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Chapter 4 - Interações Inesperadas

Quando cheguei em casa, a sensação de vazio dentro de mim parecia maior, e o tumulto no mercadinho ainda ecoava na minha cabeça. Meus pensamentos me atormentavam por algum motivo, mas não durou muito tempo antes do meu estômago fazer um leve protesto, lembrando-me de que, com toda a confusão, eu havia esquecido de almoçar.

"Espero não ver aquele garoto tão cedo" - disse irritada, incerta do que aconteceria nos próximos capítulos.

Abri a geladeira e, no meio de algumas sobras, vi uma maçã vermelha. Decidi que, por ora, aquilo seria o suficiente para "forrar" o estômago e não passar mal. Mastigava devagar, tentando me distrair com a textura crocante enquanto a mente voltava a divagar entre os vários pensamentos. Será que nos veríamos novamente? Por que eu me sentia daquela forma sempre que o via e por que sempre brigávamos? Eu sabia que provavelmente encontraria o amigo dele na faculdade e, de alguma forma, eu tinha a sensação de que aquilo não havia terminado.

***

As duas semanas seguintes foram cheias de tarefas. Passei os dias organizando a casa, tentando criar um ambiente onde eu me sentisse mais confortável. Limpei o pó das prateleiras, mudei os móveis de lugar e tentava me preparar para esta nova fase, para a faculdade e para buscar informações sobre meu passado. As noites eram solitárias, mas eu rapidamente me acostumei com o silêncio que preenchia a minha vida e a angústia que eu sentia ia se dissipando, dando lugar a um sentimento de expectativa. Além disso, pensar na faculdade era um alento: um novo ciclo, novas amizades, adquirir novos conhecimentos e a chance de desenhar um futuro diferente.

***

Finalmente havia chegado o momento que eu esperava, me sentia animada, mas também ansiosa. Eu havia estudado por três anos no Brasil, e agora estava prestes a estudar por dois anos em Nova Orleans.

A manhã estava ensolarada, e o clima tinha uma leve brisa. Tomei meu banho, sequei o cabelo e o prendi em um coque solto. Coloquei um longo vestido preto que acompanhava meu corpo e uma sapatilha confortável caso precisasse ficar andando pelo Campus, e me lembrei do colar que sempre usava no pescoço, um legado da minha família de sangue, que era a única conexão que eu ainda tinha com eles.

Ao chegar à faculdade, senti uma onda de nervosismo me atingir, a quantidade de pessoas ao meu redor parecia ter multiplicado e isso não ajudava os meus nervos. Olhares, risadinhas e vozes se misturavam, criando um ambiente que me deixava à beira de uma crise de ansiedade. O Campus era muito maior do que eu imaginava, e descobri que ali existiam 2 Campus diferentes, o de psicologia ficava a minha frente e o de medicina ficava à esquerda. Apesar disso, eu estava determinada a não deixar o medo dominar, por isso entrei no prédio e busquei a recepção para pedir informações sobre a sala de psicologia do quarto ano.

Ao chegar na recepção, pedi informações sobre a sala e as matérias que estudaria e, enquanto aguardava a resposta, um misto de ansiedade e expectativa preenchia o ar. De repente, uma voz familiar atravessou a confusão.

"Hey, garota... você por aqui?" — disse ele, numa entonação animada, que atraiu olhares.

Virei-me rapidamente e, ao reconhecer o rosto dele, uma série de emoções apareceram. O mais novo do grupo, com seu jeito descontraído, aparecia para me mostrar que meus dias de paz não chegariam tão cedo e que eu, com certeza, ainda me colocaria em outras confusões com o amigo dele. Percebi que vários olhares se mantinham em nós, olhares confusos para ser sincera.

"Eu sou o Sam, lembra-se de mim?"

"Oi…" — consegui responder, tentando esconder a inquietação na voz, torcendo para que as pessoas parassem de olhar e para que Leo não aparecesse do nada. Eu definitivamente não queria iniciar uma discussão.

Como se percebesse meu nervosismo e, pudesse ler meus pensamentos, sorriu.

"Fique tranquila. O Leo não está nesta parte da faculdade." — disse, se divertindo com minha cara de espanto.

"Nesta parte?" — perguntei, receosa, sentindo que as palavras saíram mais como um suspiro do que uma pergunta.

"Sim, ele estuda no segundo Campus, o que fica do lado." - Apontou com o dedo, como se estivéssemos fora do prédio e eu pudesse ver alguma coisa - "Ah… Você quer que eu o chame?" — brincou.

Dei uma risada nervosa. O estresse de estar em um novo lugar e a ansiedade por reencontrar Leo começaram a conflitar, mas, de alguma forma, a descontração dele servia como um alívio temporário. Ele parecia alguém tranquilo, que não faria algo para machucar uma outra pessoa, e eu apostei tudo exatamente nesta sensação que tinha sobre ele.

