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Chapter 4 - A Garota de Capuz

Como já mencionei, não gosto da ideia de desistir facilmente quando quero algo. E, naquele dia em que a garota de capuz me empurrou, por algum motivo, minha vontade de conhecê-la não diminuiu. Na verdade, aumentou. E muito. Era como se esse desejo não fosse apenas sobre conhecê-la e entender mais sobre a espécie dos Zhaallk, mas como se houvesse algo mais, algo que eu ainda não conseguia explicar muito bem.

No dia seguinte, acordei bem cedo, levantei, vesti uma boa roupa, tomei meu café e disse à minha mãe que iria sair.

- "Mãe, vou até a vila hoje. Tudo bem?" perguntei.

- "A-até a vila? Por quê? Você precisa de algo de lá?" ela questionou.

- "Caso precise, eu mesma posso ir, filho. Não se preocupe, pode ficar aqui" completou antes que eu tivesse tempo de responder.

- "Eu agradeço, mãe, mas não preciso de nada. Vou apenas conhecer a região, já que nunca estive lá" expliquei.

- "Apenas para conhecer? Mas aquela região pode ser perigosa, filho. Ainda mais com o aumento da procura do reino por pessoas para ajudar no esforço de guerra. Se você realmente quer ir, eu vou junto, só para ter certeza" ela disse em tom preocupado.

A guerra que o reino de Cedrus travava com seus vizinhos havia se intensificado naquela época. Algo que deveria durar apenas alguns meses já se arrastava por anos. Muitas vidas haviam sido ceifadas, e muitas ainda seriam. Cedrus, nosso lar, lutava para manter sua posição contra os reinos de Falthur e Columbus, que atacavam incessantemente. Mas os recursos militares de Cedrus estavam diminuindo alarmantemente. Embora Falthur e Columbus tivessem forças menores, possuíam tecnologia muito mais avançada.

Para sobreviver, Cedrus, governado por nobres egoístas e oportunistas, começou a enviar crianças para a guerra. Assim, conseguiam prolongar os combates o suficiente para que esses nobres fugissem para outros reinos e impérios mais seguros, como o poderoso Valthorim, com sua grande costa no Oceano Vhalirûn, ou o reino Thalorûn, que ficava mais próximo e servia de refúgio para a nobreza de menor status.

Com isso, a preocupação da minha mãe era compreensível. Mesmo que o conflito não estivesse próximo da nossa vila — localizada no coração de Cedrus, um dos maiores reinos da região —, a chegada constante de refugiados aumentava os riscos. Pessoas desconhecidas agora vagavam por nossa vila, trazendo consigo incertezas e perigos.

Por fim, cedi à insistência dela.

- "Certo, mãe, venha comigo. Assim você se sentirá melhor, não é?" falei em tom brincalhão.

- "Exatamente…" respondeu, sorrindo.

Nós nos preparamos e partimos rumo à vila. No caminho, vimos tendas improvisadas espalhadas por ali, pertencentes aos refugiados que buscavam abrigo. O olhar da minha mãe refletia tristeza, mas também desconfiança. Seguimos até o centro da vila, que antes era pouco movimentado, mas agora estava repleto de pessoas.

Minha mente, no entanto, já tinha um destino em mente: a panificadora local. Quando minha mãe sugeriu uma visita à livraria da vila, onde comprara meus livros, recusei educadamente.

- "Bem, filho, chegamos à vila. Viu? Nada de outro mundo. É até bem simples. Há algum lugar específico onde você gostaria de ir?" ela perguntou.

- "Não tenho muita certeza, mãe…" respondi, receoso de revelar meu verdadeiro interesse na padaria e levantar suspeitas.

- "Hmm… Que tal a livraria? Você adora livros, não é?" sugeriu animada.

- "Acho que, desta vez, quero fazer algo diferente. Já sei! Que tal a padaria? Estou com um pouco de fome e tenho curiosidade em saber como eles fazem as massas" sugeri, torcendo para que ela não percebesse minha intenção.

- "A padaria, é? Hmm… Bom, se está com fome e curioso, podemos ir" respondeu, com um tom levemente desconfiado.

- "Isso…" murmurei, satisfeito.

Ao chegar, a padaria estava menos movimentada do que o restante da vila. Entre rostos conhecidos e estranhos, vi a mulher Zhaallk ocupada na cozinha, moldando pães com destreza. Meu olhar, no entanto, foi direto para o fundo do salão, onde avistei Scilia. Ela estava sentada, com seu capuz, concentrada em um livro.

