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Chapter 5 - Convite para a Confusão

Eu sempre gostei muito de estudar, principalmente coisas relacionadas a idiomas, folclore, e a mente humana. Mas chegar em casa, depois de todas aquelas aulas, foi gratificante. Apesar disso, eu sentia um vazio, me sentia sozinha naquele dia.

Decidi passar a tarde lendo sobre histórias de Nova Orleans, há vinte e cinco anos atrás, na época do meu nascimento, na esperança de encontrar pistas que me ajudassem a decifrar minha própria identidade. Durante minhas leituras, eu descobri que várias coisas aconteceram durante aquele período, eventos inexplicáveis, por assim dizer, o que me fez questionar se havia alguma conexão comigo e com meus antepassados. Eu desejava tanto descobrir algo, um fragmento da minha história, uma pequena luz no meio de toda a escuridão que eu vivia.

Enquanto eu me dedicava a leitura, o vibrar do meu celular me tirou do meu estado de concentração. Percebi que havia recebido uma mensagem e decidi abrir para ler, pois imaginava que seria algum familiar, porém era um número desconhecido, dos Estados Unidos.

*Hey, Maya!* - Dizia a mensagem

*Quem é?* - Questionei

*Seu melhor (novo) amigo! rsrs... é o Sam* - ele respondeu, e um momento de confusão me atingiu. Como ele havia conseguido meu número? Eu não lembrava de ter dado o número a ele ou qualquer outro aluno.

Talvez eu tivesse demorado muito para responder, pois logo ele enviou uma nova mensagem. Apesar de que, de alguma forma, eu achava que ele conseguia ler minha mente.

*Peguei seu número no papel que a recepcionista entregou hoje. Espero que não se importe*.

Não sei dizer se aquilo me deixou feliz ou irritada, pois eu nunca fui fã de compartilhar meu número de telefone, especialmente com pessoas que eu mal conhecia. Eu sentia que as pessoas geralmente invadiam a minha privacidade, o que me incomodava bastante. No entanto, tentei afastar esses pensamentos, eu estava sendo dura demais e talvez até chata. Sam parecia tranquilo, e talvez ele não fosse me incomodar. Mal sabia eu do que ele era realmente capaz.

Imagino que, cansado de esperar minhas respostas, Sam decidiu me ligar, pegando-me de surpresa. 

"Hey" - Eu disse, tentando soar tranquila.

"Hey troublemaker" - Ele respondeu, com um tom brincalhão - "Contei para os meninos que estamos estudando juntos e que somos melhores amigos agora, e eles querem te convidar para um jantar. Será um pedido de desculpas pelo que aconteceu no mercadinho. Você vem, né?"

A sua voz soava como o de uma criança mimada que queria algo e não deixava os outros em paz, não sem antes fazer birra.

"Não sei se é uma boa ideia, Sam." - Eu estava incerta sobre a situação, mas sendo sincera, estava mega curiosa para ver onde aquilo nos levaria e, também, ver o rosto de Leo outra vez, mesmo sabendo que nossa última interação não havia sido a mais amigável e que provavelmente continuaríamos nos alfinetando.

"Relaxa! Leo vai se comportar." - Ouvi duas vozes falarem ao mesmo tempo, seguidas por um grunhido, que era provavelmente do "garoto que se comportaria".

"Certo!" - Eu disse, não muito certa de ter feito uma boa escolha. - "Me passe o endereço e o que eu devo levar".

Não pude evitar sorrir ao ouvir aplausos do outro lado da linha, e alguns "uhuuu", que pareciam divertidos e descontraídos.

"Nós iremos te buscar!" - ouvi Kael dizer no telefone. E antes que eu pudesse protestar, ele complementou - "Esteja pronta às 19h. Já temos o seu endereço, então não precisa mandar por mensagem." - Com isso, eles desligaram o telefone e eu não pude nem perguntar como eles tinham meu endereço, mas então me lembrei que na folha da recepção, existiam todas as minhas informações.

O fato deles saberem onde eu morava me deixava inquieta, como se eles pudessem aparecer a qualquer hora, batendo em minha porta e invadindo minha casa. Aquilo poderia ser normal para eles, mas para mim não era.

***

Comecei a me arrumar para o jantar às 18h. Olhei no espelho e senti uma pontada de nervosismo crescer no meu peito. Escolhi uma blusa simples, mas que realçava a cor dos meus olhos, coloquei meu jeans confortável e uma sapatilha. Meus pensamentos e sentimentos se misturavam, num misto de ansiedade e expectativa. Eu estava animada por conversar com Sam, ele era divertido, mas estava mais ansiosa para ver Leo.

Quando olhei pela janela, já era quase hora de ir, e o pôr do sol parecia ainda mais belo do que nas noites anteriores. O telefone vibrou em cima da mesa, e eu corri para visualizar mensagem.

*Estamos chegando! Prepare-se para uma noite divertida.* - Sam escreveu, seguido de um emoji piscando.

Eu respirei fundo, tentando organizar meus pensamentos. O que esses garotos poderiam ter em mente? Será que teríamos um jantar tranquilo ou seria cheio de desavenças, pirraças e sarcasmos?

***

Alguns minutos se passaram e, de repente, ouvi uma buzina. Olhei pela janela e vi Kael e Sam, sorrindo e acenando para mim. Acenei de volta e me virei para pegar meu telefone, minhas chaves, afagar meu gato e pegar o vinho que eu tinha comprado porque, apesar de terem dito que não era para levar nada, eu sentia que isso era uma obrigação e ir de mãos vazias não estava no plano. Desci as escadas e fui em direção à porta, abri lentamente, tentando desesperadamente não deixar meu gato escapar. Sam foi o primeiro a falar:

"Oi, Maya. Pronta para a nossa aventura?" - ele disse animado - "Ah! Você tem um gatinho. Qual o nome dele?"