"Não, está tudo bem. Não quero causar mais estresse do que já estou causando a mim mesma" — respondi, tentando manter o tom leve, mesmo enquanto o nervosismo crescia.

"Senhorita Maya" - ouvi a mulher da recepção me chamar e me virei para ela. - "Aqui está a sua grade deste semestre".

Antes que eu pudesse fazer algo, Sam deu um passo à frente e pegou o papel — "Vejo que você está no quarto ano da psicologia. Que legal! Estaremos na mesma sala" - disse ele animado. - "Eu irei ajudá-la daqui! - comentou, olhando para a recepcionista, que apenas acenou com a cabeça.

"Obrigada pela ajuda" - eu disse antes dele me puxar pelo braço.

Com um sorriso amistoso, ele começou a me guiar pela extensão do Campus.

"Então você é a Maya?" - Ele perguntou, me olhando animado.

"Acredito que já tenha escutado coisas não muito agradáveis sobre mim" - eu disse em tom sarcástico. - "Desculpe! Estou um pouco ansiosa" - comentei.

"Fique tranquila! Eu entendo" - Sam me passava uma energia amigável e isto estava acalmando meus nervos. "Meu primeiro ano aqui também foi totalmente estressante. Mas você logo se acostuma e eu ficarei feliz em te ajudar, se quiser, claro!

Conforme caminhávamos juntos, eu sentia que meus sentimentos estavam mais tranquilos e eu até consegui dar algumas risadas antes de chegar na sala.

***

Sam decidiu se sentar perto de mim e, para minha surpresa, eu comecei a me divertir com ele, me sentia bem. Ele parecia extremamente animado e tinha um jeito natural de conversar e tranquilizar as pessoas, o que tornava sua companhia agradável. Durante as aulas, ele interagia com os professores e suas opiniões criativas me deixavam intrigada, pois apesar de parecer inexperiente, ele refletia inteligência em suas observações.

***

As aulas passaram rapidamente, e vários tópicos foram discutidos, como psicologia comportamental, farmacologia e transtornos psicológicos. No entanto, eu estava ansiosa para que aquilo acabasse e eu pudesse ir logo para casa, pois meu estômago estava roncando.

Enquanto conversava com Sam durante as mudanças de professores, ele me contou mais sobre os outros integrantes do grupo. Descobri que eles moravam juntos, Kael era professor do segundo ano de Medicina e que ele aparecia de vez em quando nas aulas de psicologia, trazendo conhecimentos relevantes para a área. Rafe era tatuador, Eli um advogado, e Sam, como nós, ainda estava na faculdade, mas estudando Medicina.

"Kael não é muito novo para já ser professor de Medicina?" — me permiti questionar.

"Kael já tem 32 anos" — respondeu, dando uma risada contagiante.

Embora aquela revelação não mudasse muito a forma como eu via as coisas, era engraçado vê-lo se referir ao outro como se fosse muito mais velho. A conversa se desenrolava de forma leve, me permitindo rir e questionar algumas coisas, até que, de repente, Sam fez uma pergunta que fez meu coração disparar.

"Você não estaria mais interessada em saber sobre o Leo, talvez?" — Ele disse, mantendo um tom divertido, quase curioso, como se estivesse se divertindo às minhas custas.

Para minha surpresa, apesar de ter ficado um pouco ansiosa, não me irritei. A carga emocional que acompanhava o nome de Leo ainda estava muito presente, mas havia algo tão genuíno na forma como Sam interagia que eu acabei relaxando.

"Talvez você queira que eu saiba algo?" — eu respondi, tentando lutar com a vontade de realmente questionar algumas coisas.

Sam pensou um pouco antes de responder e sua expressão mudou, revelando uma fração de seriedade. - "Olha, Leo é um enigma para muitas pessoas. Ele é uma pessoa incrível e está sempre disposto a ajudar, por isso está estudando medicina, mas ele tem um jeito de se afastar... Ele já passou por algumas situações que..." - ele não conseguiu terminar sua frase e seu rosto ficou um pouco pálido. "Desculpe, eu preciso ir! Não devia ter te falado essas coisas." - Ele disse, acenando e saindo rapidamente da sala. 

Eu o olhei sair, intrigada. Suas palavras se instalaram no fundo da minha mente, criando novas perguntas. O que havia acontecido? Por que mudou sua feição e saiu da sala tão rápido? Essa nova dinâmica tinha me deixado confusa.

Assisti a última aula e tentei anotar o máximo de informações que consegui para passar para Sam, pois me senti no dever de fazer aquilo. Ele tinha me ajudado muito hoje. E após algumas horas eu estava finalmente em casa.