Dois anos atrás
— EEEEE ACABOOOOOU! A EQUIPE "TRY OUT" É A GRANDE VENCEDORA DO TORNEIO MUNDIAL DE CS3! — a voz estridente do locutor ecoava pelo estádio lotado, abafada apenas pelos gritos ensurdecedores da multidão em êxtase.
"Counter Shot 3", ou simplesmente CS3, dominava o cenário dos jogos de tiro da era moderna, rivalizando diretamente com "Glory", o MMORPG mais jogado do mundo. No centro desse universo competitivo estava Deniel — estudante exemplar e, mais impressionante ainda, o jogador número 1 de CS3 no ranking global. Seu nick? "S1mpl3".
O comentarista, ainda ofegante pela adrenalina do momento, se inclinou para o microfone, com um sorriso estampado no rosto:
— Como você se sente sendo o melhor do mundo por dois anos consecutivos e, agora, liderando sua equipe para a terceira vitória mundial?
Deniel, com o suor ainda escorrendo pela testa e o coração acelerado, sorriu de orelha a orelha.
— Olha, eu... não, nós estamos muito animados. Gostaria de agradecer não só ao nosso treinador e aos amigos, mas também à minha família. — Ele fez uma pausa, olhando diretamente para a câmera, os olhos brilhando de confiança. — Chloe, essa foi pra você!
Mas o brilho de Deniel desapareceu tão rápido quanto havia surgido. Meses depois, no auge da carreira, ele sumiu sem deixar rastros. Nada de despedidas, anúncios ou explicações. Alguns diziam que ele havia se aposentado, cansado da pressão; outros criavam teorias da conspiração, afirmando que ele estava envolvido em algo obscuro. Havia até quem acreditasse que ele jogava escondido com uma conta smurf, longe dos holofotes.
Presente
O medo fazia o coração de Deniel bater como um tambor desgovernado. A luz pálida da lua iluminava parcialmente o quarto, projetando a sombra distorcida da figura à sua frente — uma senhora de aparência macabra, cujo sorriso grotesco parecia entalhado a faca no rosto enrugado. Seus olhos vazios pareciam perfurar a alma dele.
— D-desculpa… eu… eu não vi o seu gato… — gaguejou Deniel, a voz trêmula, engasgada pelo terror.
A mulher deu um passo à frente. O som dos seus sapatos arrastando no chão ecoou como pregos arranhando um quadro-negro. Instintivamente, Deniel recuou, tropeçando de volta para o quarto. Num gesto desesperado, tentou fechar a porta com toda a força, mas uma resistência inumana impediu. A mulher pressionava do outro lado com uma força descomunal, empurrando a porta com facilidade, enquanto Deniel suava frio, lutando para manter o obstáculo entre eles.
— ME DEVOLVA O BICHANO! — gritou ela, a voz alternando entre um tom rouco e outro agudamente perturbador, como se várias pessoas falassem ao mesmo tempo.
Aquilo não era força de uma senhora idosa. O suor escorria pela testa de Deniel, os músculos tremendo, o desespero crescendo. O que diabos está acontecendo?!
— Eu já disse que ele não está aqui! Por favor, vá embora ou… eu vou ligar para a polícia! — gritou, mas sua voz soou fraca, abafada pelo pânico.
Num último empurrão, a mulher arrombou a porta. Deniel caiu para trás, batendo com força no chão frio. O sorriso havia desaparecido do rosto dela, agora substituído por uma expressão vazia e ameaçadora. O olhar fixo e penetrante queimava a sanidade dele.
"Eu vou morrer?" — pensou, engolindo em seco, o medo gelando suas veias.
Ela se aproximava, os dentes agora visíveis — pontiagudos, afiados como lâminas, brilhando à luz da lua. Quando Deniel pensou que seria o fim, algo voou pelo ar e atingiu violentamente o rosto da mulher. Uma maleta. O impacto foi brutal, jogando-a contra a parede com um baque surdo, onde ela desabou, desacordada.
Uma voz masculina ecoou pelo quarto:
— Peço perdão pelo inconveniente, mas uma senhora da sua idade não deveria estar acordada a essa hora.
Deniel ergueu o olhar, ainda ofegante. Diante dele estava um homem alto, vestindo um terno impecável e segurando a maleta como se fosse um acessório comum. O cabelo negro e longo caía sobre os ombros, dando-lhe um ar de personagem saído de um filme.
— Armas tiram minha elegância. Espero que a maleta não tenha causado uma má impressão, shonen. — disse o homem, com um sorriso debochado no canto dos lábios.
"Shonen?" — Deniel mal conseguia processar o que aquilo significava.
— Err... muito obrigado, senhor. Você me salvou, mas… o que é ela? — perguntou, ainda trêmulo, tentando se levantar.
— Hmmm… já que ela visitou seu quarto, podemos chamá-la de uma "Visitante". — O homem sorriu, ajeitando o terno. — Meu nome é Lucius.
Deniel estendeu a mão para cumprimentá-lo.
— Deniel… prazer.
Lucius ignorou o gesto, apenas consultando o relógio com um olhar impaciente.
— Está na hora de sairmos daqui.
Sem entender nada, Deniel o seguiu, fazendo perguntas que foram completamente ignoradas. Havia algo estranho em Lucius, mas, paradoxalmente, sua presença transmitia uma sensação desconcertante de segurança.
Quando chegaram à escadaria do prédio, um som metálico ecoou. Ambos correram para o andar inferior, onde a cena que os aguardava parecia saída de um pesadelo: três corpos mutilados, rostos tão deformados que era impossível reconhecer feições humanas.
No fundo do corredor, duas crianças encolhidas tremiam de medo. Entre elas e os corpos, estava um homem de costas, segurando uma barra de ferro ensanguentada.
— Hmm… será que você é um deles também? — murmurou o homem, em um tom calmo e frio, girando levemente a cabeça.
Antes que Deniel pudesse reagir, o estranho surgiu à sua frente num piscar de olhos, a face obscurecida por sombras, impossível de distinguir.
"Rápido demais!" — pensou Deniel, sentindo o instinto de sobrevivência gritar.
Mas, antes que pudesse se defender, uma mão se interpôs. Lucius segurava a barra de ferro com uma facilidade desconcertante.
— Posso confirmar que ele não é um deles. — disse Lucius, o sorriso arrogante nunca abandonando seu rosto.
Deniel, ainda paralisado, encarou o agressor, o gangster. Seus olhos eram completamente pretos, com uma pupila branca brilhante — um contraste perturbador. Isso é… uma tatuagem nos olhos? Seus olhos sempre foram assim?
— Tsc… vocês dois me enojam. — o homem cuspiu as palavras, colocando um cigarro na boca e descendo as escadas, sumindo na escuridão.
Deniel, ainda em choque, lembrou-se das crianças. Correu até elas.
— O tio da barra de ferro salvou a gente… — disse uma delas, apontando para os corpos destroçados.
Lucius, com um sorriso irônico, comentou:
— Pelo visto, temos um anti-herói aqui, não é mesmo, jovem Deniel?
Deniel apenas acenou com a cabeça, sem conseguir processar o que acabara de acontecer. O cheiro de sangue ainda impregnava o ar. O silêncio era ensurdecedor.
— O que… C@r@lhos acabou de acontecer aqui?