"Sushi" - eu disse, ouvindo-os rir do nome escolhido.

"Parece que alguém gosta de comida japonesa" - Sam disse enquanto cutucava Kael.

Kael deu um passo à frente e sorriu, com um brilho travesso nos olhos. "Nós prometemos que seria divertido, certo? Vamos!"

O que será que me aguardava?

***

Não demorou muito para que chegássemos em uma mansão. A fachada estava pintada em um tom creme e exibia portas enormes, assim como as janelas. Os pilares foram trabalhados em detalhes mais escuros e, ao me aproximar, pude ver que os detalhes eram desenhos de lobos, que pareciam vigiar cada visitante.

"Wow" - exclamei, sem conseguir esconder minha surpresa.

As portas se abriram e um aroma delicioso de comida tomou conta do ar.

"Bem-vinda, Maya" - disse Eli, com um sorriso amigável. Ele estendeu a mão para me cumprimentar e eu o fiz. Logo atrás dele surgiu Rafe, me cumprimentou com um sorriso e aceno. Ambos lançaram um olhar para Kael, enquanto avaliavam a situação com o mais velho.

"Leo está finalizando o jantar, então pedimos desculpas por ele não vir recebê-la" - disse Eli, percebendo que meus olhos correram para um vazio atrás deles.

Eu sorri, um pouco envergonhada, e enquanto era direcionada para o interior da mansão, ouvi um pouco sobre aquele lugar imenso. A mansão tinha três andares, além do subsolo, e eles se divertiam com minhas expressões de curiosidade. No porão ficava a biblioteca, algo que me deixou animada porque eu amava livros, e também o escritório. O primeiro andar era formado pelas áreas comuns como a sala de estar, a sala de jantar, a cozinha e o banheiro de visitas. O segundo andar e o terceiro andar eram os quartos, seis deles.

"Ela, com certeza, não quer saber sobre a casa." - ouvi Leo dizer, em um tom ríspido, enquanto se aproximava do grupo. Vi quando ele olhou para alguém atrás de mim, que havia soltado um som baixo de advertência. Ele assentiu e voltou-se para me cumprimentar, com um tom mais leve.

"Oi, de novo! - ele disse, ainda usando um tom amargo.

"Oi" - eu respondi.

"Espero que você goste da comida" - ouvi-o dizer surpresa, pois parecia que ele se importava, mas logo ele acrescentou - " Eles me obrigaram a cozinhar, como um pedido de desculpas, mas não se preocupe, eu não coloquei veneno."

Ouvi quando seus amigos chamaram-lhe a atenção, e ele deu de ombros.

"Desculpe! Só estou dizendo" - ele bufou, olhando fixamente em meus olhos e fingindo arrependimento.

"Imagino que não tenha colocado" - repliquei forçando um sorriso. - "Até porque seus amigos também estarão comendo e você não faria mal a eles" - Respondi de forma que o deixasse irritado.

Com o passar do tempo eu percebia que, talvez, aquela seria a nossa forma de comunicação, entre sarcasmos, respostas rispidas e olhadas de desejo.

***

O jantar estava delicioso, Leo havia feito um ensopado de carne e mariscos, acompanhado de arroz branco e pão feito em casa. Além disso, havia uma salada completa, com alface, tomate, cenoura, palmito e azeitonas e alguns outros petiscos, como tiras de frango frito e batata frita. A mesa estava cheia, e parecia que eles iriam alimentar 10 pessoas.

Kael havia escolhido nossos lugares, de forma que existiam três pessoas entre Leo e eu, pois, segundo Kael, ele não queria correr riscos de ver facas voando. Durante a refeição eu descobri que eles se revezavam nas tarefas domésticas, dividiam funções como limpar a casa, cozinhar, tirar o lixo, fazer compras e limpar a piscina que ficava no fundo da mansão. Aquilo havia me deixado surpresa, pois era um costume raro na minha cidade, a maioria dos homens como eles, não realizavam serviços domésticos, sendo apenas função da mulher.

Após finalizarmos o jantar, insisti em ajudar a retirar as coisas da mesa e depois de muito discutir, eu consegui ajudá-los um pouco, apesar de ter sempre um ou dois tentando me atrapalhar no meio do caminho. Quando decidi que era hora de lavar a louça, Kael e Eli se posicionaram na minha frente, bloqueando meu caminho até a pia, pois eles diziam que era falta de educação deixar uma dama, e visita, fazer o trabalho deles.

Estava prestes a protestar quando, de repente, Leo surgiu do nada e me jogou sobre seus ombros, como se eu não pesasse nada, fazendo com que nossos corpos levassem um "choque". O impacto causou uma mistura de adrenalina e confusão, e senti quando seus músculos reagiram ao toque também. Todos ao nosso redor ficaram boquiabertos, enquanto eu tentava apenas me segurar, com medo de que ele me soltasse de qualquer jeito.

"Pare de ser teimosa" - ele declarou, levando-me para a sala de estar, e me jogando no sofá.

Kael e Sam o seguiram, tentando amenizar qualquer possível briga. Rafe veio, logo atrás, trazendo consigo duas garrafas de vinho e sugerindo que tentássemos resolver nossas diferenças em algum jogo, e logo vi Eli se juntar a nós, carregando uma caixa térmica com mais bebida e também uma assadeira com petiscos.

Eu não conseguia responder após aquela situação e percebi que Leo também não abria a boca. Para ser sincera, eu nem conseguia pensar muito bem no que havia acontecido e por isso apenas acenamos com a cabeça, concordando com bebidas e jogos.