confie em mim, essa garota não é alguém com quem você deveria se envolver.

E, sem mais explicações, entrou no apartamento ao lado.

Deniel, ignorando o aviso, entrou no apartamento 402. A porta estava entreaberta, e ele precisava saber se a garota estava bem. Quando deu o primeiro passo para dentro, viu "Gi" sair do banheiro, completamente nua, secando os cabelos com uma toalha.

Deniel ficou paralisado, o rosto vermelho de constrangimento. Ele deu um passo para trás, cobrindo os olhos com as mãos.

— Me desculpe! Eu... eu não sabia que você estava...

Ela riu suavemente, sem se abalar.

— Tudo bem. Eu não sabia que tinha visitas. Você é o rapaz do outro dia, certo?

A gentileza na voz dela contrastava com a situação, mas algo naquilo parecia... errado. As palavras do homem de terno ecoaram na mente de Deniel: Essa garota não é alguém com quem você deveria se envolver.

Ele forçou um sorriso e balançou a cabeça.

— Desculpe. Foi um engano. Não queria incomodar.

Antes que ela pudesse responder, Deniel saiu rapidamente, sentindo o peso de algo que não conseguia explicar.

Enquanto subia as escadas de volta ao seu andar, encontrou novamente as duas crianças que sempre brincavam ali. Um menino e uma menina, talvez gêmeos, vestindo macacões combinando. Eles pareciam felizes, completamente alheios ao caos que rondava aquele prédio.

Deniel passou por eles, mas algo no olhar das crianças o deixou inquieto. Havia algo incomum, algo que ele não conseguia identificar.

Quando chegou ao seu andar, Deniel percebeu que a porta do seu apartamento estava aberta. Um frio percorreu sua espinha. Lentamente, ele se aproximou, sentindo o coração acelerar a cada passo.

No interior escuro, a silhueta de uma pessoa estava parada no final do corredor.

— Q-quem é você? — perguntou Deniel, a voz tremendo.

A figura não respondeu. Apenas permaneceu imóvel, como se esperasse por ele.