- "Mãe, olha, é a Scilia. Vou cumprimentá-la, ok? Espere na fila por mim" disse, animado.

- "Filho… Tem certeza? Lembra do que aconteceu da última vez?" perguntou, preocupada.

- "Sim, mãe, mas acho que Scilia não tem mais medo ou receio de falar comigo. Lembra que ela até me disse seu nome?" argumentei.

- "Sigh… Tudo bem, vá. Mas ficarei de olho em você. Tome cuidado e seja educado" alertou.

Aproximei-me de Scilia com calma, para não assustá-la, e me sentei de frente para ela.

Arrasta…

- "Olá, Scilia. Tudo bem?" perguntei, animado e amigável.

Scilia deu um pequeno salto de susto e, aos poucos, abaixou o livro que lia, olhando para mim.

- "D-Dravyn? O-o que você está fazendo aqui? Por que chegou assim, do nada? Me assustou!" disse, visivelmente irritada.

- "Haha… Desculpe, não era minha intenção. Vi você aqui e resolvi vir conversar" respondi, sem jeito.

- "O que está lendo?" perguntei, mudando de assunto rapidamente.

- "Sigh… Bem, este é um livro que ganhei dos meus pais quando tinha 3 anos. Ele conta a história de um dragão que, mesmo nunca machucando ninguém, era caçado e odiado por todos. No fim, ao ser encurralado, ele se vê forçado a atacar para sobreviver, o que só reforça o ódio daqueles que o perseguiam. Não importava o motivo, apenas que ele era um dragão e, para eles, deveria ser morto" contou, com tristeza no tom de voz.

- "Você parece conhecer bem esse livro. Já leu muitas vezes, não é?" observei, notando o estado gasto das páginas.

- "S-sim, eu o li muitas vezes, mas não importa... Ler sempre me faz lembrar que as pessoas são más. Não importa o que tenha acontecido antes, elas sempre vão acreditar apenas naquilo que acham certo, ou que é melhor para elas," disse ela, calmamente.

- "Eu concordo. As pessoas, muitas vezes, se deixam alienar por coisas sem sentido ou por preceitos sem nenhuma base. Porém, algumas poucas ainda buscam um mínimo de sanidade nas palavras alheias antes de tomar qualquer ação," respondi.

- "Eu sou um exemplo desse tipo de pessoa. Nunca agiria sem entender tudo o que está acontecendo," completei.

- "Hmm... E se fosse um dragão grande e que todos dissessem ser cruel?" ela perguntou, sem desviar os olhos do livro.

- "Um dragão grande e cruel?" repeti, rindo, imaginando a cena.

- "Se eu encontrasse um dragão, mesmo que todos dissessem que ele é cruel ou perigoso, eu realizaria um grande sonho. Adoro esses animais. São seres incríveis, com capacidades quase infinitas. Encontrar um dragão seria uma honra! Não hesitaria, mesmo que o chamassem de maligno ou ameaçador. Eu acredito naquilo que meus olhos veem e no que sinto. Detesto tirar conclusões precipitadas ou adotar como verdade algo que outra pessoa diz, sem verificar por mim mesmo," declarei, com firmeza, enquanto me levantava, pois minha mãe já me chamava.

- "No fim, se eu pudesse encontrar um dragão como este do livro, eu o protegeria com minha vida, se fosse necessário, e o ajudaria a encontrar a paz. Ainda que precisasse enfrentar um exército inteiro. Esse é quem eu sou" finalizei, correndo até minha mãe.

Scilia abaixou o livro e me encarou. Ela não podia acreditar no que eu havia dito. Afinal, quem seria louco o suficiente para proteger um dragão contra um exército inteiro? O que alguém ganharia fazendo isso? Mas ela ainda não me conhecia, e por isso ficou cheia de dúvidas.

Voltei para perto da minha mãe, que conversava com a senhorita Zhaallk. Desta vez, ela estava um pouco menos apressada do que quando chegamos. Ao me ver, a senhorita Zhaallk me cumprimentou com um grande sorriso. Minha mãe já tinha conversado com ela e contado sobre o meu interesse em aprender mais sobre o trabalho que ela fazia ali. A senhorita Zhaallk, por sua vez, aceitou minha presença na padaria enquanto ela preparava as massas.

- "Olá, Dravyn. Que bom vê-lo novamente," disse ela, com um sorriso caloroso.

- "Senhorita Zhaallk... O prazer é todo meu!" respondi, fazendo uma reverência.

- "Sua mãe me disse que você tem interesse no trabalho que faço aqui. É verdade?" perguntou ela, animada.

- "Sim, senhora" respondi, educadamente.

- "Hmm... Por mim, tudo bem. Posso lhe ensinar tudo o que quiser saber sobre a produção de massas aqui, desde que sua mãe permita," disse ela.

Olhei para minha mãe com os olhos brilhando, quase implorando para que ela me deixasse ficar. Por um momento, ela hesitou, mas não resistiu por muito tempo e acabou cedendo. Permitiu que eu ficasse ali e aprendesse com a senhorita Zhaallk, com a condição de não sair sozinho da padaria. Ela temia que algo ruim pudesse acontecer comigo e prometeu me buscar ao final da tarde, antes do pôr do sol.

- "Sigh... Tudo bem, Dravyn. Você pode ficar, mas lembre-se: não quero que saia da padaria ou do lado da senhorita Vyresska," disse ela.

- "Vyresska?" perguntei, confuso.

- "Espera... Esse é o seu nome?" perguntei, agora surpreso.

- "Hahaha! Sua reação foi a melhor que já vi," respondeu a senhorita Zhaallk, rindo.

Na verdade, o nome completo da senhorita Vyresska era Vyresska Thalynar. Ela era uma mulher impressionante. Os Zhaallk eram uma espécie guerreira e muito poderosa. Isso, no entanto, não significava que ela fosse uma guerreira, mas apenas que pertencia a uma raça com essas características. Vyresska tinha cabelos curtos e loiros, olhos verdes em formato de fenda, semelhantes aos da espécie Howlith ou Serpentia. Seu corpo atlético e uma longa cauda coberta de escamas também chamavam atenção. Seus dentes não passavam despercebidos, com quatro caninos proeminentes e dois dentes afiados mais ao fundo, usados para inocular um potente veneno, os quais ela havia me mostrado na minha festa de aniversário, no dia anterior.

Minha mãe entregou meus cuidados à senhorita Vyresska e voltou para casa. Já eu segui para a cozinha com ela, onde aprendi os preparativos básicos necessários antes de mexer com qualquer coisa: lavar as mãos, higienizar os ingredientes, como legumes e frutas, e garantir que tudo estivesse limpo. Após isso, começamos a preparar as massas. Usamos ovos de Kaorrax, farinha, leite de Hornock, açúcar, uma pitada de sal, fermento natural, entre outros ingredientes, até preparar a primeira leva do famoso "Pão de Fruvorra." Essa era uma receita especial da padaria, recheada com a Fruvorra, uma fruta cremosa e adocicada, com um leve aroma cítrico. Era deliciosa mesmo quando consumida pura.

A tarde foi chegando, e já tínhamos produzido muitos pães e bolos. Parecia que, se quisesse, eu poderia abrir minha própria padaria! Com o movimento reduzido naquele horário, tivemos um momento para descansar e conversar.

- "Então, Dravyn, o que achou do meu trabalho?" perguntou a senhorita Vyresska, curiosa.

- "Sinceramente, senhorita Vyresska, não conseguiria trabalhar no seu lugar. É preciso muito autocontrole para não comer os pães antes de vendê-los," confessei, rindo, um pouco envergonhado.

- "Hahaha! Entendo o que quer dizer. No começo, eu também tive dificuldade com isso," respondeu ela, rindo da minha inocente observação.

- "Mas... Esse trabalho ainda é muito melhor que muitos por aí. Tempos de guerra são terríveis. Devemos ser gratos por não estarmos como muitos lá fora," disse ela, pensativa.

Curioso, aproveitei a pausa para perguntar algo que já me intrigava há algum tempo:

- "Tia Vyresska... Você poderia me contar qual é a sua relação com a Scilia?" perguntei, tímido.

- "Hm?... Isso foi inesperado," ela respondeu, surpresa.

- "Bom... Por onde começo? Ah, sim!" ela disse, refletindo por um momento.

- "Scilia e eu não somos daqui. Viemos de outro lugar há alguns meses, fugindo das guerras que assolavam nosso país," explicou, com um tom triste.

- "O-o que? De onde vocês eram?" perguntei, surpreso.

- "Nosso país natal se chama Zhyranthys. É um reino habitado apenas por híbridos. Ou melhor, era... Depois da guerra, ele foi destruído e consumido por outro reino," respondeu, com visível pesar.

- "Zhyranthys? Mas esse país não ficava no extremo leste? Uma região sem guerras?" perguntei, ainda mais surpreso.

- "Bom, durante certo tempo, claramente, não haviam muitas guerras. Porém, alguns meses atrás, tudo começou a mudar quando o antigo rei de Kaerthalyon morreu e foi sucedido pelo príncipe herdeiro. Por algum motivo, ele odiava os povos híbridos e começou a incitar a população de seu reino a exterminar o povo de Zhyranthys. Não demorou muito para que a guerra começasse, e até mesmo os países que considerávamos aliados nos traíram. Como resultado, nosso país, sendo menor e militarmente mais fraco, acabou derrotado. Aqueles que não foram mortos foram escravizados, e apenas alguns poucos conseguiram fugir. Eu e Scilia fomos algumas dessas pessoas…" respondeu ela, enquanto os olhos começavam a se encher de lágrimas.

- "...Na época, eu era próxima dos pais de Scilia. Vamos dizer assim. Quando a guerra estourou, eles me pediram que a levasse comigo e fugisse, enquanto eles ficariam para trás, nos dando tempo para escapar. Scilia tinha apenas 4 anos na época e sofreu muito com a separação repentina. Foram incontáveis as noites em que ela acordava aos prantos, gritando pelos pais no meio da noite… Eu só… só sinto tanto por nunca ter conseguido fazer nada naquela situação" disse ela, enquanto as lágrimas finalmente escapavam.

- "Depois disso, Scilia nunca mais foi a mesma. Antes, ela sorria, brincava... Era uma garota alegre. Mas, depois daquele dia, perdeu a vontade de fazer quase tudo. Ela se fechou, passou a usar um capuz e raramente sai para fazer qualquer coisa. Apenas quando eu insisto," Vyresska disse, ainda chorando.

- "Por meses, vagamos por vários territórios até chegarmos aqui, nesta vila. Foi aqui que decidimos nos instalar, ao menos temporariamente…" concluiu ela, enquanto limpava as lágrimas com os dedos.

Eu, apesar de ter apenas 4 anos na época, já era maduro para minha idade. Por isso, ouvi tudo com atenção e, mesmo sem saber exatamente o que dizer, não pude fazer outra coisa senão confortá-la. Odiava ver alguém de quem gostava tanto se sentindo tão triste.

- "Entendo… Você fez o melhor que podia, senhorita Vyresska. Graças a você, o bem mais precioso para os pais de Scilia está vivo e pode sonhar com um futuro. Por isso, nunca sinta que fez pouco. O que fez foi algo pelo qual os pais dela, onde quer que estejam, estarão sempre gratos. Eles puderam partir em paz, sabendo que a filha estaria sob os cuidados de alguém tão incrível quanto você," respondi, com um tom perseverante e um sorriso no rosto.

Vyresska ouviu minhas palavras com um olhar surpreso e, ao mesmo tempo, intrigado. Eu, uma criança, acabara de confortá-la, e, por mais incrível que pareça, isso pareceu aliviar parte do peso que ela carregava há tanto tempo.

- "Hahaha, você tem razão, Dravyn!" disse ela, com um sorriso sincero, enquanto bagunçava meus cabelos.

Então, ela se levantou e se espreguiçou. Nesse momento, minha mãe chegou à padaria para me buscar. Corri para ela, cheio de entusiasmo, contando tudo o que havia aprendido naquele dia. Antes de ir embora, porém, decidi tentar algo. Corri de volta para Scilia, que ainda estava sentada à mesa desde o amanhecer.

- "Scilia, olá!" disse eu, ao me aproximar.

- "O-o que você quer, Dravyn?" perguntou ela, um pouco tímida.

- "Scilia, percebi que você gosta muito de livros, certo? Que tal vir até minha casa para ler alguns comigo? Podemos conversar sobre várias histórias e, quem sabe, você goste da minha coleção. Tenho vários livros! Acho que vai adorar," sugeri, com um sorriso animado.

- "L-ler alguns livros? N-na sua casa?" ela perguntou, hesitante.

- "Isso mesmo! Você gosta de livros, não é?" insisti.

- "S-sim, eu gosto, m-mas…" ela começou, mas eu a interrompi.

- "Certo, então está combinado! Espero você amanhã de manhã. Tenho certeza de que vai gostar muito, eu prometo. Até mais, Scilia!" finalizei, sorrindo, antes de correr de volta para minha mãe.

Naquela noite, mal consegui dormir por causa da ansiedade. Nunca havia sentido algo assim antes, por ninguém nem por nada. Será que ela realmente viria? Será que fui rude ao convidá-la? Ou será que ela iria gostar dos livros da minha coleção? Logo, eu descobriria as respostas.